evermore escrita por Paulie


Capítulo 1
... for evermore


Notas iniciais do capítulo

Amiga secreta,
Começo as notas me direcionando especificamente para você porque, afinal, sem você, não existiria fic.
Quando eu vi seu nome no papelzinho (bem, papelzinho eletrônico, mas você me entende), eu, sem eufemismo, morri de medo. Medo porque suas fics são incríveis, medo porque você tem uma das fics de Fleur e Bill que eu mais gosto de todos os tempos, medo porque não somos tão próximas assim e talvez eu não estivesse escrevendo algo que você gostaria.
Apesar do medo, eu fiquei tão feliz de ter te tirado. Porque você é uma pessoa incrível e eu me senti extremamente honrada de ter a chance de te presentear.
Eu nunca escrevi nada sobre Drastoria, mas sua primeira opção era esse casal. Bom, desculpa ter escolhido, eu acho, já que não é uma música lá muito feliz para se escrever, não é mesmo?
Quero que saiba que, de coração, foi uma história escrita com muito carinho, pensada e concebida com você em mente.
É um amigo secreto, mas não é em dezembro, então: tudo de bom pelo resto do ano (e da sua vida). Você merece.

Aos demais, espero que gostem e aproveitem essa história!



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evermore

uma fanfic para o amigo secreto evermore

 

por Paulie

para Liv

 

novembro

 

and i was catching my breath

barefold in the wildest winter

 

Astoria nunca foi uma esportista. Também nunca foi uma entusiasta com atividades físicas ou exercícios ao ar livre. Não era nem sequer adepta a essas práticas. Que ironia era, portanto, que ela estivesse ali escalando os últimos metros daquela montanha gelada nesse exato momento. 

Respirou fundo e, de alguma forma, esperava que o ar rarefeito, a baixa concentração de oxigênio, a baixa temperatura daquele ar - ou, em última instância, a combinação de todos os fatores - fossem capazes de fazer seus pulmões respirarem de uma forma que a fizesse sentir viva novamente. Que produzisse novos neurotransmissores que fossem capazes de acordar seu cérebro - ela estava decidida, naquele ponto, que apenas os já existentes no seu corpo não eram capazes de lidar com o trabalho. 

Já faziam praticamente quatro meses desde que se sentiu viva pela última vez. E ela não conseguia mais suportar a cada novo dia continuar sendo a mesma morta-viva do dia anterior.

Os olhos doeram ao encarar a branquitude profunda de toda aquela paisagem - era bom sentir outro tipo de dor que não a emocional, ela achava que não era mais capaz. Talvez o guia estivesse certo e novembro não tenha sido a melhor época para aquela escalada, com a ameaça de uma tempestade de neve constante ali no topo.

Se recompôs - ela era uma Malfoy, afinal. Era a última Malfoy, mas morreria honrando o sobrenome que lhe foi dado - ou, melhor dizendo, que conquistara.

 

dezembro

i had a feeling so peculiar

that this pain would be for evermore 

 

Embolou a página do jornal, arremessando-a rumo à lixeira - sem sucesso em acertá-la. Nem mesmo hoje eles poderiam deixá-la em paz? Era pedir muito? 

E não era como se eles sequer soubessem da história inteira: narravam as partes que eram mais convenientes, ignoravam todo o resto e estampavam as manchetes mais chamativas em letras garrafais na capa. 

A foto que usaram dessa vez, pelo menos, era uma das boas. Levantou-se em um rompante da poltrona que ocupava indo atrás do papel que tinha jogado para o outro canto do cômodo momentos antes. Caiu em seus joelhos com mais força do que gostaria, desesperada para alcançar e começar o processo de desamassar a reportagem. 

Esticou o jornal por cima do tapete, passando as mãos por toda a extensão da página - inútil: as marcas recusavam-se a ir embora. Ergueu-se e deixou a sala, até mesmo tropeçando nos degraus da escada na pressa para descê-la na maior velocidade possível, procurando por algum dos funcionários a cada quarto que passava. 

— Ah, Bianca, aqui está você - ela se apoiou no batente da cozinha, um pouco sem ar pelo afobamento. 

— Sra. Malfoy? 

— Preciso do ferro. De passar roupa. Onde fica? 

— Posso passar para a senhora, só me entregar a roupa.

— Não. Preciso do ferro. Agora. 

Os joelhos nem sequer sentiram o impacto dessa vez, quando começou a passar o ferro já aquecido por sobre as letras pretas no papel. Como mágica, os amassados começaram a se apagar. Exceto aquele, bem na bochecha de Draco. Era uma foto bonita, mas ela não podia permitir que ficasse maculada por sua total falta de prudência.

Até mesmo no dia final, a bochecha de Draco estava intacta. Todo seu rosto estava. Um pouco pálido, no fim, mas ainda assim intacto. Em suas memórias, um pouco embaçadas depois desses seis meses, às vezes se mesclavam: pele, cabelo, roupa de cama e paredes - todos tão brancos que os limites se tornavam imprecisos. A tentativa praticamente inútil de adiar o inevitável.

Quando o cheiro de queimado invadiu suas narinas foi que percebeu que, perdida em memórias, havia deixado o ferro parado no mesmo lugar por tempo demais: um buraco queimado foi feito, furando a página e também marcando o tapete. 

A foto que tentava preservar encontrava-se destruída, contudo as letras em negrito do título se mantinham intactas: “Investigações sobre família Malfoy continuam: esquema de lavagem de dinheiro cada vez mais evidente”. 

Em um acesso, se ergueu e arremessou o ferro com a força que reunia dentro de si, arrancando o aparelho da tomada com um puxão. O barulho que resultou do choque entre o pesado eletrodoméstico e o gesso da lareira ecoou pelo cômodo - grande demais, vazio demais.

Hoje faziam cinco meses desde que Draco se fora.

 

in the cracks of light

i dreamed of you

 

As horas que passava deitada em sua cama eram as melhores do seu dia - Astoria não dormia muito, no sentido literal da palavra, mas era capaz de passar horas sonhando acordada e encarando o teto. Sem ter de responder perguntas. O que era a melhor parte. 

As sombras que os galhos da grande árvore plantada do lado de fora do quarto refletiam no teto durante a noite quase se rearranjavam, tornando vívidas suas memórias. Era como um cinema de sombras particular, em que ela podia reviver os momentos em que era realmente feliz. 

Naquela noite, assim que deitou, as sombras se arquitetaram no formato de um poste de luz, e ela sorriu, reconhecendo que assistiria às memórias daquele mês de março, há anos atrás. O mês em que conheceu o que era felicidade de verdade.

 

i replay my footsteps on each stepping stone

trying to find the one where I went wrong

 

A primeira vez que Astoria guarda lembrança de ter visto Draco, ela provavelmente tinha dez anos. Talvez onze. Seu pai estava lendo o jornal sentado na mesa do café da manhã, e ela comia se preparando para ir para a escola. Lá, na primeira página, estava uma foto em preto e branco de uma família toda loira, com roupas elegantes e grandes sorrisos no rosto. 

Astoria se lembra de ter feito uma piada sobre como o cabelo dele parecia ter sido lambido por uma vaca. Seu pai riu e Daphne disse que ofereceria seu cabelo a qualquer língua de vaca se em troca ganhasse a primeira página. 

Depois disso, claro, se ela prestasse atenção aos noticiários ocasionalmente se depararia com Draco ou com algum membro da família Malfoy. Mas ela era uma pré-adolescente: isso não estava em sua lista de prioridades.

Quando já estava terminando o ensino médio, discutir política era algo que gostava — embora sua mãe sempre ralhasse com ela que mulheres, especialmente tão jovens quanto ela, não deviam se meter nesse tipo de assunto (enquanto isso, seu pai apenas ria do dar de ombros de Astoria, que havia se tornado a marca registrada para quando a mãe começava a falar sobre isso). 

Nesse momento, claro, era inevitável não citar o nome Malfoy em algumas (a maioria) das discussões. A família estava há anos atuando no cenário político, ocupando todo e qualquer tipo de cargo que tivesse direito. E, se só isso não bastasse, aqui e ali surgiam boatos não tão agradáveis sobre a licitude de uma parte da sua fortuna. 

Então, se Astoria fosse ser sincera, ela o conhecia - de nome, e de aparência, e de influência - desde muito tempo. Mas se a perguntassem diretamente quando eles se conheceram, ela diria sem pestanejar: onze de setembro. Uma terça-feira. Achava estranhamente mágico que tivessem se conhecido em uma terça, não é um dia que você normalmente espere grandes acontecimentos - e, em resumo, ela diria, todo nosso relacionamento foi exatamente assim. 

Ela havia acabado de escrever um trabalho extremamente longo e cansativo e completamente inútil para sua formação profissional e se sentiu em pleno direito de caminhar até o bar da esquina de casa - até um desconhecido concordaria que uma dose de tequila era necessária e merecida. 

Já estava em sua segunda dose - mas quem estava contando? - quando um homem praticamente se jogou no banco ao seu lado no balcão, pedindo ao barman uma dose de uísque antes mesmo de se acomodar no assento. 

— Vou adivinhar que você não teve um dia muito bom? - ela disse antes que pudesse se impedir. 

— Foi o bar na terça-feira que entregou? Ou o terno amarrotado? 

— Na verdade, o desespero por álcool - ela deu de ombros, com um sorriso, finalmente olhando para o rosto do homem - Não esperava que fosse um Malfoy, isso devo admitir. 

— Então você me conhece.

— Sou britânica de nascença, um pouco impossível não te conhecer. Mas se quiser me contar o que aconteceu, posso fingir que sou, digamos, austríaca e nunca vi seu rosto na minha vida. 

— Uma das minhas primas é casada com o primeiro ministro de lá. Acho que a maioria lá me conhece também. 

Astoria riu. 

— Tudo bem, então eu sou uma argentina. Feliz? 

— Acabei de contar pro meu pai que eu tranquei a matrícula da minha faculdade. E que cancelei meu registro no partido dele. Também posso ter dito que ele é um filho da puta, mas essa parte eu tenho quase certeza que foi apenas mentalmente. 

Astoria acenou com a cabeça, acabando com a dose em sua frente e pedindo outra ao barman antes de responder. 

— Também não estava esperando isso, Malfoy. Estava preparada para um “ah meu Deus, diminuíram minha mesada”, ou, não sei. Não sei o que dizer também… - ela apontou para o barman - Traz outro uísque pra ele também. Eu pago. 

— E quem está pagando uma bebida pra mim, a propósito? Você me conhece, mas não te reconheço… 

— Astoria. Astoria Greengrass. Prazer - ela estendeu sua mão para ele. 

— E por que você está num bar numa terça-feira?

— Acabei de entregar um trabalho enorme, então estou me dando um presente - deu de ombros. 

Talvez tenha ficado até mais tarde do que planejava inicialmente no bar - especialmente considerando que tinha de estar na universidade para uma aula logo cedo no dia seguinte. Quando saiu, vestindo seu sobretudo, Draco Malfoy fazia o mesmo ao seu lado. 

— Quer dividir o táxi? - ele perguntou. 

— Eu moro há cinco casas daqui - ela apontou para o prédio (que um dia foi) marrom logo adiante.

— Sendo assim, vou ter de te acompanhar até em casa então. 

Ela sorriu e não recusou quando ele começou a andar ao seu lado. Pararam poucos metros depois e ela pegou a chave na bolsa, abrindo o portão. 

— Já que você não vai passar por iniciativa própria, acho que vai caber a mim perguntar se você não vai me dar seu número - ele comentou, quando ela se virou de frente para ele novamente. 

Ela não respondeu. Ao contrário, sorriu e deu um passo para mais perto dele. Os cabelos loiros do rapaz estavam em um tom prateado sobre a luz do poste que estava bem acima de onde estava. Teve de ficar na ponta dos pés e deu um beijo no canto da boca do homem. 

— Você sabe onde eu moro, acho que não precisa de celular por enquanto, precisa? Boa noite, Draco. 

Na quinta-feira, Draco voltou ao seu prédio e, como não sabia o apartamento dela, tomou a melhor saída que pode pensar no momento: apertou todos os interfones, pediu desculpas muitas vezes, até acertar. Astoria desceu as escadas com a bolsa na mão e um sorriso no rosto, enquanto entrava no táxi junto a ele. 

Quando um ano depois ele a pediu em casamento, ela aceitou com lágrimas nos olhos. Apesar das insistências da mãe de que ela sujaria seu nome, se colocando no meio de um grande escândalo - a cada semana saíam novas reportagens sobre a lavagem de dinheiro e corrupção política envolvendo a família Malfoy -, Astoria não se importou. Draco já não estava mais no negócio junto com o pai, seriam apenas os dois. 

Se mudaram para o apartamento dele, quando se casaram. Menos de seis meses depois, Lucius, o pai de Draco, faleceu, e eles se mudaram para a mansão da família para ficarem junto a Narcisa, a viúva. Astoria era feliz, mais feliz do que se imaginaria. 

Mesmo quando perceberam que não conseguiriam ter filhos, ela estava feliz. Ela e Draco deram as mãos quando a médica lhes contou sobre o útero inóspito de Astoria, após o quinto aborto espontâneo. Choraram, como era de ser esperado, mas logo superaram e conseguiram seguir em frente. 

Cogitaram adoção. Chegaram a enviar os documentos, fizeram todo o processo. Esperaram ansiosamente. Tempo demais. Foi Narcisa quem abriu os olhos deles: eles não seriam escolhidos, não jogariam uma criança inocente no meio de um escândalo político, na mão de criminosos. Não se tivessem a opção de não fazer isso. O processo ainda estava em julgamento, mesmo que Lucius estivesse morto. 

Foi outro baque para o relacionamento dos dois. Justamente quando pareciam estar se recuperando, Narcisa adoeceu. Ela perdeu toda sua força e vitalidade, de um momento para o outro, e já estava acamada quando diagnosticaram o câncer em seu pâncreas. Faleceu menos de dois meses depois. 

Haviam se reerguido - mais uma vez. A vida era uma montanha-russa, Astoria sabia, e eventualmente chegaria ao momento da subida. Fizeram uma viagem para a Grécia: ela decidiu que estavam ali, começando a subir mais um morro. As águas azuis, as construções brancas, o amor que sentia por Draco, o quanto eles se completavam. 

Ao voltarem para a Inglaterra, a primavera tinha feito desabrochar todas as flores que Narcisa havia plantado em seu jardim. Astoria sempre havia gostado da mansão, mas essa era sua estação favorita: quando podia caminhar rodeada de cravos. 

Eles estavam discutindo uma próxima viagem - Astoria queria conhecer o Rio de Janeiro, mas Draco achava que deviam conhecer o interior australiano. Ela se lembrava exatamente do momento em que deu uma risada e encarou os olhos muito azuis de Draco. Porque era exatamente nesse momento em que a memória se tornava escura demais, e que não conseguia mais prosseguir.

 

i rewind the tape, but all it does is pause

on the very moment all was lost

 

Astoria se sentou em um rompante na cama, sentindo a camisola molhada com seu próprio suor grudar em suas costas. Havia cochilado. 

Se fosse sua escolha, teria escolhido continuar adormecida. Talvez nos seus sonhos as próximas memórias fossem alteradas, não fossem tão dolorosas, pudessem mostrar um futuro diferente. Ela não saberia dizer exatamente se isso aconteceria: nunca conseguiu, nem mesmo uma vez desde aquele dia, prosseguir dormindo quando seus sonhos se aproximavam daquele dia. 

Levantou-se em um impulso da cama. Abriu a água da pia do banheiro e até mesmo chegou a encher suas mãos com ela, tentando molhar seu rosto. Quando encarou seu reflexo no espelho a sua frente, porém, não continuou. Ainda podia ouvir a água corrente no fundo, abafada, como se escoasse em um cômodo longe dali. 

Colocou a mão sobre o peito, uma dor súbita a acometeu. Pontadas, pontadas, dor. Seria isso que Draco teria sentido? Teria ele sentido alguma dor? Ela torcia para que não, ou, se fosse muito inevitável, que tenha sido muito rápido. Como uma picada de abelha: você sente a dor, de repente não tem mais nada lá - bem, até tudo começar a inchar. 

Mas Draco não teve realmente tempo de sentir qualquer coisa inchar, teve? Após aquele momento em que ele caiu no chão de casa, ela não o havia visto acordado nunca mais. Talvez um infarto fulminante tivesse sido uma saída menos dolorosa para ele (e o mesmo tanto para ela). Todas as paradas durante aquela noite no hospital - só para a manhã trazer a morte definitiva… 

Apesar de estar sentindo as pontadas, sabia que não tinha nada. Não era a primeira e não seria a última vez que sentia aquilo. Mas estava melhorando. Ela estava. As crises eram mais espaçadas agora e ela conseguia trabalhar melhor sua respiração. 

Tempos depois - segundos, minutos, horas, ela nunca sabia identificar - ela encarou novamente sua imagem pálida no espelho. Em seu rosto, além das gotas de suor que já estavam ali, longos rastros de lágrimas se estendiam pelas bochechas. Molhou-o e fechou a torneira, voltando para a escuridão do seu quarto. 

 

fevereiro

 

to be certain we’ll be tall again

 

Pela primeira vez desde julho, ela conseguiu passar em frente ao cemitério e não sentir seu coração apertar no peito. Estava dentro do carro, rumo a uma consulta de rotina com sua médica. Talvez fosse hora de visitar o túmulo de Draco, foi o pensamento que passou pela cabeça dela. 

Mais de uma semana depois foi que ela realmente conseguiu ir até lá. Os túmulos dos Malfoys ficavam em um lugar único do cemitério. Havia uma cerejeira plantada ali, mas que agora estava com os galhos completamente desnudos. Eram uma coleção imponente de mármore claro, muito bem cuidados e com flores regularmente trocadas - eles tinham um funcionário contratado especialmente para isso, afinal. 

Mesmo depois de todo esse tempo, ainda não havia se acostumado com tantos funcionários que eles tinham - ela nem sabia de todos eles até hoje, mesmo sendo a nova responsável pelas finanças. Ainda mais considerando que estavam em plena decadência, era de se esperar que não houvessem tantos deles. 

Percebeu que estava de forma inconsciente adiando o momento que estaria de frente a Draco. Respirou fundo - respirar era tão mais fácil agora, quase como se não precisasse mais ser um esforço voluntário. 

Se ajoelhou e encarou o nome de seu marido cravado na pedra. Era difícil imaginar que tudo que Draco era agora era… Isso. 

Conseguiu sorrir. Fechou os olhos e, em sua memória, Draco era Draco novamente. Começou a falar com ele, como se ele realmente estivesse ali. Porque ele estava. E sempre estaria. Com ela. 

 

março

can’t not think of all the cost

and the things that will be lost

 

A porta do escritório de casa sempre foi muito barulhenta. Astoria se lembra de ter descido as escadas, ainda na primeira semana de casada, ainda meio dormindo e com uma carranca no rosto. 

— Você vai ter de passar um óleo nessa porta se pretende continuar vindo trabalhar sábado de madrugada. 

— Já são sete e meia, querida. - Draco já estava sentado em sua poltrona atrás da mesa quando respondeu.

  — Como eu disse, madrugada. - ela contornou o esposo e apoiou o queixo na cabeça dele. 

— Não vou mais mexer na porta, prometo. Pode voltar a dormir.

— Agora já acordei, não consigo dormir de novo… - apesar disso, seus olhos já se fechavam como se um peso invisível os estivessem forçando a isso.

— E se a gente fosse tomar brunch naquele lugar que você gosta? Aquele com os bolinhos de framboesa. 

— É por isso que eu amo você - ela respondeu, abraçando o pescoço do homem - Vou ir trocar de roupa. 

Ela lembrava vividamente daquele dia. E também dos outros que vieram em que também foi acordada pelo barulho da porta - aparentemente óleo era inútil naquela situação. Hoje, no entanto, havia ficado feliz ao ouvi-lo: era como se uma parte do próprio Draco ressurgisse apenas para lembrar que aquele era o seu escritório. 

Faziam oito meses desde que havia pisado pela última vez ali. Suspirou, era tempo de se reerguer - tanto ela quanto o nome Malfoy. Havia acordado hoje com aquela ideia insistente, com aquela inspiração. 

Há muito, ela sabia, o nome que adotara após o casamento estava manchado - e, era preciso ressaltar, não sem motivo. Nos últimos tempos, após a morte de seu sogro, Draco estava tentando uma nova abordagem, mudando o foco do nome da política e áreas de direito para a área administrativa. 

Ela não entendia muito daquilo, se fosse sincera, mas achou que tentar ler algumas coisas e entender para onde ele estava direcionando seus esforços fosse um bom princípio.

Aparentemente, ela raciocinava consigo mesma (às vezes em voz alta, já que aparentemente seu cérebro funcionava melhor assim), Draco estava investindo com parte do lucro que tinha no ramo imobiliário em uma nova empresa hospitalar. Uma rede de laboratórios de análises clínicas, aparentemente. 

Discou o número do contador da família - ele com certeza conseguiria explicar melhor para Astoria. 

 

julho

 

is there a line that we could just go cross?

(you were there)

 

Era isso. Ela sorria para o reflexo de si mesma no espelho da sua maquiagem, orgulhosa. Tinha certeza que, se Draco estivesse aqui hoje, ele também estaria orgulhoso. De certa forma, ele estava, e sempre estaria. 

Seria o dia de inauguração da nova filial da empresa. Ela havia tomado a frente do projeto. Havia feito os últimos detalhes na planta humanizada (no fim, seu diploma de arquitetura não havia sido jogado fora). Havia decidido que a fachada teria mármore branco, como uma assinatura dos Malfoy. E que usaria verde esmeralda nos estofados da sala de espera.

Sempre achou que verde combinava com a família. Talvez por isso hoje havia escolhido usar o colar de esmeraldas que Narcisa havia lhe dado de presente de casamento. Nunca havia tido coragem de usar, eram muito imponentes, gritavam Malfoy. 

Pois bem, que gritassem. Pois ela era uma - e nunca havia se sentido mais como uma. E se o sobrenome fosse morrer com ela, ela faria questão de honrá-lo durante o restante da sua vida, e de contribuir para o legado da família. Era a última Malfoy, mas faria questão de que fossem lembrados ainda por muito tempo - por coisas boas, não pelos infortúnios do meio do caminho.

Draco estaria com ela a cada passo. Mas era seu papel agora ser forte por eles.

Astoria Malfoy sorriu antes de sair do carro para inaugurar seu novo prédio. 

 

i had a feeling so peculiar 

that this pain wouldn’t be for evermore


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Notas finais do capítulo

Apesar de não ter como escrever algo super alto astral por causa da música - meu Deus, é só ler a letra de Evermore e ficar para sempre refletindo enquanto chora em posição fetal - eu não queria uma história triste.
É mais uma história sobre superar o luto, aprender a seguir em frente apesar de tudo, sobre construir um legado.

Meu super obrigada às meninas do JPFMB pelo convite e oportunidade de participar do amigo secreto. Me diverti muito.

Espero que todos tenham gostado, em especial você, Liv.

Beijinhos e até uma próxima!