Frank - O Caçador 1ª Temporada escrita por L R Rodrigues


Capítulo 6
Frank vs. Stein (Parte 2)




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O diretor abrira a porta da sala de Carrie com alarde, o celular em mãos.

— Boa notícia: Frank já está na sala de interrogatório.

A assistente o fuzilou com o olhar.

— Em que mundo isso é uma boa notícia? - questionou, aborrecida, levantando-se depressa da cadeira.

— Desculpe, não mencionei a possibilidade dele responder em prisão domiciliar. - informou Ernest, logo sentindo o vibrar do celular indicando ser uma nova chamada. Carrie não deu suspiro de alívio, mas a chance era até tranquilizadora. - Se a justiça for feita, na visão deles, a mancha na imagem do departamento pode ser amenizada. - atendeu a ligação. - Alô?

"Com justiça eles querem dizer condenação por julgamento... Frank ainda tem muita sorte por ser um agente especial, fosse um qualquer decretariam prisão temporária até o primeiro dia no tribunal.", pensou Carrie, resistindo o máximo que podia á seu instinto de roer as unhas quando a situação pressionava nervosismo.

A expressão que o diretor fazia durante a ligação só a deixava com mau pressentimento.

Errnest baixou o telefone, tapando o auto-falante.

— Má notícia: Frank nocauteou um vigia e escapou roubando um carro de um dos funcionários. - voltou à chamada - Obrigado por informar, Jake, até mais. - desligara, o sangue fervendo nas veias - O que aquele imbecil pensa que está fazendo? Já estava com a corda no pescoço, agora está prestes a ser estrangulado.

— Você ouviu todo o interrogatório? - perguntou Carrie, afligindo-se.

— O superintendente foi até lá, soube que ele disse ter posto um rastreador no carro que ele diz ser igualzinho ao seu. A história de que ele enfrentou seu gêmeo malvado é um conto da carochinha para os policiais.

— O mini-rastreador que lembro de você ter dado á ele ano passado... - disse Carrie, um pouco pensativa. Depois voltou seu olhar de pressa ao diretor - Você deve ter a senha, posso saber pra onde ele está indo.

— Calma aí, só um segundo... - disse Ernest, movendo rapidamente seus dedos na tela touchscreen. Após um instante, finalmente acessou a senha da qual nem lembrava mais - Aqui está. - mostrara à Carrie.

Memorizando os dígitos com eficiência, a assistente logo correu até seu notebook para rastrear o GPS de Frank bem como a direção do carro que ele estaria seguindo.

— Frank segue por uma estrada que vai à uma área residencial há 52 minutos daqui. Já o carro grampeado... - disse ela, digitando a senha - Aqui. - Ernest se pôs ao seu lado, curioso. Um círculo vermelho piscava para indicar que o carro do impostor parou em algum ponto da área - Rua 1115. Número da casa: 53. - um momento de reflexão a pegou sem que percebesse.

— Terra chamando Carrie... - disse Ernest, estalando os dedos próximo ao rosto dela.

— Ah sim. - disse ela, despertando - Esses números... Essa rua me soa familiar, algo me diz que o Frank já investigou um caso nesse exato local. Como estou na zona de perigo, melhor ir pra casa. - disse ela, pegando sua bolsa e apressadamente encaminhando-se à porta.

— O quê? Não entendi. - disse Ernest, seguindo-a.

— Preciso falar com Frank na zona livre que é onde fica minha casa. - disse ela, abrindo a porta. Virou-se para o diretor - Não se preocupa comigo, mesmo que eu não possa de impedi-lo de cometer uma loucura, podemos refrescar as memórias de um do outro sobre essa pista. - fechou, saindo rapidamente.

Duvemport mal conseguia conter dentro de si tamanha enervação que aquele imenso peso provocava. Passou as mãos no rosto, sentindo-se sem eira nem beira.

                                                                                        ***

O carro preto roubado seguia a toda velocidade por aquela estrada escura. Dobrou numa semi-curva fazendo uma nuvem de poeira subir. As mãos de Frank no volante suavam em abundância.

"Espero que quem encabeçou toda essa artimanha pra ferrar com a minha vida tenha um bom motivo pra fazer o que fez.", pensou Frank, sentindo uma revolta consumi-lo.

O toque do celular o tirou de seus devaneios movidos pela raiva.

— Alô? - disse após atender - Carrie, é você?

A assistente, àquela altura, já havia parado seu carro em frente à sua residência. Quando saiu fizera a ligação.

— Frank, seja lá o que estiver pensando em fazer, eu sugiro que desista. Você se tornou um fugitivo da lei, a Força Tática vai caçar você até os confins da cidade.

— Sem chance. Eu fiz o que julguei ser correto, por mais impulsivo que fosse; Não me orgulho disso, mas foi preciso. É minha única oportunidade de tirar essa história a limpo cara à cara com o cabeça dessa armação.

— Olha, me escuta... - disse Carrie, sentindo-se um pouco cansada ao fechar brevemente os olhos - É muita sorte eu ter chegado em casa e descobrir que você ainda está à caminho. Está com o GPS ligado?

— O GPS do rastreador. - disse Frank, olhando para o aparelho conectado ao GPS comum do carro. - Está me guiando até onde ele parou.

— Eu já sei onde ele está. É numa área residencial, rua 1115, casa número 53. Isso te soa familiar?

Uma torrente de arrepios assaltou o detetive. Parecia que um lampejo de lembranças tivesse sido acionado. Quase se esqueceu de que estava dirigindo.

— 1115... Tô começando a lembrar... Foi um caso... um caso sobre demônios. - disse, logo esbugalhando os olhos ao ter clareza das informações antes nebulosas - Aquele caso das gêmeas, Carrie! Uma delas se chamava Emily ou era Ashley, sei lá...

— As irmãs possuídas. Uma delas ligou pra você quando na verdade era o demônio querendo atrai-lo para uma armadilha. - disse Carrie, fazendo bom uso de sua ótima memória novamente - Foi há 3 anos, talvez um dos primeiros casos que você pegou. Tantos foram desse tipo nessa época que até entendo você não lembrar. Esses nomes também... Mas Ashley me parece mais provável de ser o real nome de uma delas.

— Olha, Carrie... - a fala de Frank tornou-se embargada de tensão - Acho melhor não falarmos mais nisso, vamos nos focar só em pegar o verdadeiro monstro.

— E se o demônio que viu for o mesmo que possuiu elas? - questionou Carrie, suspeitando da tentativa do detetive em desconversar. - Frank, raciocina comigo, não pode ser mera coincidência ele estar tão próximo de você e só agora, quando surge uma duplicata que está vinculada a casa onde você exorcizou esse mesmo demônio. Não sente as peças se encaixando? Essa é uma das melhores sensações que gosto de ter quando vamos fundo no mistério.

— Quer saber mesmo o que aconteceu naquela noite? - perguntou Frank, sentindo-se angustiado. O céu nublava-se sinalizando uma vindoura chuva passageira.

— Por que está me perguntando isso? - quis saber ela, franzindo o cenho, desconfiada.

— Porque não fui totalmente honesto com você. - disparou Frank, com firmeza - Eram duas irmãs gêmeas. Mary e Ashley... sim, são esses os nomes, sem dúvidas. Pra ser direto... eu... - os primeiros chuviscos começavam a cair, fazendo ele ligar os limpadores de para-brisa - Em dado momento, eu fiquei perdido, o desgraçado só queria jogar comigo e então...

— E então...? - indagou Carrie, ávida por saber, congelada de curiosidade.

— Então, eu... Acabei matando a Ashley por engano. - revelou Frank, comovido.

— Oh, deus... - surpreendeu-se Carrie, com um forte aperto no coração. - Isso explica muita coisa.

— Eu forcei essa memória falha só pra tentar esquecer que vivi aquela noite. - declarou Frank, a culpa voltando à tona com força total. - Provavelmente Mary, acho que era a mais velha, deve ter arquitetado isso como vingança. Em outras palavras, ela é uma descendente da tal civilização.

— Ótimo, mistério resolvido. - disse Carrie, empolgando-se de repente. - Não vou te culpar, você foi ludibriado, era um demônio trapaceiro, não precisa se torturar por isso. Eu vou até aí e...

A fala de Carrie foi interrompida quando a assistente recebeu um golpe por trás da cabeça através de um cassetete preto, caindo instantaneamente inconsciente no chão. A figura atrás dela era uma pessoa vestida inteiramente de preto com uma máscara de mesma cor, cujo olhos eram a única parte que deixava visível.

Frank estranhou a abrupta interrupção, mas não mentiu pra si mesmo quando lhe veio a certeza de ter escutado um barulho de um golpe bem forte.

— Carrie? Está na escuta? O que foi isso aí?

A figura sombria se aproximava lentamente para apanhar o celular com a mão coberta por uma luva negra. Ela, por fim, tirara a máscara, revelando ser uma linda garota de cabelos loiros cacheados.

— Sim, ela vai á minha casa. Eu mesma vou leva-la para um passeio. Ela voltar dele sã e salva só depende do resultado final.

— Essa voz... - disse Frank, estarrecido. A chuva se intensificou. - Vo-você... é a Mary Taylor. O que fez com a Carrie?

— Relaxa, só a pus para dormir. - disse ela, o tom debochante - Mas caso demore, ela pode ter um descanso eterno. Assim como minha irmã. Lembra do rosto dela? Da expressão de horror que ela fez quando enfiou aquela faca molhada com óleo sagrado?

— Eu me enganei. - disse Frank, tentando defender-se.

— Ou talvez o demônio estava em você e fingiu remorso quando o estrago estava feito. - acusou ela, irredutível, a expressão sisuda. - Mas compactuou das intenções dele, por isso não procurou esclarecer nada comigo depois.

— Olha, quer saber de uma coisa? Você deve ser tão paranoica quanto é boa em criar homens de lata. Eu vou salva-la e é bom não encostar em nenhum fio de cabelo dela. Tá entendendo? - disse Frank, adotando uma postura severa compreendendo a ameaça que Mary representava.

— Vou adorar ver você tentar me impedir. - provocou Mary, chutando o corpo de Carrie para vira-la já que havia caído de bruços - Vou chegar antes porque não quero perder o segundo round. - desligou.

Ao ver que a ligação foi encerrada, Frank pisou fundo no acelerador em meio à chuva quase torrencial. Uma descarga de adrenalina fora ativada em seu corpo ao se dar conta do perigo que Carrie poderia estar correndo nas mãos de uma mulher que, a julgar pelo tom, seria capaz de tudo para saciar sua vingança.

                                                                                        ***

Os olhos de Carrie abriam-se lentamente apresentado uma visão borrada e turva de um local que emanava velhice e com ambiente preenchido por um odor pesado de mofo e poeira.

A assistente gemia enquanto despertava. A primeira coisa esclarecida que viu foram suas mãos presas por cintas de couro bem amarradas. Sentiu o peito também amarrado pelo mesmo material e as têmporas com eletrodos grudados numa esponja molhada com água misturada a sal. A dor atrás da cabeça latejava de dois em dois segundos aparentemente. Ao erguer os olhar para frente, viu Mary abrindo o grande livro de comandos que herdara por direito.

— Ah, então é você... - a voz de Carrie gradualmente tornava-se menos fraca e menos arrastada - Você é uma Anakon.

— E você minha prisioneira. - retrucou Mary fazendo pouco caso da situação - Também a pessoa que ele mais ama. Não é?

"A que ele mais ama?!"

— Olha, não sei que tipo de insanidade planeja fazer comi... - cortou a frase ao visualizar à sua esquerda um painel de alavancas para eletricidade. Isso a fez despertar por inteiro, graças também à revolta - Uma cadeira elétrica?! Genial... Vai ameaçar me fritar se o Frank não chegar a tempo.

— Em 10 minutos pra ser exata. - disse Mary, encarando-a com as mãos apoiadas na mesa - Ou ele coopera ou você se junta à minha irmã. Ele desgraçou minha vida tirando a coisa mais importante que eu tinha, nada mais justo do que tirar a coisa mais importante da vida dele.

— O que te leva a considerar que eu ser alguém relevante pro Frank justifica eu ter que estar aqui?

— Minhas fontes, meus estudos. - disse ela, soando misteriosa, levantando uma sobrancelha com ar soberbo. - Todo esse tempo dediquei minha vida a esse plano e não vou descansar até chegar ao fim.

— Então admite que esteve espionando o Frank? - pressionou Carrie, desafiadora.

— Eu sou a captora, sou eu quem devia fazer perguntas. Mas sendo generosa: Sim. Existe alguém no departamento de polícia que me deu uma colher de chá e me poupou bastante. Ele me chamou de paranoica, você também deve ser já que lendo-a pela aparência também não dispensa uma boa conspiração ou um mistério suculento.

— Eu pareço paranoica pra você? Faça-me o favor... - disse Carrie, não afastando o pensamento sobre o aliado misterioso de Mary. "Só pode ser aquela falsiane da Megan! Ligada às Indústrias Crissman e agora a uma psicopata vingativa... Essa noite tá ficando cada vez melhor." - Se vou morrer aqui, morrerei por Frank. Ele agiu com ingenuidade, o demônio manipulou toda a situação para pega-lo.

— Ingenuidade não é o mesmo que inocência. - destacou Mary, o olhar colérico - Vou lutar para fazer a justiça acontecer, é uma causa nobre pela memória da Ashley.

— Colocar sua vingança estúpida na frente de várias vidas inocentes é muito nobre. - ironizou Carrie, não escondendo seu repúdio pela frieza cristalina da garota.

— Os fins justificam os meios. - redarguiu Mary, sorrindo cinicamente.

Carrie balançava a cabeça, enojada.

— Talvez a Ashley era uma pessoa bem mais digna de estar viva.

Barulhos de passos ecoaram em aproximação. Mary voltou sua atenção para a escadinha que permitia a entrada, logo sorrindo presunçosamente.

— O show já vai começar. - disse ela, sentindo-se juíza no combate que decidiria se Carrie sairia viva ou morta.

A figura troncuda de Frank irrompeu das sombras em uma postura insegura. Os olhos de arrependimento genuíno fixaram-se naquela jovem amargurada e corrompida pelo ódio. "Tem que existir um jeito disso terminar sem mortes. Ela não tá pra brincadeiras. Vou ser cauteloso e tentar do meu próprio modo, preciso tocar o coração dessa menina custe o que custar.".

— Frank... - disse Carrie, animando-se contidamente ao vê-lo - Como pode ver, minha vida é a moeda de troca.

— Solta ela, Mary. Vamos conversar. - pediu Frank, fechando os olhos por um segundo, seriamente focado. - Eu posso sair daqui sem seu perdão, mas não vou sem a Carrie.

— Ou pode sair bem machucado. - provocou ela, olhando de soslaio para uma porta escancarada que ficava poucos metros de distância da escada. - Já eu não sairei sem ver você ter o que merece. A morte é boa demais pra você, então imaginei que a forma ideal de fazer minha justiça era desgraçando a sua vida de uma forma pior do que fez com a minha. A humilhação, a sensação de fraqueza... - sorriu de canto  -... quis fazê-lo pagar em dobro todo o sofrimento que me causou. Essa é a justiça que quero fazer.

— Chama isso de justiça?! - disse Frank, enervando-se - É justiça pessoas inocentes morrerem como se não fossem nada por causa de uma pessoa que não saiu do segundo estágio de luto!? O demônio gosta de despertar a raiva mais profunda nas pessoas com suas travessuras, e pelo visto não foi diferente com você. Nós fomos vítimas nisso, Mary. - disse, apontando para si e para ela com rapidez. - Nós fomos enganados! Aquele demônio pregou uma peça cruel na gente, foi tudo parte do plano maquiavélico dele. Tenta entender isso.

— Frank, não gaste sua saliva com essa garota, ela é uma psicopata, saca as algemas antes que o T-800 venha. - disse Carrie, logo em seguida tendo um lampejo de teoria - Ou talvez... talvez o demônio esteja nela!

— Pior que eu não trouxe óleo sagrado, nem água benta. - disse Frank, encarando-a sério. Ergueu a mão direita, esticando o braço - Mas não quer dizer que não possa tentar. - falou, desafiante.

— O que vai fazer? - perguntou Mary, olhando-o com chacota - Que idiota, vocês devem saber que um Stein só pode ser controlado por um Anakon, devem ter visto algo numa wikipédia de quinta categoria. Eu tenho sangue descendente. Se eu tivesse um demônio usando meu corpo minha criatura só seria um homem de lata sem rumo. E aí? Satisfeitos?

— Pior que parece fazer sentido... - disse Carrie, decepcionada - Esquece o exorcismo, Frank, ela é uma psicopata mesmo, pra isso aí ou é cadeia ou quarto branco.

— Cala a boca senão vou até aí e faço churrasquinho de você, sua vadia! Devia ter fechado sua boca com uma bola de meia suja! - bradou Mary, irritada. Voltou-se para Frank depois, alterando a expressão para um misto de raiva e tristeza - A Ashley era tudo o que tinha, éramos inseparáveis. Após a morte dos nossos pais, só tínhamos uma a outra. Ás vezes dias sem comer, dias sem dormir ou falar com pessoas. Infelizmente, o privilégio que carrego no meu sangue não consegue trazê-la de volta. Que outra escolha eu teria que fazer?

— Ser forte e tentar seguir em frente, era o mínimo. - aconselhou Frank, tocado pela emoção - Sei que sofreu, mas escolher o ódio não é algo de que se deve orgulhar. Imagina como sua irmã se sentiria?

— Eu imagino a Ashley todos os dias. - disse Mary, derramando uma lágrima - Só o que vem à cabeça é a imagem dela em meus braços agonizando com a ferida sangrando. Não quer contar pra sua amiga como foi? Tenho certeza que ela vai adorar saber. Tenho mais certeza ainda de que se lembrou de cada detalhe no primeiro segundo que ouviu minha voz.

As palavras estavam entaladas na garganta. A apreensão de Frank aumentava, mas não chegando a impedi-lo de narrar resumidamente os fatos.

— Quando eu cheguei... fui logo jogado contra a parede. Tinha uma garota vindo, era a Ashley, então pensei ser o demônio e que o lance de irmã possuída era uma cilada. Achei que era um dos que queria se vingar, é difícil distingui-los. A Ashley realmente estava possuída, pude constatar. Joguei água benta, ele recuou. Depois as luzes piscaram até o blecaute total, na rua toda, o bicho era poderoso e fiz ele ficar irritado. Num corredor encontrei a Mary, foi aí que percebi ser verdade. Ela tinha deslocado o ombro por causa do demônio. Ouvimos gritos da Ashley. Procuramos por quase toda a casa.

— E você teve a péssima ideia de nos separarmos. - disse Mary, mantendo-se acusadora.

— Isso foi uma deixa para o demônio pegar a Mary. Encontrei ela desmaiada no quarto da Ashley que estava sentada num canto, assustada. Daí a confusão começou. Perguntei se o demônio tinha deixado a Mary inconsciente ou se tinha saído dela e se escondido, mas ela mentiu dizendo que só viu a Mary entrar e desmaiar. Uma mentira bem forçada, por sinal. Eu ia verificar o pulso da Mary, mas joguei água benta nela antes. Mas fui pego com guarda baixa - ergueu os olhos sérios para Mary - quando a Ashley quebrou uma garrafa de uísque e tentou me atacar com o gargalo, crente que eu estava possuído. - fez uma pausa, as palavras barradas pela comoção - Segurei o braço dela... e enfiei a faca sem pensar duas vezes. - apertou os olhos e mordeu os lábios, sofrendo internamente com o arrependimento - Não aconteceu o que eu esperava. No mesmo instante, Mary acordou e me viu com a faca e Ashley caindo no chão.

— Me debrucei sobre o corpo da minha irmã e ele ficou lá parado, forçando um estado de choque. - disse Mary, estreitando os olhos para o detetive - Gritei pra ele sair e o chamei de assassino. Senti vontade de pegar o gargalo e eu mesma cortar a garganta dele, mas me controlei e algo me dizia... - arqueou as sobrancelhas - ... para esperar a hora certa de fazer da maneira certa. Foi quando lembrei da vantagem que corre no meu DNA. Tirei o Orb do baú e canalizei todas as lembranças ruins desse dia pra ele pra que quando eu o transformasse no cérebro e coração, o meu Stein copiaria seus trejeitos através dessas memórias. É assim que se faz.

— Bastava compartilhar memórias com o Orb para o T-800 agir como o Frank?! - disse Carrie, não escondendo seu espanto - Espera aí! - falou, sua voz elevando-se após uma ideia - O que garante que você seja a verdadeira Mary?

— Insinua que sou um Stein? Que piada de mau gosto. - disse Mary, quase deixando escapar uma risadinha sarcástica - Só existe uma Mary Taylor para se vingar de Frank Montgrow. - declarou, virando o rosto para o detetive.

— Só vou pedir mais uma vez. - disse Frank, categórico e sem mais traços emotivos na face - Deixa a Carrie fora disso. Não precisa tirar mais nada de mim quando já tem um brutamontes de metal que pode arrancar meu couro. Mas daí você acha a morte boa demais pra mim, então eu prefiro apanhar do que ver minha melhor amiga - apontou para Carrie com o indicador esquerdo - ser sacrificada numa cadeira elétrica! - olhou para o lado com mais atenção, logo franzindo o cenho - E que tipo de gente põe uma cadeira elétrica num porão?

— Do tipo que adora fazer cócegas em Steins. - respondeu Mary, sucinta - Assim era o meu bisavô, essa casa foi habitada por três gerações da família. Ele costumava alimenta-los com eletricidade, os deixava mais resistentes e mais ágeis. Fiz isso hoje de manhã no meu. - disse ela, olhando rapidamente para a porta entreaberta - Bem, chega de conversa. Vai ter que seguir minhas regras.

— Eu devia prende-la agora mesmo. Olha a distância entre mim e você e você e a Carrie. - disse Frank, mostrando-se desintimidado. - A algema pega no seu pulso antes do primeiro passo, já vou avisando.

— Vejo que desistiu de mendigar perdão, era só uma fachada, esperava que o abraçasse, daí me prenderia. Não sou tão estúpida. - falou ela, com repúdio intenso.

— Desiste, Frank. - disse Carrie - Não dá pra dialogar com uma pessoa dessas. Palavras não convencem psicopatas. Você vai continuar se arrependendo de ter julgado a Ashley cedo demais e ela vai continuar batendo na mesma tecla de que você é quem estava possuído quando a matou. E não estava!

— Não estava mesmo. - defendeu-se Frank, erguendo de leve as duas mãos.

— De qualquer forma, não há como provar. A primeira impressão é a que fica. - disse Mary, ardorosamente inflexível, virando uma página do livro. - Ele podia ter jogado água benta, mesmo que fosse atacado, pra ter certeza, mas nem isso ele fez.

— Àquela altura do campeonato, eu já estava jogando o jogo sádico do demônio. Era óbvio que se Ashley tentasse me ferir eu iria revidar, pois o demônio estaria mirando nas duas e não em mim.

— Olha, já cansei dessa lenga-lenga toda. - esbaforiu-se Mary, batendo suas mãos na mesa - Você é um a-ssa-ssi-no e vai seguir conforme minhas regras a partir de agora! - decretou, com todo o seu ódio manifestado - Se você vencer, pode sair da cidade pra recomeçar sua vida como uma nova pessoa, eu construo um outro Stein 10 vezes mais fiel que o original que vai se entregar à polícia. Se perder, sua amiga vira pó e você vai ver o sol nascer quadrado.

— Sair da cidade? Recomeçar minha vida? Mas nem a pau! - reclamou Frank, cansado de bancar o bonzinho para aquela garota que se negava a entende-lo por puro ego. - Eu tenho uma missão a cumprir. Um legado a honrar.

— Também tenho minha missão. Acabar com o homem que matou minha irmã. - disse Mary, sentindo a presença forte do seu Stein chegando perto - Não eu, mas ele.

Frank virou o rosto para sua direita como que por reflexo. Um vulto robusto abria a porta e andava em direção ao detetive, logo sendo iluminado pela única lâmpada que estava acima de Mary. Um clone de Frank com uma expressão exageradamente sisuda como ele nunca esboçaria.

Carrie mau sentiu sua boca abrir-se em estupefação.

— Admito: Você é uma piranha psicótica, porém caprichou na fidelidade.

— Carrie! - disse Frank, olhando-a com reprovação na voz e na face.

— Ahn... quero dizer... Acaba com ele, você consegue. - disse ela, abrindo um sorriso nervoso.

— Você de novo. - disse o Stein, a voz rude e rosnante.

— Digo o mesmo. - retrucou Frank, olhando-o de baixo à cima - Aposto que você também não queria estar aqui. Se concorda comigo, vamos dar as mãos e nos abraçar e tudo isso acaba bem.

Uma atmosfera silenciosa constrangeu o detetive que viu sua patética tentativa de selar pacificidade ser encarada pelo semblante endurecido de sua duplicata.

— OK. - disse Frank, assentindo, sem escolha a não ser ceder ao desafio - Não pense que vou me conter. - falou, fechando o punho direito e desferindo um soco contra o rosto do Stein que simplesmente virou-o para o lado. A reação instantânea veio na forma de uma dor lancinante nos ossos da mão. - Ai, ai, ai... - se virou para trás apertando firme a mão doendo.

— Começou mal. - zombou Mary. Era o momento exato para comanda-lo. Pousou seu indicador direito na página, passando-o pelos hieróglifos enquanto lia em voz baixa. Carrie a observou.

O Stein, após a leitura de sua criadora, erguera os braços e pegara Frank pelas costas, brutalmente arremessando-o contra uma parede de madeira que se despedaçou por inteiro com o impacto.

— Frank! - gritou Carrie, preocupada.

O detetive se ergueu aos poucos dos pedaços de madeira, logo pegando uma tábua e golpeando-o contra o rosto de sua "versão robótica" duas vezes nos dois lados. O pedaço se desfez completamente, sem provocar nenhum dano visível. O Stein deu alguns passos adiante, logo socando-o uma vez e em seguida pegando-o com uma só mão pela gola da camisa por baixo do sobretudo e o colocando-o contra uma parede de tijolos. Ao solta-lo, desferiu uma sequência de cruzados de esquerda e direita.

Carrie fechava os olhos, aturdida com os ruídos fortes dos socos. Mary eram só sorrisos direcionados ao êxito de sua cria.

O rosto de Frank sangrava dos dois lados com hematomas que se agravavam a cada golpe.

No último soco, o detetive desencostara da parede, ficando em posição quadrúpede para cuspir alguns bolões de sangue. Sentiu a perna direita do incansável Stein rapidamente baixar seu corpo contra o chão, pressionando sua coluna vertebral dolorosamente. O gemido sofrível do caçador torturava Carrie psicologicamente. Com um dos olhos apertados, Frank entreviu um objeto que possuía uma espécie de cano de finura conhecida.

— Sugestão para agilizar o trabalho: Aperte um braço até quebrar todos os ossos.

— Não! - vociferou Carrie - Se quer vê-lo morrer, então faça você mesma! Ah, já sei, aquela vontade se transformou em covardia!

— Você é uma idiota. Disse que a morte dele não é o suficiente para aliviar minha dor. - disse Mary, voltando seu rosto para a luta - Só quero vê-lo sofrer lentamente até implorar.

O Stein pegara o braço esquerdo de Frank, forçando o ombro, passando a usar o joelho na pressão contra a coluna. O gemido do caçador tornou-se um grito rápido de dor. Recompôs a insistência no objeto à sua frente que vira com mais clareza. Era um maçarico que estava no armário de ferramentas que caiu depois de Frank ser jogado. Convenientemente, um isqueiro que guardava havia caído quando ficou em posição de quatro.

Pegou o isqueiro, acendendo-o e empurrando-o até a ponta do maçarico que acendeu num segundo fazendo brotar uma chama azulada. O detetive tentou esticar seu braço o máximo que conseguia a fim de alcançar o maçarico, tentando ignorar a dor que infligia-se em suas costas e braço.

Seus dedos alcançaram-o até chegar totalmente à mão. Em um ato que julgava improvável, Frank jogara o maçarico aceso para trás, esperando ter mirado no rosto do Stein.

A chama penetrou violenta no lado esquerdo do rosto da criatura mecânica, afastando-o de Frank numa distância segura o bastante para que o detetive pudesse ter espaço para contra-atacar.

"Ele fez um ponto, já era tempo", pensou Carrie, querendo roer as unhas assistindo aquele vale-tudo entre homem e "máquina".

Cambaleando de leve, o Stein grunhira sentindo as brasas consumirem a pele artificial. Com Frank levantando-se, ele mostrara a metade de sua falsa face corroída pelo fogo, consequentemente deixando à mostra o metal prateado e chamuscado que compunha sua cabeça. O olho era apenas uma órbita circular e vazia.

O detetive pegara uma barra de ferro próxima à ele, fazendo-a subir com o pé e levando-a à mão direita, segurando-a firmemente para logo depois desferir um golpe contra a metade metálica do rosto do oponente, em seguida outro na metade "humana". Por último, daquela sequência, golpeou-o no queixo com a ponta da barra de aço, fazendo-o cair para trás com maestria.

Aproximando-se dele, Frank mirava a ponta de sua arma improvisada para o pescoço do Stein até toca-lo com ela, fortificando a ameaça.

— Últimas palavras? - Frank sentia o gosto saboroso da vantagem na boca, além do sangue de seus ferimentos logicamente. - Tem uma coisa no seu rosto... É sangue ou óleo?

Os pés do Stein, contudo, o pegaram com a guarda baixa ao fazer uma rasteira que o derrubou com violência contra o chão, logo levantando-se depressa e chutando Frank na barriga repetidas vezes. Por sorte, o detetive reconquistou proximidade com a barra que soltara devido ao imprevisível golpe anterior. Pegara a barra com as duas mãos, reunindo o máximo de força para aquele atraque decisivo.

Antes que ele o pegasse pelas costas novamente, Frank virou-se, reerguendo-se com a mesma rapidez que cravara a barra diretamente na parte central do peito do Stein.

— Hasta la vista, baby. - disse Frank, vanglorioso, empurrando-o com a barra fincada no local alvejado. Do ponto quebrado via-se um círculo de luz verde tremeluzir incessantemente.

Mary fitava a volta por cima do detetive com perplexidade amalgamada à frustração total. Carrie, por outro lado, conseguia formar um sorriso de satisfação mesmo temendo uma investida impulsiva de Mary que a colocaria num flerte súbito com a morte.

O Stein foi empurrado até uma parede, fitando Frank com seu olho "humano" congelado de temor e a boca arfando constantemente. Até, por fim, cair com as costas roçando na parede e não expressar quaisquer sinais de vida. O sentimento de vitória por ter vencido uma cópia sua era demais para o coração do detetive que viu a luz do Orb apagar-se. Retirou a barra de aço, a mesma fazendo um barulho rascante como o de uma espada sendo desembainhada, logo jogando-a no chão fazendo um tilintar metálico.

— Não!! Mas que droga!! - reclamou Mary, batendo suas mãos na mesa em profunda raiva. Ergueu um olhar de ira para Frank. - Como pôde?

— O ponto fraco da sua lata velha era muito óbvio. - disse Frank, andando uns passos à frente, o rosto bastante machucado. - Esse Orb piscava cada vez que ele me socava, como se fosse uma resposta às reações dele. Ele é osso duro, mas só precisava de uma brecha segura.

O descontrole da derrota criava uma ebulição no sangue de Mary.

— Agora solta ela. - exigiu Frank, sacando as algemas caso ocorresse o contrário - É a última vez que peço, a última mesmo. - falou, o tom severo.

— Vou liberta-la. - disse Mary, a fala mansa, andando em direção à sua prisioneira. No entanto, o tom usado não passava de uma simulação. - Vou liberta-la da sua convivência... e deste mundo. - mirou seus olhos na alavanca para ligar a tensão elétrica de aproximadamente 3.000 volts.

— Não, espera aí! - disse Frank, desesperando-se e querendo intercepta-la. Carrie estava quase se debatendo na cadeira em um instinto de lutar por sua vida.

Algo inesperado pegara os dois de surpresa de forma assustadora.

Uma mão, irrompida da escuridão, puxara Mary para trás de forma bruta, depois soltou-a e em um segundo Mary estremeceu o corpo como se estivesse sendo eletrocutada. Um inconfundível ruído de eletricidade denunciou ser um taser.

Após Mary cair inconsciente, a figura revelou-se para a dupla que estava paralisada de curiosidade.

Um homem de meia idade vestindo um terno preto com gravata vermelha... e usando um broche que estampava o logotipo do DPDC.

— Diretor!? - disseram ambos em uníssono, espantados.

Duvemport escondeu a arma de choque, desligando-a, sentindo-se desconcertado.

— Pra quê tanto alarme, meus amigos? - indagou, olhando-os com uma face meio brincalhona. - Ernest Duvemport nunca perde uma boa briga e uma boa chance de ser um Deus Ex-Machina.

Frank correu para desinstalar os eletrodos de Carrie e desamarra-la.

— Inacreditável... - disse Carrie, libertando-se das cintas de couro - Mas... O senhor veio me seguindo?

— Não você. - disse o diretor, tranquilo e sem arrepender-se do que fez - Ela - olhou para Mary - Na verdade, estive aqui desde que Frank chegou. Eu ouvi tudo.

— O quê? O senhor ficou escondido esse tempo todo? - questionou Frank, franzindo o cenho - Podia ter dado uma mão.

— E encarar esse golem?! Além de dois contra um não valer, eu apoio uma luta de igual pra igual.

— Essa lata velha tem a mesma aparência que eu, não quer dizer que eu seja tão forte quanto ela. - argumentou Frank, aparentando insatisfação por saber do posicionamento do chefe quanto ao caso. - Olha... - coçou a cabeça, ao mesmo tempo sentindo os hematomas doerem - ... realmente achou que ele fosse eu?

O diretor mostrou sensibilidade.

— Infelizmente, sim. É verdade. Acreditei que tinha surtado.

— O verdadeiro cérebro psicótico dessa situação não passa de uma mulher que se deixou consumir pela vingança. - disse Carrie, olhando para Mary com desprezo. Se agachou-se, aproximando sua boca ao ouvido dela - Se ferrou... vadia.

— Me desculpe, Frank. - disse Ernest, apertando a mão do subordinado - Sei exatamente como recompensa-lo.

— Não preciso de aumento, já ando satisfeito com meu lucro. - disse Frank, bem-humorado.

— Quis dizer sobre sua situação. - disse ele, levantando uma sobrancelha - Se há alguém que vai apodrecer numa cela até a morte... é esta diabinha.

— Se tem um plano, então diz logo. - disse Carrie, ansiosa - Como pretende limpar a bagunça do Frank?

— Estão olhando para um expert em livrar amigos de ciladas. - garantiu Duvemport, seguro de si.

— Vê lá o que senhor vai fazer, hein. - disse Frank, tocando-o no ombro e andando para sair dali. Carrie o acompanhou.

— Hum, não perdem por esperar. - disse Ernest, parecendo prometer algo realmente eficaz. Virou-se para a dupla, fazendo-os parar para ouvi-lo. - Nós formamos um belo time, não acham?

Frank e Carrie entreolharam-se meio incertos.

— Ahn... É, a gente dá pro gasto. - declarou Frank, dando um sorriso fechado para o chefe.

— É isso aí. Um viva para a equipe Duvemport.

— Que nome brega. - reprovou Carrie, comicamente provocando-o - Se fosse assim, preferiria seguir carreira solo.

— Tipo, você caçadora? - perguntou Frank, achando engraçado - Eu pagaria pra ver. - olhou para o diretor que lhe retribuiu um sorriso concordando com a zoação.

— Apostariam alto é? Quem viver verá. - disse Carrie, com plena certeza de não medir riscos quanto a possível empreitada.

                                                                                           ***

Frank terminava de encaixar o Stein em seu pequeno porta-malas, tendo a sensação de ser um assassino que recolher o cadáver para esconde-lo no carro. Mas nada comparado ao peso irretirável pelo assassinato de Ashley. O detetive apoiou uma mão na porta traseira, fitando o homem de aço, o sósia fielmente criado à imagem do original.

Carrie se aproximava dele, com as mãos nos braços sendo acometida pelo frio da madrugada.

— Percebi que precisava de companhia. - disse ela, dando uma olhadela no Stein.

— É, preciso. - respondeu Frank - Além de band-aids e uma compressa de gelo. - disse, fazendo-a dar uma risadinha.

— Quão útil essa sucata vai ser na sua vida? - perguntou ela, estranhando a ideia do amigo de se apoderar da criação de sua inimiga.

— Como uma lembrança. - disse Frank - Afinal, coleciono bugigangas sobrenaturais, então nada fora do serviço. - olhou para a assistente - Penso até em um dia revivê-lo.

— Usar um Stein em benefício próprio é impossível nessas circunstâncias. - disse Carrie, fitando-o - Você danificou o núcleo do Orb, e pedras como essas são extremamente raras. Nessa condição, nem eletricidade é capaz de ressuscita-lo. Só vai estar guardando um boneco de metal coberto de ferrugem.

— Por mim tudo bem. - disse Frank, dando de ombros - Nada que umas latinhas de refrigerante não resolvam. - falou, arrancando uma risadinha da colega - Quem diria né? Um homem de lata ter um coração tão frágil quanto o de um humano.

— E a fabricante ter um cérebro tão limitado quanto o dele. - complementou Carrie.

Ambos riram. No entanto, uma curiosidade martelava a cabeça de Frank.

— Mas sabe... Não tô conseguindo engolir esse mistério que o diretor tá fazendo sobre limpar minha barra. Tomara que ele aja de forma que não deixe rastros.

— Parece que minha curiosidade descontrolada é contagiosa. - ressaltou Carrie, o tom de satisfação.

Enquanto esperavam o diretor retornar após fazer o que tinha idealizado, as nuvens carregadas dissipavam-se expondo um céu repleto de estrelas.

                                                                                         ***

Na manhã seguinte... 

A TV de LCD do largo corredor principal do DPDC mostrava a notícia que era de cobertura exclusiva da maior rede de televisão da cidade. Na reportagem estava uma gravação de Mary sendo levada algemada pelos policiais, visivelmente alterada pelas acusações, mas mais ainda pelas provas achadas em sua casa em uma vistoria estimulada por denúncia anônima.

— Tem que estar havendo um engano! Vocês não sabem mais do que eu! Frank Montgrow é um assassino! Ele matou minha irmã mais nova! Dá um close aqui em mim, por favor! Vocês, agentes do departamento, que assistindo isso, prestem atenção: O homem com quem vocês trabalham tem um segredo... - seus olhos fixaram na câmera.

— Que tipo de segredo? Está a par de alguma informação confidencial a respeito do agente Montgrow? - perguntou a repórter.

— Sim. Acontece que ele é um... um caçador. Ele não é inocente. Ele caça monstros.

— Monstros? Coisas sobrenaturais? Está insinuando que ele possui uma vida dupla baseada no sobrenatural?

— É claro que sim. Quando minha irmã foi possuída por um demônio, ele a matou covardemente, mas meu palpite era de que o demônio estava nele e...

— Tudo bem, mocinha, já falou muita bobagem... - disse o policial, tirando-a do foco para conduzi-la.

— Bem, pelo que podemos ver, Mary Taylor está veementemente convencida de que um dos investigadores do DPDC preserva um segredo de cunho surreal. Sua prisão foi decretada quando a polícia encontrou uma máscara tecnológica com 100% de eficácia de disfarce, além de resquícios de pele artificial  e perucas masculinas. A identidade do cúmplice de Taylor que se passou pelo agente Montgrow, e verdadeiro responsável pelas mortes de mais de 56 pessoas, civis e policiais, em cerca de 12 ataques em apenas dois dias, permanece desconhecida, mas sua busca e captura não estão fora de cogitação. Embora tenha sido automaticamente inocentado do caso após as descobertas, Montgrow ainda terá de prestar um depoimento a porta-vozes do Conselho de Segurança. Eu sou Melanie Roscoe, diretamente da área nobre de Danverous City à DTV.

Assistindo à transmissão ao vivo, Megan ajeitava seu óculos de armação fina e quadrada, a expressão bastante séria.

Alguns minutos depois, chegara à sala do diretor. Antes de entrar, certificou-se de não haver ninguém por perto. Convencidamente segura, girou a maçaneta, logo entrando em silêncio.

Os saltos de seus sapatos faziam barulho leve - enquanto ela andava em direção à mesa de Ernest.

Ao abrir o notebook, sacou do bolso de seu bem sobretudo cinza uma espécie de mini-roteador. Em resumo, um minúsculo cubo preto com uma antena. Em um dos lados do cubo despontava um cabo semelhante ao USB, podendo ser plugado em qualquer laptop. A antena vibrou com a conexão.

Na tela surgiu um diretório. Megan, tranquilamente sentada na confortável cadeira de couro do diretor, clicara fazendo abrir uma janela com fundo preto. Um medidor de frequência surgiu, indicando tratar-se de uma transmissão de áudio. A secretária ajustou o microfone sem fio, preso ao sobretudo, ligado ao dispositivo de forma cúbica.

— Sinal vermelho. - disse ela - A garota é uma estúpida, fracassou na missão e acabou sendo presa. Agora que Frank se livrou de um problema, isso significa mais problemas... pra nós.

— Assegurou que era de sua confiança, que o anseio dela por vingança iria contra todas as probabilidades de fracasso. - disse a voz, fazendo "levantar" várias das linhas verticais da frequência, submetida a sintetização que lhe dava um ar sinistro. - A sua decepção com ela não se compara a minha com você.

— Sim, eu entendo, estraguei quase tudo. No fundo algo me dizia que ela e sua vantagem hereditária não daria conta do recado. Qual é o próximo passo?

— Eu receio que agora fica por sua conta. - sugeriu a pessoa oculta - Se quer tanto que Frank Montgrow não dê um passo além da fronteira... vai ter de provar ser boa numa missão solitária.

— Eu sempre fui sozinha. Sempre ganhei sozinha. - disse Megan, gabando-se.

— Então é chegada a hora de mostrar do quanto é capaz. E faça de tudo para que ele nem sequer veja a cor dessa maldita arma, em hipótese alguma facilite o acesso à ela. Lembre-se que esse homem cumprir seu legado representa uma obstrução nas nossas ações que não poderemos corrigir.

— Nunca me disse porque esses estudos nessa tal besta são tão importantes. - disse Megan, sabendo que soou indelicada.

— Sem querer menospreza-la, mas há certas coisas que devem se manter desconhecidas de lacaios do seu nível. Mais ainda de nossos alvos mais específicos. Se quer uma sugestão para seguir: Comece desconfiando das pessoas mais próximas de Frank.

— Já tenho uma em mente. - disse Megan, imaginando a figura de Carrie, com um sorriso suspeito.

— Ótimo. Se esforce para estar a um passo à frente dela. No entanto... caso um atrito se crie, não hesite em elimina-la. É até bom que isso aconteça. Talvez assim, com uma de suas pessoas que mais se importa no ambiente de trabalho removida da equação, Frank encontre uma oportunidade de chegar até nós nessa trágica cadeia de eventos.


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