The Weasleys escrita por nywphadora, nywphadora


Capítulo 1
Capítulo Único


Notas iniciais do capítulo

Disclaimer:
O enredo teve base na série "Bridgerton" (não nos livros) e, apesar de ter realizado algumas pesquisas, não tenho o compromisso de tornar a fanfic uma fonte histórica confiável, fazendo uso da liberdade criativa para alterar fatos históricos.

Esta fanfic pertence ao projeto Maio Weasley.



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Ginevra gostava das madrugadas. Apesar de não ser apropriado para uma dama estar acordada àquelas horas, a maior parte da cidade adormecia, portanto era o momento mais conveniente para quem apreciava o silêncio.

Além disso, era durante as noites que ela se esgueirava para fora de seu quarto e, por vezes, encontrava-se com a Srtª Angelina Johnson para que pudessem correr silenciosamente pelos jardins atrás de uma bola, que surrupiava dos pertences de Ronald. Se a baronetesa descobrisse, ficaria furiosa.

Já estava provocando demais a paciência de sua mãe depois de ter conseguido escapar da temporada social do ano anterior. Ela só pensou que sua aparência com certeza chamaria mais a atenção de possíveis pretendentes se estivesse com os cabelos na altura dos ombros, à Lady Molly Weasley não lhe agradou a ideia. Esteve dizendo a todos que ela partiu para a casa de sua tia Muriel, que estava adoecida, até que os seus cabelos estivessem a uma altura socialmente aceitável.

Independente das explicações, sua atitude foi suficiente para que os boatos surgissem. Estaria grávida? Ou talvez os Weasleys não tivessem um dote adequado e resolveram adiar a sua inserção na sociedade.

Completaria um ano que tinham se mudado para D’Arblay Street e ela ainda odiava tudo. Odiava a falta da liberdade que tinha quando moravam em uma simples casa de campo, odiava todas as exigências e regras que tinham de seguir, odiava os rumores que surgiam a todo instante por qualquer motivo fútil.

Não queria soar egoísta. Sabia que receber o título de “baronete” tinha ajudado muito os seus pais a sustentarem financeiramente a sua prole, e garantirem um dote para que ela pudesse se casar futuramente. Porém, as consequências desse título... Ela nunca pediu por isso. Viveria feliz no campo, casando-se com um homem por amor e não por causa de suas posses.

Mesmo assim, o título não era suficiente para que fossem respeitados na região. Baronete era o título nobiliárquico mais baixo, acima apenas de “cavaleiro” e “escudeiro”. Era o suficiente para serem considerados nobres e não tivessem que mudar tão drasticamente a sua realidade, mas não era suficiente para que sobrevivessem às temporadas sociais.

William, seu irmão mais velho, tinha pedido a mão de uma jovem em casamento na temporada social do ano anterior. Emily Tyler. Ela o substituiu por um duque sem nem hesitar, ainda humilhando-o por sua posição. Quanto a Percival, seu terceiro irmão mais velho, estava cortejando Penélope Clearwater há uma temporada, e nada saía disso. Para ela, seria um pouco mais simples. Não sabia quanto era o seu dote, mas em questão do mercadeiro casamenteiro, era mais fácil para ela do que para seus irmãos. Era só ela ser linda e educada, e talvez tivesse a sorte de laçar algum lorde que não estivesse próximo da cova.

— Sem sono?

Levantou o olhar do degrau da escadaria em que tinha se sentado, observando Charlie, o seu segundo irmão mais velho, descer os degraus restantes até ela.

— Precisa descansar, amanhã será um dia movimentado — ele disse, sentando-se ao seu lado.

— E, no entanto, todos os meus irmãos se encontram solteiros — ela virou-se, concluindo um pensamento em voz alta.

Charlie riu baixo, inclinando a cabeça para outro lado.

Ficaram em silêncio por um tempo, apreciando a serenidade e o vento frio que vinha de uma janela aberta no saguão de entrada da residência.

— Eu não sei se irei me casar algum dia — ele disse em certo momento — Eu até falei com Tonks...

— Propôs a ela? — Ginny não sentiu-se tão surpresa quanto deveria.

— Nós somos amigos, então eu pensei que talvez... — deu de ombros — Eu não consigo explicar, não consigo me visualizar casando com alguém.

— Bom, tu és homem, então se ficares solteiro pelo resto da vida, ninguém irá te importunar. Mas o que ela disse? — perguntou sem conseguir conter a curiosidade.

— Ela está gostando de uma pessoa.

Ajeitou-se no degrau, deitando a cabeça no ombro do irmão.

— Não irá me dizer quem é, estou correta?

— Não está errada — Charlie respondeu, sorrindo — Ela é a minha melhor amiga, quero que seja feliz. Não tenho sentimentos dessa classe para com ela. Eu só não consigo... Não sei o que há de errado comigo.

— Ei — ela deu um tapa de leve no seu braço — Não há nada de errado contigo. Não deveria se cobrar tanto.

Ele deitou a cabeça na sua, que ainda estava recostada ao seu ombro.

— E o que te preocupa, espuma do mar? — usou o apelido que sempre lhe chamava desde criança.

— Saudades de casa — disse simplesmente.

Escutou-o murmurar por baixo da respiração um “idem”.

— É melhor retornar ao meu quarto e fingir que estou dormindo — ela concluiu, assim que viu os primeiros raios de sol surgirem pela janela.

Subiram as escadas sem precisarem se preocupar se o degrau rangiria, ao contrário de sua antiga casa. Não demorou muito tempo para que a governanta entrasse em seu quarto e lhe “acordasse” para o desjejum. Até mesmo isso lhe foi tirado quando se mudaram. Sentia falta de sua mãe acordá-la, acariciando os seus cabelos.

Assim que trocou a sua camisola por um vestido longo, desceu as escadas até a sala de jantar. Nunca se acostumaria à rotina de não tomar o café da manhã na cozinha apertada e quente, mesmo que não fosse a sua lembrança mais confortável.

— Teremos um dia muito agitado hoje — disse Molly, assim que sua filha ultimogênita uniu-se ao restante da família — Todas as debutantes comparecerão ao baile na casa dos Parkinsons.

Aproveitou a distração de sua mãe para revirar os olhos na direção de Rony, que pôs mais uma torrada na boca para abafar a risada.

— Frederick, George, não quero saber de gracejos!

— Nós? — George se fez ofendido.

— Seríamos incapazes, mamãe — completou Fred.

— Ronald, por favor, se comporte! — sua mãe pediu.

O que era engraçado, considerando que ele estava com a boca tão cheia de comida que era impossível fechá-la enquanto mastigava. Mesmo assim, ele assentiu.

— E, Ginevra...

— Já sei — a interrompeu antes que terminasse de falar — Seja uma dama. Posso ir visitar os Grangers agora?

— Eu a acompanho! — Rony ofereceu-se rapidamente.

Molly suspirou, antes de assentir.

— Não volte tarde, ainda precisa praticar o piano e vamos nos arrumar para mais tarde — ela disse.

— É claro — Ginny respondeu, sem ter escutado metade do que foi dito.

— Leve a Srª Figg contigo — completou, antes que pudesse deixar a mesa.

A Srª Figg era a sua governanta. Sempre que precisasse sair de casa, precisava ser acompanhada da Srª Figg. Uma dama da sociedade não podia caminhar desacompanhada. Provavelmente sua mãe não confiava que Rony poderia protegê-la, mesmo que eles fossem caminhar para o outro lado da rua.

Não sentia-se confortável em conversar com as pessoas com a Srª Figg por perto. Não que acreditasse que a idosa contasse tudo o que tinha escutado para sua mãe, mas mesmo assim... Por isso, todas as vezes que ia à casa dos Grangers, pedia para que as deixasse a sós.

Assim que chegou à casa, sem esperar por um pedido, a governanta partiu para a cozinha, onde as criadas ficavam em seu tempo livre a fofocar. Uma coisa curiosa sobre as casas da cidade: a cozinha ficava no subsolo.

Hermione estava sentada no sofá da sala de estar, lendo um livro, como sempre. Escutou os seus passos adentrando o cômodo e ergueu os olhos por cima das páginas para sorrir para eles.

— Ginny! Rony! — ela deixou o livro fechado na mesa de centro.

Um ano antes, quando chegou à cidade e estava triste por não ter mais Luna como sua vizinha e melhor amiga presente constantemente em sua vida, a Srtª Hermione Granger foi a primeira amizade que fez. O pai dela era um médico importante na cidade. Qualquer evento social a família era convidada para, no caso de acontecer algum infortúnio, os convidados não precisarem se deslocar para chamar por ajuda.

— Como estão? — perguntou a filha do doutor, levantando-se de seu lugar.

— O que tu pensas? — Ginny respondeu com menos delicadeza do que se tivesse sido Rony, e foi sentar-se ao lado dela, sem esperar por um convite — Será o primeiro baile que participarei.

— Mas tudo há de dar certo — disse Hermione, olhando para Rony um pouco perdida.

— Ginevra ainda não se acostumou com as mudanças — ele disse.

— Não me chame de Ginevra — ela resmungou.

— Escute — sua amiga voltou a se sentar — Aprendeu tudo o que precisava. Teve um ano inteiro para se preparar para esta noite. E pense pelo lado positivo, não precisará se apresentar à rainha Dorea.

Apresentar-se à rainha não era uma obrigação, apesar de algumas famílias seguirem à risca o cronograma, e não garantia convite em eventos sociais importantes. Algumas famílias achavam que sabiam mais sobre as debutantes, e outras não eram tão seletivas.

— Muitas moças passam várias temporadas sem arranjar um partido, não é sua obrigação conseguir de primeira — Hermione continuou, sabiamente.

— Certo, observe só Penélope Clearwater — disse Rony, sentando-se ao outro lado de Hermione — Ela está há cinco temporadas, pelo que soube. E mesmo após os cortejos de Percy...

— Ela claramente deseja alguém de maiores posses — a castanha torceu a boca.

— Diga isso ao meu irmão — retrucou Ginny — Quem sabe assim ele possa parar de se humilhar.

Uma criada aproximou-se, segurando uma bandeja de chá e biscoitos.

— Obrigada, Charity. Muito atencioso de sua parte — Hermione sorriu para ela.

— Nada disso tem a ver comigo — a ruiva continuou, antes mesmo que a empregada se afastasse, inclinando-se para pegar um biscoito — Eu odeio chá, e sou obrigada a beber por etiqueta.

— Bom, não sinta-se obrigada, Lady Weasley — ela ergueu uma sobrancelha, risonha.

Rony encheu duas xícaras silenciosamente, sem interferir na conversa entre elas. Ao fim, apenas ofereceu o pires para Hermione.

— Obrigada — ela sorriu para ele.

Se não tivesse a perfeita lembrança de ter crescido no ducado de St Albans, Ginny diria que Rony e Hermione eram amigos de longa data, quiçá até de infância. A afinidade entre eles era enorme e conversavam com uma profundidade raramente vista entre um homem e uma mulher que não fossem comprometidos ou até mesmo casados.

— Estou aterrorizada — a ruiva confessou, dando uma pequena mordida no biscoito.

Os biscoitos da Srtª Burbage só não eram melhores que os que sua mãe costumava fazer.

— Por que não conversa sobre isso com sua mãe? — Hermione perguntou, tomando um gole de seu chá em seguida.

— Não seria justo.

Lembrava-se de como sua mãe ficou exultante quando soube por seu pai da bonificação do rei por seus serviços prestados. Ela estava tão feliz por poder finalmente ceder a todos os desejos e caprichos de seus sete filhos. Conversar com ela sobre seus sentimentos partiria o seu coração. Seria egoísmo demais. Quantas moças não desejavam a mesma oportunidade de subir na vida como eles puderam?

— Eu só preciso de mais tempo para me adaptar — mentiu.

Hermione não pareceu convencida, mas não forçou o assunto.

— E quanto a senhorita? — Rony perguntou.

— Ron, tu podes me chamar de "tu" — ela o repreendeu suavemente — Estarei lá esta noite também.

— Escutou sobre a filha do diplomata? — Ginny perguntou rapidamente, percebendo uma expressão estranha em seu irmão.

Conversaria com ele sobre isso mais tarde.

— Não creio que ela esteja interessada na temporada social, sequer sabemos se ela permanecerá em Londres pelo próximo ano — Hermione respondeu, então virou-se para Rony — Imagino que a vida de diplomata não deva ser fácil.

— Mas deve ser fascinante — ele comentou, após terminar um gole de seu chá — Poder viajar frequentemente para diversos lugares.

Ficaram conversando por um bom tempo, até que Rony olhou para o relógio de bolso que seus pais deram a ele quando completou os 17 anos. Todos os seus irmãos tinham um, não acreditava que receberia um também no ano seguinte.

— Devemos ir, está entardecendo — ele anunciou, levantando-se.

— Então nos vemos todos no baile? — Hermione perguntou, levantando-se também.

Seria engraçado imaginar a expressão no rosto de Lady Pansy Parkinson ao vê-las por lá, mas ela não tinha escolha, Ginevra era uma debutante e Hermione era a filha do médico. Se não convidassem os Grangers, estariam à mercê em uma emergência de saúde.

— Até mais tarde, Mione — Ginny despediu-se, indo até a cozinha para chamar a Srª Figg e deixá-los a sós por alguns instantes.

Assim que chegaram em casa, Molly reclamou sobre o atraso deles e apressou-a a ir tomar um banho para poder se arrumar.

Quando já estava vestida e com as bochechas coradas por algum pó desconhecido, sentou-se ao banco do piano para aguardar por seus irmãos. Eles sempre se aprontavam horas depois dela com o argumento de que eram mais rápidos. Dedilhou as teclas em uma lenta melodia, uma das únicas que conhecia sem precisar ler a partitura, mas parou quando Bill beijou a sua testa e sentou-se no sofá às suas costas.

— Não precisa parar por minha causa — disse o seu irmão mais velho, dando uma mordida na maçã que ele certamente tinha pego da despensa.

— Todos irão ao baile?

A ideia de ser conduzida por seus seis irmãos era excruciante. Alguns podiam ser bem ciumentos quando se tratava dela.

— Mas é claro — George desceu as escadas.

— Não perderíamos a "estreia" de nossa irmã por nada — completou Fred, logo atrás.

— Nem que eu fosse uma pianista — ela resmungou.

Em um momento de distração, Fred roubou a maçã da mão de Bill. De seus irmãos, os gêmeos eram os mais hilários.

— Onde estavam esta manhã? — perguntou Bill com seriedade — Mamãe esteve os procurando.

Eles gaguejaram, tentando inventar alguma desculpa para não terem dormido em casa. Foram salvos de dar uma resposta pela chegada de seu pai.

— Se teremos essa comitiva todos os bailes da temporada, a locomoção será um empecilho — comentou Ginny.

Odiava a ideia de que toda a sua família a acompanharia o tempo inteiro. Eram eventos tão fúteis, não tinha necessidade de perderem o seu tempo com isso.

— Ânimo, espuma do mar — Charlie sentou-se ao seu lado no banco, virado para o lado oposto — Terá comida de graça.

Rony foi o último a descer, atrasado como sempre, e então eles puderam ir.

O cartão de dança que amarraram em seu pulso assemelhava-se muito a uma etiqueta de preço de produtos de lojas. Percy a encarou escandalizado quando ela comentou isso, enquanto que Fred e George precisaram voltar aos jardins para gargalharem sem chamar a atenção dos convidados.

— Não é disso que se trata? Estamos à venda — comentou em sussurros a Angelina, assim que a encontrou, próxima da mesa de petiscos.

— És incorrigível — ela negou com a cabeça, sorrindo.

Pôde escutar pelos cochichos e pelas cabeças se virando que mais uma família imponente tinha chegado ao baile.

— Ela é linda! — Angelina exclamou o que muitos estavam pensando.

A filha do diplomata era loira e com traços franceses. Apesar de já passar dos 20 anos, conservava feições juvenis e uma delicadeza em seus trejeitos.

— Pergunto-me o porquê ainda não é casada — disse Ginny sem malícia.

— Talvez esteja esperando pela pessoa certa.

— A boa nova é que ela terá a atenção de todos os rapazes — Hermione surgiu ao lado delas, aparecendo do nada como sempre — Caso alguém esteja fugindo de casamento essa temporada.

Ginny sentiu o seu rosto corar naturalmente com a insinuação.

— Ela precisará de outro cartão de baile, não caberia tantos nomes — tentou desviar o assunto.

— Como conseguiu escapar de sua mãe, que mal lhe pergunte? — Angelina pegou uma taça de vinho da bandeja de um dos serviçais que passava por perto.

Ela indicou com a cabeça o centro do salão, onde seu pai dançava com sua mãe.

Pôde ver Percy discutindo com uma moça que não era Penélope próximo de onde os casais dançavam. Ele tinha derramado vinho no vestido dela, aparentemente.

— Aposto que Audrey vai dar um olho roxo ao seu irmão — Angelina comentou ao seu lado.

— Ela não faria isso! — Ginny exclamou, espantada.

— A Srtª Harrison não é muito... — Hermione hesitou — Bem, eu gosto dela.

— Eu também, e isso já esclarece tudo — completou Angelina.

Não conseguiu sentir pena de seu irmão. Apostava que ele estava distraído demais com Penélope dançando com um rapaz para ter prestado atenção no caminho, e com certeza era orgulhoso demais para ter pedido desculpas.

— Ela sempre fica isolada, não gosto disso — disse Hermione repentinamente.

Não percebeu que o assunto tinha mudado, até olhar na direção em que a amiga olhava. Lady Verity Dawson estava desacompanhada como sempre, o que era considerado um escândalo para a sociedade. A maioria das jovens era sempre acompanhada de seus familiares, mas os pais dela tinham morrido e seu tio era um sujeito um tanto quanto perturbador. Nunca estava presente nas celebrações e havia boatos de que estava sempre ébrio.

Ginny pegou duas taças de champanhe e caminhou em direção à debutante afastada.

— Acredito não termos sido apresentadas formalmente, Lady Dawson — disse, assim que chegou próxima a ela — Gostaria de uma taça?

Verity apenas a olhou por alguns segundos, tentando entender o porquê tinha se aproximado.

— É muita gentileza, Lady Weasley — disse por fim, aceitando o champanhe.

— Soube sobre Lady Diggory? — perguntou Ginny — Parece que voltará à cidade durante a temporada, talvez possamos encontrá-la em algum evento próximo.

Apesar de ter sido afastada da temporada anterior por causa de seu cabelo, Angelina tinha lhe contado tudo sobre Lady Rebecca Yang e seu noivado com Lord Cedric Diggory. A melhor maneira de se adaptar a um novo ambiente era fingir que conhecia a todos de quem falavam, mesmo que nunca tivesse visto o rosto de Lady Yang, agora Diggory.

— Soube mais — Verity disse, enquanto Ginny tomava um gole de sua taça — O neto do infante estará presente durante a temporada.

— Um cavalheiro da infantaria? — perguntou Angelina, aproximando-se delas — Certamente um soldado é admirável.

Lady Dawson sorriu, como se elas fossem ingênuas demais.

— Não da infantaria — ela aproximou o rosto delas, como se fosse um segredo que não deveria contar.

Hermione arquejou ao lado de Ginny, atraindo um ou dois olhares para elas.

— Quando diz infante, não se refere ao...? — ela começou.

— Sobrinho neto do rei? — Verity completou, tomando um gole longo de champanhe.

— O que é um infante? — perguntou Ginny, sem entender muito bem.

Teve de decorar todos os títulos nobiliárquicos para ter uma noção de hierarquia, mas não se lembrava daquele termo.

— Infantes são os herdeiros que não são primogênitos, que não são da linha direta de sucessão ao trono — Hermione explicou, ainda pasma — Não me lembrava de que o rei Charlus tinha um irmão.

— Mas familiares da monarquia não possuem títulos de nobreza? Como "duque"? — Angelina questionou.

— Não sei a história, mas não, eles não são duques — respondeu Verity.

Fred aproximou-se delas.

— Eu sugiro que dê uma caminhada no salão antes que mamãe tenha uma síncope — ele disse à irmã — Boa noite, milady, senhoritas.

— E por onde anda a sua cópia? — perguntou Verity.

— Por que não vamos descobrir? — Fred não perdeu tempo, oferecendo a sua mão.

A Lady não hesitou, pegando a sua mão e afastando-se das garotas.

— Não seria cômico se todos os Weasleys se comprometessem esta temporada? — comentou Angelina.

— Todos...? — Ginny estranhou.

Então viu Bill dançando com a Srtª Delacour, filha do diplomata. Resolveu abster-se de comentários.

— Meu irmão tem razão, eu devo "caminhar" por aí — repetiu as palavras com desgosto.

Era a sua condição para não ter sua mãe em seu cangote a noite inteira, empurrando-a para cada rapaz de sua idade que encontrasse.

Dançou com alguns, mas nenhum a interessou. A melhor parte da noite foi conversar com suas amigas e, como Charlie disse, desfrutar da comida de graça.

Chegou em casa exausta, rapidamente substituindo seu vestido de festa por uma camisola. Era curioso como o seu vestido de festa parecia uma camisola já, não havia muita diferença, apenas o tecido e alguns detalhes da costura. Apesar do cansaço físico, o seu cérebro não conseguia se desligar, então desceu as escadas, escutando vozes vindas do escritório de seu pai.

Curiosa como era, abriu a porta destrancada, deparando-se com seus irmãos parecendo ter uma das típicas "conversas de homem", regadas a conhaque.

— Ginny! Deveria estar dormindo! — exclamou Percy.

Ignorou-o, fechando a porta atrás de si.

— O que houve?

— Estávamos conversando sobre o paradeiro dos gêmeos — respondeu Charlie, recebendo olhares dos outros — O quê? Ela descobriria uma hora ou outra.

— Como se não fosse óbvio — Ginny aproximou-se da mesa de madeira, sentando-se em cima dela como se fosse um banco.

— Esperava mais — disse Bill, os braços cruzados — Sabem o quão difícil é para nós. Se não somos honrados, que pais aceitarão que desposemos suas filhas?

— Muitos libertinos formam família — saiu em defesa dos gêmeos — Quem se importa com o que os homens fazem?

— Não deveria encorajar esse comportamento, Ginevra — disse Percy.

— Ela já fez pior.

Diante da fala espontânea de Fred, todos ficaram mudos.

— Como é? — perguntou Bill.

— Que exagero — Ginny desceu da mesa — Eu não entrei em um antro de depravação, muito menos cheguei tão longe.

— Desde quando tu sabes desses assuntos? — Percy parecia que ia ter um infarto.

Ela olhou para os gêmeos, que empalideceram.

— Nós não tivemos culpa! — exclamaram — Estávamos falando com Ronald e ela nos escutou. Sabem como ela é!

Bill pôs uma mão na testa, como se estivesse tendo uma enxaqueca, mas não deu maior importância ao assunto, ao contrário de Percy.

— O que quiseram dizer com aquilo?

— Eu beijei um garoto.

— Ginevra! — exclamou Percy.

— O quê? Eu devia ter beijado uma garota?

— Quando foi isso? E por que Fred e George sabem? — perguntou Rony.

Porque eles eram fofoqueiros.

— Foi em St Albans. Michael Corner, mas foi só um encostar de lábios, não precisam se aborrecer — ela respondeu com naturalidade.

— Pensei que tivesse sido Dean Thomas — George franziu o cenho.

Percy arquejou, como se tivesse engolido a rolha da garrafa.

— Não sou o tipo dele — ela comentou — Na realidade, creio que nenhuma mulher seja.

Fred e George escancararam a boca.

— E nunca nos contou isso? — Fred exclamou, indignado.

Ela deu de ombros.

— Já acabou a fofoca? — perguntou Charlie, parecendo se divertir.

— Já que esclarecemos os fatos — respondeu Ginny, caminhando de volta até a mesa, onde Bill e Charlie estavam apoiados.

— Conhaque?

— Charlie!

Ela aceitou o copo estendido, nunca recusava uma dose de álcool.

— Deixe-a beber. Ela beberá coisas bem piores quando se casar.

Não foi só Ginny que engasgou com a declaração.

Bill voltou a pôr a mão na testa, exasperado.

— Eu estava falando de whisky! — exclamou Charlie, espantado — Céus, como são mal pensados!

Tomou um longo gole de conhaque, sentindo a garganta arder e seu rosto corar, mas pelo menos a culpa seria da bebida.

Pôs o copo pela metade em cima da mesa, vendo um pergaminho ali.

— Ah! Então foi por isso que vieram conversar — ela disse — Uma lista de pretendentes viáveis.

Pegou a lista antes que Percy pudesse.

— Vejamos — ela começou a caminhar pelo escritório — Lord Roger Davies. Um pouco velho demais, não? Lord Draco... Eu prefiro me jogar da ponte! Sir Cormac McLaggen... Desculpa, eu senti um refluxo.

Rony ria diante de suas brincadeiras.

— Quem é Harry Potter?

Nesse ponto, Bill pegou a lista de suas mãos.

— Só estamos preocupados — ele justificou-se.

— Sem necessidade — ela retrucou.

A porta do escritório abriu-se.

O pai deles parou, parecendo surpreso por vê-los ali.

— Não está um pouco tarde? — ele perguntou, divertido.

— Eu estava dizendo aos meus irmãos exatamente a mesma coisa — Ginny disse rapidamente — Escutei vozes da escadaria e vim verificar.

A expressão de Arthur deixava claro que ele não acreditava muito no que ela dizia.

— Certo, vão dormir — ele disse, por fim.

— Boa noite, papai — Ginny deu um beijo em sua bochecha antes de sair do escritório.

Havia sido um dia muito agitado, como sua mãe já previa. Assim que recostou-se à cama, caiu no sono.

 

➣➣➣

 

Não tinha bebido muito, mas a sua resistência era relativamente baixa, já que o máximo de álcool que costumava consumir em festas e jantares era vinho e champanhe. Por isso, na manhã seguinte, despertou com uma dor de cabeça terrível.

— Bom dia, Lady Weasley — Angelina a recebeu, assim que entrou no boticário que seus pais administravam.

— Algo para ressaca? — pediu Ginny quase manhosa.

— Eu irei preparar.

Observou-a caminhar pela loja, pegando potes de diferentes ervas e unindo-as a uma tigela para moê-las. Não entendia muito sobre a preparação de medicação, mas as plantas que os Johnsons arrumavam em suas viagens eram muito úteis para curar alguns incômodos.

— Como passou a noite? — perguntou Angelina — Não deveria estar em casa para receber os pretendentes?

— Se é que haverá algum — ela respondeu — E como foi para ti?

— Dancei com o teu irmão.

— Qual deles?

— Fred.

Ginny suspirou.

— Parece que todos os meus irmãos estiveram bem ocupados — comentou.

— Com todo respeito, seus irmãos são colírios para nossos olhos — Angelina pegou o pilão e começou a moer com delicadeza as plantas — Apesar do título, muitas jovens sonham com os cabelos ruivos.

— Incluindo a senhorita? — ela ergueu uma sobrancelha — Seria um prazer tê-la como cunhada.

— Se algum dia o seu irmão desejar se amarrar — ela bufou, passando as ervas moídas para um pote com tampa menor.

— E não foi o desprendimento de Fred que lhe atraiu? George sempre foi o mais cavalheiro dos dois.

— Aqui está — ela lhe passou o pote, sem responder a sua afirmação.

— Obrigada.

As ruas começavam a encher-se de pessoas. Caminhou para sua casa, imaginando a bronca que sua mãe lhe daria por ter saído tão cedo sem avisar e desacompanhada. Mesmo assim, não se importou. Assim que chegou, foi até a cozinha no subsolo para ferver a água para o chá. Odiava chá, mas era praticamente a solução de todos os problemas de saúde que as pessoas pudessem vir a ter.

— Lady Ginevra! — a Srª Figg exclamou, descendo as escadas — Se precisava de um chá, poderia ter me pedido!

— Sua ajuda não é necessária, mas obrigada — respondeu.

Encheu a xícara cheia de plantas moídas com a água. A maioria das pessoas apenas deixava as folhas inteiras, o que tornava o aspecto do chá repugnante, em sua opinião. Forçou-se a beber, tentando conter as expressões de desgosto e, assim que terminou, subiu até o primeiro andar.

— Ginevra, onde esteve? — sua mãe perguntou — A Srª Figg foi despertá-la e não a encontrou.

— Eu fui até a cozinha — mentiu.

— E já está pronta para sair? — Percy a alfinetou.

Se não fosse por ele, sua mãe dificilmente notaria que tinha trocado de roupa.

— Quantas vezes já lhe disse que não deve sair sozinha?

Ignorou a repreensão, sentando-se à mesa ao lado de George. A primeira coisa que fez foi pegar a jarra de suco, precisava tirar o amargor do chá de seu paladar.

— Algum evento para hoje? — ela perguntou.

— É esperado que receba pretendentes — George lhe informou.

— Ah, isso — não conseguiu disfarçar o tom desanimado de sua voz.

— Não deve sentir-se pressionada, no entanto — Bill disse rapidamente — A decisão será sua.

Percy olhou um pouco duvidoso para o irmão mais velho, mas não o questionou. A escolha ser sua não os impediria de palpitar, é claro.

Duvidava que qualquer outra debutante tivesse seis irmãos na mesma sala de estar, aguardando pelos possíveis pretendentes de sua irmã. Mesmo que a maioria deles não agisse agressivamente a maior parte do tempo, a sua mera presença podia ser aterrorizante. Ginny não reclamaria, os rapazes que vieram eram um pouco estranhos.

Parecia que ter cabelos ruivos era exótico o suficiente para que alguns a rodeassem como um animal de zoológico.

— Talvez o senhor devesse contratar um pintor, um retrato é mais permanente — disse, depois de ficar por mais de 5 minutos parada de pé, sendo observada com afinco por um jovem bem arrogante.

— Ginevra! — Molly a repreendeu.

Não muito depois, o homem foi embora, para seu alívio. Jogou-se no sofá, ao lado de Charlie, e pegou um bolinho da bandeja.

— Terei de ficar o dia inteiro aqui? — ela perguntou — Já é quase meio dia, todos os pretendentes que estivessem interessados, já teriam vindo.

— Precisamos elevar a sua moral, irmãzinha — disse Fred — Os seus pretendentes são péssimos.

Bill o repreendeu com apenas um olhar e então virou-se para ela.

— Algum...?

— Não — respondeu, antes que pudesse completar a pergunta.

— Certo, é apenas o começo da temporada — ele tentou soar positivo.

— Não deveriam ser tão condescendentes com sua irmã — sua mãe levantou-se de seu lugar, do outro lado da sala.

— Deveria estar satisfeita, mamãe — disse Ginny, sabendo que seria odiada pelo que diria a seguir, mas precisava perturbar os seus irmãos um pouco — Bill está interessado na Srtª Delacour, finalmente Percy está desencanando da Lady Clearwater, Fred dançou a noite inteira com a Lady Dawson, George não para de conversar com a Angelina, e Rony um dia percebe por quem ele está apaixonado.

Charlie nem tentou disfarçar a sua gargalhada.

— Não tens ideia da grande confusão que Fred e George se envolveram — ele sussurrou ao seu lado.

— O que disse, Charlie? — a mãe deles parecia ter ouvidos de tuberculoso.

— Nada, mamãe — ele ajeitou-se, pigarreando.

Assim que Molly saiu da sala para decidir se ia encerrar as visitas pelo restante do dia, Ginny virou-se para o irmão, exigindo uma explicação silenciosamente.

— Mas tu és um fofoqueiro, Charlie! — Fred reclamou, jogando um biscoito na direção dele.

— Angelina gosta do Fred, mas o George gosta da Angelina. Verity gosta do George, mas o Fred gosta dela. Então eles decidiram fingir ser o outro — ele contou em um tom de voz baixo, para caso sua mãe estivesse por perto.

— Elas ficarão furiosas quando descobrirem! — ela exclamou, pasma.

— Não irá contar a elas, certo? — perguntou George.

— Decerto que não.

Eles pararam de falar assim que escutaram os passos de Lady Weasley voltando à sala.

— Bom, acho que encerramos por hoje — ela disse, parecendo contrariada.

— Excelente! — Ginny ergueu-se de um pulo, pegando um biscoito da bandeja para comer.

— Como ontem ocupou a tarde inteira na casa da Srtª Granger, hoje ficará em casa para praticar o piano.

Voltou a afundar no sofá, desanimada.

— Enquanto eu, irei cortejar uma dama — disse Fred, levantando-se.

— Cuidado para não cortejar a dama errada — retrucou Ginny, azeda.

— Darei os seus cumprimentos à Hermione — Rony debochou, passando à sua frente, logo atrás de Fred e George.

— Obrigada, aproveita e cumprimenta também os pretendentes que forem visitá-la — alfinetou, levantando a voz conforme ele se afastava.

Sua mãe apenas suspirou, parecendo inconsolável pelo seu temperamento, como se não fosse herdado da família.

— Vamos, irmãzinha, vou ensiná-la umas músicas diferentes — Bill ofereceu-se.

— Ensine-me algo animado, não aguento mais tocar Mozart, me faz ficar com sono — pediu.

Percy levantou-se de seu lugar, recolhendo o seu livro. Provavelmente iria até a biblioteca ou conversar com papai no escritório. Ele sempre se oferecia para ajudá-lo, mesmo que não fosse o filho mais velho, como se esperasse que Bill desistisse de suas responsabilidades.

— Tu vais tocar essas duas teclas aqui, um dedo em cada três vezes rápido e duas vezes mais devagar. Assim — ele demonstrou a ela — Eu vou tocar essas duas aqui, vamos tentar assim.

Ginny sempre teve dificuldade para entender as partituras, era sempre mais fácil de aprender quando o irmão explicava daquela forma. “Toque essas teclas desse jeito tantas vezes”. Homens gostavam de complicar as coisas, era a única explicação para invenção daqueles desenhos estranhos nas partituras.

— Preste atenção agora. Tu vais tocar estas mesmas teclas quatro vezes rápido. Então tu vais tirar o dedo dessa daqui e ir bem rápido nessa outra. Esse dedo vai continuar aqui e esse vai para essa outra tecla, do outro lado uma vez bem lenta.

— Eu ainda não aprendi a contorcer os meus dedos, Bill — ela comentou, divertida.

— Certo, consegue trocar os dedos bem rápido nesse momento aqui? — ele demonstrou com uma habilidade que ela nunca conseguiria alcançar.

— Podemos tentar.

— Vamos fazer essa parte para que treine e depois vamos juntar com a primeira parte.

Ele sempre deixava as teclas mais fáceis com ela, como pôde perceber ao ver os dedos dele deslizando pelo lado esquerdo do piano. Sempre teve muita paciência para lidar com ela.

— Poderia se oferecer para ensinar piano à Srtª Delacour — Ginny sugeriu.

— Três vezes rápido nessas duas teclas, vai deslocar esse dedo para cá e tocar uma vez longa, e então voltar para a posição inicial lentamente — ele a guiou para a próxima parte da música — Estou certo de que a Srtª Delacour tem grande conhecimento do piano.

— Talvez sobre músicas francesas, mas quanto às músicas britânicas? — ela insistiu, seguindo suas instruções — A propósito, acredito ter escutado um forte sotaque na voz dela, talvez precise de ajuda para aprender o idioma. E não me diga que ela já tem um instrutor, ela chegou à cidade há dois dias — completou, antes que ele pudesse retrucar.

— Querendo se livrar tão rápido de mim, Lady Weasley? — Bill perguntou.

— O que posso fazer? Sou uma romântica incurável — respondeu.

Charlie sentou-se do outro lado de Ginny no banco, que milagrosamente cabia os três sentados.

— Vão precisar de uma mãozinha — ele disse, reconhecendo a música.

— Algum dia poderei tocar sozinha? — perguntou Ginny, embora não se incomodasse.

— Com muita prática, e não tem praticado muito nos últimos tempos — Charlie a alfinetou.

— Que deselegante.

Concentrou-se na melodia, seguindo as instruções que Bill lhe passava.

Demoraram um tempo para que ela aprendesse todas as notas na ordem correta e depois repassassem a música inteira algumas vezes, com a ajuda de Charlie em alguns momentos.

Não tinha muita habilidade para o piano, tocava por obrigação. Toda dama da sociedade era obrigada a saber tocar, e não ajudava o fato de que começou a aprender apenas no ano anterior, enquanto que outras moças sabiam desde crianças. Se pudesse escolher um instrumento, escolheria a flauta. Controlar os assopros era muito mais fácil para ela do que controlar os seus dedos em ritmos diferentes.

— Agora o seu desafio é aprender a tocar todas as notas sozinha — disse Bill, algumas poucas horas depois.

— Os meus dedos estão me matando — ela esfregou as mãos, sentindo a dor pelos movimentos repetitivos — Preciso descansar.

— Avançou bastante hoje — Charlie a elogiou.

— E de que isso vai me adiantar? Arranjar um marido? E depois? Vai ser uma distração da minha vida de casada?

— A música é uma expressão dos nossos sentimentos, dos nossos pensamentos — disse Bill — É uma terapia.

— Alguém está sentimental hoje — Charlie murmurou para ela.

— Srtª Delacour estará na festa? — Ginny perguntou.

Parecia que a sua vida se resumia a festas agora, e apenas isso.

— Boa tarde, Ginevra — ele disse, antes de sair da sala.

Ela trocou um olhar cúmplice com seu segundo irmão mais velho. Ajeitou-se novamente no banco à frente do piano, tocando as primeiras notas quando escutou a porta da entrada da casa bater com um estrépito.

Ela levantou-se sem dizer mais nada e seguiu os passos pesados para o segundo andar da casa, que davam para o quarto de Rony.

— Vai embora — escutou-o dizer quando bateu na porta.

— Não seja criança, Ron.

Passado o momento de educação, girou a maçaneta e entrou no quarto, mesmo sem sua permissão, como seus irmãos faziam o tempo inteiro com ela.

Rony tinha largado os sapatos de qualquer jeito no chão e se jogado na cama. O quarto parecia grande demais para abrigar as coisas que ele tinha. Talvez ele gostasse de ter um quarto próprio depois de tantos anos, mas os gêmeos sentiam falta de dormirem juntos. Nenhum deles tinha cartazes presos às paredes mais. Perguntou-se o que teria sido da casinha que moraram desde que nasceram.

— O que houve? — ela sentou-se na ponta da cama, esperando pelo momento que ele ia empurrá-la para fora.

— Briguei com Hermione — ele respondeu.

— Certo, me conte o que há de novo.

Ele, que estava deitado, sentou-se rapidamente.

— Estávamos jogando xadrez e então a Srª Burbage entrou na sala e disse que tinha alguém querendo vê-la!

— Uau, ela não é exclusividade sua — Ginny debochou.

— Era o panaca do McLaggen, ela não suporta ele.

A pergunta era quem suportava.

— Não entendi ainda a questão — ela confessou — Por que brigaram?

— Pode ser que eu tenha socado o McLaggen — ele murmurou.

— Tu és mesmo um parvo — puxou a mão dele para ver se tinha se machucado, mas parecia que a briga não tinha durado tanto — Não precisa se estressar, logo estarão resolvidos de novo. Se fosse tu, compraria flores.

— E por que eu faria isso? — ele franziu o cenho, confuso.

— Para pedir desculpas pela sua atitude, mesmo que não se arrependa.

— Mas só se dá flores quando está cortejando.

Ginny levantou-se, indo até a porta.

— E te incomoda pensarem que está cortejando-a? — ela perguntou.

Saiu do quarto, sem esperar por uma resposta.

Voltou para a sala e praticou mais um tempo o piano, até sua mãe aparecer para liberá-la de seu martírio, obrigando-a a subir para seu quarto para se arrumar.

A festa daquela noite seria na casa dos Greengrass.

Assim que a Srª Figg terminou de ajudá-la a se vestir, Ginny foi para a cadeira em frente à penteadeira, esperar que ela fizesse o seu penteado, mas sua mãe entrou no quarto.

— Deixe que eu faça isso. Obrigada, Arabella.

Vinha alguma conversa, pensou consigo mesma.

— Como se sente em relação a esta noite? — perguntou a mais velha, começando a escovar o seu cabelo.

— Normal, não é como se fosse a primeira — ela deu de ombros.

— E não está interessada em ninguém?

Sua mãe parecia estar se esforçando para manter uma conversa com ela como nos velhos tempos, quando ela subia na cama dos pais e ficavam fofocando sobre tudo e todos. Algo que não faziam mais. Não conseguia entender o porquê um título mudava tantas coisas.

— Não, não encontrei nenhum garoto interessante — ela respondeu — Aposto que Bill se casa essa temporada.

— Ah, sim — viu-a torcer a boca.

— Não aprova a Srtª Delacour?

— O quê? — Molly ergueu o olhar, parecendo surpresa e então suspirou — Não é isso, só penso que pode ser bem difícil para os seus irmãos. Olhe só Percy...

— Percy envolveu-se com a pessoa errada, isso acontece em qualquer lugar — Ginny abriu a caixa da penteadeira apenas para observar o colar que seus pais lhe deram pela sua primeira temporada social — Não é como se eles fossem ficar desonrados por se envolver com algumas debutantes.

— É claro que não é a mesma coisa — ela concordou, fazendo uma trança nas laterais de seu cabelo —, mas não posso deixar de me preocupar em como estão se adaptando.

— Já faz um ano que estamos aqui.

— E um ano é suficiente?

Não, não era, mas manteve a sua expressão intacta, sem querer demonstrar o que realmente pensava.

— Eu sei que tem sido difícil para todos nós — ela mantinha os olhos fixos em seus cabelos, trançando com habilidade —, mas somos fortes. Já passamos por tanta coisa, alguns eventos sociais não são nada.

Não soube o que responder, então permaneceu calada.

— Pronto — ela pôs os grampos nos lugares certos.

Não sabia se era uma regra, mas não costumava ver as debutantes de cabelo preso, nem as casadas de cabelo solto.

— Queria que existisse mais para mim do que tocar piano e me casar — murmurou para os seus dedos, abaixando a cabeça para evitar o seu olhar.

— Oh, Ginevra — sua mãe apoiou sua cabeça na barriga dela, em um abraço improvisado, tentando não desfazer o seu penteado — A vida de casada é muito boa. Ter filhos é uma das melhores coisas que podem acontecer a uma mulher.

— E ir à universidade e exercer uma profissão é a melhor coisa que acontece a um homem — ela retrucou.

— Mas não é proibido trabalhar.

— Só é mal visto pela sociedade, e devo ter a autorização de meu marido para isso.

Elas suspiraram quase ao mesmo tempo.

— Te esperarei lá embaixo — sua mãe afastou-se.

Pôde escutá-la descer as escadas e bater com força na porta do quarto de Rony para apressá-lo.

Respirou fundo, observando o seu reflexo no espelho. Então pôs as mãos nos descansos da cadeira e ergueu-se.

Sempre escutava de mulheres que diziam ter nascido na época errada, de que as décadas anteriores eram melhores, mas sentia que tinha nascido muito antes do que deveria.

Desceu as escadas com cuidado para não escorregar na barra do vestido. Estava acostumada com a visão de seus irmãos sentados na sala de estar, conversando e rindo. Rony desceu não muito tempo depois e então eles puderam partir.

— De quantos eventos sociais uma temporada é formada? — o questionamento surgiu enquanto estavam a caminho.

— Muitos — Bill respondeu simplesmente.

Deitou a cabeça em seu braço, observando a paisagem passar.

— Me fale sobre a Tonks, como ela está? — pediu a Charlie.

— Bem, eu acho — ele pareceu confuso.

— E o rapaz por quem ela estava interessada?

Bill riu baixo.

— Ginny, eu não pergunto a ela sobre a vida amorosa dela — Charlie respondeu.

— E por que não? — ela reclamou — Quer saber? Eu vou visitá-la. Saber as coisas por ti não funciona.

— Cansou-se de Hermione e Angelina? — Bill perguntou — Está tentando novas amizades? Te vi conversando com Lady Dawson ontem.

— Perdão, não fui informada que existia um limite de amizades — ela pôs a mão enluvada abaixo da clavícula — Hermione e Rony certamente terminarão juntos, Angelina resta saber qual dos...

Charlie deu um chute rápido e leve em sua perna, fazendo-a se lembrar de que sua mãe estava logo ao lado. Estava tão silenciosa durante a viagem que tinha se esquecido de sua presença.

— Pretendentes irá aceitar — concluiu apenas para disfarçar — Uma conversa não constitui uma amizade, então não sou amiga de Lady Dawson, embora gostaria.

— Não está mais aqui quem disse — Bill ergueu as mãos, se rendendo.

Permaneceram em silêncio pelo restante do caminho.

Assim que a carruagem parou, Ginny não esperou pelo condutor para abrir a porta.

— Gin, espera!

Não deu tempo de escutar o seu aviso. O chão estava mais distante do que tinha pensado, então ela tropeçou e quase caiu ao descer, agarrando-se com força na porta. Olhou ao redor, sentindo o rosto corar e escutando Charlie abafar a gargalhada. Bill desceu rapidamente, preocupado.

— Tudo bem?

Ela uniu os lábios com força, tentando não rir da própria situação. Apenas assentiu com a cabeça, evitando olhá-lo.

Ele ofereceu o braço para que ela segurasse e ela rapidamente aceitou.

— Querida, seja mais cuidadosa — foi a repreensão sutil que recebeu de sua mãe.

Não prestou atenção à decoração, já que todas as residências que visitavam durante os bailes eram esplêndidas.

— É de bom tom cumprimentarmos os anfitriões — sua mãe lembrou-lhes com sutileza.

Assim que localizaram os senhores Greengrass, curvaram-se e seus pais adiantaram-se em nome da família para agradecer pelo convite. Os Greengrass eram sem dúvidas mais simpáticos do que os Parkinsons.

Ginny não pôde evitar olhar ao redor, procurando pelos cabelos cheios e cacheados característicos de Hermione.

Bill deu um aperto discreto em sua mão, fazendo-a voltar a prestar atenção na conversa.

— Aproveitem a festa — disse a senhora Greengrass.

Ela sorriu e então acompanhou o irmão para longe.

— Tudo certo com a sua perna? — ele perguntou — Sente dor?

— Foi apenas o susto.

Seria ótimo se tivesse se lesionado antes da festa, teria de ficar sentada o tempo inteiro. Era o que recebia por ser distraída.

— Vou deixá-la aqui.

Ela puxou a mão do braço dele, ainda procurando por suas amigas.

— Aproveite a dança — disse antes que ele pudesse se afastar.

Teve a sua atenção captada pela mais jovem dos Greengrass, que estava logo atrás da mesa de petiscos sem se importar com nada. Ter sido gerada fora do casamento lhe deu liberdades que outras jovens não possuíam.

— Com licença, viu a Srtª Granger?

Não era McLaggen. Nunca tinha visto aquele rapaz antes.

— Não, senhor.

Ele apenas sorriu e se afastou.

Hermione lhe devia algumas histórias aparentemente interessantes.

— Finalmente te encontrei! — Angelina puxou o seu braço — Hoje está mais movimentado que ontem!

— Me pergunto o porquê — respondeu debochada — Escute só. Um rapaz veio perguntar por Hermione.

— Era bonito?

Elas caminharam em direção a alguma sala mais afastada da confusão de conversas e danças.

— Duas palavras — Ginny pegou uma taça de champanhe de um dos garçons no caminho — Uniforme militar.

— Pelo menos uma de nós não ficará encalhada — Angelina deu uma piscadela — Te ajudo a encontrá-la e então vou atrás de Fred.

Lembrou-se do que Charlie disse sobre os gêmeos e bebeu um longo gole de champanhe.

— Não precisa, vai lá.

— Tem certeza? — ela hesitou.

— Eu estou ótima! Vá!

Ela caminhou lentamente até a porta do salão, assim que a amiga a deixou. Apoiou-se contra o batente, observando os casais dançando no centro pelo que pareceram horas, conforme bebia mais e mais.

Alguns rapazes à sua frente apostavam, como sempre, em relação às debutantes. Quem casaria, com quem, quando.

— Será obrigada a casar-se com ele, já é a sua quinta temporada!

— Quem sabe? Talvez Lady Clearwater tenha sorte e algum marquês se interesse por ela.

— E quanto a Srtª Delacour?

— Weasley não tem a menor chance!

— Dançaram juntos ontem e hoje.

— Não sabia que dançar agora firmava compromisso.

O efeito do álcool e o jeito como falavam de seus irmãos fez seu sangue ferver. Ginny trocou sua taça vazia por outra.

— Eu aposto 50 libras que a Srtª Delacour se casa com o meu irmão esta temporada.

Os senhores assustaram-se com sua intervenção. O que parecia ser o líder riu, como se o que dissesse fosse absurdo.

— Escutar a conversa de outras pessoas é deselegante.

— Tratar meus parentes com indignidade seria o quê? — ela perguntou.

— Deixem-na apostar — um deles disse — É mais dinheiro para nós.

Seus irmãos deviam estar ocupados demais para ver a situação em que estava, por isso que não foi interrompida.

— Mulheres não apostam.

— Talvez porque elas sempre ganhem e os senhores não gostem de perder — ela rebateu.

Um dos rapazes desencostou da pilastra, e ela ergueu o queixo para mostrar que não o temia.

— Ou talvez porque elas não tenham dinheiro para apostar.

— Isso não será um problema! — uma voz respondeu antes que ela pudesse.

Estava tão envolvida na discussão que não percebeu quando um homem aproximou-se por trás dela. Olhou para o lado, observando o homem separar algumas moedas de seu bolso e estender aos outros.

— Este é o momento em que o senhor me entrega o recibo da aposta — ele explicou lentamente como se estivesse falando com uma criança, ao ver que não havia reação.

Sentiu prazer ao ver o rosto do apostador ficar vermelho de raiva e de vergonha.

— Era só uma conversa — ele murmurou, de repente acuado.

Afastou-se da roda masculina, tomando um longo gole da taça.

Ela realmente tinha perdido tempo discutindo com um bando de bocós?

— Não preciso da sua proteção — disse, assim que percebeu estar sendo seguida.

— Oh! Eu não seria tolo de pensar isso — ele respondeu — Posso saber seu nome?

— Não — ela pegou mais uma taça de champanhe.

Escutou-o rir pelo próprio fora que levou.

Parou de caminhar, observando-o por cima da taça enquanto bebia. Tinha cabelos negros, olhos de um intenso verde e usava óculos, o que era um pouco estranho. As pessoas mais cegas não costumavam usar óculos em eventos sociais, por mais que isso causasse algumas cenas bem engraçadas, mas ele não parecia se importar.

— Não estava no baile ontem — ela disse.

Já começava a sentir a sua mente ficar leve e a sua boca perder o filtro das palavras, mas não se importou com isso.

— Não sou muito fã dos Parkinsons — ele respondeu.

Ela tentou abafar a risada, fazendo um som engasgado.

— Não é o único — conseguiu dizer.

— Não vejo as pessoas olhando para ti e comentando, então suponho que não ficou ébria ontem, como está hoje, o que me faz perguntar o que tem contra os Greengrass — ele caminhava atrás dela.

Se algum de seus irmãos visse, especialmente os mais ciumentos, ficaria com a pulga atrás da orelha. Milagrosamente, seus irmãos estavam muito ocupados com suas vidas amorosas para dar um olhar que fosse a ela.

— Primeiro baile da temporada, estava disposta a fazer tudo do jeito certo — Ginny respondeu.

— E agora desistiu?

— Precisamente.

Apoiou-se contra uma pilastra, conseguindo espichar o pescoço para ver o seu irmão dançar mais uma vez com Fleur Delacour. Esperava muito que ele não se iludisse como Percy.

— Não vai me impedir de beber ou ir atrás de algum dos meus irmãos? — perguntou.

— Pensei que já estava estabelecido de que não precisava de proteção — ele respondeu, sorrindo para ela.

Franziu levemente o cenho, tentando raciocinar por cima do álcool.

— Ginevra Weasley.

— Perdão?

— O meu nome — ela voltou a olhar para os casais dançando.

— Encantado em conhecê-la, Lady Weasley.

Quando virou-se em sua direção, pôde ver Charlie um pouco distante de onde estavam.

— Ah não — ela murmurou, tentando se esconder para não ser vista.

Ele olhou na direção em que ela olhava e, percebendo que estava fugindo, embora não entendesse que era de seu próprio irmão, estendeu a mão para ela.

— Gostaria de dançar?

— Essa é uma péssima ideia — respondeu, mas pegou a sua mão mesmo assim.

Deixou a sua taça pela metade em uma bandeja pelo caminhão, e continuaram caminhando pelos corredores laterais do salão para longe de Charlie. Foram até o hall de entrada da casa, onde algumas pessoas passavam caminhando às vezes, mas não era de perto tão frequentado quanto o salão.

— Engenhoso. Os jardins são zona proibida para moças solteiras e eu certamente seria assunto pela temporada inteira se dançasse no meio de todos — Ginny disse — Enquanto que aqui é um local teoricamente público.

— Estou mais do que curioso para entender como uma pessoa ébria é capaz de dançar.

Apesar de aparentar estar troçando dela, não sentiu-se irritada com ele, sentia vontade de rir do quão patética devia estar a sua situação.

— Pois saiba que eu danço muito bem — ela pôs uma mão em seu ombro e deixou a outra erguida, levantando uma sobrancelha em desafio.

Ele não demorou a pôr uma mão em sua cintura e segurar a sua outra mão.

Algumas pessoas passaram pelo hall, chegando ao baile ou indo embora, mas Ginny não prestou atenção nelas. Atenta em não pisar nos pés de seu parceiro, considerou que não teria sido uma catástrofe se estivessem no salão, afinal, ele sabia conduzir os passos com perfeição. Apesar disso, era bom não ter todos os olhares sobre ela por pelo menos alguns minutos.

Podia escutar o eco dos instrumentos tocando no cômodo ao lado, podia escutar os sons de conversa e os saltos das mulheres batendo no chão de mármore.

— Nada mal — ele disse com um sorriso.

Então ele fez um movimento para que ela girasse e ela acabou tropeçando.

— Péssima ideia girar quem está ébrio — Ginny brincou, apoiando-se no ombro dele para não cair.

— Erro meu, me perdoe.

Tentou demonstrar que não se importava, mas a verdade é que estava se sentindo muito tonta.

O homem a ajudou a ir até uma cadeira, para evitar que desmaiasse, parecendo preocupado. Escutou-o dizer algo sobre seus irmãos e então voltar para o salão, mas não conseguiu prestar atenção. Fechou os olhos, sentindo-se disposta a dormir por umas duas noites seguidas.

Depois disso, lembrou-se apenas de acordar na sua cama.

Resmungou, sentindo a sua cabeça explodir de dor pela luz da manhã invadindo as cortinas. Era muito pior do que ontem, ela não sentia-se capaz de se levantar e ir buscar um chá. Queria voltar a dormir, mas estava enjoada demais para conseguir fechar os olhos.

— Eu odeio a minha vida — resmungou para o travesseiro.

Escutou a porta do quarto abrir e escondeu debaixo do edredom, na vã esperança de que a deixassem dormir pelo restante do dia.

Sentiu sentarem-se ao lado de seu corpo na cama e então puxarem com delicadeza o edredom. Certamente não era sua mãe, ou já estaria gritando com ela.

— Isso vai te ajudar.

Escutou Percy deixar um copo em cima da mesa de cabeceira e levantar-se para fechar mais as cortinas. Suspirando, Ginny obrigou-se a sentar e pegou o copo.

— O que é isso? — fez uma careta ao sentir o cheiro.

— Suco de tomate.

Ela sentiu ânsia de vômito e não conseguiu disfarçar.

— Vamos, vai te ajudar com a ressaca — ele disse.

Estava estranhamente cuidadoso, nem estava lhe dirigindo aqueles olhares repreensivos de sempre. Obrigou-se a beber, cobrindo o nariz e fechando os olhos para ver se ajudava a engolir.

— Odeio tomate — ela resmungou.

— Eu sei — ele coçou a ponta do nariz.

— Agora é a hora que vai dizer que fui imprudente? Que não deveria ter bebido tanto?

— Todos já passamos por essa experiência, Ginevra. O que diferencia é que... — ele pigarreou, cruzando os braços — podia ter se posto em perigo. Quando estamos ébrios, não temos muita noção do que está acontecendo ao redor.

— Posso me cuidar sozinha.

— Quando está sóbria, confio em ti de olhos fechados. Mas isso é diferente.

Imaginava que o seu estado físico não lhe dava muita confiabilidade. Resolveu não discutir, sua garganta estava seca e sua cabeça doía.

— Se arrume, mamãe está esperando lá embaixo.

Ele saiu do quarto, deixando-a resmungar sozinha.

Nem perguntou-se onde estaria a Srª Figg àquelas horas, virando-se para pôr um vestido de dia apropriado.

Caminhou pelo corredor quase de olhos fechados, perguntando-se quem tinha feito a gentileza de correr todas as cortinas da casa, deixando tudo insuportavelmente iluminado.

Desceu as escadas com cuidado, a última coisa que precisava era cair e morrer nos degraus.

— Bom dia, irmãzinha — George a cumprimentou, assim que chegou à mesa para tomar o café da manhã.

— Dia — ela resmungou.

Bill empurrou uma xícara de café em sua direção, que ela aceitou sem hesitar. Fazia um tempo que não bebia café, era tudo o que precisava.

— O que puseram no café? Está bom — ela apreciou mais um longo gole — Não é chocolate.

— Bill conseguiu mel no comércio central — respondeu Charlie.

— É por isso que é meu irmão favorito.

— Qualquer um que faça o que quer é seu irmão favorito — retrucou Fred.

— Ontem não era Charlie? — perguntou George.

Ela mostrou a língua, e então percebeu que estava tudo silencioso demais.

— Onde está a mãe?

— Na sala de estar, bordando alguma coisa — respondeu Rony.

Isso não era bom.

Adiou ao máximo a sua ida até a sala de estar, aproveitando a comida tranquilamente. Quando não suportava mais comer, levantou-se e saiu.

Mesmo após o fracasso do dia anterior, a sala estava arrumada e estaria durante o dia para a visita de possíveis pretendentes. Os biscoitos assados em cima da mesa de centro. Sua mãe estava sentada em um dos sofás bordando algum lenço de renda delicado. Ginny não era ruim em bordado, mas nunca chegaria aos pés dela. Sentou-se ao seu lado, esperando pela bronca que não veio.

Ótimo, então ela ia fazer o famoso tratamento de silêncio. Pois bem, Ginny pegou um tecido para bordar também, silenciosamente, já que a simples ideia de tocar piano fazia a sua cabeça latejar.

Escutou as risadas de seus irmãos vindas da sala de jantar, onde realizavam todas as refeições. A mesa comprida parecia curta demais para nove pessoas todos os dias. Quase pensou em abandonar o bordado e voltar para a conversa, o silêncio era perturbador.

— Ninguém viu o que aconteceu, exceto aquele jovem que foi atrás de Bill — sua mãe disse em um tom baixo de voz, quase como se estivesse falando sozinha — Viemos para casa logo depois. Deve estar se perguntando o que aconteceu, já que apagou durante o caminho.

Não lembrava-se sequer de ter entrado na carruagem.

— Não precisavam ter vindo todos — disse Ginny, sentindo-se culpada.

Não sentia pena de Fred e George, mas Bill parecia estar se divertindo. Charlie e Rony provavelmente deram graças aos céus por voltarem cedo. Percy talvez estava entretido em algum assunto com cavalheiros, se não estava atrás de Penélope outra vez.

— Seus irmãos estavam preocupados contigo, Ginevra. Aquele jovem foi muito gentil de não dizer que estava embriagada, disse que estava a passar mal — disse Molly, deixando reluzir um pouco de seu temperamento.

— Perdão, exagerei no champanhe — disse simplesmente, orgulhosa demais para fazer uma cena sobre isso.

— Espero que isso não se repita.

Decerto que não.

Enquanto bordava a delicada renda, sem nem saber direito o que estava fazendo, pensou naquele jovem. Sequer perguntou o nome dele! Que estúpida tinha sido.

Sem dúvidas teria outro evento social àquela noite, perguntou-se se ele estaria lá.

Era tão entediante todas as noites se deslocar de carruagem para ficar horas socializando e sendo vista como um produto a ser adquirido.

— Como tu e papai se conheceram? — murmurou timidamente.

Sua mãe pareceu amolecer, suspirando e erguendo a cabeça do bordado.

— Apesar de morarmos na mesma região, nos conhecemos no dia de St Patrick. Muitos imigrantes irlandeses — explicou antes que ela pudesse perguntar — E no dia de St Stephen, ele me pediu em casamento. Não foi algo que aconteceu de um dia para o outro, nós começamos como amigos e fomos nos aproximando.

— Uma amizade que durou nove meses.

— Não — Molly sorriu — A amizade não acaba porque o amor começa, Ginny. Não existe casamento sem confiança, fidelidade, companheirismo.

Ela sabia que existia, mas entendeu o que sua mãe quis dizer. Um casamento não funcionava sem esses pilares. Muitos casamentos começavam sem amor, mas funcionavam por existir respeito e amizade entre os cônjuges.

— As coisas eram mais fáceis sem tantas regras e eventos sociais — afirmou Ginny.

Antes que sua mãe pudesse falar algo, a Srª Figg entrou na sala.

— Milady, uma visita — ela anunciou, parecendo pasma — Lord Potter.

— Pois deixe-o entrar, Arabella!

Ginny suspirou, voltando a prestar atenção no lenço. Aparentemente a sua escapada na noite anterior não a privou de ser vista por algum rapaz. Era um pouco difícil com os seus cabelos ruivos tão chamativos. Talvez fosse até mesmo um dos idiotas com quem tinha discutido por causa de uma aposta.

Sentiu o estômago afundar com a ideia. Isso sim causaria uma discussão em casa, sua mãe não deixaria passar como sua ressaca...

— Bom dia, miladies.

Aquela voz fez com que ela erguesse o olhar.

Ela não tinha ficado embriagada na frente de um lorde! Não era possível que ela fosse tão desafortunada.

— Lord Potter, é uma honra recebê-lo em nossa propriedade — sua mãe cumprimentou-o, enquanto ela ainda tentava raciocinar o que estava acontecendo — Ginevra?

O chamado quase entredentes de sua mãe a despertou, largou o bordado no sofá e levantou-se para poder reverenciar.

— Não creio que seja necessário — Potter disse rapidamente, quase desconfortável.

Ela tinha mesmo despertado aquela manhã?

Dirigiu o olhar discretamente para a porta da sala, percebendo Fred observar a situação, mordendo uma maçã e parecendo se divertir muito.

— Perdão, não fomos devidamente apresentados — Ginny tentou recuperar um pouco da própria dignidade — Eu sou Ginevra Weasley.

Ele já sabia disso, é claro.

— Harry Potter — ele se apresentou, finalmente dando um nome aos seus delírios.

Sua mãe foi lentamente para um sofá mais afastado, como se ela não fosse ser notada por estar se locomovendo devagar.

— Por favor, sente-se — ela disse, dando outra olhada para onde Fred estava, considerando a ideia de atirar-lhe uma lamparina.

— Quis ver como estava se sentindo, deixou a todos nós preocupados — disse Harry, assim que ela sentou-se ao seu lado.

Se fosse qualquer outro ser humano na face da Terra, ela daria uma resposta bem mal educada.

— Estou bem, obrigada — mentiu — E como foi o restante da festa? Aconteceu algo mais memorável? — permitiu-se brincar.

— É difícil competir contigo, Lady Weasley.

— Por favor, me chame de Ginny.

Era incômodo ter sua mãe escutando a conversa, podia sentir que a qualquer momento ela interviria para impedi-la de falar alguma bobagem.

— Então me chame de Harry — ele respondeu.

Ela sorriu.

— Algum problema, Frederick?

Ginny levantou o olhar, sua mãe olhava fixamente para o seu irmão, que hesitou, ainda apoiado ao batente da porta, a maçã quase finalizada em sua mão.

— Nenhum, só estava procurando por George. Viram ele por aí? — Fred tentou disfarçar.

— Já procurou na sala de jantar? — Ginny perguntou com deboche.

— Como pude ser tão estúpido! — ele respondeu com o mesmo deboche, até mesmo batendo na própria testa — Obrigado, caríssima irmã. O que seria de mim sem sua ilustre presença?

— Eu posso dizer o que será se não desaparecer da minha frente em cinco segundos.

Ele saiu rapidinho da sala, até mesmo fechando a porta por onde veio.

Sua mãe precisou se conter, podia sentir, era de suas regras não repreender seus filhos na frente de visitas. Hermione era exceção, ela a considerava da família, então repreendia Rony sem hesitar.

— Chá, Harry? — Ginny ofereceu, sorrindo docemente.

Geralmente isso era suficiente para assustar alguns pretendentes, mas ele estava sorrindo.

— Perdão, não sou muito fã de chá — ele respondeu com sinceridade.

— Café é melhor, não é? — ela disse — Eu vou buscar.

Antes que sua mãe pudesse impedi-la, ela foi até a porta que dava para a sala de jantar. Assim que abriu a porta, quase derrubou Rony, que estava escorado tentando escutar a conversa.

— Escutem aqui todos — ela praticamente sussurrou, fechando a porta.

— Estou bebendo café! — Charlie se defendeu.

— Não quero saber de ficarem incomodando — Ginny disse com o dedo em riste — Mamãe está lá, não tem necessidade alguma de ficarem bisbilhotando!

— Eu seria incapaz de uma coisa dessas — George mostrou-se ofendido.

— Vai assustá-lo também? — perguntou Bill, lendo o jornal.

— Estou tentando, mas ele é perseverante — ela respondeu.

— Tem de ser perseverante, tens seis irmãos — comentou Percy.

— E Ginevra é pior do que todos nós — retrucou Rony — Se ele conseguir amansá-la...

Ginny deu um tapa estalado em seu braço. Pegou o bule de café da mesa, sob os protestos dos irmãos, e então retornou à sala de estar.

— Perdoe-me a demora — ela voltou a sentar-se ao seu lado, pondo o bule em cima da mesa de centro.

Olhando para sua mãe, conseguiu ler o "não pode deixá-lo sozinho aqui, é falta de educação" em seus olhos. Deu de ombros, em seu jeito discreto de pedir desculpas, e então ajeitou-se.

— Onde estávamos? — virou-se para perguntá-lo.


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