A Saga E - A pirâmide Colossal escrita por Diego Farias


Capítulo 39
Aquele dos meus pesadelos - O interlúdio




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  Tudo corria absurdamente mórbido no Yomotsu Hirasaka. Os moribundos seguiam em fila indiana em direção ao buraco do mundo dos mortos, onde toda expectativa de um dia, retornarem a ver a luz do sol, se perderia.

  Aquele homem estava sentado em uma pedra e observava aquela cena fúnebre e imaginava o quão cheio estava o salão de seu mestre. E por sua vez, problematizava absurdamente o seu comportamento de não retornar até lá. Àgora de Ammit estava em crise.

  Como sendo o servo pessoal do Deus dos Funerais, ele poderia voltar incontáveis vezes do mundo dos mortos. A benção de seu mestre o protegeu de ser completamente derrotado pelos cavaleiros de bronze, mas não o protegeu das incertezas que eles lhe causaram.

  Lembrou-se dos infinitos julgamentos que assistiu. Sempre se alimentou muito bem dos corações impuros dos humanos. Eles eram egoístas, perversos, traidores, mentirosos, invejosos, adulteros e tudo de ruim e imoral que poderia existir numa sociedade. Por isso, perguntava-se: “Como aquelas crianças conseguiram a benção de sua deusa para derrotá-lo?”

  Ele começou a questionar a deusa Athena. Ela seria uma deusa profana? Possuiria outro senso moral? Ou os cavaleiros que enfrentou pertenciam a uma classe diferente de humanos? 

  ― O quê? ― exclamou surpreso. ― Aquele é...

 

  Finalmente uma figura conhecida na fila indiana dos quase mortos. Ryuho de dragão caminhava amendrontado, acompanhando os mortos em sua procisão até o mergulho final. O filho de Shiryu apresentava olheiras fundas, olhar esbugalhado e cabelos quebradiços.

  Ágora torceu o nariz e ficou decepcionado. Ele ( Ryuho) e seus amigos, teriam vencido o regido de Ammit por sorte? De qualquer maneira, sentia-se na obrigação de terminar com a agonia do jovem dragão e por que esperar que ele se precipitasse no abismo? Era melhor jogá-lo diretamente nele.

   ― Por favor, não! ― gemeu o garoto ao ser suspenso no ar por suas vestes. ― Eu não posso morrer ainda.

  ― Está consciente no mundo dos mortos? ― admirou-se o egípcio. ― Significa que você possui um cosmo tão elevado a ponto de abrir uma passagem pelo Seikishiki

  Ágora saltou da fila indiana e jogou o garoto sobre o solo arenoso do Yomotsu. Ryuho tossiu um pouco e ao reconhecer o servo do deus Ánubis, ele se levantou e colocou em posição de luta.

   ― Não estou aqui para lutar, jovem cavaleiro de Athena! Se eu quisesse poderia tê-lo lançado na gargante e nunca mais voltaria para junto de seus amigos.

  ― O que está tramando?

  ― Eu estou com muitas dúvidas e acho que os deuses lhe enviaram para esse lugar para que você possa saná-las. Diga-me: Como é que você definiria, Athena?

   O pequeno dragão ergueu uma sobrancelha e nada entendeu. Ágora desviou o olhar com uma respiração cansada e resolveu sentar-se numa pedra.

   ― Eu sempre tive uma visão muito ruim de vocês, humanos. ― Ryuho desfez a sua guarda e parecia curioso pela fala de Ágora. ― Me alimentei de infinitos corações impuros e imorais, mas vocês... O que Athena fez ou faz para que sejam tão...

  ― Nada! ― Ágora parecia incrédulo. ― Athena acredita em nós. A lenda diz que a deusa Athena reencarna de duzentos em duzentos anos para defender a Terra das forças do mal e você não está errado. As vezes os humanos fazem muitas e muitas maldades, mas nós também possuímos um coração capaz de amar, ajudar e acolher aqueles que sofrem. Deuses são diferentes de humanos. Nós podemos comportar uma dualidade de ações e sentimentos... Você deve ter sentido isso, já que devorou infinitos corações, estou errado?

   Ágora parecia surpreso e abriu um sorriso sem graça.

   ― São conceitos muito interessantes, por mais que eu não possa concebê-los. Deve ser interessante ser humano, cavaleiro de dragão.

  ― Nos ajude! ― o servo de Ammit encarou o dragão abismado. ― Se há dúvida em seu coração é porque você está dividido em seu propósito. Talvez você não esteja de acordo com os métodos do seu senhor e viu em nós a possibilidade de que...

  ― Não ouse manchar a integridade do mestre Anubis. Basta um golpe do meu dedo e sua alma será despedaçada em mil pedaços.

  ― Mas foi você que a manchou no momento em que duvidou de seu mestre!

  ― Eu o avisei, jovem cavaleiro... GARRA DEVORADORA DE CORAÇÕES!

   Ryuho cruzou os braços diante do rosto para tentar se defender, mas ao notar que nada lhe acontecera, abriu os olhos e contemplou uma cena inusitada.

   ― O que pensam que estão fazendo? ― disse Ágora abismado com a quantidade de mortos-vivos que o seguravam e nitidamente protegiam o filho de Shiryu. ― Por que estão protegendo esse garoto?

  ― Por que ele está destinado à proteger o Seikishiki. ― disse uma voz senil.

   Tanto Ryuho, quanto Ágora olharam para uma coluna a esquerda e notaram que uma figura esquisita, jazia sentada ali na posição de lótus. Parecia um senhor com seus oitentas anos, de pele bem branca, cabelos platinados, tão cumpridos que cobriam seu rosto.

   ― Esse é... ― Ryuho começou a suar frio. ― Aquele dos meus pesadelos. Ele é real.

  ― Quem é você, maldito? E o que quer dizer com essa história de protegido do Seikishiki?

  ― De tempos em tempos, a entrada do mundo dos mortos escolhe seu guardião. Um deles, inclusive, foi o meu mestre. Ele foi um dos doze cavaleiros de ouro e era atendida pela alcunha de Máscara da Morte de Cancêr, hoje, os mortos andam errantes e vocês, deuses egípcios estão interfirindo diretamente na roda de reencarnação e os mortos estão protegendo esse menino, porque eles o escolheram desde pequeno.

  ― Como assim me escolheram? Eu não lembro de nada.

  ― Esqueceu-se que havia uma entrada para o mundo dos mortos rente a cachoeira de Rozan? ― o pequeno dragão estremeceu dos pés a cabeça. ― O mestre de seu pai a vigiou por mais de duzentos anos, agora é sua vez de guardá-la, Ryuho.

  ― Eu não entendo... O que você quer de mim?

  ― Que você se torne o novo cavaleiro de ouro de câncer e restabeleça a ordem no mundo dos mortos! ―ambos ali ficaram presentes. ― Eu poderia fazer isso, mas infelizmente, meu corpo está selado no Monte Etna agora.

  ― Monte Etna? ― o garoto repetiu com a certeza de que já havia ouvido esse nome. ― O monte Etna é onde está selado o Titã Typhon.

  ― Graças ao meu sacrifício, inclusive. Realmente! Esqueci de me apresentar. Eu sou um cavaleiro de bronze do século XX que lutou ao lado de seu pai e companheiros! Sou Mei - o cavaleiro de Coma de Berenices.

  ― Não me importa quem você seja, mas eu não deixarei que você fale mal do mestre Anubis e nem do mestre Osíris.

  ― Veja por si, só. 

  Ryuho e Ágora se surpreenderam ao notarem que estavam sobrevoando a garganta do mundo dos mortos. O dragão ficou apreensivo, mas notou que estava preso a algo muito fino que lembrava fios de cabelo.

   ― Os mortos depois da chegada dos deuses egípcios estão sendo sentenciados ao esquecimento eterno. Sejam culpados ou inocentes. Eles não tem direito a um julgamento justo e isso impacta diretamente a roda de reencarnação.

  ― Por que está me mostrando isso? ― disse Ágora.

  ― Você queria uma resposta. ― disse o velho Mei. ― Agora, diga-me se não a encontrou guerreiro egípicio?

   O cavaleiro de bronze retornou a borda do penhasco e começou a desaparecer em partículas brilhantes. Ryuho sentia o estômago revirar, lembrando de alguns eventos estressantes e assustadores em sua infância, mas a fúria de Ágora lhe chamou atenção.

   ― O que ele estava me sugerindo? Que eu me tornasse um cavaleiro de Athena?

  ― Bastet se uniu a nós! ― ele ficou abismado. ― Ela está decidida a proteger o meu pai e se tornou a amazona de bronze de Lince.

  ― Voce não entenderia... Eu nasci para servir o mestre Anubis! Mesmo que eu não compartilhe as mesmas convicções, eu não posso ir contra a sua vontade.

  ― E quando você irá servir a você, Senhor Ágora? Essa guerra pode mudar completamente o curso do universo e o lado que o senhor escolher o tornará parte responsável pelo que virá.

   O guerreiro de Ammit cerrou os punhos e começou a elevar o seu cosmo. Ryuho encarou a fileira de mortos e sabia que eles não chegariam a tempo de protegê-lo. Ágora abriu a palma da mão e Ryuho sentiu o seu corpo se desfazendo rapidamente.

   ― Volte imediatamente para o seu corpo, jovem dragão! Volte antes que eu me arrependa e o jogue nesse foço para que nunca mais renasça.

  ― Você não é um homem ruim, Senhor Ágora! Só precisa se libertar dessa prisão.

   O cavaleiro de Ammit sentou na primeira rocha que viu. Trincou os dentes de raiva e agora, odiava-se por ter as respostas das perguntas que o incomodavam. Decidiu que só levantaria dali, quando escolhesse um lado. 


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