Dear Mr. Nemesis escrita por Nekoclair


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo






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Careless overreaction leaves destruction. Foe’s efforts entice trouble.

 

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Quinta-feira. Um final de tarde em um certo cruzamento no centro da cidade.

Uma multidão agitada tomava conta das ruas, passos apressados ​​e altos reverberando no concreto da calçada.

Era o final de outro longo e cansativo dia de semana e um mesmo pensamento — um mesmo anseio — governava todas as mentes igualmente; as pessoas mal podiam esperar para chegar em casa e desfrutar da paz e do sossego, do conforto de seus sofás e do ruído de fundo da televisão, enquanto desperdiçavam o restante do dia assistindo a vídeos de gatinhos no Youtube.

Em meio a essa multidão apressada e cansada, havia um homem — de aparência comum, vestido em um terno preto e uma gravata azul-clara, e com cabelo escuro como uma noite sem lua, os fios penteados para trás e longe de seu rosto, nenhum fora do lugar. Devido às suas roupas e feições simples, ele se assemelhava aos vários assalariados que enchiam as ruas do centro da cidade.

Parado na beira da calçada, o homem olhou para frente e então permitiu que seus olhos castanhos se erguessem em direção ao céu, o qual escurecia gradualmente. Diante dele havia um cruzamento movimentado, os carros zumbindo alto ao passarem por ele. Um pouco mais à frente, do outro lado da rua, havia um edifício realmente alto, que — assim como o homem — havia conseguido se tornar um só com o cenário, assemelhando-se a todos os demais da vizinhança.

O homem observava o prédio com uma atenção inabalável, mal piscando. E ele não era o único olhando furtivamente para ele.

O edifício em si não era de forma alguma especial. Ele era consideravelmente alto e bonito, com grandes janelas cobrindo toda a frente do prédio, e quase todos os andares eram alugados e abrigavam algum tipo de loja ou serviço. No entanto, esses não eram os motivos pelos quais o prédio atraía tantos olhares diariamente.

A Torre de São Petersburgo tinha uma reputação, pois ali era possível encontrar um homem como nenhum outro.

— Estou entrando — o homem falou em seu celular e, em seguida, atravessou a rua quando os carros pararam ao que o semáforo ficou vermelho.

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Houve o toque familiar de uma campainha e então a porta do elevador se abriu, revelando ao seu ocupante uma sala sombria que não ia muito além. Com as sobrancelhas erguidas em confusão, o homem deu um passo cauteloso para fora do elevador, assustando-se quando as luzes de repente se acenderam ao que um sensor de movimento captou sua presença.

A sala sombria se iluminou, dando a ele uma visão clara do tamanho e do interior do cômodo em que se encontrava. Pendurado em uma das paredes estava uma pintura de uma cidade enterrada na neve, e em um canto repousava um vaso de plantas de beleza inquestionável, com folhas de um tom vivo de verde.

O homem estava bastante confuso com o cenário à sua frente, o qual contradizia aquele que sua mente havia fornecido anteriormente, durante sua subida dentro do elevador. O lugar estava muito quieto, a respiração de máquinas completamente ausente, e o cômodo parecia muito mais caseiro comparado ao que ele esperava encontrar. Mesmo assim, ele tinha certeza de que estava no lugar certo — no último andar da Torre de São Petersburgo.

Mesmo que ele estivesse um pouco — bastante — confuso com aquela recepção, o homem sabia que não devia se permitir correr nenhum risco.

Dando um passo furtivo à frente, o homem grudou seu corpo a uma das paredes e se aproximou da porta localizada no outro lado da sala não muito larga. Abaixando-se ao lado dela, ele estendeu a mão. A princípio, ele hesitou e recuou, perguntando-se se algum tipo de armadilha o aguardava, porém, no fundo de seu coração ele sabia que não era o caso. Depois de respirar fundo uma última vez, o homem finalmente encontrou coragem e fechou a distância restante, pousando a mão na porta e sentindo a textura gravada na superfície, que carregava o calor familiar de madeira. Aparentemente, a porta era exatamente o que parecia ser — uma porta comum e sofisticada.

Voltando-se para a maçaneta, ele decidiu arriscar uma tentativa. Mas, como esperado, a porta nem sequer balançou. Talvez esperar encontrá-la destrancada tivesse sido um desejo excessivo de sua parte... Felizmente, ele sempre estava pronto para tais situações.

Arrancando o botão do punho de sua camisa, o homem puxou a ponta de uma haste que se encontrava dobrada dentro do botão e começou a trabalhar na fechadura da porta. Como ele estava ajoelhado, suas mãos e olhos estavam no nível do buraco da fechadura, tornando seu trabalho um pouco mais fácil. Logo, a porta estava destrancada.

Quando ele colocou um pé para dentro da sala que estava até então trancada, o homem ficou confuso com a escuridão imperturbável e com o silêncio agourento que a acompanhava, o qual parecia ser interminável até que o som de passos rápidos foi ouvido. O homem ficou tenso quando percebeu que os passos estavam vindo em sua direção, e em grande velocidade. Rapidamente, ele buscou o grande relógio em seu pulso. Ele girou uma das engrenagens e o relógio se acendeu, criando um feixe de luz e iluminando o espaço à frente.

Ele se preparou para o que quer que estivesse por vir, pronto para revidar caso uma luta se iniciasse, mas quando apontou a lanterna ao seu redor, foi incapaz de encontrar seu adversário — e então, de repente, algo estava se esfregando em sua perna.

Um grito agudo escapou de sua boca e ele saltou para trás. As batidas de seu coração estavam tão altas quanto trovões em uma noite tempestuosa e estrondosa, e o arrepio que percorreu seu corpo de ponta a outra estava agora fazendo suas pernas fraquejarem. Por precaução, ele deu mais alguns passos para trás — melhor prevenir do que remediar.

Com o coração batendo contra a garganta, ele apontou a luz para baixo, e o que ele encontrou foi bem diferente de qualquer coisa que tenha passado por sua cabeça nesse meio tempo. Diante dele estava um grande poodle marrom, seu rabo balançando sem parar enquanto o observava com pequenos olhos que pareciam carregar a luz de todo o universo, de tão brilhantes que eram.

Makkachin latiu duas vezes, feliz.

 — Makkachin?!

O homem se permitiu respirar novamente, o peso em seu peito diminuindo significativamente.

— Então era você, garota... Onde está o Victor? — ele perguntou, sem realmente esperar uma resposta, mas incapaz de se conter ainda assim.

Ele se agachou e segurou a cabeça da cadela entre as mãos, sorrindo enquanto entrelaçava os dedos no pêlo macio, lutando contra o impulso de esfregar o nariz contra o focinho frio de Makkachin.

Ele amava cachorros.

Ele realmente amava cães. Principalmente poodles.

Ele deveria estar acariciando a cadela de seu arqui-inimigo, entretanto?

Provavelmente não.

Mas não era sempre que ele tinha uma oportunidade dessas ao seu alcance! Normalmente, ele só podia se encontrar com Makka aos finais de semana e isso não era nem de perto suficiente...

Sempre que se encontrava com Makkachin, o homem se lembrava de seu falecido cachorro, o qual fora sua maior companhia durante a infância. Isso o deixava nostálgico e melancólico, mas também feliz e cheio de um calor que ele não conseguia encontrar em nenhum outro lugar. Ele nem se importava se sorria como um tolo quando se perdia na fofura de um cachorro, pois ele ficava tão feliz que não conseguia se importar com mais nada.

Agora calmo ao se dar conta de que o perigo iminente tinha sido apenas um mal-entendido de sua mente, a qual tendia a estar sempre cheia de preocupações desnecessárias, ele se afastou do animal — que simplesmente se sentou ao lado de seus pés sem se importar com o mundo — e deu uma olhada melhor ao redor, apontando seu relógio-lanterna em direção ao cômodo e inspecionando-o atentamente.

O que ele encontrou não foi de forma alguma o que ele esperava.

Ele estava, em todos os sentidos, dentro de uma sala de estar.

A sala era grande, e as paredes estavam pintadas em um tom claro e tranquilo de azul, o qual o fez pensar em uma piscina límpida de águas rasas. Havia um grande sofá branco no meio da sala, junto com uma mesa de centro e uma pequena estante de livros. Uma grande almofada repousava perto da parede, com um cobertor e alguns brinquedos — coisas da Makka, certamente. E, no canto da sala, havia uma grande mesa de jantar feita de madeira, um pequeno lustre brilhante pendurado sobre ela. Haviam fotos em cima dos elegantes móveis espalhados pela sala e lindas pinturas expostas nas paredes. Era a própria definição da casa de uma pessoa rica.

Esta era a casa do Victor, claramente.

O homem olhou em volta, silenciosamente, sentindo-se muito confuso com a situação atual. Teria ele errado uma curva no saguão lá embaixo, no térreo? Ele apertou o botão errado no elevador? Esta era a casa de Victor, certo? Isso significa que ele havia invadido?...

Assim que ele decidiu partir em busca do interruptor, cansado de andar às cegas sem enxergar um metro à sua frente, tudo se iluminou — literalmente. Pego de surpresa, o homem se sobressaltou, virando tão rapidamente que quase perdeu o equilíbrio devido à vertigem. Seu coração batia tão forte que ele podia o sentir latejando nos ouvidos.

Um homem perto dos trinta olhou para ele do outro lado da sala, vestido com um sobretudo rosa e calças pretas justas. Havia também um lenço amarelo brilhante em volta de seu pescoço, cuidadosamente amarrado em um laço na frente. Se Victor não fosse um homem tão bonito, aquele traje certamente ficaria ridículo.

 — Katsudon? — o homem perguntou, chamando-o pelo seu pseudônimo.

Makkachin disparou em direção ao seu dono assim que o viu, correndo pela sala em velocidade máxima e cuidado mínimo, fazendo com que ela batesse de cabeça nas longas pernas de Victor. A cadela não parecia ter se importado — ou machucado — com a colisão, pelo menos; Victor, por outro lado, quase perdeu o equilíbrio e caiu de cabeça no chão quando Makka se chocou contra ele.

O homem — Katsudon — olhou para o seu arqui-inimigo e depois ao seu redor, em direção à sala, à cozinha e às portas que certamente conduziam a aposentos mais privados. Sua boca permaneceu aberta, pois ele não tinha ideia sobre o que fazer, o que dizer, de como explicar o que estava fazendo ali ou como isso tinha acontecido.

O que alguém era suposto de dizer quando era pego invadindo a casa de seu némesis?

Katsudon gesticulou ao redor, sem palavras, tentando transmitir a centena de pensamentos que estavam formando um nó em sua cabeça. Sem sucesso. Ele desistiu, e permitiu que seus braços permanecessem imóveis ao lado de seu corpo.

 — Desculpe — ele disse, finalmente, olhando para baixo embaraçado.

— Não, não! Não se preocupe! — Foi a vez de Victor gesticular e mover as mãos inquietamente diante do rosto. — Eu percebi que algo estava errado quando você não chegou depois de tanto tempo... Já faz um tempo que recebi sua ligação e, enquanto me perguntava o que poderia ter acontecido, recebi uma notificação do sistema de segurança da minha casa.

Claro que havia um sistema de segurança ... Katsudon queria esconder o rosto de tanta vergonha que estava sentindo, mas se conteve; agora não era o momento de sentir pena de si mesmo. Em vez de se esconder, Katsudon se forçou a olhar em direção ao seu nêmesis, a encará-lo. Essa foi a maneira que ele encontrou para tentar compensar seu erro.

No entanto, a troca de olhares entre eles não durou muito. Foi a vez de Victor desviar o olhar, seu cabelo claro e sedoso caindo sobre sua testa e cobrindo uma parte ainda maior de seu rosto do que o normal.

 — Foi minha culpa — Victor insistiu, sua voz suave como um sussurro. — Eu deveria ter sido mais claro sobre qual elevador você deveria tomar para chegar ao laboratório — ele disse enquanto coçava a nuca, nervoso.

 — Sim, haviam, tipo... quatro deles. Quando alguém sequer precisaria de tantos elevadores? — Katsudon brincou, tentando aliviar o clima. Porém, não funcionou e só o fez se sentir um idiota. Ele se repreendeu mentalmente.

Victor riu de qualquer maneira, brevemente, apenas para que Katsudon não se sentisse completamente desconfortável, mas ele não fez nenhum esforço para oferecer uma resposta ao que ele tinha dito ou continuar aquele assunto.

— Por favor, entre. Podemos chegar ao laboratório pelas escadas naquele corredor — disse ele.

Depois de agradecer e se desculpar uma vez mais, Katsudon seguiu atrás de Victor, ainda se sentindo bastante desconfortável com toda a situação em que eles se encontravam. Pelo menos eles não estavam sozinhos. Makkachin os seguiu de perto, pulando ao redor deles até que Victor deu à cadela o que ela tanto queria — atenção.

Eles continuaram andando e Katsudon se sentia como se estivesse caminhando pelo deserto do Saara, e não através de uma sala ar-condicionada. Ele podia sentir o suor escorrendo pelas suas costas, o resultado de seus nervos fracos. Victor podia ver que seu nêmesis ainda estava se sentindo bastante ansioso com o que tinha acontecido — mesmo que não tivesse sido culpa dele, como ele mesmo havia deixado claro — e ele tentou aliviar a tensão que ainda enchia o ar ao redor deles, mantendo o silêncio desconfortável afastado.

— Obrigado por usar a porta, a propósito. Ainda não consegui consertar aquela janela que você quebrou da última vez.

Essas palavras perfuraram Katsudon como lanças longas e afiadas. No entanto, sentindo que Victor estava tentando ajudar, ele fez o possível para ignorar os efeitos daquele golpe crítico ao seu psicológico já tão enfraquecido. Ele sorriu o melhor que pôde.

— Sem problemas... E desculpe pela janela. — O sorriso em seu rosto não era o mais convincente, mas pelo menos ele estava tentando.

Victor acenou a mão de forma despreocupada.

— Faz parte da profissão. Quebrar uma janela ou duas é inevitável.

Depois de virar numa curva e descer as escadas, os arredores começaram a ficar mais sombrios a cada passo que eles davam no corredor que corria à frente deles, que era o único caminho disponível. Katsudon não pôde deixar de notar a mudança na atmosfera.

As tábuas de madeira que cobriam o piso do apartamento de Victor foram substituídas por um revestimento simples e frio de concreto, e o tom delicado e suave de azul que cobria as paredes também foi embora, substituído por um tom de cinza sóbrio que também se encontrava presente no teto. Além disso, fora as luzes de emergência que brilhavam em uma linha que corria no meio do corredor, a iluminação não era muito forte. Até Victor estava começando a dar uma impressão completamente diferente. Suas roupas, que antes pareciam algo proveniente da passarela de algum desfile de moda extravagante, agora faziam Katsudon pensar naqueles vilões de filmes clássicos em preto e branco — um homem estiloso que era o orgulhoso proprietário de uma beleza distinta, mas que era também, ao mesmo tempo, alguém que você não gostaria de encontrar sozinho em um beco escuro. Com o rosto sombreado devido à escassa iluminação, Katsudon não conseguia nem reconhecê-lo.

Naquele momento, sua imagem era condizente com sua posição de vilão — inimigo do povo, aliado apenas de seus próprios interesses.

Quando eles finalmente chegaram ao final do corredor, não havia nada além de uma porta de aço, uma lâmpada pendurada em cada lado. Eles haviam enfim chegado ao laboratório.

Victor — não, o Treinador se virou e olhou para Katsudon, olho no olho. O homem sentiu seu coração acelerar e pular em direção à garganta, enquanto suas pernas ficavam mais e mais geladas. Ao que a luz irradiou por detrás dele, o rosto de Victor ficou completamente sombreado, imerso na escuridão.

E então Victor sorriu gentilmente e Katsudon conseguiu respirar novamente.

— Vamos tentar de novo, então — disse Victor.

Katsudon estaria mentindo se dissesse que não estava nem um pouco feliz de ver a expressão despreocupada de Victor uma vez mais depois daquela caminhada tortuosa e silenciosa pelo corredor. Era bom sentir o coração batendo em ritmo normal novamente.

— Me dê dois minutos para entrar no personagem de novo. — Victor ergueu dois dedos e inclinou a cabeça levemente para a direita.

Katsudon não sabia como se sentir a respeito de seu inimigo ter que "entrar no personagem" para fazer seu trabalho, mas já era tarde demais para começar a questionar o que se passava na mente de Victor. E, de certa forma, ele estava feliz e contente por ter um arqui-inimigo como ele. Ele nunca trocaria Victor por qualquer outra pessoa.

Katsudon acenou com a cabeça, um pequeno sorriso pendurado em seus lábios, e então Victor fechou a porta na sua cara.

Agora sozinho, Katsudon se viu sem uma visão clara do que fazer enquanto esperava. Ele recostou contra a parede e contou os segundos enquanto batia os dedos na perna. Em algum momento, porém, ele perdeu a conta e o tédio começou a tomar conta. Seu celular já estava em sua mão quando ele percebeu.

Katsudon estava mandando uma mensagem para sua mãe sobre sua programação para o fim de semana quando um garoto loiro veio buscá-lo, fumegando pelos seus ouvidos quase que visivelmente. O homem deu um pulo, pego de surpresa pela porta que se abriu sem cuidado e com muita força, colidindo com a parede bem ao lado de sua cabeça.

— Oh, Yurio… — o homem murmurou enquanto se afastava da parede e dava um passo para trás; inconscientemente, não porque ele estava com medo ou algo assim, é claro.

O loiro cruzou os braços na frente do peito. Ele estava vestindo uma blusa preta de gola alta e calça cargo bege que parecia um pouco grande demais em sua cintura estreita. Algo brilhava em seu cinto e Katsudon esperava que não fosse uma faca.

— Que porra você está esperando, porco? Já se passaram quase dez minutos! — Ele parecia impaciente, e a maneira como ele batia o pé no chão apenas confirmava sua irritação.

O garoto era o aprendiz do Treinador, e ele veio da Rússia há um ano justamente para trabalhar ao lado do vilão que ele tanto admirava. Ele era jovem e de estatura baixa, seus traços infantis marcantes como os de alguém que ainda esperava pelo seu primeiro estirão; mas não se deve deixar enganar pela sua aparência. Yurio era forte e talentoso, com olhos ferozes e determinação inabalável, e a única coisa que o faltava agora era um pouco de experiência. Dê a ele alguns anos e ele certamente se tornará um vilão de renome.

Yurio deu um passo à frente, seus pés batendo forte no chão enquanto ele se aproximava de Katsudon, parecendo muito com um caçador indo atrás de sua presa. Katsudon não recuou desta vez, mas se curvou para trás para que pudesse escapar do alcance do garoto. Posicionando as mãos na frente do corpo, Katsudon tentou levantar algum tipo de escudo que o protegeria da ira do jovem.

Ele só percebeu seu erro quando já era tarde demais.

— Que porra é essa?! — Yurio explodiu novamente.

Yurio imediatamente focou em seu telefone — que ainda estava em sua mão, Katsudon percebeu um pouco tarde demais — e roubou o dispositivo dele com um movimento rápido, levando consigo o orgulho de Katsudon como um agente experiente e treinado. Sendo ele alguém que passou por um treinamento rigoroso e que atuou como o cão de guarda do Treinador por dois anos, era vergonhoso que ele tivesse acabado de ser derrotado por um jovem de quinze anos que tinha quase metade de seu tamanho. Ele tentou não pensar muito a respeito disso, mas aquele ferimento em sua autoestima certamente deixaria uma cicatriz; uma que ele não seria capaz de esquecer por um bom tempo.

— Você estava no celular?! — Yurio perguntou, indignado, seus olhos arregalados e sua voz elevada.

— Desculpe... eu estava... mandando uma mensagem para a minha mãe. — Katsudon tentou se defender, mas não era preciso ser um gênio para saber que não era um motivo bom o suficiente para se distrair no meio do trabalho.

Yurio o encarou como se ele tivesse um parafuso solto. O jovem balançou a cabeça lentamente, sua indignidade ainda muito clara em suas expressões.

— Você está brincando comigo? — O fato de isso ter sido dito de maneira calma não ajudou Katsudon a se sentir melhor consigo mesmo.

Ele estava prestes a se desculpar, sabendo muito bem que estava errado, quando foi interrompido por Yurio. O jovem estendeu a mão e o agarrou pela gravata, puxando Katsudon para frente e forçando-o a curvar as costas. Seus rostos estavam tão próximos que Katsudon não pôde deixar de ficar com medo de que Yurio arrancasse seu nariz com uma mordida.

— Leve isso a sério, porra! — Yurio gritou na cara dele, sua voz tão alta que o agente desejou poder tapar os ouvidos.

Katsudon deveria ter esperado que um pouco de gritaria estaria esperando por ele, considerando o tipo de pessoa que Yurio era.

— Victor está esperando por você — disse Yurio, agora com mais calma, mas ainda visivelmente enfurecido.

Os olhos de Yurio eram azuis e ferozes, profundos e perigosos como o fundo acidentado de um lago, e havia um tom de verde bem no fundo, como se uma gota de tinta tivesse caído acidentalmente dentro de seus olhos. O menino ainda segurava a sua gravata e não parecia ter a intenção de soltá-la tão cedo.

O contato visual mantido entre eles só foi quebrado quando Yurio virou o rosto.

— Ele está sempre animado pela sua vinda, não sei porque porra de motivo. É como se ele quisesse que você visse a merda que ele está fazendo e depois o impedisse — Yurio falou para o agente.

Yurio não parecia feliz com as palavras que saíram de sua boca, as suas expressões dando a impressão de ele ter acabado de provar um limão azedo. Ele parecia incomodado. Katsudon queria perguntar o que o estava incomodando, por que ele estava com aquela cara, mas ele estava ocupado demais com seus próprios pensamentos e emoções para estender a mão para o jovem à sua frente.

Katsudon sentiu algo borbulhando dentro de seu peito. Principalmente vergonha, mas junto dela havia algo mais — algo quente e terno, levemente doce, uma emoção que ele ainda não estava pronto para rotular.

— Ele é um idiota, um completo idiota! — Yurio continuou, incapaz de se conter.

Katsudon fechou os olhos e respirou fundo, de repente se sentindo um pouco estranho por causa dos sentimentos que vagavam em seu peito, os quais estavam impedindo-o de prestar atenção nas palavras que o garoto estava dizendo naquele momento. No entanto, ele logo foi arrastado de volta à Terra.

Yurio puxou sua gravata, não mostrando nenhuma restrição em sua força, e arrastou Katsudon para ainda mais perto de seu rosto. O agente se sobressaltou, pois fora pego completamente desprevenido.

— No entanto ... Mesmo que ele seja um idiota do caralho, ele ainda é meu superior e eu não vou deixar você tratar ele assim!

O queixo de Katsudon caiu, mas nenhuma palavra saiu de sua boca aberta.

— Vá até ele — Yurio ordenou quando finalmente o soltou, fazendo Katsudon cambalear antes que pudesse recuperar seu equilíbrio novamente. — E se ele voltar a andar em círculos pela sala de estar por sua causa, eu juro que vou esfolar você vivo.

Yurio empurrou o celular de volta em suas mãos e Katsudon olhou para o garoto em silenciosa admiração, sua boca ainda ligeiramente aberta.

Certamente, o que ele disse não foi adequado ou, bem... respeitoso, nem legal — crianças não deveriam falar sobre esfolar pessoas vivas tão levianamente. No entanto, Yurio tinha convicção e, mesmo que às vezes pudesse ser um tanto orgulhoso e excessivamente confiante, ele estava pronto para lutar pelas pessoas com quem se importava. Isso quase fez Katsudon querer recrutá-lo — se ele tentasse fazer isso, todavia, Yurio certamente bateria nele. Katsudon gostava de seu nariz do jeito que ele era, então ele permaneceu quieto.

Colocando o celular no bolso, Katsudon trocou olhares com o garoto e acenou com a cabeça. Ele penteou o cabelo para trás para que nenhuma mecha ficasse fora do lugar e respirou fundo, esperando até sentir que seus pulmões estavam cheios até o limite antes de deixar o ar sair. Quando se viu pronto, ele se virou e foi em direção à porta de aço, caminhando com passos firmes e as costas retas.

— Não se atreva a deixá-lo deprimido! Eu não quero lidar com as besteiras dele pelo resto da semana! — Yurio disse enquanto era deixado para trás, no corredor. Aparentemente, hoje, ele não tinha a intenção de ir atrás dele e se envolver no drama dos adultos.

O que ele havia experimentado até agora já tinha sido mais do que suficiente.

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O Treinador esperava por Katsudon com os braços cruzados, sentado em uma cadeira que ele havia pego em algum canto de seu laboratório. Ao lado dele, uma máquina zumbia, esperando ansiosamente para ser finalmente ligada e colocada para trabalhar. O vilão olhou para o relógio pendurado na parede à sua direita e suspirou, sentindo-se um pouco abatido.

Essa situação em particular não era estranha para ele, mas ele nunca pensou que seria tratado dessa forma por Katsudon, dentre todas as pessoas. Nestes dois anos em que eles têm trabalhado juntos, Katsudon se mostrou ser, repetidamente, uma pessoa de moral, guiado pelo seu senso de responsabilidade e ética, entre outras coisas que não valia a pena mencionar agora. O relacionamento deles sempre foi baseado em confiança e respeito mútuo, então ele não conseguia parar de se sentir um pouco para baixo agora.

Ele se sentia traído.

Ele nunca pensou que Katsudon o trataria assim, deixando-o esperando por tanto tempo. O tique-taque do relógio também não estava colaborando, apenas tornando o passar do tempo ainda mais perceptível, mais doloroso.

— Provavelmente aconteceu alguma coisa — ele disse a si mesmo. Mais do que tudo, ele gostaria de poder acreditar em suas próprias palavras. — Katsudon não é assim. Ele sempre vem. Sempre…

Esperar dessa maneira para que alguém viesse fez o Treinador se lembrar de quando ele havia acabado de começar sua vida no crime — aqueles dias não eram os mais brilhantes, e não era um período de sua vida que ele gostava de relembrar. Ele não queria pensar no passado, mas como ele não tinha mais nada para fazer, era difícil manter sua mente sob controle.

De jeito nenhum ele estaria de bom humor quando Katsudon chegasse... Mas tanto faz. Afinal, era culpa dele mesmo. Nada mais justo do que fazê-lo lidar com as consequências.

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Quando Katsudon finalmente alcançou o Treinador, ele encontrou o homem sentado em uma cadeira, suas expressões sombrias parecendo ainda mais nebulosas ao que as sombras pousaram sobre seu rosto. Ele estava olhando para fora, pela janela que Katsudon quebrou em sua última visita. O céu estava ainda mais escuro do que quando ele chegou à Torre de São Petersburgo mais cedo, o agente percebeu amargamente, e algumas estrelas podiam inclusive ser vistas piscando para ele de seus lugares na escuridão completa do céu noturno.

Katsudon avançou com passos leves e desconfortáveis, e parou quando achou que a distância entre eles era boa o suficiente. Ele tinha um sorriso hesitante no rosto, uma tentativa de manter o clima agradável, mas ele sabia que não estava funcionando — como poderia, quando tudo que ele conseguia pensar era em como ele havia deixado seu nêmesis esperando?

Ele olhou para baixo, sua máscara caindo aos pedaços enquanto a culpa em seu peito gritava para ser ouvida. Katsudon estava prestes a se desculpar quando o Treinador finalmente se virou em sua direção, e seu olhar por si só foi suficiente para calá-lo.

Aquele não era Victor Nikiforov, o homem sensível e gentil que ele conhecia há dois anos. Esse era o Treinador, seu nêmesis e a maior fonte de problemas da cidade. Katsudon não tinha o direito de colocar seus sentimentos à frente de suas obrigações. Ele tinha que levar isso a sério; ele tinha que levar o Treinador a sério.

Esta não é a hora para pedidos de desculpas.

Era hora de agir.

O passado se foi, escrito e acabado. Em vez de se preocupar com o que ele havia feito, ele deveria pensar sobre o que poderia fazer — o que deveria fazer — de agora em diante.

Porém, isso não significava que sua culpa havia sumido, ou que o peso em sua consciência havia diminuído de alguma forma.

Katsudon estava endireitando as costas mais uma vez quando percebeu que o Treinador estava se levantando. No próximo segundo, ele já estava colado em seu rosto, seu sobretudo rosa voando atrás dele enquanto ele corria para a frente. Ele se moveu tão rápido que sua figura se transformou em um borrão para seus olhos. Katsudon nem mesmo teve tempo de se preparar adequadamente para o que estava por vir.

Ele se preparou para o impacto da perna do Treinador contra seu braço, mas então o homem girou e, não fosse pelo brilho capturado pelas suas lentes de contato, Katsudon agora teria um corte de cima a baixo em seu abdômen. Felizmente, apenas seu terno sofreu danos.

Katsudon saltou para trás, mantendo-se longe da faca que estava sendo apontada para ele. O agente deu um passo para trás e logo o vilão estava vindo atrás dele, a distância entre eles nunca crescendo tanto quanto Katsudon desejava. Eles só pararam de se mover quando o Treinador começou a ficar sem fôlego, finalmente ficando para trás.

— Eu odeio essa sua resistência — o vilão resmungou enquanto tentava se recompor, sua respiração ainda vacilante. — Vamos, deixe-me cortar você. Só uma vez. Acho que eu mereço. 

— Talvez. Mas não, desculpe. Teremos que lidar com sua frustração de outra maneira — disse Katsudon enquanto descansava um pouco os pulmões. Ele não estava tão cansado quanto o Treinador, mas ainda assim ele tinha um limite e não deveria abusar da sorte.

Katsudon olhou para seu nêmesis, seus olhares se encontrando imediatamente, e ele engoliu em seco de nervoso quando percebeu o quão frios os olhos do Treinador estavam neste momento.

O Treinador estava realmente levando isso a sério. Katsudon tinha que trabalhar mais duro do que nunca, ou então ele não seria capaz de sair hoje ileso. Não fosse pelas lentes de contato que melhoravam os reflexos de seus olhos, ele certamente já teria perdido; ele tinha que agradecer a Phichit mais tarde, por fornecer a ele uma tecnologia tão boa.

Mas essa situação era realmente incomum, e Katsudon se perguntava se a estranheza da situação era devido à raiva que seu nêmesis estava aparentemente sentindo em relação a ele. Nesse caso, ele não poderia nem mesmo culpá-lo por lutar com tudo e não mostrar nem um pingo de misericórdia, pois a culpa era completamente do próprio Katsudon que ele estava agora tendo de lidar com uma luta tão complicada.

O Treinador geralmente não era tão violento; ele sempre foi o tipo de vilão que apostava em sua esperteza, que pensava grande e lutava com inteligência. Katsudon sabia que seu arqui-inimigo sempre carregava uma faca com ele, mas nos dois anos em que trabalhou com ele, esta foi a primeira vez que o Treinador realmente apontou a lâmina para ele com a intenção de realmente feri-lo.

Essa situação era louca demais para o seu gosto, e nada boa para o seu coração. O batimento cardíaco de Katsudon estava em um frenesi, e suor escorria por suas costas de uma forma que certamente estava ensopando a sua camisa branca. Ele cerrou as mãos em punhos, não querendo que seu nêmesis as visse tremendo, e sentiu as unhas cravando na pele de sua palma.

O Treinador veio para cima dele mais uma vez, antes que ele pudesse se acalmar.

Seus olhos se arregalaram e uma massa de ar se prendeu em sua garganta, recusando-se a sair de sua boca ou voltar para seus pulmões. Sentindo-se muito abalado, Katsudon só poderia tentar fugir, mas sua angústia apenas o fez tropeçar nos próprios pés quando deu um passo desajeitado para trás.

Ele prendeu a respiração ao ver o mundo girar em seu eixo. Ele sabia que o chão estava se aproximando rapidamente, mesmo sem olhar por cima do ombro. Movido pelos seus instintos, Katsudon fechou os olhos, preparando-se para a colisão que era inevitável; agora, tudo o que ele podia fazer era torcer para não bater a cabeça no chão frio e duro de concreto.

Mas então sua queda foi repentinamente interrompida.

O Treinador o agarrou pela gravata, e a única razão pela qual Katsudon não sufocou foi porque ela foi feita especialmente para não pressionar sua garganta em casos como esse; mais uma vez, ele tinha que agradecer a Phichit.

Pendurado no ar enquanto era segurado pela gravata, Katsudon abriu os braços e estendeu a mão em direção ao seu nêmesis, querendo desesperadamente se agarrar em algo. Ele tinha acabado de alcançar seu sobretudo rosa quando o Treinador decidiu encurtar a distância entre eles e soprar em seu rosto. O arrepio que percorreu o corpo do agente desta vez foi forte o suficiente para fazer seu corpo inteiro estremecer.

Sem um pingo de piedade ou misericórdia, o Treinador cortou sua gravata azul com um rápido movimento de sua faca. Katsudon caiu para trás ao que perdeu sua única fonte de apoio. Sua bunda bateu no chão, dolorosamente, e quando ele perdeu o equilíbrio, todo o seu corpo caiu para trás e ele se viu deitado no chão frio. Ele não tinha mais forças, nem para se mover, nem para falar; tudo o que era capaz de fazer era olhar para o teto, que agora parecia mais distante do que nunca.

Quando o Treinador se ajoelhou ao seu lado, Katsudon sentiu seu corpo ficar mais e mais gelado enquanto lágrimas surgiam e se acumulavam no canto de seus olhos.

Ele tremia, e seu nêmesis se aproximava cada vez mais.

As batidas de seu coração eram altas, rápidas e responsáveis pela sensação desconfortável em seu peito.

O Treinador tinha chegado tão perto que Katsudon podia se ver no reflexo dos lindos e brilhantes olhos azuis de seu nêmesis.

— Acho que isso foi o suficiente para a minha vingança — ele sussurrou, seus lábios quase roçando a orelha de Katsudon.

Houve outro arrepio, mas desta vez foi diferente.

O Treinador se levantou e olhou para o resultado de seu trabalho, admirando a vista como se estivesse observando um quadro famoso. Suas expressões haviam se suavizado e retornado àquelas que Katsudon estava acostumado a ver, para seu grande alívio; o agente não sabia por quanto tempo mais seu coração teria sido capaz de continuar batendo de forma tão acelerada — provavelmente não muito.

Deuses, ele se sentia cansado... Seu corpo inteiro doía. Ele se sentia quente e confuso. Ele queria tomar o banho mais longo de sua vida, apenas para relaxar em uma banheira e esquecer tudo o que aconteceu hoje.

— Não posso exagerar. Afinal, não posso te perder — disse o Treinador, ainda olhando para ele, suas mãos casualmente apoiadas no quadril.

Katsudon foi incapaz de conter o rubor que tomou seu rosto, ligeiramente surpreso com a capacidade de Victor de dizer coisas tão embaraçosas sem mostrar uma gota de vergonha. Ele realmente era alguém fora deste mundo... Talvez um alienígena.

— Você acha que eu preciso de uma corda para amarrar você? Você consegue mover as pernas? — o Treinador perguntou, indiferente.

Katsudon teve vontade de rir, mas se contentou em bufar e balançar a cabeça.

— Não consigo mover um dedo — admitiu ele, com sinceridade, o gosto amargo da derrota uma presença nem um pouco ignorável dentro de sua boca. Mesmo se pudesse, no entanto, ele não iria; ele tinha perdido, isso estava mais que claro, e ele não tinha o direito de resistir depois de cair de bunda no chão.

— Você tinha que me foder tanto assim? — Katsudon perguntou, cansado.

— Desculpe, mas não vou me desculpar por isso.

Não era como se Katsudon esperava que ele o fizesse, de qualquer maneira. Novamente, ele mereceu passar por tudo aquilo, embora teria sido bom se ele não tivesse sido humilhado tal como ele foi. No entanto, ele sabia muito bem que poderia ter sido muito pior.

— E minha gravata! Por que você sempre destrói ela?! — Katsudon perguntou, o volume de sua voz elevando-se quando seus olhos pousaram no pedaço de pano azul ainda preso no punho de seu arqui-inimigo.

— Posso me desculpar por isso menos ainda... Ela é tão feia!

O Treinador franziu as sobrancelhas, parecendo enojado como se a própria existência daquela gravata o ofendesse. Às vezes, entender o que se passava dentro da cabeça de seu nêmesis se provava ser uma tarefa bastante difícil.

Katsudon riu brevemente. Os músculos de seu corpo haviam apenas começado a relaxar, mas seu peito já parecia bem mais leve. Ele olhou para cima, na direção de Victor, e um sorriso surgiu em seus lábios antes que ele pudesse se conter.

— Então — ele começou, atraindo a atenção de Victor —, qual é o grande plano do mal para hoje?

O Treinador sorriu largamente, suas feições imediatamente iluminando-se.

Quando Katsudon percebeu, ele já havia sido levantado do chão. Ser carregado nos braços era constrangedor, mas não estava nem perto de ser a coisa mais vergonhosa que aconteceu com ele naquele dia, então o agente não fez nada além de corar um pouco enquanto eles se dirigiam em direção à máquina. Ele não tinha o direito de reclamar.

O Treinador o carregou facilmente, seus passos suaves e sem pressa como se não houvesse um homem adulto de altura e peso consideráveis ​​em seus braços, e então ele ajudou Katsudon a se sentar na cadeira que ele mesmo ocupava antes, bem ao lado da barulhenta máquina. Katsudon olhou para o Treinador enquanto ele girava alguns interruptores, lâmpadas e botões acendendo gradualmente, conforme ele interagia com o painel.

Por fim, o vilão se virou de volta em sua direção, e tossiu apenas pelo drama do gesto.

— Eis minha mais nova invenção! — ele exclamou, enquanto apontava para a máquina com ambas as mãos.

Katsudon permitiu que seus olhos percorressem a máquina, olhando-a de cima a baixo com uma curiosidade repleta de preocupação. Era um pouco grande — mas não a maior que ele já vira — e metálica, como as coisas geralmente eram. Estava apitando e piscando e havia uma grande alavanca vermelha bem no meio, entre os pequenos botões e interruptores. Havia também uma antena, cujo propósito ainda era desconhecido.

Não tendo ideia do que aquela máquina estranha poderia fazer, Katsudon não teve escolha a não ser esperar um esclarecimento por parte do Treinador. Felizmente, a explicação logo foi dada a ele.

— Com isso, um pensamento é uma ação! Nada mais vai deter as pessoas!

Katsudon fez uma careta, pesando o significado das palavras de seu nêmesis dentro de sua mente. Ele tinha um mau pressentimento de tudo isso...

— Você tem certeza de que é... — uma boa ideia, ele quis dizer. Porém, antes que as palavras pudessem sair de sua boca, o Treinador já havia puxado a grande alavanca localizada no meio da máquina.

Ela brilhou e zumbiu ainda mais alto do que antes.

— Que comece a operação COLD FEET!

Um feixe de luz branco explodiu da antena, espalhando-se e indo embora em uma onda que continuaria a se expandir e crescer tanto quanto pudesse alcançar. O Treinador sorria enquanto assistia sua invenção funcionar, e estava claramente se sentindo orgulhoso de si mesmo.

Katsudon piscou uma, duas vezes, e então suspirou. Ele já podia sentir que problemas começariam a surgir muito em breve.

O Treinador caminhou em direção à sala de controle localizada no canto de seu laboratório, onde vários monitores mostravam o que estava sendo capturado pelas câmeras de vigilância espalhadas pela cidade. Katsudon levantou-se e o seguiu, já se sentindo muito melhor e com o controle das pernas recuperado — talvez a máquina tivesse alguma coisa a ver com isso, quem sabe.

Enquanto ele se posicionava ao lado do Treinador, Katsudon olhou dos monitores para o homem à sua direita, o qual tinha agora uma expressão estupefata no rosto. Ele parecia surpreso e confuso, sua boca aberta em um espanto silencioso.

Tal como o agente previra, surgiram problemas por todo lugar, mas o centro da cidade era um caso especial e mais complicado — este havia se afundado em caos, talvez devido à proximidade com o epicentro da onda de luz e perturbação. As pessoas gritavam umas com as outras, os carros buzinavam impacientemente. Haviam mais brigas do que se podia acompanhar. Duas crianças corriam pela rua, a mãe gritando ainda mais alto para elas voltarem para o seu lado. Alguém jogou uma casquinha de sorvete na cabeça de um casal.

Katsudon não sabia o que o Treinador havia esperado que acontecesse, mas aparentemente seu nêmesis havia sido um pouco inocente em seus planos desta vez. O vilão mal podia acreditar no que via e tudo o que podia fazer era assistir, sem palavras, as filmagens ao vivo apresentadas pelas câmeras da cidade.

— O que exatamente você achou que ia acontecer? — Katsudon perguntou depois de um tempo, nem mesmo pensando em segurar a língua; ou talvez ele simplesmente não fosse capaz disso. Talvez eles também tivessem sido afetados pela máquina.

— Eu... Eu não pensei que as pessoas pudessem ser tão ruins! Quer dizer... Eu pensei que talvez uma ou duas brigas pudessem acontecer, mas isso? — Ele gesticulou para os monitores, as expressões em seu rosto ainda tão perplexas quanto no início. — Já se passaram, tipo, cinco minutos!

— Sinto muito, mas nem todo mundo é como você: uma pessoa doce com um coração feito de ouro — disse Katsudon e ele imediatamente praguejou baixinho, escandalizado pelas palavras que haviam saído de sua própria boca sem o seu consentimento, antes que pudesse colocar um freio sobre elas.

Aparentemente, sua suposição anterior estava realmente certa, e eles também foram afetados pelo poder da máquina.

Ele não tinha um bom pressentimento...

— Você acha que eu sou um doce? — o Treinador perguntou, apontando para si mesmo e sorrindo descaradamente.

Sim... Cale a boca, nem uma palavra! — Katsudon olhou ferozmente para o vilão ao seu lado quando percebeu que o homem estava prestes a abrir a boca, certamente pretendendo levar o assunto adiante.

Katsudon estava começando a perceber que honestidade demais podia ser um problema... Um grande problema.

Katsudon se virou antes que ele mesmo acabasse dizendo alguma verdade que não deveria sair da privacidade de seus pensamentos, apavorado por todas as maneiras que ele podia tornar a situação ainda pior. Seu rosto estava queimando de vergonha, e seu nêmesis parecia encantado com isso, mas felizmente ele não trouxe o assunto de volta.

Em silêncio, eles olharam para os monitores por mais um tempo, observando em silêncio o caos que estava se desenrolando e crescendo por toda a cidade.

— Por favor, me diz que você pode fazer algo a respeito — disse Katsudon, finalmente.

— Sim, é claro — ele respondeu com naturalidade, e depois acrescentou: — Mas eu sou um vilão, eu deveria fazer coisas ruins de vez em quando ... Certo?

— Não pergunte pra mim! — Katsudon se sentia frustrado e cansado, e podia sentir o início de uma dor de cabeça pressionando contra a sua nuca. — Além disso, você não era mais um vilão tipo “Eu faço o que eu quero”? Não era isso que você queria, então qual é o ponto?

Então, o agente foi atingido por um pensamento, uma pergunta que latejou em sua mente e que escapou por sua boca tão rapidamente quanto um raio — felizmente, ele pretendia expressar essa pergunta de qualquer maneira.

— Espera. O que você sequer pretendia alcançar com tudo isso? — Katsudon perguntou, confuso.

Ao lado dele, o Treinador sobressaltou, surpreso, de repente parecendo muito desconfortável e também um pouco tímido. Ele fechou os lábios com força, tentando ficar quieto. No entanto, como ele também foi atingido pelo raio da máquina, ele não teve escolha a não ser dar voz à verdade.

— Queria convidar alguém para um encontro — admitiu o vilão, por fim, parecendo aflito como se cada palavra fosse um golpe direto em seu estômago, e em seu orgulho.

Katsudon se virou lentamente e olhou para seu nêmesis como se ele tivesse crescido uma segunda cabeça, duvidando de seus ouvidos embora cada palavra tivesse sido dita com clareza, não deixando espaço para mal-entendidos ou dúvidas.

Que diacho foi isso que ele disse?

— Você não pode estar falando sério.

O Treinador olhou para baixo, seus ombros tremendo levemente, um sinal claro de que ele ainda estava tentando resistir aos efeitos de sua própria máquina. Mas essa era uma luta perdida. Sem os freios em sua língua, ele continuou escavando o chão abaixo de seus pés, enfiando-se em um buraco cada vez mais profundo.

— Eu nunca consigo! Essa pessoa é simplesmente perfeita e eu sou apenas mais um cara na vida dela! — Ele gritou, escondendo o rosto atrás das mãos enquanto as palavras saíam de sua boca uma após a outra, rápidas e trêmulas.

O agente assistia à cena em silêncio, com as sobrancelhas arqueadas e a boca aberta.

— Ok, isso é ridículo — foi a resposta imediata de Katsudon.

De repente, o agente estava se sentindo muito acordado. Ele esfregou o rosto, de cima a baixo, e suspirou profundamente. Ele não conseguia acreditar que essa era a causa de todo esse problema — isso, de todas as coisas.

Victor, o Treinador, tanto faz... Seu nêmesis o encarou com os olhos bem abertos, parecendo magoado e perplexo com sua falta de delicadeza. Katsudon suspirou, percebendo que não tinha escolha a não ser adicionar algum significado às suas palavras, ou Victor simplesmente as interpretaria como grosseria.

— Victor, você é, tipo, o homem mais bonito desta cidade — Katsudon explicou, pacientemente, mesmo enquanto ele dizia o óbvio.

O agente sentiu suas bochechas esquentarem, mas ele não teve tempo de lamentar seu constrangimento agora. Ele continuou, permitindo-se seguir o fluxo, pela primeira vez sentindo-se grato ao efeito da última invenção do Treinador.

— Você tem um corpo bacana, cabelos bonitos e macios, olhos lindos, uma personalidade amorosa, um coração gentil… — Ele começou a listar, contando nos dedos. — E você tem um cachorro e uma linda casa!

Katsudon queria segurar o homem pelos ombros e sacudi-lo até que ele percebesse a realidade que estava bem diante de seu rosto — e assim o fez, ou pelo menos por alguns segundos. Estar sob a influência da máquina aparentemente tinha seus méritos.

— Você não precisa de uma máquina, você precisa da porra de um espelho! — Katsudon disse, finalmente.

— Geez, eu sei que sou um bom partido... Embora seus elogios sejam realmente comoventes, muito obrigado — disse o Treinador, dando de ombros e balançando a cabeça distraidamente.

Katsudon franziu as sobrancelhas, sentindo que seu nêmesis o estava desafiando de alguma forma, convidando-o a socar seu lindo rosto. Ele cerrou as mãos e respirou fundo. Felizmente, Victor começou a falar novamente antes que Katsudon decidisse resolver a questão com suas próprias mãos — ou punhos, neste caso.

— Mas… Essa pessoa… Ela é muito mais que tudo isso! Ela é, tipo, a joia mais preciosa no cofre de um colecionador! Nenhuma flor jamais poderia competir com sua beleza, nem mesmo a rosa mais brilhante e delicada!

— Você está apaixonado? — Katsudon realmente não sabia por que ele perguntou isso; a pergunta saiu de sua boca assim que o pensamento lhe ocorreu. No entanto, se pudesse, ele voltaria atrás.

— Sim, claro que sim! Como eu poderia não estar, quando essa pessoa sorri para mim tão de forma tão doce?!

O agente olhou para baixo, para longe dele. Sentiu uma dor no peito, um aperto de considerável desconforto, mas ele decidiu que era melhor ignorar por enquanto. Ele suspirou e procurou os olhos de Victor uma vez mais, encontrando-os tão azuis quanto o céu naquela manhã. Eram realmente bonitos.

— Você é tão romântico… — ele disse, por fim.

— Eu sei — disse o Treinador, exasperado, escondendo o rosto atrás das mãos mais uma vez.

— Eu não estava te elogiando — murmurou Katsudon, seus olhos castanhos o julgando.

— Eu sei!

Katsudon suspirou e olhou para seu nêmesis por um instante, o qual parecia mais com Victor do que com o Treinador a cada minuto que passava, ao que sua máscara começava a escorregar por causa do feixe da máquina. Os ombros de Victor tremiam e suas orelhas estavam vermelhas; era a primeira vez que Katsudon o via envergonhado devido à suas próprias palavras.

Não era uma visão tão ruim...

— Fofo — Katsudon sussurrou, suavemente, e imediatamente desviou o olhar quando seu rosto começou a ficar mais quente a cada segundo.

Ele não conseguia acreditar em si mesmo. Seu coração estava acelerado, batendo tão forte que ele podia sentir as palpitações através da pele, e ele estava com medo de como as coisas estavam indo. Felizmente, desta vez, Victor estava ocupado demais com sua própria autopiedade para prestar atenção nas palavras suaves que ele havia proferido, logo, ele não absorveu o que Katsudon havia acabado de falar. No entanto, quanto mais ele poderia aguentar? Por quanto mais tempo ele seria capaz de evitar de se machucar por causa de palavras ditas descuidadamente?

— Ei, Treinador, você pode, por favor, fazer algo sobre essa bagunça? As coisas estão piorando no Starbucks; talvez eles erraram o nome de alguém ou algo assim — Katsudon perguntou e apontou para um dos monitores, que mostrava pessoas reunidas ao longo de um balcão. Por dentro, ele agradeceu aos céus por lhe dar uma desculpa para trazer de volta este assunto.

Percebendo que seu plano havia falhado completamente e que não havia mais nada a fazer, Victor suspirou e voltou para o lado da máquina, reconhecendo sua derrota. Katsudon foi atrás dele, acompanhando o caminhar cansado ​​do vilão enquanto se mantinha mais ou menos dois passos atrás. Olhando para as costas curvadas e desanimadas de Victor, Katsudon sentiu seus pensamentos se enchendo de assuntos com os quais ele preferia não ter de se preocupar neste momento; ele os empurrou para o fundo de sua mente, decidindo lidar com eles mais tarde — ou nunca.

De volta ao lugar onde todo esse problema começou, o Treinador girou os interruptores e puxou a alavanca mais uma vez, suas mãos viajando pelo painel com uma familiaridade esperada do criador da máquina. Outro feixe explodiu e Katsudon foi imediatamente capaz de sentir que havia funcionado.

— Bem, de jeito nenhum eu poderia convidá-lo para sair naquela situação — Victor disse, abatido, enquanto coçava a nuca em evidente embaraço. Ainda assim, ele se forçou a sorrir.

Katsudon caminhou em direção a ele e deu um tapa em seu ombro, de leve. Os olhos deles se encontraram, castanhos e azuis.

— Você consegue. Seja você mesmo. Estarei torcendo por você — disse Katsudon, o mais suave e gentilmente que pôde. — E se não der certo, ainda estarei aqui. Vou até te emprestar meu ombro, se você precisar. 

Katsudon sorriu e uma faísca percorreu os olhos azuis do Treinador.

— Obrigado — disse Victor, visivelmente emocionado, sorrindo de maneira tão doce que o aperto no peito de Katsudon, é claro, só poderia ficar mais forte.

Ainda assim, ele manteve aquele sorriso firme em seus lábios.

— É para isso que servem os arqui-inimigos, certo? — disse Katsudon, e ele estava grato que os efeitos do feixe haviam desaparecido.

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Sábado. Uma habitual hora de almoço em um certo restaurante no centro expandido da cidade.

Uma multidão animada tomava conta das ruas, passos sem pressa, mas ainda assim barulhentos, reverberando no concreto da calçada; embora não tão altos quanto o volume das vozes.

Era o meio de outro fim de semana, os quais nunca eram longos o suficiente, e um mesmo pensamento — um mesmo anseio — governava todas as mentes igualmente; as pessoas mal podiam esperar para sair de casa e desfrutar da companhia de suas famílias, do conforto do sol quente e do ruído de fundo do assobio dos pássaros, enquanto aproveitavam as preciosas horas dos seus dias de folga para comer uma comida deliciosa em um dos muitos restaurantes que se apresentam na cidade.

Em meio a essa multidão sem pressa e animada, servindo os clientes que entravam pela porta de estômago vazio, havia um homem — de aparência comum, vestido em um avental verde e jeans, e com cabelo escuro como uma noite sem lua, os fios macios contra sua testa e parando logo acima da armação grossa de seus óculos. Devido às suas roupas e feições simples, ele se assemelhava aos vários filhos que davam uma mão aos pais nos negócios da família — que era exatamente o que ele era.

Parado no meio do salão, o homem olhou para frente e então permitiu que seus olhos castanhos vagassem pelo cenário bem iluminado. Diante dele havia uma família conversando alto enquanto passava o sal pela mesa. Um pouco mais à frente, do outro lado do cômodo, havia uma mesa vazia, que — assim como as outras — estava coberta por uma toalha branca, de prontidão, apenas esperando para ser preenchida com clientes.

O homem caminhou em direção a dita mesa e colocou alguns pratos sobre a toalha branca, fazendo seu trabalho com atenção inabalável, mal piscando.

O restaurante em si não era especial de forma alguma. Ele era consideravelmente popular e aconchegante, com pratos deliciosos cobrindo todo o texto do cardápio, e quase todas as mesas ficavam lotadas nos finais de semana. No entanto, esses não eram os motivos pelos quais o restaurante tinha uma clientela consideravelmente grande e fiel.

O restaurante Yu-topia tinha uma reputação, pois ali era possível comer como um rei e pagar um preço razoável.

— Yuuri — uma mulher chamou, e o homem se voltou para a voz que ele sabia pertencer a sua mãe. Ela sorriu docemente e disse — Seu amigo está aqui.

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O dia estava agitado, como era de costume nos fins de semana, com mais e mais pessoas entrando a cada instante. No entanto, Yuuri navegava por suas tarefas com uma rapidez em seus passos que só poderia ser esperada de alguém que já fazia esse tipo de coisa há bastante tempo, alguém que estava familiarizado com o que deveria ser feito e como o trabalho poderia ser realizado mais rapidamente. Ele não odiava ajudar no restaurante Yu-topia, mas ainda assim ficou grato quando sua mãe lhe deu uma pequena pausa para ele ir cumprimentar seu amigo.

Assim que Yuuri se viu livre de suas obrigações — mesmo que apenas por um breve instante —, ele caminhou em direção à mesa posicionada perto da janela. A luz do sol caía suavemente sobre o rosto de seu amigo, dando calor às suas expressões já calorosas. Em vez das ruas movimentadas e da bela paisagem do lado de fora, o homem escolheu assistir cada passo de Yuuri, observando atentamente sua aproximação com um sorriso curvando seus lábios e a cabeça apoiada em uma das mãos.

Phichit acenou casualmente enquanto Yuuri se sentava à sua frente, e então tomou um gole de seu café quente.

— Desculpe pela demora. O dia está agitado hoje — Yuuri disse enquanto relaxava em seu assento, sentindo pela primeira vez como suas pernas estavam cansadas agora que ele era capaz de dar a elas algum descanso. — Como vão as coisas do seu lado? Algum equipamento novo pra mim? — ele perguntou, o peito repleto de expectativa.

Phichit sorriu e endireitou as costas, esse tópico sendo um que ele evidentemente estava feliz em cair de cabeça.

— Tenho trabalhado em um guarda-chuva. Mas adivinhe, também é um escudo resistente! E vou tentar adicionar uma arma na ponta... Ou pelo menos é o que eu queria fazer. No entanto, terá que ser algo menos letal por causa dos protocolos. — Ele suspirou e balançou a cabeça, lentamente, e era claro que ele estava desapontado com as restrições que era obrigado a seguir.

— Mas ainda há muito a se fazer — Phichit acrescentou, por fim.

— Uma invenção não muito original de sua parte — Yuuri disse com uma expressão impassível.

— Eu sou pago para criar equipamentos úteis para os agentes, não para eu ser criativo — explicou ele, indiferente, e encolheu os ombros sem se importar. Yuuri riu brevemente, apenas por um segundo, sua risada tão rápida que poderia ter sido confundida com uma tosse bem humorada.

Por um momento, eles conversaram sobre tudo e absolutamente nada. De suas frustrações no trabalho a uma simples fofoca, não havia nenhum tópico que não pudesse ser compartilhado entre esses dois bons amigos.

Yuuri e Phichit tinham alguns poucos anos de diferença na idade, mas pouco o bastante para que seus problemas e inseguranças fossem praticamente os mesmos. Eles ingressaram ao SOAP praticamente ao mesmo tempo, embora tenham sido escolhidos para diferentes departamentos. Yuuri — ou Katsudon, o pseudônimo que escolhera para si — era um agente de campo que trabalhava diretamente com um vilão designado a ele, enquanto Phichit trabalhava nos bastidores, no Setor de Desenvolvimento e Manutenção.

— Ouvi dizer que eles estão pensando em atribuir Emil Nekola aos irmãos Crispino — Phichit anunciou enquanto pousava sua xícara, compartilhando uma informação que ouvira outro dia no escritório. A bebida já havia esfriado, mas ele não parecia se importar, não com tantas coisas boas para fofocar e manter a boca ocupada.

Yuuri não teve problemas em ligar o nome a um rosto, especialmente porque Emil era alguém que deixou uma forte impressão quando se conheceram. O jovem era alto, loiro e bem-disposto, sempre tentando se mostrar útil. Eles se encontraram duas vezes, talvez três, desde que Celestino o apresentou ao novo recruta, na maioria das vezes cruzando caminhos dentro do escritório.

— Eu lembro dele. Ele foi descoberto pelo Celestino nem seis meses atrás, né? Não é muito cedo? Ele sequer terminou o período de treinamento? — Yuuri perguntou, um pouco preocupado.

Quando as memórias de seus próprios dias como um novato fluíram para seus pensamentos, ele foi forçosamente lembrado do treinamento árduo pelo qual teve que passar. Ele estremeceu. Não sentia nem um pouco falta das aulas práticas de combate.

— Eu não tenho ideia, mas provavelmente não. Ele é muito jovem e mal completou dezoito anos. Mas os Crispinos não fazem parte de um bando perigoso. Eles são mais, tipo... encrenqueiros. Ouvi dizer que eles estão pensando em designá-lo para eles porque são uma combinação feita no céu, ou algo assim.

— Não ouço essa expressão desde que me designaram para o Treinador — Yuuri admitiu, e ele estaria mentindo se dissesse que não estava surpreso.

Ele até agora não tem ideia do que isso significa, mas ele tem que concordar que ele e o Treinador eram de fato um bom par. Suas personalidades realmente não conflitavam entre si e, embora fossem arqui-inimigos, tinham um relacionamento baseado na confiança e no respeito mútuo. Além disso, nos dois anos desde que começaram a trabalhar juntos, nenhum dos dois jamais se machucou gravemente durante as lutas — embora, neste caso, Yuuri tivesse certeza de que era porque o Treinador se segurava na maior parte do tempo; era o quão gentil Victor era, como pessoa, como vilão e como inimigo.

Se Emil se encontrasse na mesma situação, talvez não houvesse realmente porque se preocupar; e Celestino com certeza sabia o que estava fazendo.

— Falando sobre o Victor… — Phichit murmurou, chutando-o levemente por baixo da mesa e acenando com a cabeça em direção à porta.

Discretamente, Yuuri se virou.

Não foi difícil encontrar seu nêmesis, o qual havia se sentado em uma mesa do lado de fora, na área externa — Victor não era alguém que você conseguia facilmente perder de vista no meio de uma multidão, mesmo se quisesse. Embora ele não estivesse vestido com roupas tão chamativas quanto as que usava quando estava incorporando o seu eu-vilão, o Treinador, ele ainda era estiloso e atraente o suficiente para atrair muita atenção. Vestido em um suéter listrado e jeans pretos justos, ele parecia muito com uma modelo no meio de uma sessão de fotos. Makkachin se encontrava ao lado de sua cadeira, observando tudo ao seu redor com curiosidade.

Todos os sábados, Victor almoçava em Yu-topia. Desde que ele se deparou com o restaurante, dois anos atrás, ele criou esse hábito e nenhuma semana se passou em que ele quebrasse essa pequena rotina.

A princípio, Yuuri pensou que o homem havia vindo atrás dele, já que ele apareceu na porta deles no mesmo dia em que Katsudon foi designado para trabalhar com o Treinador. No entanto, isso acabou se mostrando ser apenas um mal-entendido da parte dele. Surpreendentemente, tudo tinha sido apenas uma grande coincidência.

Yuuri se virou novamente em direção ao seu amigo, que estava sorrindo de forma travessa e balançando as sobrancelhas. Ele pode sentir seu rosto esquentar.

— Nem começa — ele repreendeu Phichit e desviou o olhar, na esperança de que isso esconderia o rubor que obviamente se apresentava em seu rosto. — Eu já disse que não é o que você está pensando. Ele gosta da comida, só isso — Yuuri insistiu, sem saber quem ele estava tentando convencer mais com aquelas palavras.

— Yuuri, por favor — ele revirou os olhos. — Ele obviamente vem aqui por sua causa — disse Phichit, sem pensar duas vezes.

— Victor é meu nêmesis! — Yuuri se inclinou sobre a mesa, não querendo que a conversa fosse escutada por outrem.

— O Treinador é o seu nêmesis — disse Phichit, como se isso fizesse alguma diferença.

Yuuri não teve que falar em voz alta sobre como o argumento de Phichit era falho — afinal, nada daquilo significava que eles eram pessoas diferentes — porque seus pensamentos estavam devidamente expostos em seu rosto, facilitando para que Phichit entendesse as emoções complicadas que brilhavam nos olhos de seu amigo.

— Então mude ele através do poder do amor! — Phichit sugeriu, jogando as mãos ao alto.

— Phichit! — Yuuri resmungou, querendo se esconder em um buraco bem fundo e nunca mais sair.

Phichit permitiu que ele tivesse seu pequeno colapso, observando Yuuri se afundar mais e mais em sua cadeira, fechando-se em uma bolha de autopiedade e contradição. A situação era bastante óbvia.

— Ok, mas sério — Phichit falou, seu tom de voz agora muito mais sóbrio, fazendo Yuuri erguer os olhos. — Victor não é tão ruim assim. Metade das coisas que ele faz nem mesmo faz sentido. — Phichit deu de ombros, apenas para adicionar peso às suas palavras.

— Isso não é verdade! — Yuuri o interrompeu, endireitando sua postura e olhando Phichit olho no olho. — Victor; não, o Treinador sabe o que está fazendo — na maioria das vezes, ele não disse — e as motivações para suas malfeitorias podem não ser as usuais, mas ainda assim são válidas!

Phichit apenas acenou com a cabeça e olhou para o lado, tentando expressar sua compreensão e arrependimento pelas palavras que havia dito através de suas expressões reflexivas, mas escondendo um sorriso satisfeito por trás da mão que ele estava usando para manter a cabeça erguida até agora.

Confie em Yuuri para sempre vir em defesa do Victor.

Ao permitirem que o silêncio assentasse sobre eles, os dois se viram olhando para Victor, que por sua vez observava impacientemente os seus arredores, como que procurando algo — ou alguém. Quando seus olhos se encontraram, Victor sorriu e acenou com a cabeça educadamente. Yuuri acenou de volta e Phichit acenou preguiçosamente. Os dois amigos tentaram retomar a conversa anterior, mas como Victor continuava a olhar de relance na direção deles de tempos em tempos, Pichit estava tendo dificuldades em manter-se focado no assunto de Emil Nekola.

Phichit se virou e riu um pouco quando Victor foi mais uma vez pego encarando, sendo imediatamente repreendido por Yuuri, que estava ficando mais e mais tímido a cada segundo.

"Phichit não pode estar certo, pode?" Yuuri questionou, perguntando a si mesmo e a mais ninguém; ele ainda não estava pronto para expressar essa preocupação em voz alta e não tinha certeza se um dia estaria.

Não, claro que não. Não havia nenhuma chance de ele ser especial, ou do Victor estar de alguma forma interessado nele. Afinal, o próprio Victor disse que havia alguém por quem ele estava apaixonado — a pessoa com que ele queria ir em um encontro, que era mais bonita do que uma flor e mais preciosa do que uma joia. Não faria sentido Yuuri ser por quem Victor estava interessado. Mesmo que Victor tenha ficado envergonhado depois de dizer todas aquelas coisas no outro dia, enquanto ainda estava sob os efeitos do raio da máquina, não era tanto quanto seria esperado caso tivesse sido uma confissão real para a pessoa em questão.

Victor não estava apaixonado por ele. Não importava qual teoria ou explicação maluca Phichit apresentasse, simplesmente não havia jeito de isso ser verdade. Não fazia sentido.

Phichit observou seu amigo com uma sobrancelha erguida e lábios franzidos, tentando ler o silêncio de Yuuri e sendo capaz de compreendê-lo de alguma forma. Ele suspirou e balançou a cabeça, lentamente.

Já que Victor não conseguia parar de olhar na direção deles, Phichit decidiu que era melhor ele se retirar, mesmo que um pouco mais cedo do que ele havia pretendido. Yuuri tentou pará-lo, implorando para que ele ficasse um pouco mais.

— Mas você não tem que voltar ao trabalho? — Pichit perguntou e Yuuri não teve coragem de dizer que essa era a razão exata pela qual ele não queria que ele fosse embora.

Ele não estava pronto para voltar ao trabalho, pois havia uma grande chance de que ele teria que interagir com Victor se o fizesse. Ele não tinha certeza se estava com a cabeça no lugar certo para encará-lo neste momento.

Phichit se afastou sob o olhar atento de seu amigo, que o viu partir com uma expressão de dor. Phichit desejou-lhe boa sorte ao chegar à porta e acenou antes de deixar Yuuri sem escolha a não ser voltar ao trabalho.

Sem mais desculpas às quais poderia recorrer, Yuuri se viu sem nenhuma rota de fuga no caminho à sua frente. E como se o mundo conspirasse contra ele, sua mãe disse para ele ir lá fora e anotar o pedido de Victor assim que ele terminasse de vestir o avental.

— Eu realmente preciso? — Yuuri perguntou, timidamente. Seu coração estava batendo rápido, fazendo-o se sentir um pouco desconfortável.

Mesmo que ele soubesse com certeza que Phichit estava falando bobagens, ele ainda era incapaz de afastar aquelas palavras de sua mente.

Sua mãe, Hiroko, cruzou os braços e franziu os lábios em evidente insatisfação.

— Não seja preconceituoso, Yuuri! Victor pode ser um pouco peculiar e causar problemas, mas um cliente ainda é um cliente! Ele ser um vilão não muda nada quando ele vem aqui comer! 

— Eu sei. Não é por causa disso — Yuuri explicou, pensando que era estranho que sua mãe pensasse que, de todas as coisas, logo isso poderia ser o motivo. Ele tem servido o VIctor por muito tempo para que esse seja o problema. Dois anos inteiros e contando.

— Então o que é?

Essa era uma pergunta complicada por vários motivos.

Em primeiro lugar, porque dizer que ele não podia ir até lá porque estava se sentindo tímido perto dele era muito constrangedor.

Em segundo lugar, porque as únicas pessoas que sabiam sobre a realidade de seu relacionamento com o Victor eram do SOAP, já que ele ser um agente secreto significava que... bem... era um segredo. No entanto, o Treinador era uma figura pública e Victor não era muito bom em se disfarçar — isto é, se ele estava sequer se preocupando com isso. Então, para o mundo, Yuuri era apenas um garoto normal que trabalhava no pequeno restaurante de seus pais, enquanto Victor era um vilão e a fonte da maioria dos problemas que aconteciam na cidade. Não havia nenhuma maneira de alguém chegar a conclusão de que, talvez, houvesse algum tipo de conexão entre eles, que eles eram arqui-inimigos e se agarravam ao pescoço um do outro quase toda semana.

Vendo que não tinha como explicar o turbilhão de pensamentos e sentimentos que estavam martelando em sua cabeça enquanto mantinha sua identidade e o relacionamento deles em segredo, ele simplesmente se virou e foi buscar o pedido de Victor. Porque isso era mais fácil e ele não precisava de outra fonte de dores de cabeça.

Conforme Yuuri se aproximava, Victor se endireitou na cadeira. Ele tentou não pensar muito a respeito disso.

— Oi — Victor disse quando Yuuri chegou ao seu lado e começou a acariciar sua cadela, algo que fazia parte da rotina deles tanto quanto as visitas semanais de Victor ao restaurante.

O pêlo de Makka já era geralmente macio, mas hoje parecia ainda mais do que o normal, e Yuuri ficou feliz com a oportunidade de acariciá-lo. Isso ajudou a acalmar sua mente, e também o seu coração indomado, o que era um bom bônus. Além disso, tornou a situação mais fácil para Yuuri, e quando ele finalmente dirigiu sua atenção para Victor, ele o fez com confiança de que não estragaria tudo imediatamente.

— Olá, Victor. Chegou tarde hoje. — Yuuri o cumprimentou, certificando-se de manter sua voz firme.

— Sim, eu estava arrumando algumas coisas em casa. Minha última máquina não funcionou muito bem, então eu estava tentando ver se poderia aproveitá-la de alguma forma, fazer algumas modificações. 

Yuuri estava realmente grato pelo rumo que aquela conversa tinha ido, em direção a um assunto com o qual ele estava familiarizado e no qual ele confiava em ser capaz de responder sem se atrapalhar todo. Ele já podia sentir seus ombros relaxarem.

— Entendo. Espero que funcione da próxima vez, embora eu tenha certeza de que alguém irá impedi-lo de qualquer forma — disse ele, levemente provocativo.

— Você pode deixar isso com o Katsudon — Victor sorriu de volta.

Yuuri riu um pouco, suas preocupações anteriores a essa altura já arremessadas no lixo, completamente descartadas e esquecidas, deixadas de lado.

Ele realmente gostava dessa dinâmica no relacionamento deles. Nêmesis no trabalho, mas amigáveis em suas vidas pessoais. Mesmo com Katsudon impedindo os planos malignos do Treinador, nem uma vez Victor usou isso contra Yuuri. Todas as semanas, ele vinha almoçar em Yu-topia e eles conversavam, mesmo que apenas brevemente. Não chegava ao ponto de eles serem próximos, mas ele sempre achou que a possibilidade estava aberta a eles. Tudo o que precisavam fazer era se permitir dar um passo à frente, um em direção ao outro.

— Então, o que vai querer? — Yuuri perguntou, casualmente, puxando um bloco de notas do bolso de seu avental verde.

Assim que Yuuri disse isso, a expressão de Victor mudou completamente. Ele desviou o olhar, timidamente, de uma forma que não combinava com ele. Yuuri imediatamente sentiu que algo estava errado.

— Na verdade… — Victor tentou olhar para ele, mas falhou.

Yuuri tinha um mau pressentimento sobre isso.

Victor ficou em silêncio por mais tempo do que Yuuri gostaria, os segundos ressoando em sua cabeça mesmo na ausência de um relógio. Makkachin se esfregou na perna de Victor, como se o encorajando a continuar, tentando dar-lhe coragem. Finalmente, ele suspirou.

Quando Victor olhou para Yuuri novamente, ele estava sorrindo como sempre — entretanto, para Yuuri, aquele sorriso parecia um tanto errado em seu rosto.

— Eu vou querer o filé. Número 4. Sem cebolas. E uma limonada, por favor. 

Yuuri anotou o seu pedido e olhou para Victor mais uma vez. Ele queria relaxar, dizer a si mesmo que não havia razão para estar tão nervoso, mas se viu incapaz disso. Aquele sorriso ainda estava no rosto de Victor, e ele estava o deixando preocupado. Antes de ir à cozinha para passar a comanda aos cozinheiros, sentou-se à sua frente sem nem mesmo pedir permissão antes.

Ele sabia que se arrependeria, mas perguntou de qualquer maneira: 

— Está tudo bem?

Victor olhou para ele com surpresa, sua boca permanecendo aberta por um momento antes dele se lembrar de fechá-la. Ele corou visivelmente e, como se tivesse sido atingido por algo, buscou as mãos de Yuuri em cima da mesa, segurando-as com ternura.

Yuuri prendeu a respiração.

— Yuuri! — Victor chamou seu nome, desespero presente em sua voz. Yuuri se assustou, pego de surpresa. A voz de Victor estava alta e agora todos estavam olhando para eles.

Deixado sem palavras, Yuuri não sabia o que fazer. Tudo o que ele sabia era que as mãos de Victor eram grandes e quentes, e que estavam segurando as dele sem intenção de soltá-las.

Ele tinha um pressentimento muito, muito ruim sobre isso...

— Eu sei que sou apenas mais um de seus clientes, mas para mim você é como o Sol! Eu sei exatamente como Ícaro se sentiu, pois eu também não teria nenhum problema em me queimar com o seu calor se isso significasse me aproximar de você! 

Essas foram certamente as palavras mais embaraçosas que Yuuri já ouviu na vida e ele se esforçou para se convencer de que o rubor em seu rosto era apenas por causa da vergonha alheia que ele estava sentindo — o que não era o caso, claro. Ele estava apenas mentindo para si mesmo em meio ao estado caótico de sua confusão.

Yuuri ainda estava tentando assimilar tudo o que havia sido dito quando sentiu as mãos de Victor tremerem ao redor das dele. Antes que Yuuri pudesse entender a situação e o significado por trás daquelas palavras, Victor já havia começado a falar novamente.

— Você poderia, por favor, ir em um encontro comigo?

Os lábios de Yuuri ficaram subitamente secos e sua mente vazia. Ele disse sim, sem sequer pensar no que estava fazendo, ou mesmo ouvindo as palavras que saíam de sua própria boca.

As pessoas aplaudiram. Seus pais ficaram surpresos, mas não tanto. Makkachin pulou ao redor de suas pernas.

— Finalmente! — gritou sua irmã do caixa.

.

—--

.

Mais tarde naquela noite, Yuuri ligou para Phichit assim que saiu do banho. O dia havia sido longo, muito longo, e ele estava cansado e não havia nada que ele quisesse mais do que deitar na cama e descansar o rosto no travesseiro, sem ser incomodado até o dia seguinte. No entanto, ele não podia adiar essa ligação.

Nesse momento, ele realmente precisava muito de alguém para desabafar, um amigo para ajudar a colocar seus pensamentos em ordem — não havia como ele fazer isso sozinho.

— Phichit? — Yuuri disse quando uma voz sonolenta atendeu do outro lado da chamada. Ainda era um pouco cedo, mas Phichit gostava de passar a maior parte dos seus  dias de folga compensando o sono que ele perdia durante a semana.

Ele se sentia mal por acordá-lo, mas era uma emergência.

Ele tinha que dizer a Phichit que, de alguma forma, ele estava certo esse tempo todo. Victor estava realmente apaixonado por ele. No entanto, a questão dos sentimentos de Victor não era a única coisa que ele precisava contar a ele, tampouco o mais importante. Na verdade, havia um assunto ainda mais urgente a ser discutido.

— Eu tenho um problema. Um encontro... — Yuuri balançou a cabeça, repentinamente sem palavras.

Por que isso tinha que ser tão difícil?

Ainda tendo problemas com os pensamentos que, naquele momento, não se encontravam nem um pouco ordenados, um atropelando o outro dentro do caótico estado de espírito presente no interior de Yuuri, ele decidiu que era melhor simplesmente forçar as palavras para fora de seu peito e esperar que elas fizesse algum sentido; pelo menos isso parecia mais fácil do que tentar descobrir como levar a conversa ao ponto de que ele precisava.

— Escuta... Acho que o Victor não percebeu que Katsudon e eu somos a mesma pessoa. O que eu faço?

Yuuri esperou, um grito entalado no fundo de sua garganta, desconfortável e angustiante. Ele esperou, ansioso, batucando os dedos contra a perna. Do outro lado da ligação, silêncio.

Phichit não riu como normalmente faria.

— ...O que? — seu amigo sonolento perguntou depois de um tempo, de repente parecendo muito acordado.

 


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Notas finais do capítulo

Oi, gente. Há quanto tempo. :) Fazia muuuito tempo que eu não postava nada, mas cá estou eu, com uma longfic de verdade dessa vez.

Primeiramente, eu queria dizer que o Nyah me ferrou e não deixou eu colocar o nome do capítulo que eu queria, então eu coloquei no próprio corpo do texto. Eu tive muito trabalho pensando nesses títulos, então nem ferrando vou descartar tudo por causa de algo assim. Aproveitando a deixa do título, eu queria dizer que o título está em ingês porque eu escrevi essa fanfic inicialmente em inglês (inclusive, ela está finalizada então podem ficar tranquilos que essa história já está com o final garantido!), e algumas coisas se perderiam se eu traduzisse então eu decidi manter em inglês.

Agora, quanto aos capítulos, serão 10 no total e estou planejando atualizá-los no primeiro domingo do mês. Sei que parece muito tempo, mas com a minha rotina no trabalho é meio complicado eu prometer algo diferente disso, principalmente porque tem capítulos com umas 50 páginas mais pra frente na história lol

Enfim, acho que é isso que eu tinha de importante a dizer. Quem puder deixar um comentário, eu ficaria muito grata. Se preferir ler em inglês, vou estar postando no Ao3, mas será atualizada na mesma data que em português. (btw dia 4 agora é meu aniversário, e eu não teria nada contra receber reviews de presente cof cof)

Well, that's all. Vejo vocês mês que vem.



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