Ça Ira escrita por Tahii


Capítulo 1
Juste comme ça


Notas iniciais do capítulo

Saluuuuuuuut! ♥

Cá estou mais uma vez com uma história curtinha para o Delacour's Month. Foi uma delícia escrever sobre o Louis e eu agradeço imensamente o projeto por inspirar essa nova aventura hihihi ♥

♫ https://www.youtube.com/watch?v=TxWLybPwBzs&ab_channel=JoyceJonathanVEVO



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Le temps fera l’affaire et toi et moi… 

Oh, ça ira! 

Seria uma noite difícil de dormir. Não apenas porque seu coração batia feito um tambor, não! Os efeitos colaterais de Lysander não se resumiam apenas numa taquicardia qualquer ou num episódio de insônia, até mesmo porque ele aparecia em seus sonhos como uma maldita resposta a tudo aquilo que havia causado. E não pedia desculpas nem nada, apenas… Apenas deixava as coisas ainda piores. Louis não podia esperar outra coisa, afinal, era muito característico de Lysander não ter o mínimo jeito com absolutamente nada. Ele era desajeitado, avoado em níveis estratosféricos e, pior, era insuportavelmente habilidoso em desregular o sistema cardíaco de Louis. 

— Ei — foi Lorcan, seu colega de dormitório, quem o tirou dos devaneios. — Já está dormindo? 

— Não — perverso, Louis pensou consigo mesmo, ainda mais quando viu o sorriso estampado no rosto dele. Não era como se o rapaz não soubesse da “quedinha” de Louis pelo seu irmão gêmeo, ou não imaginasse que estava agitado remoendo todas aquelas coisas mais uma vez. — Estou pensando no jogo de amanhã. 

— No jogo? 

— É. 

— Está preocupado?

— Um pouco — Louis continuou olhando para o teto, tentando não morder tanto os lábios. Estava, de fato, preocupado, pelo simples motivo que fazia um tempo que não conseguia pensar direito quando estava no mesmo metro quadrado que Lysander. — Eu estava ouvindo a conversa dos meus primos outro dia e acho que eles estão bem fortes esse ano. 

— Não mais do que a Sonserina com aquela capitã dos infernos — ralhou, ajeitando-se debaixo das cobertas. A derrota para a Sonserina e, mais precisamente, para a ex-namorada do Scamander, rendeu muita reclamação na Torre da Corvinal, e treinos mais intensos também. — De qualquer modo, estou sentindo que vamos ganhar. 

— Roxanne diria que isso é sinal de mau agouro.

— Você acha?

Eu não estou sentindo como se eu fosse ganhar.

— Ah, veja pelo lado positivo, LouLou — o Weasley revirou os olhos, odiava o apelido. — Se você não ganhar o jogo, talvez ganhe outra coisa. Eu chamaria isso de sorte. 

— Do que está falando?

— Digamos que… Alguém vai estar vendo o jogo.

— Várias pessoas estarão — tentou soar indiferente, causando uma risada abafada no amigo.

— De fato.

Louis não disse mais nada. Cogitar a hipótese de Lysander realmente assistir ao jogo fazia sua respiração falhar e o deixava trezentas vezes mais ansioso. Só que não era uma possibilidade tão realista, visto que o Scamander não era dos mais chegados no esporte, ou na maioria das coisas que pessoas mais padronizadas gostavam; era mais ligado em estrelas, planetas, satélites e, pelo o que sua constante falta de atenção denunciava, universos (provavelmente paralelos). 

A última vez que pôde trocar algumas palavras com o garoto foi na aula de Herbologia, quando derrubou propositalmente um vaso cheio de terra fedorenta no chão, bem ao lado dele; Neville Longbottom ficou indignado com tamanho descuido, é claro, e nada seguiu como o planejado clichê que atormentava sua mente nas noites em que planejava como poderia, bem discretamente, se aproximar um pouco mais dele.

Vaso reparo! — Lysander conjurou, acabando com a pequena desordem, rápido o suficiente para interromper o descontentamento do professor, que logo retomou às correções. 

Lysander deu o vaso nas mãos de Louis, mas, infelizmente, ele não pôde sentir nada além do odor da terra, o qual fizera Lorcan ter uma crise de tosse seca. Ficou frustrado o resto da aula por não ter tido tempo para se abaixar, pegar o vaso e, sem querer, tocar nas suas mãos. Por que, Merlin, magia tinha que existir? Louis nunca sentiu, tão fortemente, vontade de ser um trouxa como naquele dia.

— Não fique chateado por perder cinco pontos, LouLou — Lorcan zombou, ao seu lado, fingindo prestar atenção na professora. — Quem sabe você não conquista mais quinze na próxima aula? 

O próximo período teria Trato das Criaturas Mágicas e Louis sempre faturava alguns pontos porque era bem participativo, mais do que qualquer outro do sexto ano. A única parte trágica da história era que dividiam o período com a Sonserina, o que rendia longos minutos de reclamações por parte de Lorcan.

Era terrível e ao mesmo tempo ótimo conviver com o seu possível cunhado. Terrível porque eles tinham os mesmos olhos azuis cintilantes, que lhe causavam arrepios quando se via perdido em devaneios durante algumas falas demoradas de Lorcan; ótimo porque percebia que aquela coisa que começava a brotar no seu coraçãozinho de manteiga tinha a ver com a essência de Lysander, visto não ser possível substituir por ninguém, nem mesmo seu próprio gêmeo

Houve um tempo que Louis pensara que não conseguiria gostar de ninguém além da sua ex-namorada — Ivy Higgs —, e posteriormente foi ainda mais estranho entender que poderia gostar de garotas e garotos. Primeiro pensou que poderia ser, simplesmente, uma atração pelo excesso de testosterona que Michael Turner — seu primeiro crush menino — emanava; chegou a beijar algumas outras meninas depois de ter ficado com ele num armário de vassouras. Aquele dia havia sido… Louco, mas lhe rendeu a chave necessária para abrir o seu ser para a possibilidade de gostar de outras pessoas. Sua ex não tinha dado certo, Turner definitivamente não daria certo, mas alguém, em algum momento, iria aparecer em sua vida. 

E não tardou para, de repente, se ver interessado em Lysander.

— Ei, Lou — ele levou um susto quando ouviu a voz de Lucy no silêncio da biblioteca. Ela segurava um monte de livros. — Já está fazendo o pergaminho do Binns? 

— Sim, não posso procrastinar mais. Você já fez?

— Ah, não. Vou deixar para depois. Estou ocupada num projeto com a Sinistra, Lysander e eu, na verdade — Lucy apontou para trás. O garoto lia a capa de um dos livros. — Parece que vai ter uma chuva de meteoros e vamos testar um feitiço para analisar o…

Blá, blá, blá.

Não que Louis detestasse ouvir sua prima discorrendo sobre assuntos que gostava, afinal, nada se comparava às conversas entediantes com suas irmãs sobre Teorias do Espaço-Tempo. Contudo, a culpa não foi dele se, naquela tarde em específico, Lysander estava estonteante com a capa pendurada na bolsa de ombro, a gravata mostarda frouxa, metade do cabelo preso; e parecia estar com um brinco, ou sabe-se lá o que aquilo era. Um dente de alguma coisa? Um osso? Um…?

— Louis? — Lucy chamou sua atenção, fazendo-o piscar atordoado. De repente, um sorriso brotou nos lábios dela. — Outch! Pensei que vocês já se conheciam! — riu, puxando o garoto pelo braço. Ele também pareceu ter sido abruptamente acordado para a realidade. Era evidente que já se conheciam, o que só fez as bochechas do Delacour ferverem humilhantemente. — Lys, esse é o meu primo Louis. 

— Eu sei, ele divide o dormitório com o meu irmão — respondeu olhando nos olhos dela, indiferente. Louis pensou, consigo mesmo, se eles não estariam tendo algum lance. Seria uma pena, de fato, porque ele era bonitinho. — E temos aulas de Herbologia, História da Magia e Poções juntos. Já nos conhecemos. 

— É, já nos conhecemos — o Delacour sorriu, sem jeito, lançando um olhar furioso para a prima. — Eu estava olhando para esse negócio na orelha dele, na verdade. É um osso, Lysander, ou…? 

Lysander. Um nome bonito e fácil de dizer. 

— É uma lasca de dente de um Meteoro-Catalão. Lembranças de uma viagem dos meus pais à Catalunha, antes de eu nascer — ele fitou Louis por alguns instantes, o suficiente para remexer o almoço que ainda era digerido em seu estômago. — Eu uso como um amuleto contra energias ruins.

Louis nunca torceu tanto para ter uma energia extremamente boa, e isso acabou marcando o início de uma nova página na sua vida amorosa. 

Depois desse evento na biblioteca, a sua ex-namorada e seu ex-ficante deixaram de ocupar espaço na mente atormentada por insônia do rapaz; Lysander havia conseguido tomar posse do lugar. Na verdade, ele pareceu se alastrar mais rápido do que Louis achava ser possível. De repente, pegou-se preocupado em estar mais bonito nas aulas com a Lufa-Lufa, frequentar a biblioteca em horários específicos, e, também, perdia um tempo considerável das aulas de Poções pensando em como poderia se aproximar. Suas abordagens clichês inspiradas em filmes trouxas não tiveram 1% de sucesso. 

Ele conseguiu falar um ou dois “oi” para o Scamander nos corredores, tentou trombar nele para derrubar seus livros, tirar de Lucy informações sobre sua vida, e chegou a convencer Lorcan a sentar com a prima nas aulas apenas para tirar ela de perto. Talvez tivesse sido esse o seu maior pecado.

— Mas você é bom em Poções — Lorcan, por sua vez, era péssimo. 

— Quebra essa aí pra mim, Lorcan. A Lucy sempre é legal comigo, quero ajudar ela em alguma coisa. 

— Tudo bem, podemos ir juntos para Hogsmeade, hum? Mas eu não vou trocar a minha dupla por isso. 

— Lorcan, s’il vous plaît! Eu faço os pergaminhos do Binns para você até a gente se formar. 

Embora não fosse a melhor barganha, Louis conseguiu ficar ao lado de Lysander nas aulas do velho Slughorn. Lucy e Lorcan acabaram se dando bem, principalmente porque o Delacour usou a mesma desculpa para ambos — mas Lucy aceitou antes dele oferecer qualquer coisa, porque ela tinha uma alma essencialmente boa. Diferente de Lorcan que, depois de algumas semanas, teve um grande insight

— Por Merlin! Eu não acredito — a voz dele ecoou pelo salão comunal da corvinal. Louis deu um pulo no lugar; estava muito concentrado pensando na próxima jogada do xadrez. — Agora tudo faz sentido.

— O quê? 

— Você gosta dele! 

— Hã?

— Fala sério, você gosta dele. Do meu irmão. Você gosta do meu irmão! — a boca dele estava aberta de surpresa, os olhos cintilando tanto quanto os de Lysander na aula da Aurora Sinistra. 

Louis não pôde negar, tampouco iria. Estava precisando de alguém para confessar seus sentimentos, mesmo que essa pessoa tivesse a mesma cara do garoto que gostava. Foi um alívio poder dizer com todas as palavras:

— É, eu gosto do Lysander. 

… e poder, é claro, confabular planos para se aproximar dele. Porém, o saldo continuava estagnado mesmo depois de semanas.

Às vezes deixava-se ser pego por Lysander enquanto o olhava durante as aulas que tinham juntos, tentava se aproximar da prima quando estava com ele, até Lorcan inventava coisas para falar para o irmão só para Louis ir junto. Só que nada acontecia. Pelo contrário, tudo parecia ser um grande ciclo fadado a se repetir.

— Por que você não fala com ele? O Lys é na dele, mas… — as conversas sempre acabavam assim, em coisas que Louis deveria fazer. 

Louis precisou de um tempo para conseguir elaborar um plano de ação e ter coragem o suficiente para executá-lo. Não sabia por que sentia tanto receio, não seria a sua primeira vez flertando ou beijando alguém. Quer dizer, ele ria incrédulo ao cogitar essa remota possibilidade de ficar, de verdade, com Lysander. Até aquela quinta-feira, toda a paixão era unilateral; por sorte, o pequeno Delacour acordou disposto a mudar os rumos do seu destino. 

— Oi! — foi o terceiro “oi” da história deles, e talvez o mais importante. Teriam aula de História da Magia juntos e, bem, foi uma boa ideia cumprimentá-lo antes de entrar na sala e fazer questão de atrapalhar um pouco sua passagem pela porta.

— Oi — ele respondeu, erguendo o olhar rapidamente. Louis considerou tal reação quando estava pensando em como poderia fazer algo útil para puxar um papo com ele, por isso teve a brilhante ideia de usar uma pulseira esquisita que Roxanne lhe dera no natal do ano anterior. Ele tinha plena certeza de que Lysander olharia, pelo menos, para aquele singelo artefato de prata. — Isso é uma corrente lunar? — Louis abriu um largo sorriso, animado ao extremo. 

— Sim, estou pensando nos pingentes que vou acrescentar.

— Dizem que brotos de acácia costumam ser um bom núcleo para pingentes de prata. Espantam a cruz torta! 

— E onde que eu consigo isso? 

— Com o professor Longbottom. Posso pedir para ele, se quiser. 

— Claro que quero. 

Louis tinha que admitir como sua imaginação voou alto naqueles efêmeros instantes pré-professor Binns; passou a aula toda sonhando com o momento que se encontrariam para ele lhe entregar os brotos. Contudo, não conseguiu conter sua frustração quando, no outro dia, Lucy foi lhe importunar na biblioteca segurando um saquinho marrom.

— Lysander pediu para eu te dar esses brotos.

— Pediu, é? Meus mais sinceros agradecimentos— resmungou impaciente, guardando o saquinho dentro de sua capa.

— Por que está com essa cara? 

— Porque nada do que eu tento dá certo, Lucy! — esbravejou, irritado, deixando a pena no tinteiro. — Não sei mais o que fazer. Nem se quero fazer. 

— Mas vocês mal se falam, Lou — ela passou a mão pelos cabelos do primo antes de encostar-se na mesa de madeira. — Não pode desistir tão facilmente.

Facilmente? Eu não tenho nenhum indício positivo de que estou fazendo a coisa certa. Não vou ficar insistindo igual um idiota. 

— Mas… Mas… Você gosta dele e ele-

— Não está nem aí. Simples assim — bufou, debruçando-se sobre o pergaminho escrito pela metade. 

— Talvez ele goste de você também — disse baixinho, não causando nenhuma reação no apaixonado desiludido. — Você ouviu o que eu disse?

— Infelizmente. 

— E não vai dar importância?

Talvez não implica certeza nenhuma, Lucy. 

— Hm… Certo… E se eu disser que ele gosta de você ao ponto de me importunar dia e noite porque acha você mais lindo do que Júpiter no céu de verão? — ele ergueu o rosto imediatamente, sentindo o coração tropeçar nas próprias batidas. Não queria criar falsas expectativas, mas aquela colocação só poderia ser coisa de gente estranha como Lysander e Roxanne.  

— O quão sério está falando?

— Muito sério, só que… Era um segredo. Faça o que quiser com essa informação, só não conte que fui eu quem te falou.

Louis não tinha muito o que fazer além de ficar em choque por algumas horas e sentir um pouco de taquicardia só de pensar que alguma coisa poderia rolar. Contudo, a velocidade em que estavam não o deixava muito animado; a perspectiva parecia limitada a um date dali cinquenta anos.

Após a grande revelação de Lucy, o pequeno Delacour se viu ainda mais fantasioso em relação a sua paixão e mais empenhado em tentar achar novas formas de se aproximar dele. Embora Lorcan enchesse sua cabeça com as vantagens de uma abordagem mais direta depois de ouvir planos sem fim, Louis ainda não estava convencido. De todas as pessoas que conhecia — principalmente quando se comparava com os primos mais velhos —, Louis não se achava o mais determinado. Constantemente ficava imerso em dúvidas existenciais e possibilidades remotas que o impediam de dar certos passos quando era o momento. Ele não sabia quando era o momento e o que fazia o momento ser o momento; não se considerava um completo acomodado, mas sem dúvidas não tinha a dose de ousadia que parecia deixar sua família maluca — pelo menos não na maior parte do tempo; às vezes Louis enlouquecia, assim como eles, e fazia coisas um tanto quanto impulsivas. Só que naquela situação, não sabia o que fazer, definitivamente.

— É simples, LouLou — Lorcan deu fim ao tempo de reflexão do Delacour após longos minutos de um silêncio entediante. — Chame ele para ir para Hogsmeade. 

— Mas vai demorar para irmos. O próximo fim de semana é o jogo. 

— Para quem esperou até agora — deu ombros. — O que é duas semanas perto de dois meses? Se você aguentar, eu aguento também. 

— O que você aguenta?

— Suas lamentações. Me desculpa, mas tudo já estaria resolvido caso você, simplesmente, armasse uma emboscada. 

— Você fala como se eu quisesse matar ele. 

— Se isso acontecesse eu te acobertaria. Da mesma forma que eu te acobertaria caso você fosse dar uma volta pelo corredor da Torre de Astronomia na noite de terça-feira e ficasse esperando alguém descer as escadas já que alguém fica, no mínimo, dez minutos olhando o céu depois que a Sinistra vai dormir. Essa é a vantagem de ser o melhor aluno, segundo palavras do próprio. 

— Do que está falando?

— Ah, digamos que eu vou ficar com a monitora da grifinória na terça-feira e ela sugeriu as escadas da Torre de Astronomia depois da aula da Sinistra. Isso me lembrou o Lysander e eu perguntei que horas ele fica por lá bajulando a professora. 

— E como você me acobertaria se vai estar com a monitora da grifinória?

— Justamente por eu estar com ela, cabeção. Olha, se quiser seguir a minha dica, siga. Se não quiser, depois não reclame. Certo?

Obviamente Louis seguiria a dica do amigo. Primeiro porque Lorcan era muito bom planejando coisas, segundo porque ele não aguentaria mais duas semanas naquela situação. Encontrá-lo à noite, sozinho e despretensiosamente era o cenário perfeito para a sua abordagem mais direta. Tudo pareceu, enfim, propício. Uma pena que desandou mais rápido do que as poções de aumentar seios que Dominique usava. 

— Não, não, não! — Lorcan negava com a cabeça, veemente, depois de ter escutado Louis discorrer sobre a Torre de Astronomia vazia. — Deve estar havendo algum engano. Eu avisei o Lysander, ele não estava lá de alegre e suscetível ao acaso. 

— Mas ele não estava. É um sinal de que eu tenho que desencanar e focar no jogo do sábado. Fim. C’est la vie.  

Só que como Louis focaria no jogo se, mesmo frustrado, não conseguia diminuir a frequência que Lysander aparecia em seus pensamentos? Como focaria no jogo se ainda tinha duas aulas de Poções com ele para encarar?

Usando de todo o seu potencial de ator, Louis fez um esforço hercúleo para não insistir em nenhuma tentativa. Não olhou para ele, não estendeu os ingredientes, não deixou o livro de ingredientes cair no chão, não sorriu; contentou-se em ficar encarando Lorcan do outro lado da sala. Seu amigo tentava se comunicar com as sobrancelhas e os olhos, mas nada além de caretas esquisitas podia ser compreendido. 

— O que esse idiota está fazendo? 

Lysander sussurrou bem perto dele, causando uma séria sensação de queda gelar seu estômago. Virou o rosto rápido, sem vacilar em fitar as orbes azuis do rapaz. Embora esperasse que Lysander fosse capaz de ter acesso aos seus pensamentos apenas com aquele olhar, sabia que não seria possível, por isso voltou a prestar atenção no caldeirão sem verbalizar resposta alguma. Porém, não resistiu ao sorriso ao ver Lorcan bater a palma da mão na outra fechada em punho quando, certamente, viu o irmão com cara de desentendido. 

Conforme os dias se passavam, Louis ficava mais irritado. Continuava querendo se aproximar de Lysander e continuava com alternativas escassas — além daquelas que jogava fora, como a aula de Poções. Poderia ter aproveitado para chamá-lo para a próxima ida a Hogsmeade ou algo mais eficaz do que fingir que não sentia os braços se encostarem as vezes ou notava a proximidade com a qual ele sussurrava alguma coisa — embora as tentativas foram poucas, visto que Louis não deu nenhuma resposta concreta para ele. Nem um sorrisinho. 

— É, você é um burro — Lorcan constatou num jantar, distraído com as asinhas de frango. 

— Vou chamar ele para tomarmos cerveja amanteigada. 

— Vai mesmo?

— Sim. 

— Quando?

— Na aula de herbologia.

— Fala sério — largando os ossos no prato, o Scamander negou com a cabeça. — Não tem nenhum momento mais legal para fazer isso?

Louis não se deu ao trabalho de responder; já não era óbvio que o prazo de tomar alguma atitude estava perto do vencimento? E o que importava se era no meio de uma aula de Herbologia? Apesar de não entender nada sobre garotos, o pequeno Delacour tinha convicção que era a espécie que menos pensava. Logo, a influência do local na resposta de Lysander era praticamente nula. 

A aula seria na quinta-feira de manhã antes do almoço e, por isso, Louis ficou ensaiando em frente ao espelho — e com Lorcan — o que diria exatamente. Mesmo com o amigo dizendo que Lysander com certeza aceitaria, ele não relaxou até vestir as luvas de couro e ver o sorriso amigável do professor Longbottom na estufa três. Posicionou-se na bancada e ficou fingindo que estava distraído com as adoráveis plantas de tentáculos carnívoros. Lysander e Lucy chegaram em cima da hora, mas nada impediu que ele ficasse ao lado de Louis. Cumprimentaram-se com um “oi”. 

Uma certa decepção abateu o Delacour ao notar o tom desinteressado dele. Porém, voltou a ficar alegre ao pensar que Lucy poderia ter ficado entre eles e isso sim seria um péssimo sinal. Sem economizar no olhar — que parecia ter um certo brilho a mais quando estava mal intencionado daquela forma  — e no sorriso, encheu-se de expectativas. Só precisava que o professor Longbottom ficasse bem animado e falante para ter uma brecha. 

Ça merde — praguejou vendo que a sua oportunidade não chegaria. Já havia passado, no mínimo, meia hora e a estufa estava num completo silêncio graças à exagerada dedicação dos alunos em não machucar a planta venenosa. 

— Algum problema, Weasley? — o professor se aproximou, genuinamente preocupado. Louis deveria estar, àquela altura, com o maxilar travado e cenho franzido de mau humor. 

Apenas negou com a cabeça, embora estivesse a um passo de usar a ousadia Weasley para dizer que sim, estava tudo errado. Estava cansado de ficar patinando daquela forma! Só queria dar uns beijos, não era algo de outro mundo, afinal. 

Quando, enfim, o professor Longbottom começou a passar nas bancadas para verificar o andamento da extração da seiva fedorenta, o abismo de quietude foi substituído por um crescente burburinho e Louis viu a oportunidade perfeita para derrubar alguma coisa no chão, esperar Lysander se abaixar para pegar, abaixar-se também para falar com ele. Porém, não foi tão bem sucedido na parte de ser desastrado; como estava irritado, pensou que ele poderia não dar a mínima se um instrumento pequeno caísse no chão, por isso fez questão de derrubar o vaso e impregnar a sala com o odor — o que foi uma péssima ideia. Todos olharam na direção do barulho, Lorcan começou a tossir exageradamente ao seu lado e Lysander se limitou a pegar a varinha para arrumar a bagunça. 

Vaso reparo! — ele conjurou, acabando com a pequena desordem, rápido o suficiente para interromper o descontentamento de Neville, que logo retomou às correções. Era uma das aulas favoritas do Scamander, e ficou óbvio que ele jamais perderia um minuto sequer se distraindo. Foi um pouco burro da parte de Louis, depois ele teve que confessar. 

Lysander até deu o vaso nas mãos de Louis, mas, infelizmente, ele não pôde sentir nada além do terrível odor. Ficou frustrado o resto da aula pelo acaso não ter colaborado para o seu plano. Louis nunca sentiu, tão fortemente, vontade de ser um trouxa como naquele dia — ou, pelo menos, de ser um pouco mais inteligente. Saiu da aula cuspindo fogo, com Lorcan ao lado falando bobagens sobre como quase havia morrido, e deparou-se com a triste realidade de que havia falhado (de novo) na missão de se aproximar. Os dias seguintes não foram diferentes, exceto por alguns sonhos envolvendo queda de vassoura, perda no quadribol e Lysander beijando Michael Turner. 

Na noite que antecedia o grande jogo contra a Grifinória, Louis estava uma bagunça. Sentia vontade de encontrar Lysander e chamá-lo para irem juntos a Hogsmeade, o coração batia forte só de pensar que poderia beijá-lo nesse processo, a mente girava em torno das estratégias de Lorcan para o jogo, das preocupações quanto ao tempo (detestava jogar na chuva), do terror que seria passar mais uma semana daquela forma. 

— Ei — Lorcan o tirou dos devaneios ao sair do banho. — Já está dormindo? 

— Não — Louis suspirou, lamentando pelo sorriso estampado no rosto dele. Não era como se o rapaz não soubesse que ele estava agitado remoendo todas aquelas mesmas coisas mais uma vez. — Estou pensando no jogo de amanhã. 

— No jogo? 

— É. 

— Está preocupado?

— Um pouco — Louis continuou olhando para o teto, tentando não morder tanto os lábios. Estava, de fato, preocupado, pelo simples motivo que fazia um tempo que não conseguia pensar direito quando estava no mesmo metro quadrado que Lysander. — Eu estava ouvindo a conversa dos meus primos outro dia e acho que eles estão bem fortes esse ano. 

— Não mais do que a Sonserina com aquela capitã dos infernos — ralhou, ajeitando-se debaixo das cobertas. — De qualquer modo, estou sentindo que vamos ganhar. 

— Roxanne diria que isso é sinal de mau agouro.

— Você acha?

Eu não estou sentindo como se eu fosse ganhar.

— Ah, veja pelo lado positivo, LouLou… Se você não ganhar o jogo, talvez ganhe outra coisa. Eu chamaria isso de sorte. 

— Do que está falando?

— Digamos que… Alguém vai estar vendo o jogo.

— Várias pessoas estarão — tentou soar indiferente, causando uma risada abafada no amigo.

— De fato.

Louis não disse mais nada. Cogitar a hipótese de Lysander realmente assistir ao jogo fazia sua respiração falhar, e o deixava trezentas vezes mais ansioso. Só que não era uma possibilidade tão realista, visto que o Scamander não era dos mais chegados no esporte, ou na maioria das coisas que pessoas mais padronizadas gostavam; era mais ligado em estrelas, planetas, satélites e, pelo o que sua constante falta de atenção denunciava, universos (provavelmente paralelos). Apesar de não ser tão bom acertando em abordagens, Louis tinha quase certeza que Lysander estaria zanzando pelos corredores em passos lentos apenas para chegar atrasado ao jogo; nem sempre ia assistir Lorcan e, quando o fazia, chegava atrasado com uma cara de velório. 

Um sorrisinho empesteou a feição do Delacour ao lembrar-se de como Lysander tinha uma expressão indiferente na maior parte das situações. Sempre estava focado em sua própria vida, às vezes olhava para seu redor como se estivesse observando, procurando ou admirando alguma coisa; falava sem parar — com as pessoas que lhe eram mais próximas — sobre os assuntos que gostava, às vezes começava a dançar sozinho enquanto ia de uma sala para outra. Era quieto, contrastava com a personalidade assertiva de Lorcan, só que sem dúvidas era mil e quinhentas vezes mais bonito do que o irmão, apesar de ter assustadoramente a mesma cara, inclusive as mesmas pintas no pescoço. 

Enquanto que Lorcan era capitão do time de quadribol, tinha um cabelo loiro alinhado, gostava de roupas padrões, escutava rock e fazia um considerável sucesso com garotas, Lysander era o melhor aluno da Aurora Sinistra, o cabelo era cheio de cachos até a orelha e nada alinhado, curtia colares de pedras místicas, era vegetariano e muito quieto. Ah, e bonito também. Muito bonito. Apesar de avoado, era bem esperto para questões amorosas — segundo a língua grande do irmão — porque sempre estava enrolado com alguém. Para Louis era óbvio que Lorcan mentia; Lysander não parecia ter muita presença nesse sentido, ou se não já teria tomado alguma atitude para com o jovem apaixonado que vivia lhe dando olhares significativos.

Louis dormiu pensando no Scamander e, ao levantar-se, uma grande lâmpada iluminou a parte do seu cérebro responsável pelos planos de aproximação. Quando todos começassem a ir para o campo de quadribol, ele iria para a entrada do salão comunal da Lufa-Lufa e esperaria Lysander sair para poder falar logo o que queria. Como o tempo não estava ao seu favor — quinze minutos talvez fosse o prazo para esperá-lo — teria que deixar-se levar pela pressão de estar de frente para o garoto e convidá-lo para ir a Hogsmeade. 

Tout ira bien, tout ira bien, tout ira bien…

Ele ia repetindo a passos largos depois de ter despistado Lorcan (embora tivesse lhe pedido para cruzar os dedos) e pensando no que poderia dar errado. Quer dizer, havia grandes possibilidades dele não encontrar Lysander, de ir frustrado para o jogo, de bater um balaço na cabeça de um inocente e… Sentir-se um completo idiota. Porém, justamente por sentir-se, naquele instante, um completo idiota ele parou no meio do corredor. Passou as mãos pelo rosto, respirou fundo e girou os calcanhares para ir logo para o campo. Poderia resolver essa questão depois, com um bilhete ou algo do tipo. Óbvio! Por que ele não pensou num bilhete antes? Simples, fácil, rápido, indolor

Ele já estava indo em sentido contrário quando uma voz reverberou e fez seus pés fincarem no chão. 

— LOUIS! 

Virando-se apenas para ter certeza de quem era, deparou-se com Lysander correndo até onde ele estava. Sem saber o que fazer — e sem ter muitos recursos orgânicos para qualquer coisa além de respirar e piscar —, ficou parado onde estava. 

— Já está indo para o jogo? — ele perguntou ao ficar bem em sua frente. Abaixou-se, com as mãos nos joelhos, para tentar respirar direito. Louis achou uma gracinha a falta de resistência física. 

— Hã, sim. Você também?

— Não. 

— Não? — não era uma surpresa, mas Louis pensou que ele poderia ter lhe gritado para irem andando juntos ou sei lá. Apesar de tentar encontrar algo para dizer, fracassou; deveria perguntar o porquê? 

— Não nesse exato instante. Eu estava querendo falar com você. 

— Comigo?

— É, eu... — empertigando-se, deu um passo para ficar, de fato, bem próximo de Louis, o qual engoliu em seco ao sentir o perfume cítrico começar a desregular seu sistema cardíaco. Entretanto, ele não vacilou em fitar os olhos azulados de Lysander para que sua situação ficasse ainda mais complicada.

Quer dizer, embora a falência dos seus sentidos racionais fosse iminente, as coisas pareceram curiosamente fáceis naquele momento, o qual Louis reconheceu como sendo o certo; e o que fazia ele ser o certo era porque ele queria que fosse. Simples assim. 

Pensando que a próxima oportunidade poderia demorar muito para chegar, Louis pendeu um pouco o rosto para beijá-lo. Sentiu o gosto de hortelã, o perfume cítrico, o toque quente das mãos dele e, definitivamente, pôde acreditar nas palavras de Lorcan sobre a vida amorosa agitada do irmão. Ele certamente sabia beijar muito, muito bem. Deram alguns passos para trás e Louis logo sentiu a parede contra suas costas. Com as mãos nos ombros de Lysander, ele logo subiu para a nuca até alcançar os cachinhos loiros, os quais enrolou nos dedos enquanto os corpos ficavam inevitavelmente mais próximos. Era um bom aquecimento para o jogo, sem dúvidas. Precisando de um pouco de ar, puxou o lábio inferior de Lysander e aproveitou para abrir os olhos e verificar se aquilo estava mesmo acontecendo; sorriu ao vê-lo corresponder o olhar com a mão escorada na parede, bem ao seu lado. Retomaram o beijo e Louis arfou ao sentir um pouco mais de urgência e vontade de entrar no primeiro armário de vassouras que visse pela frente. 

Porém, sabia que se fizesse isso escutaria horas de sermão no senhor capitão do time. Isso o fez lembrar que seu tempo estava acabando; praguejou os xingamentos mais baixos em sua mente quando quebrou o beijo. Encostou a cabeça na parede com pesar, fechou os olhos e, infelizmente, disse:

Preciso ir. 

Lysander assentiu, dando mais um selinho nos lábios inchados. 

— Ainda tenho algo para falar com você. 

— Ah, não era isso? — assistindo Lysander se afastar com as bochechas coradas, Louis sentiu o próprio rosto ferver. Ele riu, tentando ajeitar os cabelos loiros cacheados.

Isso era o objetivo. Queria saber se queria tomar uma cerveja amanteigada comigo no próximo fim de semana.

Louis vibrou com a possibilidade. Se antes já queria ir com ele, depois do beijo queria muito

Deixar Lysander para ir jogar quadribol foi um tanto quanto difícil. Só que nem a cara amarrada de Lorcan ao vê-lo chegar em cima da hora — quando todos já estavam posicionados — tirou o sorriso de seu rosto. 

— Tenho duas coisas para te falar — o Scamander ralhou ao seu lado. — A primeira é que pouco provavelmente ele vai assistir ao jogo e pouco provavelmente você vai ganhar o que eu pensei que você iria ganhar. A segunda coisa é mil e quinhentas vezes mais importante: não se esqueça de marcar a Lily como se a sua vida dependesse disso, entendeu? Nós precisamos ganhar esse jogo. Por que ainda está sorrindo feito um idiota? 

Ça ira, mon chère! Ça ira…

 

Fin

 


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Notas finais do capítulo

*Ça Ira - vai dar certo!

Aiaiai *suspiros apaixonados*, me sinto representada pelo Louis do começo ao fim. Acho que eu sou exatamente como ele quando arrumo um crush hahahahaha espero que tenham gostado!!

Um grande beijo pra vocês ♥



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