Where We Belong escrita por Mad


Capítulo 7
Eu serei contigo, até os confins da Terra.


Notas iniciais do capítulo

Advinha só quem tá voltando como se nada tivesse acontecido? Eu mesmo, seu autor enrolado favorito! Oi gente xP
A explicação curta é: a facul me pegou de jeito. E eu dei um jeito de escrever de forma bem lenta, mas dei! Aqui está o capítulo 7.
Agora a caminho do Corte, Elisabet e Aloy também estão a caminho de conversas difíceis, sem meios para evitar. É aqui que esses caminhos irão se encontrar. A questão é: onde vão dar?
Vamos descobrir! Bom capítulo a todos ♥



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Aloy estava distraída.

 

Agora no comando da viagem, trocando de lugar com Elisabet pouco antes do sol alcançar a posição mais alta acima de suas cabeças, concentrava-se apenas no caminho adiante. Caminho este que, no atual momento, atraia ainda mais a atenção da Doutora Sobeck.

 

Ao seu redor, testemunhava o impressionante fenômeno da ausência humana em um ambiente que antes representava o dia a dia de sua civilização. A natureza era uma força imparável, mesmo após ser ressuscitada pelo Zero Dawn. Entretanto, os prédios da cidade pela qual ambas passavam se erguiam a boas dezenas de metros do chão, desafiando a erosão extrema que tornava suas superfícies marrons e desgastadas. As placas não discerníveis, os postes retorcidos, as ruelas elevadas ao longo dos morros, a vegetação invadindo os antigos estabelecimentos: Elisabet não conseguia tirar os olhos de cada novo detalhe que encontrava, tentando identificar a cidade exata.

 

"Então deixa eu ver se eu entendi… Estamos num lugar que vocês chamavam de Estados Unidos da América, e que era dividido em 50 tribos diferentes?"

 

"Na verdade não eram bem tribos… Éramos meio que uma tribo gigante vivendo em 50 cercadinhos diferentes… Eu nasci em um chamado Texas."

 

"E em qual deles estamos?"

 

"Bem.. Se a montanha dos Nora é ILITIA-9… Estamos em algum lugar do Colorado."

 

Tendo aprendido a lição com a montaria anterior, Aloy manteve o ritmo de viagem lento por um tempo, justamente quando atravessavam a cidade em ruínas.

 

"Conhece esse lugar aqui?"

 

Aloy perguntou como produto de sua curiosidade, e Elisabet  não pôde deixar de olhar os arredores com um pouco mais de urgência, olhando para os lados procurando qualquer pista.

 

"Olha… eu acho que sim? Mas não tenho certeza…"

 

A imagem se montou em sua mente, porém, apesar do estado irreconhecível da cidade. A imagem extremamente vaga de um local alterado além dos limites humanos, mas que em sua cabeça tomava vida assim como havia acontecido em sua antiga casa e na montanha dos Nora. A fachada de um prédio parcialmente caído era ocupada por uma abertura, e seu formato denunciou seu antigo propósito: um restaurante pequeno e humilde. Sua visita a cidade era agora um filme, sendo transmitido em suas lembranças.

 

"...estamos em Denver."

 

Aloy notou que Elisabet interrompia a si mesma, além do tom de voz distraído. Era interessante vê-la relembrando sua era já passada. 

 

"Denver? Nome estranho…"

 

"Hm, e como você chama?"

 

"Pesar do Diabo."

 

"Tá de brincadeira..."

 

~.~

 

As duas viajantes já tomavam grande distância de Pesar do Diabo, a antiga Denver, e o cenário ao redor voltava a ser apenas natural, com o Galope em velocidade mais alta, quando Elisabet decidiu abrir uma conversa deveras importante com a garota a sua frente.

 

"...Aloy, tem um minuto? Tem algo que eu gostaria de conversar."

 

"Só tem nós duas aqui, tenho vários minutos para você." Aloy disse entre risadas, já confortável com a presença da Doutora Sobeck. "O que é?"

 

"Lá nos Nora… Eu descobri sobre os exilados… e sobre você."

 

As risadas cessaram. E o ritmo do galope também, mais uma vez.

 

"Você resolveu muitos problemas que de certa forma eu causei… além de tudo o que sofreu como exilada, então eu meio que me sinto responsável. Foi tudo tão injusto e…"

 

"Pode parar por aí…" o movimento da máquina foi interrompido, e todas as palavras que antes estavam na ponta da língua de Elisabet foram arrancadas de dentro de suas entranhas, violentamente. Aloy suspirou antes de continuar.

 

"Você não precisa sentir nenhuma culpa… o que houve comigo, e com o mundo todo, foi culpa de uma pessoa só. Ted Faro. É simples assim…"

 

Contrastando com o desabafo honesto e fervoroso da mais jovem, não havia nada para a mais velha falar. E mesmo se houvesse, ela não seria capaz.

 

"Eu entendo você se sentir responsável… E é incrível poder ter você aqui me ajudando. Mas injustiça?" Ela fez uma pausa. "A única pessoa capaz de trazer justiça já está morta a muito tempo… Ninguém pode me dar o que me tiraram. Então não me fale de injustiça."

 

Elisabet realizava muitas buscas dentro de si, ao ouvir Aloy. Buscava formas de respondê-la, buscava formas de se desculpar, até mesmo formas de confortá-la ao perceber a voz penosa com a qual a caçadora fazia sua queixa. 

 

Buscas mal-sucedidas.

 

"Aloy… olha eu.. desculpa, não sabia que…"

 

"Só… Vamos continuar ok? Estamos perto."

 

A doutora apenas engoliu todas as suas questões e buscas, e as enterrou nas profundezas de seu íntimo.

 

"Certo."

 

O silêncio mais uma vez tomava conta da travessia, agora iluminada pela luz amarelada do meio da tarde. A nevasca do dia anterior enterrara o mundo numa espessa camada de neve, mas a visão permanecia não obstruída. Dessa forma, Elisabet mais uma vez conseguia observar os detalhes de um Titã Horus abraçando violentamente uma montanha, revivendo mais memórias do terrível passado. Não teve mais tempo para pensar, porém, quando Aloy interrompeu o movimento do Galope.

 

"A partir daqui vamos a pé. Está pronta."

 

"Sim, vamos adiante."

 

Deixando a máquina para trás, e carregando o restante dos suprimentos em uma bolsa menor, ambas tomaram um caminho tortuoso, estreito e com elevação elevada para finalmente atravessar a cadeia de montanhas que levava até o Corte. Elisabet, mesmo com dificuldades, não se via no direito de expressar qualquer reclamação, e em sua cabeça tentava focar apenas no objetivo. Aloy por sua vez não conseguia tirar da cabeça os pensamentos despertados pela discussão anterior.

 

Mas com certeza conseguia esconder tal fato.

 

"Injustiça…" 

 

Após algumas escaladas desafiadoras, o terreno finalmente nivelado, apenas árvores retorcidas e cobertas de neve as cercavam, além, é claro, do frio incessante. 

 

"Eu acho que conheço esse lugar também…"

 

"Mas é só uma floresta."

 

"Sim, mas esse ar quente vindo me faz ter algumas ideias…"

 

"Quente?"

 

Aloy não cometeria o mesmo erro novamente. O ar gélido do Corte não era interrompido, salvo por uma única situação. Situação essa que a fez empunhar o arco, preparada para um disparo.

 

"Para trás… tem algo vindo."

 

Elisabet não deu passo algum para trás, determinada a manter uma postura auto suficiente ao puxar as costas a lança presenteada por Sona apenas algumas horas antes.

 

Não esperava atacar, apenas apoiar aquela que a protegia desde o início, e que havia protegido muito mais.

 

De fato, o ar quente finalmente chegava ao tato de Aloy, que por sua vez separou mais as pernas e segurou com mais suavidade o arco, mirando logo a sua frente. E por fim, sua espera levou ao momento derradeiro, onde uma figura canina feita de metal ferozmente abria espaço em meio às árvores, avistando as duas presas de sua posição privilegiada acima de um morro.

 

Aloy não moveu um músculo, prestando atenção somente em seu alvo: Não a máquina, mas sim sua arma.

 

Utilizando os segundos preciosos nos quais a máquina analisava a situação, a jovem confirmou sua mira e atingiu em cheio o lançador de minas em sua parte posterior, desabilitando sua vantagem em armamento. 

 

Era agora uma luta relativamente mais justa. A programação do ser robótico teria Aloy como prioridade em um embate de curto alcance.

 

Elisabet tentava não se impressionar, não perder o foco. A máquina estava vindo.

 

Pulando entre as duas, as presas afiadas encontraram apenas o ar. Para a direita, Aloy se reposicionou, focando os disparos posteriores nas patas. Para a esquerda, Elisabet jogou-se ao chão, buscando o máximo de espaço possível. Sentiu a neve amortecer sua queda e sem perder tempo, se levantou. 

 

O ambiente com certeza dava mais vantagem para a máquina, que cobria as pequenas distâncias sem nenhum esforço, forçando Aloy a desviar com mais atenção. Estavam cercadas por paredes geográficas e tinham sua mobilidade dificultada pelo chão irregular sob seus pés. 

 

Recuar não era uma opção descartável, havia muito em jogo. Os olhos da caçadora buscavam uma saída, ou mesmo uma breve oportunidade. Ao mesmo tempo, a doutora via com clareza a máquina desferindo ataques mortais. Era uma boa oportunidade. 

 

Em sintonia, ouviram um zunido peculiar, e então mais dois. Clarões azuis atingiam a máquina, vindos de cima das paredes de pedra.  

 

Aloy instintivamente priorizou sua sobrevivência, se afastando o máximo que podia frente à chance de ouro. Ao mesmo tempo, a curiosidade das duas moças tomou conta, e ao olharem para cima viram três figuras, empunhando grandes armas. 

 

A jovem Nora reconhecia não só as armas, mas as vestimentas.

 

Do alto, ainda mais acima que as figuras, toras de madeira revestidas parcialmente em metal caíram, atingindo em cheio o cão ainda imobilizado pelas rajadas elétricas. Preso em meio aos troncos, teve sua vantagem roubada em instantes.

 

Instantes esses aproveitados por uma quarta figura, maior que seus companheiros. Empunhando uma lança de diferente arquitetura, ele saltou de sua posição elevada e cravou sua arma no crânio metálico, utilizando toda a força de seu peso e sua queda no ataque. 

 

A vitória vinha do céu, na cor azul dos Banuk. 

 

"Só poderíamos nos reencontrar dessa forma, Aloy."

 

"Eu gostaria de poder escolher… Mas é bom te ver Aratak, mais do que nunca."

 

Aratak sorriu com o comentário, e fez um sinal com a mão para que seu grupo descesse dos pontos de vantagem. Os outros membros usavam máscaras, que assim como suas roupas estavam manchados de neve, evidenciando uma travessia longa. 

 

"Mais amigos seus?"

 

Elisabet perguntou, enquanto tentava recuperar o fôlego. 

 

"Por incrível que pareça, sim." Aloy disse enquanto batia em suas roupas para tirar a neve em excesso. "Elisabet, esse é o Aratak, chefe do Werak que me ajudou enquanto estive no Corte." 

 

"Elisabet Sobeck. É um prazer." Era um alívio poder se apresentar normalmente. 

 

"Você é parecida com a Aloy, até mesmo sua voz."

 

Aloy sabia que poderia tratar do assunto tranquilamente, desde que fosse vaga e não despertasse o interesse de Aratak.

 

"Nós duas precisamos falar com CYAN. Por isso viemos."

 

Aratak olhou para o seu grupo, e em seguida para as duas que adentravam seu território. Enfim, disse: 

 

"Então é o momento de pagar a minha dívida. Iremos com você."

 

Aloy adoraria ter forças para recusar, mas sabia que a ajuda seria muito bem vinda, pensando principalmente em Elisabet. 

 

"Obrigada, é muita gentileza sua."

 

Assim, os quatro membros do Werak comandavam a caminhada em direção às instalações do Firebreak. A inesperada calmaria deu oportunidade às palavras, oportunidade esta que Aratak utilizou primeiro:

 

"Estávamos perseguindo alguns exilados que roubaram comida do Werak ontem, mas o Incinerante nos tirou do rastro."

 

"Exilados? Mesmo com pouca gente no Werak?"

 

"Foram exilados há 6 luas… mas voltaram para roubar. A luz azul nunca tocou seus corações."

 

Elisabet prestava atenção na conversa, pensando na natureza do exílio dentro os Banuk. Era algo que estava em sua mente agora que sabia sobre o passado de Aloy.

 

A caminhada prosseguiu, adentrando o fim da tarde. Escutavam máquinas ao longo do caminho, mas se mantinham fora de problemas ao utilizar a neve para amortecer os passos. O silêncio mais uma vez foi cortado, dessa vez por Elisabet. 

 

"Eu estava certa… Estamos no Wyoming,  parque nacional de Yellowstone. Tem um vulcão gigante debaixo dos nossos pés. Por isso não estranhei o ar quente…"

 

Aloy arregalou os olhos, interessada, e confusa com mais um nome esquisito.

 

"Vulcão gigante? Isso explica as águas quentes."

 

"CYAN foi criada para estabilizar a caldeira… se ela explodir boa parte do mundo vai junto."

 

"Você a conheceu?"

 

"Não, mas a mulher que a criou trabalhou no Zero Dawn comigo. Tínhamos gostos parecidos…"

 

E era nisso que a doutora pretendia apostar. Precisava de CYAN, a qualquer custo.

 

O vento aumentava sua intensidade à medida que subiam de altitude. A falta de  névoa permitia que Elisabet observasse um parque de Yellowstone diferente daquele que havia conhecido, mesmo com a familiar vista dos lagos termais, coloridos em suas margens. O contraste com a neve branca e limpa tinha vida própria dentro de seus olhos, a mantendo em um transe difícil de não perceber, algo que Aloy fez com rapidez ao dizer:

 

"Lindo, né?"

 

"Mais do que na minha época… É incrível."

 

Os Banuk aproveitavam a pequena parada para inspecionar o ambiente, quando Aloy se aproximou ainda mais de Elisabet e disse: 

 

"Elisabet… te devo desculpas pela forma que te tratei mais cedo. Não queria ter sido tão grossa e…"

 

"Agora é sua vez de parar por aí." Com sucesso, a mais velha retirava as palavras da boca da caçadora ao seu lado, mas sorrindo de forma gentil em sua direção.

 

"Eu fui insensível, não devia ter tratado daquele assunto daquele jeito…"

 

"Só… não estou acostumada a falar sobre. Mas eu agradeço por ter se preocupado." Aloy disse, para então devolver o sorriso. 

 

E assim fizeram, pela hora que se sucedeu. O vento balançava forte os cabelos de Aloy e Elisabet quando enfim avistaram a escadaria de metal, que levava a câmara onde CYAN se encontrava.

 

"É aqui que nos despedimos por hora, devemos voltar a tribo e arrumar a bagunça dos exilados…"

 

"Obrigado mais uma vez Aratak, espero não ter tomado muito do seu tempo."

 

O grande homem coberto de neve e suor riu alto, e então disse:

 

"Tenho todo o tempo do mundo, você me ensinou isso, lembra?"

 

O aperto de mão subsequente foi carinhoso e respeitoso, representando toda a jornada que haviam passado juntos no Caldeirão meses antes. 

 

Aos poucos, a ideia de aceitar ajuda era amadurecida nas engrenagens da mente da jovem.

 

Ao virar-se para a instalação do Firebreak, não esperava ver Elisabet parada na frente da porta coberta de gelo. A doutora olhava para o seu próprio reflexo imperfeito, hesitante e pensativa.

 

"Não sei nem por onde começar…"

 

Aloy se aproximou, se juntando a imagem distorcida no gelo e pensando em como incentivar aquela ao seu lado.

 

"Ela já me conhece, então não se preocupe, vou te ajudar a convencê-la."

 

Todos os "e se". Perspectivas, dúvidas, devaneios. Medos. Na mente de Elisabet Sobeck, os martelos entravam em repouso, e agora pensava apenas em duas coisas: tomar as rédeas da situação, e fazer isso sozinha.

 

Contemplando o silêncio, Elisabet posicionou a mão no lacre eletrônico. A porta se abriu, e um turbilhão de ar quase a levou voando para o interior da instalação, preenchendo cada espaço delimitado por paredes cobertas de gelo.

 

Aloy tomou a frente, guiando Elisabet através dos corredores. O chão escorregadio diminuía os ritmos de seus passos, e inversamente aumentava a tensão no ar. Uma miríade de ensaios e simulações preenchiam a mente de Elisabet, a irritando em um nível sutil. Já havia tomado a decisão de manter sua mente vazia e em silêncio até de fato ter que trocar palavras com CYAN, e ainda sim não conseguia fazê-lo. 

 

Quando se deu conta, viu apenas Aloy parada em frente a uma entrada, sem portas. O ambiente era escuro, com uma plataforma de vidro ao canto e pinturas crípticas na parede ao fundo. 

 

"Pronta?"

 

"Sim, vamos."

 

Recebendo a confirmação confiante, Aloy adentrou a sala, e antes mesmo de chamar pelo nome da IA, o azul tomou conta do ambiente. A esfera disforme, luminosa e holográfica surgiu a partir da superfície de vidro, tomando mais alguns segundos para finalmente se comunicar. 

 

"Saudações, Aloy."

 

Elisabet entrou logo depois, da forma mais lenta que conseguia. Estudava o momento com atenção, pronta para dizer que precisava ser dito, quando fosse oportuno. 

 

"É bom te ver de novo, CYAN."

 

"Lembro-me bem que viria caso tivesse informações sobre o Demon."

 

Aloy sorriu. Felizmente não teria que iniciar o assunto.

 

"Bem… Sim e não. Eu achei alguém que pode ajudar."

 

"E suponho que isso tenha a ver com sua acompanhante."

 

A esfera azul girou, agora com seus detalhes em roxo virados para Elisabet, pêga entre seus passos. 

 

Suspirando, era como se nunca estivesse nervosa quando finalmente disse:

 

"É um prazer, CYAN. Sou a Doutora Elisabet Sobeck."

 

Silêncio.

 

"Elisabet Sobeck…"

 

Ambas observaram enquanto a esfera azul diminuía sutilmente de tamanho, sem dizer uma palavra, a não ser:

 

"Elisabet Sobeck." Em um tom aparentemente pensativo.

 

Ouvindo apenas seu nome ser pronunciado, ela imediatamente pensou no pior, e se apressou para tentar se explicar. Porém, apenas o ar foi exalado, quando foi interrompida pela IA.

 

"O que houve com a Doutora Sandoval?"

 

Elisabet a esse ponto não sabia, Aloy também não, mas tal pergunta estava presa nos protocolos e sistemas de CYAN por centenas de anos, mesmo durante seu longo período de hibernação. A Doutora, porém, sabia a resposta e se aproximou devagar, dizendo entre suspiros:

 

"A Doutora Sandoval… eu a chamei para participar do projeto Zero Dawn como uma das Betas. Ela me ajudou a criar GAIA. Viveu o resto de sua vida pacificamente no Elísio, junto de todos os outros da equipe."

 

Ela não sabia exatamente o que havia acontecido no bunker Elísio após o dia-zero, mas não queria pensar em outra possibilidade a não ser a paz prometida a todos os habitantes.

 

Mais um período de silêncio. Máquinas não deveriam demorar para processar informações, então era com certeza alguma outra coisa. CYAN não era uma máquina comum, e também não havia passado por situações comuns.

 

"Então ela se foi, fazendo aquilo que amava."

 

Uma única gota de suor percorreu o rosto de Aloy, enquanto a caçadora instintivamente dava passos para trás, dando espaço às duas que conversavam. A mais velha por outro lado se mantinha atenta, com a luz azul da esfera à sua frente refletindo em seus olhos. CYAN agora voltava a sua forma natural, dizendo:

 

"Diga-me suas intenções. Estarei atenta."

 

A voz mecânica percorreu não só toda a extensão da sala, mas também cada centímetro do corpo de Elisabet. Era a hora de pôr suas teorias em jogo. 

 

"Eu cometi um erro gravíssimo, CYAN. Aloy provavelmente já explicou a natureza daquilo que lhe tomou o controle…"

 

Dessa vez sem demora, CYAN disse:

 

"’HEFESTO' é uma das funções subordinadas de GAIA, minha semelhante, que atuava como regente dos sistemas de terraformação."

 

"Exato. Ele te usou para criar máquinas de combate, seguindo sua programação. E isso é minha culpa."

 

Não só Elisabet, Aloy e CYAN também sentiram o peso das palavras ditas, peso este agora liberado.

 

"Elabore."

 

"Eu subestimei a força de vontade de GAIA… ela se auto-destruiu para preservar a vida, e agora todas as funções se espalharam por aí, causando todo tipo de caos."

 

"Está dizendo que as ações de HEFESTO não foram de natureza perversa?"

 

"Não… não! Eu criei HEFESTO! Meus amigos o criaram, criaram todos! E tudo daria certo se… se eu tivesse sido menos egoísta. Eu cometi o mesmo erro de novo, dessa vez com a GAIA, e agora o mundo vai pagar o preço!"

 

Enquanto falava, as lágrimas enchiam seus olhos pouco a pouco, principalmente ao lembrar dos Alphas.

 

"Mas eu sei como consertar." Ela gesticulava enquanto andava em círculos, expressando suas ideias. "Aquelas funções não foram feitas para trabalhar de forma isolada… Mas se um sistema regente for colocado de volta, todo o Zero Dawn vai se curar! Sem input humano, sem interferências."

 

"Então esse é o seu plano”, concluiu CYAN. “Um novo sistema regente."

 

A IA observou a aproximação de Elisabet, agora já envolta na luz azul de sua forma holográfica.

 

"Não existe infraestrutura para criar outra IA… e mesmo se tivesse, eu sou a última do meu povo. CYAN, você é tudo que nos resta."

 

Era o pedido mais humilde que Elisabet conseguia fazer no momento. CYAN, porém, ainda não se sentia convencida, dizendo:

 

"Meus sistemas não possuem os protocolos necessários para comandar o sistema. Em termos comuns, não sou compatível."

 

"Esse é o meu trabalho! Eu vou achar uma forma de produzir os códigos. Não vou descansar até tornar você compatível!"

 

A determinação de Elisabet agora contrastava com o receio da IA, e percebendo isso, Aloy tomou passos a frente e disse, amadurecendo observações que havia feito durante toda sua jornada.

 

"O maior poder de GAIA era o de tomar decisões… cuidar dos detalhes. Você é capaz, CYAN, é o que tem feito por anos, e muito bem."

 

O encorajamento de Aloy quebrou o silêncio da dúvida, quando CYAN disse:

 

"Será um processo penoso, Doutora Sobeck. Estando sozinha, terá que se dedicar por horas a cada dia para que o progresso seja viável."

 

"Já fizeram meu trabalho por tempo demais…" Elisabet disse enquanto olhava diretamente para Aloy, e então caminhou em sua direção. "Escute, Aloy." 

 

Os pares de olhos idênticos se encontraram, e a mais jovem foi deixada sem palavras pelo mero contato com a Doutora, que tomava suas mãos com carinho, as segurando com certa força.

 

"Eu sei que a justiça não pode ser feita… E não quero fingir que pode. Mas eu assumo daqui. O Zero Dawn, o futuro da terra, você pode deixar comigo. Vou honrar o seu esforço."

 

Por alguns instantes, a jovem caçadora pôde sentir algumas lágrimas se formando, mas sem encontrar o caminho para os seus olhos. Era um adeus súbito demais.

 

"Eu tenho feito isso há tanto tempo… Pensei que poderia continuar caso tivesse ajuda, principalmente a sua."

 

Elisabet por sua vez permitiu às lágrimas, em pequena quantidade mas perceptíveis mesmo assim, acompanhadas por um sorriso.

 

"Olha só você… Ainda se preocupando. Eu sei que não tenho direito de falar isso… Mas eu sinto muito orgulho do que você fez. É a minha vez agora."

 

Lentamente, as mãos se desvincularam, e apenas o ar frio ficava entre as duas. Aloy disse então:

 

"Eu vou manter contato, e direi para Aratak ficar de olho. Pode contar comigo ainda, você sabe."

 

"Sei que sim, garota. Tome cuidado na volta."

 

O tempo entre a despedida e a saída de Aloy da câmara foi facilmente nulificado, ambas não haviam pensado na possibilidade com a devida atenção. A princípio, era o melhor a se fazer.

 

"E depois?"

 

Apenas com CYAN fazendo companhia, Elisabet se manteve calada, se aninhando em uma cadeira congelante, inundando sua mente com o que fosse preciso. Frente aos painéis cobertos de condensação, tentava pensar no seu trabalho árduo adiante, e então olhava para o corredor. Imaginava a vida normal que Aloy agora poderia viver, e então olhava para o corredor. Não importando o quão alto forçava seus pensamentos a soar, o quão grande a escala de seu trabalho seria, seu olhar sempre voltava para o corredor.

 

"CYAN."

 

Aquele corredor vazio iria assombrá-la para sempre.

 

"Eu preciso saber se posso fazer isso longe daqui…"

 

O Zero Dawn não era mais sua única responsabilidade.

 

"Terá que achar formas de produzir os códigos. Satisfeita essa condição, é possível realizar uma transmissão utilizando seu Foco."

 

Tomando de novo a bolsa em suas mãos, e sorrindo em direção a CYAN, Elisabet disse com o máximo de determinação que conseguia buscar do fundo de seus pulmões:

 

"Eu vou fazer direito. Obrigada por concordar em me ajudar, CYAN."

 

"É o que a Doutora Sandoval gostaria que eu fizesse. Terá meu apoio, Doutora Sobeck."

 

E então partiu em disparada. 

 

Ela não poderia estar muito longe. 

 

Se esforçou para não escorregar no piso congelado, e cambaleou ao sair da instalação às pressas. Os objetos em sua bolsa balançavam assim como seus cabelos, frente a um sol alaranjado exuberante, rolando por cima das montanhas de gelo. E bem a sua frente, andando e não correndo, Aloy ainda não percebia a virada de decisão atrás de si até ser chamada no tom mais alto que uma voz poderia alcançar:

 

"Aloy!"

 

O chamado caloroso saia da boca de Elisabet e reverberava nas paredes montanhosas, causando um eco difícil de ignorar. A jovem olhou para trás sabendo exatamente o que havia ocorrido, e sorriu de volta.

 

"E todo aquele papo sobre deixar o trabalho com você?"

 

Aloy provocou entre suas risadas, pouco antes da mais velha a alcançar, arfando após sua investida.

 

"Não, não, isso ainda permanece. Recuperar o Zero Dawn é meu trabalho agora."

 

Lado a lado, ambas faziam seu caminho para fora do Corte, e finalmente para a cidade de Meridiana.

 

"Mas não é a única coisa que preciso fazer… Me permite continuar te acompanhando?"

 

Aloy abriu o maior sorriso que conseguia em meio a brisa congelante, e assentiu com a cabeça. 

 

O caminho das duas já havia se tornado inseparável, mesmo que ambas não tivessem consciência disso ainda. Conectadas através da genética, da história e, agora, também da vontade. O destino final desse caminho era exatamente a peça que faltava no quebra cabeça em suas vidas.

 

"Mas me diz o nome do tal estado onde estamos de novo?"

 

"Wyoming?"

 

"Tá de brincadeira…"

 

"A gente costumava dizer que parecia um verbo…"

 

"Um o que?"

 

"Nem vem. Eu cuido de máquinas, nada mais."


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Notas finais do capítulo

E FINALMENTE o primeiro arco da história está finalizado. Muita viagem, muita ação, e muita conversa. Agora temos tudo pronto pra desenvolver mais e mais coisas! E eu tô ansioso demais pra isso. A partir daqui as coisas vão ficar mais emocionais, e mais cotidianas, então esperem uma mudança de tom! E também, é super possível que atrase mais vezes, sinto muito por isso. Mas abandonar a fic nunca! ^^ E isso eu devo a minha irmã Anny, ou Vanilla Sky como vocês conhecem. Bem, eu ESPERO que vocês conheçam u.u Sem ela, absolutamente nada dessa fic existiria como existe hoje. E caso estejam cometendo esse crime de não conhecer ela, não se preocupem, estarão absolvidos assim que forem lá ver as fics incríveis que ela escreve sobre o casal mais fofo da Marvel. "Que casal Areiko?" N sei, vai lá ver -q
E claro, não poderia faltar o agradecimento a outra pessoa super importante pra existência dessa fic! Agradeço demais a você Aninha, que tá lendo tudo e me levantando do chão quando eu preciso xP amo vocês ;-;

Enfim! Agradeço pela paciência, e pela leitura! Conto com o feedback, como sempre. Até a próxima! ♥



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