— É melhor que eu continue aqui em Sakaar — sussurrou Loki, entrando no elevador e apertando o botão que os levaria para o subsolo.

Loki estava emocionalmente instável.

Achava que a morte de Odin não lhe afetaria o mínimo, que seria indiferente à situação, assim como foi em todas as decisões equivocadas que tomou durante sua vida. Entretanto, ouvi-lo chamá-lo de filho, dizer que o amava e completar ao dizer que Frigga se orgulharia dele fora algo completamente inesperado e doloroso.

E estar ao lado de Thor não melhorava sua situação. Fazia-o se lembrar de seu antigo lar em Asgard, de como sua vida era melhor antes do incidente com os gigantes de gelo e tudo que se seguiu até aquele presente momento. Estar com Thor fazia com que se lembrasse dos momentos bons e ruins que passaram juntos e tudo o que mais queria era esquecer. 

— Era isso que eu estava considerando.

Loki bufou, juntando as mãos na altura do peito e massageando a própria palma com o polegar; hábito que herdara de sua mãe e que insistia em repetir toda vez que estava inquieto.

Nem em um milhão de anos esperaria aquela resposta de Thor, achava que haveria pelo menos alguma relutância de sua parte quanto sua estadia em Saakar.

— Você concordou comigo? — debochou, olhando de relance para Thor.

— Esse lugar é perfeito pra você. É selvagem, caótico, sem leis — listou despretensiosamente — Irmão, você vai se dar bem aqui.

Loki revirou os olhos, agora olhando diretamente para o loiro.

— Jura que é essa ideia que você tem de mim?

Uma pausa. 

Loki pôde ver Thor a ponderar sobre sua resposta e quase revirou os olhos novamente, controlando o ímpeto de dizê-lo para não pensar muito senão seu cérebro poderia explodir. Não muito depois, a resposta veio:

— Loki, eu te achava incrível — admitiu Thor, virando-se em sua direção. — Eu pensava que iríamos lutar lado a lado pra sempre, mas... no fim do dia voltamos ao que somos. E ainda acho que pode haver o bem em você —suspirou — Vamos ser sinceros, nossos caminhos se divergiram há tanto tempo já.

Loki sabia. Sabia que haviam tomado decisões e rumos completamente diferentes em suas vidas, mas ouvir aquilo em voz alta era muito pior do que apenas admitir para si mesmo. Além disso, não poderia ficar se martirizando, parte da culpa era sua por estar sempre se afastando e afastando os outros de si.

Tudo porque sentia-se vulnerável e não gostava de se sentir assim.

— É... É provável que o melhor seja não nos vermos mais — concluiu por fim, aquela conversa tomando um rumo muito mais sentimental do que previra inicialmente.

— Não era o que você queria?

Loki queria dizer que não. Havia uma infinidade de coisas que poderia dizer para refutar a estúpida suposição de Thor, e talvez o tivesse feito fosse ele uma pessoa honesta. Mas a verdade é que nunca foi muito bom na arte da comunicação; era uma das coisas que tinha em comum com o resto da família.

Manteve-se em silêncio.

Thor suspirou mais uma vez, desviando o olhar.

— Gostaria que as coisas tivessem sido diferentes.

Somos dois, pensou. Mas não se dignificou em responder.

XxX

Quando Thor contou sobre seu plano para derrotar Hela para Loki, achou que seria definitivamente a última vez que veria seu irmão. Fosse pela dúvida se o plano daria realmente certo ou pela conversa que tiveram horas mais cedo dentro de um estúpido elevador em Saakar, Thor não tinha certeza. Mas não teve dúvidas, assim que viu Loki virar as costas para fazer o que tinha de ser feito, de que aquela seria a última vez em que se veriam.

Havia um quê de finalidade em todas as suas interações desde a morte de seu pai e o aparecimento de Hela.

Ou talvez isso tenha sido apenas influência do início do Ragnarök sobre suas emoções. Não saberia dizer.

De qualquer forma, não mudava a maré de emoções que lhe invadira ao ver as costas de seu irmão a se afastar pelo que supostamente seria a última vez.

Na hora não soube distinguir a profundidade de seus sentimentos, mas ao finalmente se ver sozinho na nave juntamente do que sobrara de seu povo e após assistir a destruição do planeta que chamara de lar por tanto tempo — a voz de seu pai vindo em sua mente, Asgard não é um lugar, é o povo —, Thor finalmente compreendeu aquela confusão de sentimentos que vinha lhe corroendo desde a morte de seu pai e que teve seu ápice durante a batalha contra Hela.

Raiva, angústia, tristeza, frustração. 

Solidão.

Talvez fosse isso que Loki tivesse sentido durante tanto tempo em sua vida.

Por isso, quando entrou em seus aposentos no final da noite e viu a imagem de Loki em pé sorrindo despretensiosamente em sua direção, não pôde evitar sorrir também. Mesmo que fosse apenas uma imagem reproduzida de Loki, aceitaria de bom grado a oportunidade de vê-lo mais uma vez.

— Thor — começou Loki, a voz livre de seu sarcasmo habitual.

— Loki — respondeu, reconhecendo a oferta de paz de seu irmão.

Ficaram em silêncio, nenhum dos lados sabendo exatamente como proceder. Feliz ou infelizmente, Thor nunca foi uma pessoa muito paciente e quebrou o silêncio após alguns segundos encarando Loki.

— Talvez você não seja tão mau assim, irmão — concebeu, por fim. Caminhou até o minibar que havia no quarto (bem, pelo menos para manter um estoque decente de bebidas em suas naves o grão-mestre servia) e serviu-se de um copo de uísque, observando o reflexo de Loki através do espelho na parede. Manteve a tampa do uísque segura entre seus dedos.

— Talvez não — admitiu, encolhendo os ombros.

Thor fitou a figura de Loki, o mais honesto e vulnerável que via há muito tempo e desejou que ele estivesse realmente ali, consigo.

Havia tantas coisas que gostaria de dizer. Tantos sentimentos empilhados, verdades escondidas a sete chaves em seu coração.

Gostaria de pedir desculpas por sua negligência a Loki e seus sentimentos, quando ainda era imprudente e infantil. Gostaria de dizer que finalmente entendia (pelo menos um pouco) como Loki havia se sentido durante tanto tempo em sua vida. De como sentia falta — de tudo que passaram juntos, de sua família, de seu lar, de não ter que se preocupar para onde ir ou o que fazer. Que sentia falta de estar ao lado de Loki. E que continuaria sentindo falta, sempre. 

Mas nenhuma dessas coisas saiu de sua boca, nem mesmo uma palavra que pudesse expressar tudo o que estava sentindo naquele momento.

Então apenas optou por um caminho mais simples, mas não menos verdadeiro. Um que valia mais do que mil desculpas jamais poderiam dizer.

Thor encarou a peça de cristal que permanecia em sua mão e apertou o pequeno objeto firmemente entre os dedos antes de dirigir novamente o olhar a seu irmão.

— Obrigado, Loki — agradeceu, fitando os olhos verdes que o encaravam expectantes e vulneráveis. Esperava que seu olhar dissesse tudo o que sua boca não conseguia. — Se estivesse aqui até te daria um abraço — e, finalmente, jogou o pequeno objeto que ainda tinha em mãos na direção de Loki, esperando que o objeto o atravessasse como todas as outras vezes, e que a imagem de seu irmão (ainda poderia chamá-lo assim?) se desfizesse, deixando-o sozinho novamente.

— Eu estou aqui — disse, pegando o objeto jogado em sua direção. Um sorriso travesso, porém verdadeiro dançava em seus lábios.

Quando Thor finalmente deu por si, já estava do outro lado do quarto e puxando Loki para si.

— Thor-

Loki calou-se ao se ver envolvido nos braços de Thor, um braço circulando sua cintura e o outro seus ombros.

O deus das travessuras congelou por um momento, não sabendo o que fazer com as mãos, que permaneciam soltas rentes ao seu corpo. Sentiu Thor aumentar o aperto ao redor de seu corpo e prendeu a respiração. — Thor…?

— Me deixe ficar assim mais um pouco, sim?

Loki suspirou, revirando os olhos, sentindo o rosto queimar. Agradeceu por Thor não poder ver seu rosto daquela posição.

— Você é ridículo — sussurrou, finalmente relaxando com o contato e envolvendo os braços ao redor de Thor, tentando retribuir o gesto. O loiro juntou ainda mais os corpos, rindo anasalado.

Loki sorriu também.

Talvez a ideia de estar ao lado de Thor dali pra frente não fosse tão ruim assim.