Presos Por Um Olhar escrita por Carol McGarrett


Capítulo 71
Oficialmente Noivos


Notas iniciais do capítulo

E dando continuidade ao Final de Semana de Ação de Graças... chegou a hora de conhecer o restante da Família Pierce e de contar sobre o noivado!
Capítulo grandinho para vocês aproveitarem bem!



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— Dona Amelia te alugou pelo dia inteiro, hein? Olha o seu estado! – Alex se referia ao meu cabelo meio úmido, meio ensebado por conta de nossa última parada, um lugar um tanto estranho, mas que faziam molhos excepcionais e algumas frituras que só avestruzes eram capazes de comer, e era tão pequeno e tão baixo que toda a fumaça e gordura da cozinha se impregnava no ar e nas coisas, e como a minha sogra ainda colocou o papo em dia com os donos enquanto aguardávamos nosso pedido, foi impossível de sair de lá sem carregar um pouco do cheiro e do óleo, no cabelo.

— Pelo menos rodei por quase toda Los Angeles. Vi a parte boa. Sua mãe, literalmente, me levou de ponta a ponta da cidade.

— Não se assustou com o ‘logo ali’ da minha mãe?

— O conceito de ‘logo ali’ dela é completamente diferente do meu, mas foi um bom dia. E, estranhamente, todas as pessoas que sua mãe conhece já sabem meu nome e de onde venho. – Dei de ombros. - Inusitado, não?

Alex deu uma gargalhada.

— Ah, essa minha mãe fofoqueira! Já espalhou para a cidade que você faz parte da família! Por acaso ela falou para você como quer fazer? Se vai hoje, ou só vai amanhã? - Ele mudou de assunto.

— Seus pais vão hoje, levando seus avós maternos, que pelo que entendi, chegaram no meio da tarde e seu pai ficou responsável de pegá-los no aeroporto. E ela pediu que você levasse a sua avó paterna.

— Hoje!?

— Sim! O que me faz te perguntar uma coisinha.

— Diga. - Alex se jogou no sofá, esperando que eu começasse a falar.

— Por que você não me falou que seus avós estavam vivos?

E meu noivo só deu um sorrisinho de lado, como que tentando se defender com todo o seu charme e seus lindos olhos azuis.

— É sério, Alexander. – Cruzei os braços e o encarei.

— Meus avós por parte de mãe, moram em Michigan. Vêm a Los Angeles, uma vez por ano. E nós vamos lá uma ou duas vezes. Minha mãe vai mais.

— Sua avó materna?

— Não é muito chegada em cidade grande e nem em reuniões de família. Por isso não veio no aniversário de minha mãe.

— Tem mais parentes?

— Importantes?

— Claro.

— Não. Tenho primos e primas, mas não nos falamos com essa frequência. Você foi apresentada a eles.

— Algo que possa me dizer para me preparar para seus avós?

— Tenho certeza de que eles já sabem de tudo sobre você. - Ele deu um sorrisinho. - Dona Amelia não é lá muito boa em guardar segredos.

— Não ajudou muito, Alex. Não se esqueça, eu não sou daqui. Não sei das tradições americanas, não quero ofendê-los ao fazer algo errado.

— Você não vai fazer nada de errado. E meus avós são tranquilos. Devem pegar um pouco no seu pé, afinal, Pepper não vai.

— Ela passa esse feriado com a família. – Conjecturei.

— Esse ano sim. Aí aparece na noite de Natal e o Will passa o dia 25 com eles. É um arranjo interessante.

— Entendo. – Respondi e fiquei me perguntando como nós dois iríamos nos arranjar para as festas de final de ano, já que uma parte da família está aqui e a outra passa as festas na Finlândia, afinal, até decoração de Natal por lá é coisa séria.

— Você já deixou tudo pronto, não? – Ele perguntou me tirando dos meus devaneios.

— As malas?! Sim, inclusive já estão no carro. Adiantei o que pude para não nos atrasar.

— Ótimo! Vou levar e começar a ajeitar as coisas do trio peludo.

— Alex... sua avó não vai se importar com os dois? – Apontei para Loki e Thor, que estavam deitados aos meus pés. - Qualquer coisa eu posso ir no meu carro, levando os cachorros, e você vai no Jipão para buscá-la.

— Não. Ela adora Stark, ele pode ir no banco de trás ao lado dela, é até bom que ela vai se distraindo. Thor e Loki podem ir no porta malas, sem problema.

— E as coisas de sua avó? Nós não nos importamos de ter pelo de husky em tudo, mas ela não deve gostar.

— Minha avó não leva muita coisa. Ela só vai para o jantar de quinta e na sexta-feira pede para que a levemos de volta para casa. Sempre foi assim. Dona Ilsa não gosta muito de ficar longe de casa, assim, não tem mala, tem uma bolsa.

Concordei com a cabeça e subi para me arrumar, Alex veio logo atrás e depois de fecharmos a casa e ajeitarmos os cachorros no carro, fomos para a casa da avó dele.

— É muito longe? – Perguntei um tanto nervosa demais.

— Um pouco, há meio caminho da fazenda. E não se preocupe. Minha avó vai gostar de você.

Fiquei em silêncio. Tinha lá minhas dúvidas se a senhora iria gostar ou não de mim, ou pior, o que ela pensava sobre o nosso relacionamento relâmpago.

Na metade do caminho, Alex entrou em Santa Clarita e depois de me contar algumas coisas sobre a cidade, paramos na frente de uma casa com muros altos.

— Bem, é aqui. Acho melhor te apresentar para ela dentro de casa. Ela vai achar mais adequado.

— Claro. Só não tranque o carro, temos que deixar a janela aberta para eles. – Apontei para os cachorros que dormiam.

Alex bateu campainha e pegou a minha mão, fazendo um carinho com a ponta do polegar nas minhas juntas.

— Não fique nervosa. Você duas têm algo em comum.

Levantei uma sobrancelha.

— Ela veio da Europa também. Logo depois da Segunda Guerra, saiu da Alemanha e se mudou para o Estados Unidos.

— Sua avó é alemã?

— Sim. Ela é.

Olhei surpresa para ele, isso era uma novidade e tanto. Ia comentar algo, porém fui interrompida, pois atenderam ao interfone.

— Pois não? – Uma voz bem mais jovem do que eu esperava falou.

— Sou eu, Alexander. Vim buscar...

O portão foi aberto antes mesmo que ele terminasse de falar.

— Bem-vinda. – Alex me disse ao me dar passagem e entramos em um jardim maravilhoso, cheio de rosas, hortênsias, tulipas, flores de lis.

— São centáureas? – Perguntei apontando para as pequeninas flores que tinham praticamente um canteiro só para elas.

— As flores símbolo da Alemanha. – Alguém respondeu. Olhamos em direção à voz e vi uma senhora de mais de 90 anos, mas muito elegante e impressionantemente altiva, que estava na porta nos observando com olhos de águia. - Poucas pessoas reconhecem essa flor. – Disse em tom de surpresa.

— Boa noite, vovó! – Alex disse, já se encaminhando para encontrá-la no alto da escada e, assim que a encontrou, deu um beijo em sua mão. Eu o segui, um tanto sem graça.

— Boa noite, Alexander! – Disse a senhora, que eu vi, tinha os mesmos olhos azuis do neto. – E ela é a sua namorada, suponho. – Olhou para mim.

— Sim. – Ele confirmou e olhou para mim que estava parada atrás dele. – Vovó, essa é a Katerina. Kat, minha avó, Ilsa.

— Boa noite, Dona Ilsa! – Estendi minha mão na direção dela, que me olhava atentamente.

Guten Abend[1]! – Ela disse, ainda com um forte sotaque alemão, mesmo que morasse na América há muito tempo.

Guten Abend!— Respondi.

— É descendente de alemães, minha criança?

— Não, senhora. Sou finlandesa de nascimento. E tenho descendência finlandesa por parte de pai e inglesa por parte de mãe.

— Interessante. Wilkommen in der Familie[2]. – Disse, misturando os idiomas.

Vielen Dank[3]!

— Gostei dela, Alexander. – Disse Dona Ilsa para o neto. – Agora vou ter alguém para conversar comigo em alemão.

— Isso vai ter mesmo, vovó. Kat fala vários idiomas.

Fiquei um tanto desconsertada com a conversa, não só porque eu estava presente, mas porque Alex estava aumentando, em muito, a minha capacidade de falar outros idiomas.

— Espero que ensine a esse preguiçoso alguns. Sempre falei tanto com ele, quanto com William, que eles deveriam aprender mais do que inglês e o pouco de espanhol que falam. Mas nunca me ouviram. – Ela se dirigiu a mim.

— Bem, em defesa de seu neto, Dona Ilsa, ele mesmo se prontificou a aprender a falar finlandês. Comprou até um dicionário.

E a senhora olhou do neto para mim e depois se virou novamente para Alex.

— Para a namorada faz isso, não? E falar alemão para conversar com a avó? Quando vai aprender?

Alex ficou todo sem jeito.

— E pare de ficar vermelho, Alexander, sabe que isso é verdade! E só não te dou um sermão aqui e agora, porque temos horário e sei que o seu cachorro está dentro do carro.

— Na verdade, cachorros. – Alex corrigiu a avó.

— Pior ainda, não podemos deixá-los lá sozinhos! Ande, minha bolsa está no sofá da sala, vou andando com Katerina, se ela não se importar em ter uma velha falando alemão na cabeça dela.

Natürlich nicht[4]. – Respondi.

Dei o braço para Dona Ilsa e fomos até o portão principal conversando em alemão, como o carro estava aberto, ajudei-a a entrar e se ajeitar no banco de trás, mesmo tendo insistido que ela deveria ir no banco da frente, pois seria mais confortável.

— Um conselho de uma mulher que já viveu muito, minha jovem, jamais entregue o banco da frente para nenhuma outra mulher. Nem para a sua sogra. Ao lado do seu namorado, noivo ou marido, só anda você! – Ela terminou de falar no momento em que Alex vinha trancando o portão principal.

— Conselho anotado, Dona Ilsa.

E ela trocou de assunto, assim que começou a brincar com Stark.

— Então, os nomes de seus lobos da neve?

— Thor é o branco e Loki, o ruivo.

— Fiel a mitologia nórdica, gosto mais de você a cada segundo. E tinha muito tempo que não via huskies. – Continuou. – Eu tinha um quando criança. Era meio acinzentado, tinha o nome de Nevasca.

Alex que tinha ajeitado a bolsa da avó no banco de trás, só olhava para nós duas com cara de dúvidas.

— Se tivesse me escutado quando mais novo, Alexander, estaria entendendo o que eu e Katerina estamos conversando! – Ela respondeu ao olhar do neto.

— Creio que terei que me redimir agora. – Ele murmurou ao fechar a porta.

— A senhora está bem mesmo aqui atrás? – Voltei ao inglês.

— Sim, minha criança. Estou bem. Assuma seu lugar ao lado de Alexander.

Fechei a porta e fui para o banco do carona. E nossa viagem foi um misto de conversa em inglês e alemão, principalmente quando Dona Ilsa queria me contar algo de Alex e não queria que ele ouvisse.

Ao chegarmos na fazenda, vi que Will já tinha chegado, pois ele estava na porta, com o telefone no ouvido.

— Aposto que está conversando com Pepper. – Alex chutou ao parar o carro na porta da casa, para que sua avó não precisasse caminhar da garagem até lá.

Descemos do carro para ajudar Dona Ilsa, e assim que viu a avó, Will encerrou a chamada e veio recebê-la.

— Boa noite, vovó! – Ele a cumprimentou da mesma maneira que Alex havia feito.

— William. Boa noite! Como está o trabalho em Atlanta?

— Indo, vovó, Indo.

— Depois me conte mais sobre ele. – Dona Ilsa respondeu e deu o braço para o neto. Eu peguei a bolsa no banco de trás e Alex soltou os cachorros, indo, logo em seguida, guardar o carro.

— Não vai cumprimentar a sua cunhada? – Ela perguntou.

— Fala, Kat! A voz já voltou ou ainda está rouca? – Meu cunhado brincou comigo, algo que desagradou a avó, pela maneira que ela olhou para ele.

— Boa noite para você também, Will.

Como o Trio Peludo tinha entrado correndo, meus sogros já sabiam da nossa presença e, sem demora, Sr. Pierce veio receber a mãe com Dona Amelia logo atrás.

E qual foi a primeira coisa que a avó de meu noivo disse?

— Gostei da namorada do Alexander! Finalmente vou ter alguém para conversar em alemão de verdade por aqui.

Eu só senti meu rosto corando de vergonha.

— Katerina, você pode fazer o favor de levar as minhas coisas para o quarto e me ajudar a guardá-las?

— Claro, Dona Ilsa. – Respondi e depois de cumprimentar meus sogros e perguntar onde era o quarto da matriarca dos Pierce, Dona Amelia me avisou:

— Vá e volte rápido, as apresentações da noite ainda não acabaram!

Fui ao lado de Dona Ilsa até o quarto dela, ajudei-a com as coisas e, quando saí do quarto, vi Alex caminhando pelo corredor com nossas malas e minha bolsa.

— Minha avó já te alugou? – Ele perguntou baixinho, apontando para o quarto com a cabeça.

— Pediu minha ajuda. - Corrigi a sua fala.

— Ela realmente gostou de você. Coisa rara de acontecer. – Me disse quando entramos no quarto.

— Sua mãe me disse que ainda tenho mais apresentações pela frente... – Falei incerta.

— A mais difícil já acabou. Os pais da minha mãe são muito mais fáceis de conquistar.

— Uma dica, por favor! - Praticamente implorei.

— Seja você e fale de cavalos. Ajudei? – Ele piscou para mim, certo de que não tinha me ajudado em nada.

— Nem um pouco. – Reclamei e preferi ir para a sala e ser apresentada ao restante da família do que ter Dona Amelia vindo nos pegar pelas orelhas.

— Não fique nervosa, Kat. Você vai tirar de letra. – Alex sussurrou no meu ouvido um pouco antes de eu ser quase esmagada em um abraço.

— E aí está ela! Amelia já falou tanto de você que sinto que já te conheço, Kat! – A avó de Alex disse.

— Olá! – Foi tudo o que eu consegui dizer ao ser pega totalmente de surpresa.

— Larga a menina, Laura! Desse jeito você mata a Loira aí antes que ela possa dizer alguma coisa.

— É bom que ela se acostume desde logo. Porque eu quero que ela vá até Michigan! – Disse para o marido. – Já você, não ligue para o que David diz. Ele fala muito! – Conversou comigo.

— Oi, vó! – Alex falou do meu lado, se fazendo notar, e eu fiquei aliviada, pois não sabia o que responder.

— Ah! Alexander. Achei que só te veria nesse ano pelo comercial que você fez! Esqueceu o caminho para a casa dos seus avós?

Alex não sabia o que dizer, então olhou para mim, eu fiquei sem resposta, afinal, nem sabia que ele não tinha ido visitar os avós, na verdade, eu nem sabia que os avós dele eram vivos até essa manhã! Ao fundo, Will gargalhava da saia justa que o irmão mais velho se encontrava.

— E você, William, não fique se achando o esperto, porque você não aparece em Michigan há mais de dois anos.

Will ficou calado e foi a vez de Alex olhar sorrindo para o irmão.

— Esses meus netos desnaturados, sempre com a desculpa de que estão trabalhando muito. Mas você não deve ser dessas, afinal, já sei que levou todos eles para assistir à Fórmula 1.

— É, nós fomos. - Confirmei e ia elaborar a frase, porém fui interrompida, já que Dona Ilsa, que entrava na sala nesse momento, olhou para os Pierce, depois para Dona Laura e, por fim, para mim.

— Alguém está ensinando a essa família um pouco do costume europeu. Isso é bom.

— Isso porque a senhora não conheceu os sobrinhos de Kat! – Dona Amelia respondeu à sogra.

— Então você tem uma família grande! Isso é ótimo! – Dona Laura falava animada e começou a dizer que precisava conhecer o restante da minha família, que todo mundo tinha que se encontrar na Fazenda deles em Michigan, e a falação aumentou quando meu sogro contou que não só eu, como também as minhas sobrinhas, adorávamos cavalos.

Alex, do meu lado, estava simplesmente confortável com toda essa conversa, que se estendeu para o jantar e para depois do jantar.

Para tentar não ser ainda mais o centro da conversa, tomei a liberdade de arrumar a cozinha, e foi só aí que pude respirar um pouquinho, mas não por muito tempo.

— Eu te disse que meus avós iriam gostar de você! – Meu noivo voltou para a cozinha e pegou o pano de prato para enxugar as vasilhas.

— Eles estão fazendo planos que envolvem a minha parte da família. Eles simplesmente não entendem o caos que seria se todos se encontrassem.

— Não diga que Liv não vai gostar... a fazenda em Michigan é dez vezes maior do que aqui. Com muito mais cavalos. E tem pôneis para Elena.

— Elena em um lugar aberto, montando qualquer pônei que ela ver! Já estou imaginando a ida ao hospital.

Alex riu do meu comentário o que atraiu a atenção de quem estava na sala.

— Só assim para o Alexander ajudar na cozinha, porque nunca fez isso. – Dona Ilsa falou. – Só quero ver se vai ajudar amanhã ou vai ficar só beliscando enquanto a Katerina trabalha.

Olhei para Alex que só tentou balbuciar alguma explicação inaudível.

— Céus, a falação nas próximas horas serão de deixar qualquer um maluco! – Murmurei.

— Você não faz ideia!

Com a cozinha arrumada, voltamos para a sala e ainda bem que mais da metade das pessoas gostavam de dormir cedo, ou seríamos obrigados a ficar ouvindo histórias da infância de Alex e Will por boa parte da noite. Não que eu me importasse, estava achando era graça, até que Alex murmurou no meu ouvido.

— Dentro de 10 dias os papéis estarão invertidos.

E tirou toda a minha animação com as histórias, como é estraga prazeres!

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O Dia de Ação de Graças começou cedo, não sei o motivo exato, contudo, os avós de Alex são incapazes de ficarem quietos e de falarem baixo, o que, claro, nos acordou e acordou Will.

— Depois eles reclamam que eu fico o dia inteiro comendo. É claro! Me acordam antes que o dia nasça e, ainda estou proibido de entrar na cozinha, querem que eu faça o que? Fico olhando para o céu? – Reclamou meu cunhado assim que nos viu. – E bom dia!

— Bom dia! – Respondemos.

— Vão fazer o que?

— Eu já fui convocada para ajudar na cozinha. Mas acho que isso é só para de tarde, não?

Os dois irmãos riram da minha cara.

— Que horas começa a preparação para o jantar? - Perguntei já temendo a resposta.

— Com as minhas avós já acordadas, aposto que já começou! – Alex disse e só pediu que fizéssemos silêncio para escutarmos a falação na cozinha. A vítima da vez era Dona Amelia e o fato de que ela não gostava de usar a sala de jantar.

Eu estava perdida.

— E olha quem finalmente acordou!! – Dona Laura veio nos cumprimentar. – Um bom dia para você, e para você e para você! – Disse quando abraçou um por um.

— Bom dia! – Respondi.

— Não tem nada de finalmente, vó. Olha a hora, são 05:50 da manhã! – Will reclamou.

— Quando mais cedo se levanta, melhor se aproveita o dia! – Sr. David respondeu ao neto e eu, sem querer, cruzei olhares com o meu sogro, e nem ele parecia concordar com essa frase.

Como se a conversa da noite anterior não tivesse sido interrompida por algumas horas de sono, a falação recomeçou, e não parou até o momento em que todos estavam comendo. Pelo visto, esse era o único modo de a casa ficar em silêncio.

Antes que os homens saíssem de fininho da cozinha, ao final do café da manhã, Dona Amelia distribuiu as tarefas do dia para cada um.

— E sem reclamar! – Era o que ela falava ao entregar o que deveríamos fazer.

— Sorte da Pepper que não veio nesse ano. – Disse Will baixinho.

Não sei o que os demais teriam que fazer, só sei que eu fiquei responsável pelo prato principal da noite. O peru.

E eu tinha certeza de duas coisas:

Ficaria o dia inteiro na cozinha e não fazia a menor ideia de como preparar essa coisa!

Eu estava, literalmente, lascada, pois toda a ceia dependia da minha capacidade (inexistente) de preparar a ave.

A única boa notícia com relação ao que tinha sobrado para mim foi que Dona Amelia já tinha deixado o tempero pronto e tinha escondido o tal do ossinho que tem que ser escondido. Ela tentou me explicar o motivo disso, mas eu não entendi foi nada.

Discretamente, busquei no Salvador dos Desesperados, também conhecido como Google, como se preparava a tal da ave. Sentei-me em um canto da cozinha e, fingindo que conversava em finlandês com alguém do outro lado, estava lendo o passo a passo para preparar aquele jantar de Ação de Graças.

Ninguém me perturbou enquanto eu fazia a minha pesquisa e ficava somente recitando uma música em finlandês para me dar um álibi sem vestígios para dúvidas. Ou melhor, quase ninguém. Alex não caiu na minha e logo se sentou do meu lado e leu o que tanto eu fazia olhando na tela do celular.

— Você não sabe fazer isso, não é? - Constatou.

— Não, eu não sei. – Confirmei baixinho, morrendo de medo de alguém descobrir.

— Não fazem peru no Natal finlandês ou inglês?

— Minhas avós fazem isso, e nunca deixaram ninguém chegar perto, eu fico responsável pelo restante dos pratos, pelas sobremesas e pela cozinha pós ceia.

— Por que você não fala isso para minha mãe? Ela vai entender. - Meu noivo estava, tão ou mais, preocupado com o fracasso iminente do jantar de Ação de Graças assim como eu.

— Até onde eu sei, essa aqui não é a letra da sua mãe. – Mostrei o pedaço de papel que tinha me sido entregue um par de horas atrás.

— Minha avó... Ah, Dona Laura!

— Assim, prefiro arriscar procurando uma receita na internet do que chatear a sua avó.

— E acha que esse site vai ter o que você precisa?

— Não julgue um site pelo nome. Tem muita coisa aqui.

Cozinha para Idiotas não é um site onde eu entraria, nem se estivesse morrendo de fome.

— “Situações desesperadas pedem medidas desesperadas”, Alexander. Agora, me deixe em paz...

— Porque você não sabe o que está fazendo! – Ele riu do trocadilho que fizera com o rádio de Kimi.

— Some daqui. – Expulsei-o da cozinha, quase aos chutes, e comecei a preparar o peru para levá-lo ao forno tendo com minha única companhia permanente pelo resto do dia, Loki, que não deixou meu lado hora nenhuma. Thor, meu outro cachorro, tinha seguido feliz os passos de meu sogro logo que este saiu da cozinha para nunca mais voltar.

E como demorou para essa ave monstruosa de quase cinco quilos ficar pronta! Eu estava a ponto de sair para comprar um maçarico para ver se essa coisa cozinhava mais rápido, quando minha sogra entrou na cozinha para poder começar a preparar a parte dela.

— E como estamos indo? – Ela perguntou ao acender a luz do forno para poder ver lá dentro.

— Esperando mais um pouco, já está quase totalmente cozido, logo, logo eu vou passar a laranja para que possa ficar dourado.

— Já está cheirando muito bem, daqui a pouco começam a borboletar pela cozinha. – Continuou Dona Amelia.

— Imagino que será questão de segundos do momento em que eu o tirar do forno e colocá-lo na mesa, para que comece a aparecer pessoas por aqui.

— Isso é verdade, ainda mais contando com a família esfomeada que temos. E, se você não tiver mais nada para fazer, não quer me dar uma ajuda aqui não?

Claramente não eu diria “não” para minha sogra, assim comecei a ajudá-la e quando vi, estranhamente acabei ajudando cada um que tinha uma tarefa na cozinha, o que resultou que eu mal saí do cômodo.

Com o jantar já praticamente pronto, só faltando servir nas travessas que iriam para a mesa, finalmente me vi liberta do fogão, fui para o quarto me arrumar e foi nesse momento que o nervosismo que tentei evitar por todo o dia me assolou de forma violenta.

Tinha chegado a hora de contarmos para a família sobre o nosso noivado, – não que eles já não soubessem - porém agora seria oficial.

Caminhei até o quarto tentando não pensar muito em como seria a cena, até porque quem falaria era Alex, foi ele quem pediu a minha mão, eu só tinha que confirmar o pedido. Minha parte era a mais tranquila.

Abri a porta do quarto só para encontrar Alex sentado na beirada da cama, vestido só com a calça social que usaria.

— Achei que você já estivesse pronto. – Comentei.

Ele, estranhamente, não me respondeu.

— Alex?! Alexander! – Tornei a chamá-lo e foi só aí que ele me escutou. – O que aconteceu?

— Eu só... só estava repassando o que eu vou falar hoje.

— Você fez um discurso?! Porque eu... eu não fiz nada.

— Não é um discurso, Kat. Longe disso.

— Então, por que toda essa preocupação? – Eu quis saber, afinal, se ele estava nervoso, eu estava dez vezes mais.

— Eu só não quero estragar o momento.

— Alex, você já me fez o pedido, e não gaste todas as suas ideias aqui, ainda temos Londres.

— Eu sei. Porém... – Ele me olhou como que pedindo que eu entendesse o ponto dele.

— Você quer realmente fazer isso direito, não quer? Quer que o anúncio marque essa data tanto para nós, quanto para sua família.

— Exatamente, Kat.

— Eu só te peço, por favor, não me faça dizer nada além do sim, acho que não vou encontrar as palavras adequadas para discursar hoje.

— Guarde as suas palavras para os votos do casamento.

— Por favor, estamos noivos. Não comece com ideia de casamento. Ainda não!

— Podíamos aproveitar que a Elena ainda é... – Corri na direção de Alex e tampei sua boca com minha mão, me agachando na sua frente para dizer:

Não. Simplesmente não. Eu não estou pronta para passar por toda a provação de se organizar um casamento, de escolher um vestido e me preparar para o grande dia ainda. Por favor, respeite isso. Eu sei que são circunstâncias completamente distintas, Alex, mas eu não estou pronta para viver tudo isso novamente. Por mais que eu não me importe com quem me deixou no altar, eu ainda não superei o fato de que me fizeram de palhaça, de idiota. E isso ainda vai levar um tempo para que eu supere. Você pode entender isso? – Pedi.

Alex, com cuidado, tirou a minha mão de seu rosto e mirou o fundo de meus olhos.

— Quando você estiver pronta, Kat. Te prometo. E vou mais além, não farei o que o Idiota fez com você. Jamais.

— Sei disso, Alex. Com uma certeza que não sei explicar, porém, me dê esse tempo, por favor.

— O tempo que você precisar, Kat.

— Obrigada! – Disse e dei um beijo nele, beijo que fez com que meu noivo se empolgasse demais e quando vimos... – Vamos parando por aqui, porque temos um jantar para ir.

— Acho que posso deixar a comemoração para outra hora. – Alex disse não muito contente.

Dei outro selinho nele e fui para o banheiro me arrumar, quando saí, já pronta e ainda mais nervosa, Alex me esperava, ainda sentado no mesmo lugar, dessa vez brincando com um pente.

— Se importa? – Ele perguntou ao meu mostrar o pente. – Sei que você gosta de fazer isso.

— Folgado. – Brinquei ao pegar o pente e bater nele de leve.

— Pare de fingir, Kat. Eu sei que você adora quando eu te peço para pentear o meu cabelo, ainda mais agora que está comprido.

— Impressionante como seu cabelo cresceu tão rápido. Mais alguns dias e vai dar para amarrar. Melhor eu começar a esconder meus prendedores e elásticos. – Falei ao me ajoelhar atrás dele para arrumar o cabelo.

Já estávamos prontos, era possível ouvir o som das vozes na sala, assim, Alex me pegou pela mão e abriu a porta, parando de repente ao fitar meus pés.

— O que? – Perguntei inocentemente, mexendo meus dedos.

— Kat... se estivéssemos em casa, eu até te acompanharia e ficaria descalço, mas hoje, eu acho que você deveria deixar a tradição finlandesa um pouquinho de lado e calçar um sapato.

Olhei tristemente para meus pés descalços, porém Alex estava certo. Era uma data importante e não era o costume do país ficar descalço dentro de casa. Assim, relutantemente, fui até a mala, tirei um par de saltos e os calcei.

— É só hoje, Finlandesa. Só hoje! – Alex murmurou contra meu ouvido e me deu um beijo na têmpora antes de fechar a porta do quarto atrás de nós.

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O jantar foi logo servido, nas palavras que Dona Amelia falou só para que eu escutasse, já que eu a ajudava a servir as travessas:

— Vamos acabar com essa falação e arrumar tudo para que possamos descansar, pois de todos, você e eu estamos trabalhando desde ontem.

Antes que começássemos a comer, ainda de pé, ao redor da mesa, cada um falou sobre o que era grato neste ano que se passou. E quando chegou a minha vez, eu falei a única verdade que existia.

Eu era grata por Alex ter entrado na minha vida, por ter sido tão bem recebida por todos da família Pierce. E era ainda mais grata por todo o apoio que tinha, não somente da minha família de sangue, mas deles também.

Logo após, pudemos comer. E era hora de saber se eu realmente tinha acertado ao escolher um site na internet para me ajudar a preparar o prato principal.

Alex, assim que mordeu um pedaço do peru, deu um chute na minha canela e sussurrou:

— Até que o Cozinha Para Idiotas ensina direitinho.

O jantar e a companhia estavam excelentes, a conversa dessa vez não envolveu o passado de meu noivo, mas sim alguma espécie de preparação para a ida da família até Michigan.

Pouco antes da sobremesa ser servida, Alex apertou a minha mão, como que me dizendo que estava na hora do anúncio para, em seguida, pedir a palavra.

Todos estranharam o movimento dele e eu tentei disfarçar o meu nervosismo, meio que sem sucesso, mas fiquei mais aliviada ao saber que não era a única, Alex, mesmo de pé, batia o calcanhar no chão, tentando aliviar a tensão.

— E o que você tem para nos falar que é tão importante, meu filho? – Dona Ilsa perguntou, olhando para o neto.

Alex limpou a garganta, abaixou a mão esquerda, claramente procurando pela minha e falou:

— A Kat e eu temos que fazer um anúncio. – Disse de uma vez e me colocou no centro das atenções junto com ele.

Enquanto eu ficava de pé e ajeitava meu vestido, pude ver o sorriso estampado no rosto de minha sogra. Dona Laura também sorria e Dona Ilsa tinha uma expressão de certo orgulho, que eu traduzi como “Finalmente ele vai se casar!”

Will, que já sabia da novidade de forma quase que oficial, simplesmente tirou o celular do bolso e começou a gravar, mesmo que eu tenha pedido para ele não fazer isso.

Alexander, ao invés de se virar para os presentes, se virou na minha direção pegando as minhas duas mãos, me fazendo, por consequência, ficar de frente para ele.

— Eu sei que já te fiz esse pedido e sei a sua resposta. – Ele passou o dedo por cima do anel que ele me dera. – Porém, agora, na frente da minha parte da família, que um dia será a sua também, Katerina, você aceita se casar comigo?

Como Alex tinha dito, eu já tinha dado a única resposta possível a ele, contudo, parecia que esse era o primeiro pedido, porque a emoção era a mesma, eu senti meus olhos se enchendo de lágrimas, minhas mãos tremeram do mesmo jeito e, inconscientemente me peguei sorrindo abertamente quando proferi as seguintes palavras.

— Você já sabe disso, mas sim, Alexander, eu aceito me casar com você! – Falei olhando-o nos olhos.

Alex apertou ainda mais minhas mãos, levou a mão direita aos lábios e a beijou, antes de me dar o beijo que selou o pedido.

Ao fundo, pude escutar que alguém chorava, e antes que nós nos virássemos para a mesa e os presentes, minha sogra já nos abraçava apertado, murmurando o quanto ela estava feliz por ter presenciado esse momento e por, finalmente, termos oficializado na frente da família.

Meu sogro foi o próximo, depois os avós de Alex. Will, estranhamente, estava quieto e calado, só gravando tudo, ou eu achava que estava gravando, pois escutamos as seguintes frases:

— Eu já falei que tenho um timming horrível, mas hoje foi de matar! Perdi o pedido oficial de casamento dos dois pombinhos! – Era Pepper. Pelo visto Will não só tinha gravado como tinha transmitido o pedido para a namorada. – Sejam muito felizes! E me convidem para o casório! Independentemente de onde vocês resolverem se casar, mas se for na Finlândia, que seja no verão, pelo amor de Deus, eu não quero ser um picolé em um vestido de festa!

E foi só depois que Pepper encerrou a chamada, que Will veio nos cumprimentar.

— Bem-vinda à família, Kat, que você se acostume com as loucuras dos Pierce! – Ele brincou como sempre. – E você, Alex, tome juízo, igual a ela, você não vai encontrar mais não!

O restante da noite passou indistinto. Não nos deixaram ajudar na arrumação e nos vimos sentados no sofá da sala, sendo bombardeados por perguntas sobre data, local e que tipo de casamento queríamos.

— Por enquanto, vovó, nenhum! – Alex pacientemente explicava. – Tudo a seu tempo. Já corremos muito com nosso relacionamento até aqui, não precisamos correr ainda mais. – Ele terminou e me abraçou de lado, me levando ainda mais para perto dele.

Dona Laura não ficou muito contente com a explicação, mas me pareceu que tinha aceitado, o que não a impediria de tentar nos convencer a fazer um casamento o mais rápido possível.

O fim do Dia de Ação de Graças, depois que o assunto casamento se encerrou de forma temporária, foi a família reunida em torno da televisão, vendo o primeiro filme de Natal da temporada.

O Grinch.

Eu, que não sou muito fã desse filme, apenas me ajeitei ao lado de Alex, que tinha passado o braço por meus ombros e fiquei ali, mirando a televisão sem prestar atenção em nada, só esperando que alguém dissesse que estava indo se deitar, para que eu pudesse ir também.

Quase uma hora mais tarde, Dona Amelia disse que não aguentava mais e se despediu de todos, e aqui eu vi minha deixa e fiz a mesma coisa, indo para o quarto praticamente no modo de economia de energia, pois nem o olho eu estava conseguindo manter aberto

Tomei um banho rápido e me joguei na cama, Alex não demorou a aparecer e quando se deitou do meu lado, apenas murmurou no meu ouvido:

— Obrigado por ter entrado na minha vida, Katerina. Eu simplesmente não saberia o que eu iria fazer se você não tivesse cruzado o meu caminho naquele sábado pela manhã. – Terminou e enlaçou os braços em minha cintura, me levando a me deitar com a cabeça em seu peito.

Mesmo um tanto grogue de sono, pude falar:

— Obrigada a você, Alexander, por ter salvado a minha vida, mesmo quando nem eu sabia que precisava ser salva. – Murmurei e dei um beijo em seu ombro.

Ficamos ali por um tempo e eu logo cai no sono. Um sono tranquilo e feliz.

 

[1] Boa noite, em alemão.

[2] Bem-vinda à família.

[3] Obrigada.

[4] Claro que não. Em alemão.


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Notas finais do capítulo

E é isso! Espero que tenham gostado tanto do capítulo quanto dos três novos personagens que apareceram!
Vou tentar o possível para postar um capítulo na quarta-feira, mas estou um pouquinho apertada nesse final de ano. O certo é que no dia 25, no dia de Natal teremos capítulo sendo postado!
Muito obrigada a você que leu até aqui e a todos os comentários que recebi!
Até o próximo capítulo!
xoxo



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