Depois que algumas horas procurando, finalmente encontrei o lago na floresta que divide Alfea da Torre Nebulosa. Ficar perto da água, quase fazia com que eu me sentisse em casa.

Toquei os meus dedos na água gelada, me sentindo mais revigorada. Coloquei minha bolsa e casaco de lado e entrei na água. Estava frio naquele dia e embora minhas roupas estivessem encharcadas, eu não sentia nada. Quando estava imersa até a cintura – que era até onde a profundidade do rio permitia –, aproveitei para abrir as minhas asas.

— Bem melhor! – exclamei com um suspiro alegre. Ficar com as asas retraídas o tempo todo é difícil, pois vivi com elas expostas ao longo de toda a minha vida. Mesmo quando o meu reino descobriu os demais e finalmente decidiu se definir como parte de Magix.

Como Stella disse, sou a princesa de um reino selvagem. Eu vim de Andros, o reino aquático de Magix. Por muito tempo nós vivemos em costumes antigos e isolados do mundo ao redor. Demoramos centenas de anos para nos misturar com os demais povos.

Quando meu pai se tornou o rei, ele abriu o reino para o mundo, nos deixando livres também. Foi ideia dele que eu viesse estudar em Magix. E por mais que eu escute alguns sussurros quando caminho pelo corredor, principalmente porque em Andros ainda temos costumes antigos – considerados “selvagens” por algumas pessoas preconceituosas –, isso não me incomoda. Não tenho vergonha da minha origem.

Um dia eu serei a rainha de Andros, e de maneira alguma pretendo fugir do meu dever. Quero continuar o legado do meu pai, preservar nossa história ao longo dos anos e proteger o meu povo. Sinto que estudando aqui em Magix posso aprender muito para quando eu for rainha. Espero que eu esteja certa.

Mergulhei no rio e permaneci imersa por alguns minutos, pensando na grande discussão e reconciliação que eu e as meninas tivemos. Não acho que Stella seja uma pessoa ruim, mas ela precisa decidir pelo que está lutando. Pelo que eu sei, sua irmã é a primeira na linha de sucessão, no entanto, só porque ela não vai ser rainha, não significa que não precisa assumir algumas responsabilidades.

Flora me pareceu tímida no início, mas esse é o jeito dela. Pelo que eu percebi ela gosta de ajudar os outros, o que é muito nobre. As pessoas que debocham dela por ser metade fada, deveriam saber que a origem não tem nada a ver com o caráter. Flora anda muito com a Musa, que é bem caladona. Não acho que a Musa seja tímida como a Flora, sinto que ela tem outro motivo para ser assim.

Já a Bloom fez com que uma luz vermelha acendesse na minha cabeça. Também não acho que ela seja uma pessoa ruim, mas algo nela me incomoda. Talvez seja por ela ser uma fada do fogo enquanto eu sou o seu total oposto? Não sei. Preciso descobrir mais sobre ela. Apesar de que no dia da discussão e reconciliação do nosso grupo, ela falou bem. Parece que ela está começando a se sentir à vontade. Que bom, talvez assim ela se abra mais.

E, ironicamente, a fada com quem divido o quarto no dormitório, a Tecna, é uma garota muito ligada à tecnologia. Apesar de eu ser uma fada que até alguns anos atrás não sabia o que era um celular, nos demos muito bem logo de cara. Acredito que seja por conta de Tecna ser prática e objetiva, assim como eu.

Um ruído na floresta interrompeu meus pensamentos e reflexões. Emergi do rio e olhei para os lados, em busca do que pode ter feito o barulho. Provavelmente era alguma animal.

— Estamos perto demais de Alfea, não acho que esse é o lugar certo. – ouvi uma voz feminina vindo do meio das árvores. Saí voando baixo, peguei a meu pertences e me escondi em um arbusto.

Poderia facilmente ficar em baixo da água escondida, mas o rio não era profundo o suficiente e também era cristalino. Quem quer que fosse, facilmente me veria ali. Além disso, ao contrário do que as pessoas pensam, as asas de uma fada não se tornam inúteis quando são molhadas, principalmente as asas de uma fada de Andros.

— É o que diz no mapa. – uma outra voz disse.

— Será que podemos acabar com isso de vez? Passamos a manhã toda atrás de uma planta! – era uma terceira voz.

— Quer ficar calma? A Torre não vai fugir! – Torre? Será que elas estavam falando da Torre Nebulosa? – Aqui, achei. O último ingrediente da poção, finalmente! – as três mulheres falaram mais alguma coisa, mas eu parei de prestar atenção quando elas mencionaram uma poção. Somente uma criatura mágica recorre à poções, uma bruxa. Eu acho que acabei de me deparar com três bruxas no meio da floresta.

Eu fiquei em silêncio absoluto até as bruxas irem embora. Depois disso eu corri de volta para Alfea e assim que adentrei a escola, bati de frente com Bloom no corredor.

— Aisha, aconteceu alguma coisa? – ela olhou para as minhas costas e só então notei que não retraí as minhas asas de volta. Fechei os olhos e fiz com que elas voltassem para dentro do meu corpo, atraindo alguns olhares.

Segurei a mão de Bloom e a puxei para fora do alcance dos ouvidos do curiosos.

— Eu acho que vi bruxas nas floresta. – sussurrei assustada, enquanto vestia o meu casaco. Minhas roupas ainda estavam molhadas, mas eu não ligava no momento.

Em Andros, a história sobre a guerra das bruxas e fadas impactou todos nós. Nós nunca tivemos nada contra os povos das bruxas, porém quando ouvimos que elas causaram a destruição do maior reino, Domino, ficamos assustados. Era um momento aonde estávamos começando a nos abrir pro resto de Magix, e a guerra fez com que o conselho real de Andros repensasse várias vezes se realmente era uma boa ideia.

— Mas... Isso é possível?

— Não sei. Eu... – abracei meu próprio corpo. Se havia três bruxas soltas por aí, quantas mais poderiam haver? – Acha que devemos contar à diretora Faragonda? – Bloom pareceu pensar no assunto.

— Ou poderíamos investigar por nós mesmas. – ouvimos a voz de Musa acima de nós, fazendo com que eu e Bloom nos assustássemos – Desculpem, não pude evitar de ouvir. – eu estava tão em choque, que sequer percebi que ela estava sentada na escada acima das nossas cabeças.

— Você acha que isso é mesmo uma boa ideia? – Bloom questionou e Musa veio andando até nós. Quando chegou na nossa frente, tirou o fone e colocou as mãos no bolso. Ela parecia mais falante do que o normal, o que era curioso.

— O que faz as bruxas poderosas é a união das energias. Se eram três, não devem estar tão fortes.

— E se forem mais?

— E se forem apenas fadas tentando praticar rituais de bruxaria? – disse Bloom – Pode... Pode não ser nada além de brincadeira.

— Justamente por isso eu acho que a gente devia investigar. – Musa pontuou – Precisamos confirmar a história antes de dizer algo para a diretora Faragonda. E tem mais, só vamos verificar. Não é como se fossemos enfrentar elas.

Eu e Bloom trocamos olhares. Não era uma ideia péssima.

— Certo. O que faremos? – perguntei e Bloom ergueu o celular.

— Primeiro, eu vou chamar as meninas.