Visão tinha a expressão neutra a maior parte do tempo de conversa, salvo quando sorriu para acalmar Wanda, e quando ouviu a confissão ficta dela, quase como se fosse a verdadeira culpada, pela busca da SWORD. Ele franziu levemente a testa, e tinha os olhos consternados fixos nela, como se perguntasse em silêncio “o que houve? Por que está falando disso?”, quase implorando para que ela abandonasse a reunião e conversasse com ele.

Wanda, por outro lado, apenas levantou o queixo e olhou diretamente o seu rosto, concordando com a cabeça e suplicando com os olhos para que confiasse nela. Apesar de se dirigir a todos os presentes, o pedido para que acreditassem em sua fala era especificamente direcionado a Visão. Talvez ela não soubesse o que estava fazendo, e agisse por impulso, porém tinha convicção de que precisava resolver essa situação antes de trazer problemas para os seus amigos.

— Então eu não estava totalmente errada. – Sussurrou Natasha. – O que você sabe a respeito da SWORD, Wanda?

Ela esticou a mão na frente de Visão para impedi-lo de falar, e começou:

— Quando eu e o Vizh fomos ao restaurante aquela noite, nós encontramos uma pessoa que estava na noite em que fomos até a cidade na Inglaterra. Ela conversou rapidamente com o Vizh antes de voltarmos ao esconderijo. – Inconscientemente, tocou o braço machucado, sentindo o queloide por baixo da manga da blusa. – Ele imediatamente reconheceu a mulher no restaurante, e a seguimos até um hotel.

Steve suspirou pesadamente. Provavelmente seria a principal reação de Visão se escutasse aquela versão da história desconhecendo o que efetivamente ocorreu, e se fosse um humano com um sistema respiratório completo.

— E como descobriram a relação com a SWORD? – Perguntou o Capitão.

Visão sentiu que era o momento ideal para se intrometer:

— As roupas dessa mulher possuíam o símbolo que vimos nos drones, e as letras ao redor formando SWORD. – Era péssimo mentir, mas era sua única possibilidade dadas as circunstâncias. Apesar de não vestir o uniforme, não tornando o símbolo identificável durante a conversa no restaurante, Visão vira as roupas penduradas no quarto do hotel, e aquilo era prova suficiente para sustentar a história.

Ainda contrariado, Steve olhou de um lado para o outro, e apenas disse, baixinho e com a voz um tanto ríspida:

— Vocês não podem esconder isso do grupo.

Natasha, um pouco mais suavizada, segurou a mão de Wanda.

— Eles provavelmente só queriam confirmar algo antes de comentar sobre esse assunto. Não é?

Wanda assentiu com a cabeça.

— Não conseguimos encontrar essa mulher, porém eu peço um pouco de tempo. – Tornando o rosto para Visão, continuou: – Só mais um pouco para descobrirmos o que ela quer e por que está nos seguindo.

Milhares de informações imediatamente percorreram os neurônios de Visão: as investigações sobre a Latvéria, a conversa com Monica, e ele sentiu vontade de falar aos colegas o que acontecera. Pedir ajuda. Ao mesmo tempo, eram assuntos concernentes só a Wanda, e era escolha dela contar ou não. Por isso, se manteve em silêncio, sentindo seu peito pesado enquanto Sam interrompia a conversa:

— Só que vocês não podem querer descobrir isso sozinhos, não é mesmo? – Ele apontou para a barriga de Wanda e prosseguiu: – Quero dizer... Você está grávida de duas crianças, e a sua barriga vai ficar enorme daqui a pouco tempo. Esse negócio de ficar se arriscando deve parar logo.

Aflita, os olhos de Wanda procuraram os olhos de Visão, que manteve o rosto neutro ao dizer:

— Eu posso cuidar da Wanda. Além disso, nós dois iremos permanecer boa parte do tempo no esconderijo. Com equipamentos certos, podemos pesquisar sobre a SWORD antes de montarmos um plano de ataque.

Aquelas palavras subiam pelos sistemas internos de Visão queimando o caminho entre suas pregas vocais sintéticas e seus lábios; porém, ele sentiu o ombro de Wanda sob seus dedos descontrair os músculos, antes tensos, e viu que seus colegas provavelmente deixariam de questionar, então, contrastante à sensação de combustão em seu corpo, ele sentiu certo alívio.

— Então posso contar com vocês para descobrirem o que a SWORD gostaria com a equipe? – Perguntou Steve, recebendo em resposta a confirmação de cabeça de ambos, levantando um dedo para finalizar: – Apenas lembrem-se de compartilhar tudo com todos do grupo, e de respeitarem os estágios da gravidez de Wanda.

Ambos Wanda e Visão novamente assentiram, contudo, enquanto esse era sincero em sua fala, aquela tinha certeza, no âmago de seu coração, que não cumpriria com aquela promessa.

Natasha deu um meio sorriso em seguida, iluminando boa parte do ambiente.

— Então, sobre o James... Onde exatamente ele iria dormir? – Ela perguntou. – O quarto que nós usamos está totalmente ocupado, e o outro quarto é do nosso casal. A não ser que eu passe a dormir com a Wanda. – Ela esticou o braço e apertou o braço da amiga com carinho. – Se o pai dos bebês não se incomodar, é claro.

Visão ponderou por alguns segundos.

— Eu não necessito de um descanso regular, porém...

— Visão! – Choramingou Wanda, e Sam deu uma gargalhada, batendo na mesa com um ponho fechado.

Steve também riu, um pouco mais contido, e respondeu:

— Não é necessário separar o casal, salvo se eles quiserem. O Bucky pode dormir no sofá que temos na sala. – Ele suspirou. – Antes de mais nada, precisamos ajeitar aquela sala.

— Também temos o quarto das crianças. – Ponderou Wanda. – O colchão não é muito largo, porém dá para acomodar eu e o Vizh. Qualquer coisa, a Nat fica no nosso quarto, e vocês três ficam no outro quarto.

— Acho que, de qualquer forma, conseguimos nos ajeitar. – Concordou o Capitão América, aliviado. – Então estamos todos de acordo? Levantem a mão se tiverem algo contrário e, caso não, vou conversar com o Bucky para vermos os detalhes da entrada dele no grupo.

Após alguns segundos de silêncio, Natasha levantou a mão:

— Vem cá, quando essa reunião acaba? Não tenho nada contra o James, só quero saber quando podemos sair daqui.

Steve consultou o relógio em seu pulso.

— Agora. – Disse. – Podem sair agora.

Ela puxou o braço de Wanda e as duas saíram porta afora, deixando o restante dos homens da equipe na sala de reuniões.

~.~

Pipoca, chocolates, e várias comidas que certamente deixariam Wanda com azia e a glicose alta, mas quem se importava? Em menos de dois dias ela descobrira a gravidez de gêmeos e vira sua cidade natal dar lugar a outra cidade. O que ela mais queria, naquele momento, era um pouco de paz.

Natasha caíra no sono na porção final de um filme de romance. O quarto dela e de Wanda era praticamente igual, com a diferença de aquele ter um armário menor e um aparelho de televisão pendurado na parede em frente à cama. Os créditos do filme rolavam na tela, e Wanda secava algumas lágrimas, emocionada. Lá fora, havia escurecido, e o silêncio dos corredores mostrava que os demais já estavam dormindo.

Wanda virou de um lado para o outro – a pobre Viúva Negra já estava na ponta da cama para Wanda ter espaço suficiente –, contudo, não conseguia dormir. Lentamente se levantou e, após desligar a televisão, desceu pelo corredor com uma camisola comprida e branca quase arrastando no chão.

~.~

Visão segurava o chaveiro de urso dado por Natasha em uma das mãos, enquanto tinha na outra o cartão de visitas de Monica Rambeau. Estava de costas para a porta aberta, a capa dourada pendendo por suas costas por algum motivo que não saberia recordar. Ele cuidadosamente colocou o presente sobre a mesa e segurou o cartão com as duas mãos; ao virá-lo, notou que o verso era apenas um papel branco com quatro pontas pretas.

Era impossível não ter alguma menção ao símbolo, presente no drone e na roupa pendurada, naquele cartão. Fitou atentamente o pedaço de papel, até que seus olhos notaram um pequeno detalhe.

Rapidamente uniu as pontas pretas, percebendo outros detalhes, e o resultado fora o símbolo de uma espada, dessa vez com o círculo ausente, indicando que aquela organização era a que imaginava ser. Tudo se conectava de uma maneira absurda de tão clara para Visão, o qual quase sentiu que deveria sentar de tão surpreso, até sentir um par de braços ao redor de sua cintura.

— Oi, Vizh.

— Wanda? – Ele sussurrou, olhando por cima do ombro. – Achei que já estivesse dormindo, no quarto da Natasha.

Com o rosto enterrado na capa dourada e macia em suas costas, Wanda negou com a cabeça, apertando mais firmemente seu corpo.

— Não conseguis dormir.

Visão colocou as mãos sobre as mãos dela, antes de virá-la e sentá-la na cama para abraçá-la. Wanda suspirou pesadamente, sentindo o amor rodear todo o seu corpo, e deitando a cabeça no peito do sintozóide.

— Não conseguia dormir. – Suspirou novamente. – Acho que não consigo dormir muito longe de você.

— Concordo. Mas qual o real motivo de tantos suspiros? – Ele questionou.

— Acho que o medo da conversa que tivemos mais cedo. Preciso dar um jeito de convencer a Monica a não nos procurar mais... Aliás, obrigada por ter me deixado mentir.

Ele assentiu.

— Eu estou aqui para acobertar você nessas situações.

Por um instante, Wanda esqueceu as suas preocupações e gargalhou brevemente, mantendo a expressão animada para Visão.

— Você não é obrigada a nada, sabe disso. – Ele disse baixinho. – Mas saiba que eu estou aqui para apoiar no que você quiser fazer.

Diversos pensamentos emergiram na mente de Wanda, que ela silenciou bastante rápido com um beijo nos lábios de Visão. Seu coração ainda batia fortemente pelas cenas intensas do filme assistido com Natasha, portanto, ela levou uma das mãos até o rosto de Visão, posicionando os dedos entre o seu pescoço e o maxilar antes de investir em um beijo mais fundo e passional. Visão, inicialmente assustado, logo correspondera, os dedos entrando pelos fios de cabelo dela enquanto fechava os olhos para sentir o momento. As únicas luzes disponíveis eram o abajur, aceso de apenas um lado da cama, a joia da mente, e o brilho prateado da lua iluminando aquele momento etéreo.

Wanda se afastou e sorriu, para depois beijá-lo novamente. Às vezes, era melhor evitar palavras e apenas se concentrar nos gestos de afeto para agradecer o apoio e tentar esquecer dos pesadelos que a rodeavam.