A Song of Kyber and Beskar escrita por Gabi Biggargio


Capítulo 19
Capítulo XVIII - O templo Sith em Coruscant


Notas iniciais do capítulo

Voltei, meus amores! E, com o capítulo, o meu mais sinceros votos de Feliz Ano Novo! 2021 não foi um ano fácil pra ninguém. Seja pela pandemia, seja pela crise financeira, seja pela escassez, todo mundo sofreu. E, pessoalmente, eu não consigo confiar em ninguém que a essa altura não esteja tomando pelo menos 1 remédio tarja preta hahahaha Brincadeiras à parte, eu desejo a todos um feliz 2022 com muita luz, muita paz e muita benção.

Agora, vamos ao capítulo!



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“O que raios você quer, Qui-Gon Jinn?”, perguntou o holograma de uma Jocastu Nu muito furiosa por ter sido acordada pelo bipe incessante de seu comunicador no meio da madrugada curuscanti. “Eu espero que você tenha um bom motivo ou eu mesma vou te reintregar à Força!”

— Peço infinitas desculpas por te acordar no meio da noite, mestra Jocasta – disse Qui-Gon, sem conseguir conter um sorriso, enquanto sua nave adentrava a atmosfera de Coruscant. – Mas eu preciso de uma ajuda sua.

“Eu vou saber cobrar esse favor um dia, pode acreditar”, ela respondeu, mau-humorada. “O que é?”

— Preciso entrar no Templo Jedi.

Os olhos da Jedi arquivista se esbugalharam e, por cada ruga na pele da mulher, Qui-Gon conseguiu ver raiva. E isso apenas o fazia querer rir ainda mais, mas ele sabia que precisava se controlar.

“Qui-Gon, meu querido”, ele adorava a forma como a mestra Jedi usava a palavra “querido” carregada de ironia, “caso você não saiba, o Templo nunca fecha as portas. Basta se identificar com a segurança e você terá livre acesso.”

— Eu sei muito bem disso, minha querida— ele respondeu. – Mas, caso você não saiba, eu deveria estar fazendo a segurança da Duquesa de Mandalore, o que, no presente momento, está sendo função exclusiva no meu Padawan. Oficialmente, eu nem deveria estar aqui, entende? Por causa disso, eu não quero que a minha visita ao Templo conste nos meus relatórios.

“E o que você quer que eu faça?”

Mas a resposta à pergunta veio na cabeça de Jocasta no momento em que Qui-Gon lhe sorriu maliciosamente. Ela sabia exatamente o que Qui-Gon queria.

— Um passarinho verde me contou uma vez que você conhece algumas passagens secretas pelo Templo – Qui-Gon respondeu. – Mais especificamente, uma para a área restrita dos arquivos, que fica bem perto de onde eu preciso ir.

Jocasta não respondeu imediatamente. Ela ficou em silêncio, sem fazer contato visual, por alguns instantes. Ponderando os riscos envolvidos.

“Esse favor vai te sair muito caro, meu querido”, ela respondeu, por fim. “Vou te enviar a localização de um hangar no nível dezessete. Estarei lá para te guiar, mas eu preciso que me dê alguns minutos. Eu estou velha e completamente sem paciência pros seus problemas.”

— Muito obrigado, minha querida.

Qui-Gon jogou-lhe um beijinho antes de desligar o comunicador, rindo sozinho do gesto e já imaginando o puxão de orelha que receberia da arquivista ao encontrá-la pessoalmente.

 

O grande saguão do Templo Jedi era um lugar muito diferente durante a madrugada. Durante o dia, as imensas janelas laterais permitiam a quase irrestrita entrada dos raios de sol, de forma que nenhuma fonte de luz artificial era necessária. Isso, sem contar o fato de que o local nunca estava vazio: apesar de estarem em quase completo silêncio, sempre havia Jedis e Padawans cruzando de um lado para o outro. Quando a noite caia e todos iam dormir, no entanto, o saguão se transformava: a luz do luar e das estrelas lhe dava um aspecto frio e fantasmagórico, alimentado pelo silêncio sepulcral que não era quebrado nem mesmo por passos.

E, exatamente por isso, Qui-Gon se sentiu terrivelmente exposto quando pisou no saguão vazio em meio à madrugada de Coruscant. Diante de toda aquela imensidão escura e silenciosa, o eco de cada um de seus passos lhe parecia mais alto de que um vaso se quebrando. Uma sensação estranha de que, a qualquer momento, mestre Yoda ou mestre Windu viriam conferir a origem de todo aquele barulho e o encontrariam adentrando o Templo na surdina lhe percorria a cabeça a todo segundo, tirando a sua paz.

Mesmo assim, o Jedi avançou pelo saguão, chegando ao fim e descendo vários lances de escada. Poucas vezes estivera naquele lugar do Templo... não gostava, não se sentia bem... mas, naquele momento, era necessário. Era onde precisava ir. Aquelas figuras misteriosas naquele lugar esquisito haviam lhe dito que deveria enfrentar os Siths. De acordo com as visões que a Força havia lhe mostrado, os Siths estavam retornando. Mas, como não havia, oficialmente, um Sith para enfrentar... um rosto... havia um único lugar em que Qui-Gon sabia que encontraria um: os subterrâneos do Templo Jedi.

Por fim, após muito perambular por escadas e corredores do Templo, descendo cada vez mais para o interior do planeta, Qui-Gon chegou a uma porta. Uma das pouquíssimas portas de todo o Templo Jedi que continha os dizeres “Entrada proibida sem a autorização expressa do Conselho”. Mas, protegido pelo seu anonimato e pelo silêncio da madrugada, Qui-Gon passou por ela mesmo assim.

Atrás dela, havia um espaço arquitetonicamente destoante com o restante de todo o Templo. Uma escada circular que, ao contrário das paredes metálicas, degraus estofados e conectores por toda a sua extensão, era totalmente feita de uma pedra velha e gasta. O único indício de tecnologia eram as luzes (também antigas) dispostas nas paredes. Aquilo mias parecia a entrada de uma ruína do que uma continuidade do Templo Jedi.

Ao olhar para frente, Qui-Gon sentiu um arrepio. Sabia o que lhe esperava ao final. Ele havia ido até ali pouquíssimas vezes em sua vida e se lembrava muito bem de cada uma delas, da sensação inexplicável de medo. Na primeira, fora levado pelo seu mestre, mas mesmo a presença dele não havia sido suficiente para aquietar o seu coração de Padawan, na época, resultando em incontáveis noites de pesadelo.

Conforme avançava pelos degraus, direcionando-se cada vez mais para o núcleo de Coruscant, Qui-Gon sentia sua espinha congelar. E não só porque o lugar se tornava cada vez mais frio, mas porque, como se saindo das pedras da parede, ele conseguisse ouvir... vozes?

 

— Mestre, onde estamos?

Ele descia as escadas logo atrás do mestre Jedi. Esse, diferentemente dele, parecia calmo e sereno como sempre. Mas não Qui-Gon. Ele não sabia se estava frio ou se seu medo era tamanho a ponto de sua pele arrepiar. Seu coração estava acelerado e ele sentia o suor escorrendo pelas suas têmporas. As pontas de seus dedos formigavam e ele conseguia sentir o sangue pulsar em seu pescoço.

— Você sabe o que existe nos subterrâneos do Templo, meu caro Padawan? – perguntou o conde Dookan.

O jovem Qui-Gon, de apenas treze anos, fez que não com a cabeça enquanto sussurrava um tímido “Não”, sem sequer ter certeza de que seu mestre havia ouvido a sua resposta.

— O Templo Jedi de Coruscant foi construído em cima de um Tempo Sith – o Jedi o informou. – Como a grande maioria dos templos Jedi, na verdade. E essa escada é a única entrada conhecida para o templo Sith de Coruscant.

— E o que... estamos indo fazer lá?

O conde demorou alguns instantes para responder. Apesar de carinhoso e sempre muito cortês, o Jedi não era nada paternal, de forma que Qui-Gon interpretou essa demora como uma tentativa intencional de lhe deixar ainda mais tenso e ansioso. Intencional ou não, havia sido bem sucedida.

— Esse não é um lugar que um Jedi deva visitar sem propósito – Dookan começou a explicar. – É um lugar que exige muita responsabilidade e, principalmente, muita maturidade. Por isso o mestre Yoda mantém aquela placa na porta lá em cima. Para manter desavisados e, principalmente, Padawans afastados daqui.

Eles desceram mais alguns degraus antes que o Jedi continuasse.

— Alguns Jedi gostam de vir meditar aqui – ele disse. – Com a técnica certa, a meditação em um lugar tão sombrio como esse pode ajudar a identificar e enfrentar os seus medos. E eu gostaria muito que você tivesse uma experiência dessas, pelo menos uma vez. Quero ver que tipo de coisas eu ainda preciso trabalhar em você durante o seu treinamento e te colocar para enfrentar os seus medos e os seus defeitos me parece um bom caminho a ser seguido.

Finalmente, os dois chegaram ao fim da escada. Alguns poucos metros à frente, no fim de um curto corredor de pedra, havia uma única porta. Feita de uma madeira envelhecida e cuja tranca era apenas uma alavanca de metal fincada em um buraco na soleira. Dookan a destrancou facilmente com a Força enquanto os dois ainda se dirigiam até ela.

Quando o Jedi abriu a porta, Qui-Gon olhou através dela e um arrepiou congelou o seu corpo por alguns segundos quando ele viu apenas escuridão. O pequeno Padawan observou seu mestre imóvel ao seu lado, que o encarava sem nenhuma sentimento em seu rosto. Foi nesse momento que o menino percebeu que seria o primeiro a entrar.

E, talvez, o único.

 

Encarando a porta de metal velha e enferrujada, Qui-Gon se lembrou da última vez que estivera naquele lugar, tantos anos antes, cerca de quatro ou cinco meses após tomar Obi-Wan como seu Padawan. Lembrava-se muito bem do seu desespero e da sua aflição quando passou pelo seu primeiro grande desafio na educação de seu novo Padawan: lembranças recentes de Xanatos e a constante idéia de que iria fracassar novamente o estavam deixando sem dormir há várias noites e ele sabia que uma meditação naquele lugar amaldiçoado poderia ajudá-lo a enterrar esses sentimentos de uma vez por todas. Ou intensificá-los.

  

— Mestre, o que estamos fazendo aqui em embaixo? – perguntou um jovem Obi-Wan. Não tão jovem quanto o próprio Qui-Gon era quando fora levado até aquele lugar pela primeira vez, mas, ainda assim, jovem. Dezesseis anos, talvez. Ou menos. Mas não mais do que isso. Uma criança, apenas...

— Eu acredito que saiba que lugar é esse, não sabe?

Um pouco inquieto (mas tentando mostrar mais coragem do que realmente tinha), Obi-Wan fez que sim com a cabeça.

— Ótimo – Qui-Gon lhe sorriu amigavelmente. – Isso torna tudo mais fácil?

— Tudo o quê, mestre?

O Jedi, então, avançou até ele e se curvou ligeiramente, mas o suficiente para que os olhos dos dois estivessem no mesmo nível. Queria conversar com seu Padawan de igual para igual.

— Esse templo Sith é um lugar polêmico – respondeu Qui-Gon. – Os mestres do Conselho não proíbem que tragamos os nossos Padawans aqui, mas pedem para que não façamos isso. Dizem que esse é um ambiente cheio de tentações e sentimentos do lado sombrio. E realmente é. Mas eu discordo deles. Acho que os Padawans tem que ser trazidos aqui o mais cedo possível. É um lugar desafiador até para o melhor dos Jedi, mas eu quero que você tenha a experiência de meditar aqui. Isso já me ajudou algumas vezes, e acho que vai ajudar de novo. E eu espero que seja uma experiência diferente pra você também.

— E o que você quer que eu faça, mestre?

Qui-Gon olhou para o seu Padawan por alguns instantes, sem saber ao certo como passar aquela informação. Por fim, após alguns segundos, ele soube que não haveria forma de fazer isso sem deixa-lo assustado. Era uma golpe que o menino precisaria sofrer.

— Lá dentro, não estaremos sozinho – disse ele. – Você vai ouvir as vozes de Siths que já morreram. Quero que converse com eles. Quero que deixe eles verem o fundo da sua alma, quero que eles conheçam os maiores defeitos do Obi-Wan. Eles vão tentar usar isso contra você, usar esses defeitos como uma fraqueza para te atrair para o Lado Sombrio.

Obi-Wan não precisou dizer absolutamente nada para que Qui-Gon soubesse que o menino sentia calafrios: ele adotara uma postura rígida e a pele de seu rosto estava pálida. Evidentemente, assustado.

— Mas você não vai deixar isso acontecer – Qui-Gon continuou. – Vai ouvir cada coisa que eles disserem pra você. E, depois, vamos estudar cada um dos seus defeitos que eles apontarem. E vamos trabalhar neles. Vamos corrigir o que puder ser corrigido e aprender a conviver com o que não puder. Você me entendeu?

O adolescente apenas fez que sim com a cabeça.

Qui-Gon lhe sorriu novamente e retornou a postura ereta, avançando contra a porta de metal e a destrancando. Ao abrí-la, ele viu a escuridão. A mesma escuridão que sempre lhe congelava a alma.

— Está com medo?

Novamente, mudo pelo pavor, Obi-Wan apenas balançou a cabeça afirmativamente.

Como um pai disposto a proteger o filho, Qui-Gon lhe estendeu a mão.

— Venha, pegue a minha mão – ele disse com ternura. – Nada de ruim vai te acontecer enquanto estiver comigo. Nunca!

O Padawan hesitou por um instante antes de, por fim, avançar e segurar a mão de seu mestre. Enquanto os dois avançavam para o interior do Tempo Sith, Qui-Gon lhe sussurrou “Fique perto de mim” e, quase no instante seguinte, as vozes dos Siths antigos começaram a ecoar nas cabeças dos dois.

 

A escuridão do templo Sith era perturbadora. Um arrepio constante na alma, como se em cada centímetro daquela penumbra, uma alma diferente estivesse à espreita, esperando pelo melhor momento para atacar. E as vozes. Ah, as vozes... Começavam como um zumbido esquisito. Em um primeiro momento, era comum se pensar em um zumbido causado pela diferença de pressão, dada à profundidade em que o templo se localizava da superfície. Mas, com o tempo, esse zumbido se transformava em um sussurro e, desse, em vozes claras e nítidas. Vozes perturbadoras e ameaçadoras. Como se a própria morte estivesse ao seu lado, enfurecida.

Com o tempo, os olhos se acostumavam com a escuridão do templo. E, nesse momento, era possível ver que não se tratava de um lugar muito amplo. Apesar das extensas pilastras que sustentavam um imponente teto de pedra, era possível ver que o templo se constituía de um amplo espaço vazio e, ao centro, um tablado quadrado, feito por uma pedra antiga e já muito desgastada. E, ao centro do tablado, uma estrutura retangular de pedra maciça. Um altar. Um altar onde, segundo o próprio Dookan, muitos Jedi já haviam sido assassinados antes.

“Então, você voltou, Qui-Gon Jinn”, uma voz maligna e sanguinária ecoou em sua mente.

Qui-Gon não lhe deu atenção. Nunca dava. Sabia que aquelas vozes apenas queriam diminuí-lo. Colocá-lo em um lugar o qual não pertencia. Ao contrário, ele continuou o seu caminho em silêncio, avançando a passos lentos em direção ao altar.

“Ah, sim...”, a voz continuou. “Você acha que tem um papel importante a desempenhar, não é? Acha que é uma espécie de quê? De messias?”

De forma alguma... Jamais um messias. Nos desígnios da Força, Qui-Gon tinha certeza que não passava apenas de um simples peão, aquele que dava o primeiro movimento e deveria estar pronto a se sacrificar quando necessário. E, pelo que descobrira bem recentemente, era exatamente esse seu papel: trazer para a Ordem Jedi alguém mais importante do que ele e morrer no momento em que fosse necessário.

Em nome de um bem maior.

“E você acredita que vai conseguir cumprir com o seu papel?”, a voz estava determinada em vê-lo sucumbir. “Quantas vezes você já falhou em seus deveres? Por sua culpa, Xanatos caiu para o Lado Sombrio. Por sua culpa, Obi-Wan se desviou da Ordem Jedi e jamais se tornará um cavaleiro. Você já falhou com duas vidas, Qui-Gon. Está disposto a condenar uma terceira? Está disposto a condenar essa garoto que nem conhece?”

Ele não ia falhar. Não dessa vez. Não podia. Não quando a Força propriamente dita lhe incumbia uma tarefa. Ele encontraria o tal garoto e faria o seu possível para que, um dia, ele se tornasse um Jedi. Aquele que traria equilíbrio à Força. E iria morrer quando fosse necessário. Não iria falhar.

Não dessa vez.

“Você não tem garantias disso, Qui-Gon”, a voz continuava. “Você já deu o melhor de si tantas vezes antes, e veja onde tudo isso te levou... A uma vida sem a confiança de seus superiores, precisando se provar para garantir que seja respeitado e tratado com dignidade entre os seus iguais. A uma vida onde o seu maior objetivo é morrer. Todo o seu esforço só te trouxe o fracasso!”

— Eu não busco poder – pela primeira vez, Qui-Gon respondeu.

“Mas você gosta do poder.”

Nesse momento, o Jedi parou de caminhar.

— O que disse?

“Como você se sentiu quando matou aquele homem em Dantooine? Não minta pra mim, Qui-Gon. Nós dois sabemos muito bem como foi. Você se sentiu poderoso. Você se sentiu invencível! Ter a decisão entre a vida e a morte dele na sua mão... sua opção... E você gostou.”

— Mentira – Qui-Gon rebateu imediatamente.

“A quem você está tentando enganar, Qui-Gon? Você se sentiu forte... como nunca se sentiu na vida... como nunca os Jedi deixaram você se sentir. E isso te fez bem. As broncas do Conselho apenas te fizeram se sentir mal. Não porque sua imagem estava manchada diante dos seus superiores, mas porque você finalmente percebeu que eles jamais iriam te apoiar. Você sentiu raiva deles. E a sua raiva alimentou o seu prazer pelo poder. E você quer se sentir assim de novo... poderoso... mas teme que isso se transforme em um vício... um vício que você não consiga controlar. Você teme que sua sede por poder seja a sua ruína e, por isso, prefere se esconder atrás da imagem do Jedi humilde que se arrepende de seus atos e que deve justificativas aos seus superiores. Que deve provar que ainda é leal!”

Qui-Gon riu. Pois sabia que aquela era uma interpretação possível. Sabia que aquela tinha sido, inclusive, a leitura que o Conselho havia feito dele. Afinal, era por isso que eles queriam testá-lo, para ter certeza de que estavam errados em seu julgamento. Mas não havia leitura mais errada na galáxia e Qui-Gon sabia a verdade.

— O que eu fiz não foi certo e não foi errado – começou o Jedi. – Foi o necessário. O certo e o errado é uma questão de ponto de vista. Todo o poder que eu exerci na situação foi me dado pelo Conselho e pelas autoridades locais. Eu posso não ter usado esse poder da forma que o Conselho gostaria que eu tivesse usado, mas foi o poder que eles me deram. Mas em momento algum em cobicei mais poder. Eu usei o poder que eu tinha da forma que me pareceu adequada, apenas. E talvez esse seja o meu conflito com o Conselho: enquanto eles acreditam que nós devamos abdicar totalmente do poder, eu acredito que nós podemos usá-lo quando necessário. E isso não me faz menos Jedi ou mais Sith. Isso apenas me aproxima do equilíbrio. O meu medo nunca foi perder o controle do meu poder, mas não saber usá-lo quando necessário. E, se existe algo que eu aprendi nos últimos dias, é que eu exerci o meu poder da forma mais adequada possível. Eu fui honesto ao que acredito e não é um Conselho de Jedi ultrapassados ou um Sith ardiloso que vão me fazer pensar o contrário.

A voz riu, quase como se zombasse dele.

“É mesmo?”

Instantaneamente, Qui-Gon foi retirado do templo Sith. Quase como em um sonho, Qui-Gon se viu novamente em Takodona. E, sem que pudesse controlar seus movimentos, seu braço descreveu velozmente um arco à sua frente e a palma de sua mão estapeou o rosto de Obi-Wan. Por uma fração de segundo antes de ser trazido de volta ao templo, Qui-Gon pode ver a expressão de choque no rosto de seu amado Padawan.

“Como você se sentiu?”, a voz lhe questionou, em um tom sugestivo e malicioso. “Como se sentiu quando soube que o seu aprendiz não teria coragem de reagir? Quando percebeu que ele jamais teria feito o que você fez? Que ele não tinha coragem pra fazer isso? Que ele não tinha coragem para devolver o tapa que você tanto merecia receber? Poderoso, não foi? Você tinha domínio sobre ele. Tinha autoridade. E você usou dela pra descarregar a sua raiva. Como você se sentiu?”

Qui-Gon tinha a resposta na ponta da língua. Não, ele não tinha se sentido poderoso.

— Arrependido – ele assumiu, enfim.

Então, houve silêncio. A voz não respondeu. Mas a outra pessoa na escuridão do templo Sith sim.

— Muito interessante a sua visão é, Qui-Gon Jinn. Sobre o Conselho, principalmente.

Assustado pela voz arrastada e rouca, o Jedi se virou repentinamente e seus olhos encontraram os do mestre Yoda a poucos metros dele.

— De você, porém, eu discordo – disse o Grão-Mestre do Conselho, caminhando a passos lentos até ele. – Mas a sua opinião eu admiro.

Por alguns instantes, Qui-Gon permaneceu em silêncio. Pego de surpresa, sua primeira reação seria pedir desculpas, mas, caso ele o fizesse, apenas confirmaria todas as acusações que a voz Sith havia feito: temendo a sua posição dentro da Ordem, ele estaria recuando diante de seus superiores. Racionalmente, portanto, ele não pediria desculpas por nada do que disse.

— Não peço perdão pelas minhas palavras – disse ele, por fim. – Mas lamento que elas tenham chegado a você dessa forma, em um momento e em um local tão inoportunos.

“Hum”, foi apenas o que o mestre Yoda lhe respondeu. Um grunhido. E Qui-Gon não sabia dizer se aquilo significava que ele estava expulso da Ordem Jedi ou não.

— Venha comigo – Yoda passou por ele, o bater ritmado de sua bengala no chão ecoando pelo templo Sith.

O som da bengala do Grão-Mestre ecoava pelo templo Sith. Sentindo-se um pouco envergonhado por ter sido observado (e, principalmente, se sentindo derrotado por ter sido pego em sua entrada furtiva no Templo Jedi), Qui-Gon não ousou contestar a ordem: ele acompanhou Yoda em direção ao coração do templo Sith.

Após caminharem por alguns segundos, os dois chegaram ao tablado quadrado central. Yoda subiu os dois degraus à sua frente e continuou caminhando, parando a poucos metros do centro do templo, onde um altar retangular de pedra se erguia.

— O que você vê? – ele perguntou, olhando para o altar, no momento em que Qui-Gon parou ao seu lado.

— Um altar – Qui-Gon respondeu. – Até onde eu sei, muito utilizado para sacrificar Jedi no passado.

— Certo você está – Yoda respondeu. – Mais nada?

O que mais ele deveria ver? Qui-Gon pensou por alguns instantes, pensando se aquilo se tratava de alguma forma de brincadeira ou se era mais algum ensinamento que Yoda tentava lhe passar. Por fim, após muito pensar, o Jedi resolver ser sincero.

— Mais nada, mestre.

— Diante de um túmulo você está – respondeu Yoda. – Sabe de quem?

Qui-Gon apenas fez que não com a cabeça.

— Darth Nihilus – Yoda respondeu. – A história dele, conhece?

— Ele perdeu a família e todas as suas posses para a guerra – respondeu Qui-Gon. – Seu planeta foi totalmente dizimado, mas ele foi o único sobrevivente. Mesmo ferido, ele sobreviveu a fome física, mas cedeu à fome da alma e passou o resto da vida buscando por poder, acreditando que isso iria aliviar a dor e o pesar que sentia. Ele dizimou civilizações e planetas esperando encontrar uma paz que nunca obteve e morreu sem jamais ter satisfeito a sua fome por poder.

Yoda respirou fundo antes de estender o braço para o altar.

— Correto você está.

Imediatamente, a tampa retangular de pedra do altar foi erguida pela Força, mantendo-se flutuando cerca de três metros acima do chão. A passos lentos, Yoda avançou, tendo Qui-Gon logo atrás dele.

— Em um holocron, Darth Nihilus seu espírito conseguiu conter – explicou Yoda, parando em frente ao altar. – Assim como na sua armadura. Enterrado inicialmente em Korriban ele foi. No transporte para esse templo, milhares de anos atrás, os escravos Sith ele perturbou. Alguns ele enlouqueceu. Para o seu espírito conter, quebrada em um ritual sua máscara foi. Mas de nada adiantou.

Qui-Gon, em silêncio, passou por Yoda e, finalmente, olhou para o buraco deixado pela tampa de pedra. Em seu interior, via-se um tecido preto muito velho e empoeirado, com mangas se encontrando sobre o topo, onde ossos de mãos humanas repousavam sobre um sabre de luz. Logo acima, era visível uma máscara branca partida em dois pedaços.

E, ao olhar nos buracos correspondentes aos olhos da máscara, Qui-Gon sentiu um arrepiou. Era como se algo sussurrasse em seu ouvido. Como se a mesma voz com a qual estivera conversando instantes antes voltasse a se fazer presente, ecoando dentro da sua cabeça.

— Enfrentar Darth Nihilus você veio?

— O quê? – Qui-Gon se virou para encarar o mestre Yoda.

Mas, assim que o fez, ele se lembrou do que aquelas figuras flutuantes haviam lhe dito. Ele deveria enfrentar os Siths e os seus medos.

— Acha que pronto está para se expor a um Lorde dos Sith?

Lentamente, o Jedi se virou para encarar os restos mortais de Darth Nihilus. Era quase como se ele sussurrasse em seu ouvido. Uma voz que o provocava. Quase como se o chamasse. Como o tentasse seduzir.

— Menos Jedi não estar pronto para enfrentá-lo não faz de você – Yoda avançou, permanecendo imóvel ao seu lado. – Nem menos sábio. Nem menos competente. O tipo de resposta que procurando estiver jamais irá encontrar se pronto não estiver. Mas enfrentá-lo sem pronto estar, do caminho Jedi apenas irá se afastar. Muitas são as tentações do Lado Sombrio. E é das mentes despreparadas que ele se alimenta. Suas limitações reconhecer, um exercício de humildade é. Jamais uma fraqueza.

Qui-Gon permaneceu imóvel, olhando para a máscara partida de Darth Nihilus no interior do túmulo.

Lentamente, o Jedi estendeu a mão e se aproximou.

— Cuidado você deve tomar – Yoda o alertou.

Mas Qui-Gon o ignorou por um instante.

E, então, ele tocou a máscara. E foi como se o espírito de Darth Nihilus se manifestasse nele naquele exato instante: a ponta de seus dedos em contato com a máscara pareceram congelar e todo o seu corpo foi tomado pela fome. Uma fome estranha. Uma fome que fazia o seu estômago gritar, mas, ao mesmo tempo, dava-lhe o desejo pelo poder. Uma ânsia incontrolável por poder fazer o que bem entendesse sem precisar prestar satisfações e sem precisar ter medo de suas consequências.

Quase que imediatamente, ele se viu, novamente, executando o tirano de Dantooine. Mas, dessa vez, não houve dúvida quanto à legitimidade de seu ato. Houve o prazer de ver o homem implorar pela sua vida enquanto colocava os braços a frente de seu rosto para, inutilmente, se defender do golpe que tiraria a sua vida. Houve prazer em ter o poder de decisão na sua mão. A vida ou a morte daquele homem dependente de seu julgamento e... mais do que isso... da sua vontade.

Quase que imediatamente, ele se viu, novamente, estapeando Obi-Wan. Mas, dessa vez, não houve arrependimento. Houve prazer. Exatamente como a voz descrevera antes, a sensação de ser vitorioso, de agredir e humilhar o Padawan sabendo que ele não teria coragem de reagir. Mas esse ato covarde não o fez se sentir arrependido e envergonhado, mas poderoso. Quase como se essa sensação sempre tivesse existido, mas ele tivesse tentado suprimi-la desde sempre, preferindo acreditar que seu próprio arrependimento era maior que a sua sede por poder.

Assustado, Qui-Gon afastou a mão velozmente.

— Preparado, você não está – mestre Yoda verbalizou o que Qui-Gon já sabia. – Envergonhado, você não deve se sentir. Muito a refletir e a aprender, você ainda tem. Retornar até aqui, você deve, quando pronto estiver. Demore o quanto for preciso.

Qui-Gon quase não prestou atenção no que Yoda lhe dissera. Em choque, ele observava as pontas de seus dedos que haviam tocado a máscara de Darth Nihilus. Ainda gélidas, como se toda a sua carne por baixo da pele tivesse sido congelada.

Com um movimento do braço, mestre Yoda baixo a tampa de pedra retangular do altar, selado, novamente, a tumba de Darth Nihilus.

— Perguntar sobre esse sabre de luz em seu cinto, eu não vou – o Grão-Mestre riu. – Quanto ao porquê com a Duquesa você não está, também não. Fingir que esse encontro nunca aconteceu, eu vou. Para o mestre Windu, contar sobre nada disso eu vou.

Isso retirou Qui-Gon de seu transe. O Jedi olhou para Yoda e, após alguns instantes, riu. Embora ainda estivesse assustado com o que havia experenciado, a certeza de que não seria denunciado ao restante do Conselho o deixou mais calmo.

— Obrigado, mestre.


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Notas finais do capítulo

E, nesse capítulo, introduzi o Darth Nihilus, o meu Sith favorito do Legends! Espero muito que tenham gostado da participação dele, porque veremos um pouco mais dele no decorrer da fanfic hahaha

Por favor, comentem! Adoro interagir com vocês e saber o que estão achando.

Beijinhos de luz!



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