A Song of Kyber and Beskar escrita por Gabi Biggargio


Capítulo 15
Capítulo XIV - A nova rainha


Notas iniciais do capítulo

I'm back, monamores
Mais um capítulo com uma participação MEGA especial! Espero muito que gostem ♥

Beijinhos!



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Visto de espaço, Naboo talvez fosse um planeta tão bonito e apaixonante quanto Alderaan (ou até mais): imensos continentes verdes cercados por imensos oceanos embaixo de imensas nuvens. Já na atmosfera, tudo isso se convertia em uma paisagem florestal marcada por uma vida exuberante e por céu de um azul hipnotizante. A comparação com Dagobah chegava a ser desleal.

Após sobrevoarem o oceano por alguns minutos, a nave chegou ao litoral, que se formava em uma imensa escarpa esbranquiçada em cuja base as ondas se quebravam, respingando gotículas intermináveis de água, subindo e descendo e permitindo que um tímido arco-íris se formasse vez ou outra. Já sobre o continente, milhares de cachoeiras dominavam a paisagem, por vezes formanda cataratas de uma água cristalina impossível de ser encontrada em qualquer outro lugar da galáxia.

E, no meio delas, Theed, a capital. Uma jóia perdida em meio a toda aquela natureza, a cidade em si era um museu: uma arquitetura majestosa e, ao mesmo tempo modesta, com estátuas dispostas em absolutamente todas as ruas, centenas de praças e fontes espalhadas a cada quarteirão. A cidade parecia ter sido tirada do coração do mais maravilhoso conto de fadas.

Qui-Gon guiou a nave até os limites da capital, pousando há quase um quilómetro de seu perímetro. Bem em tempo de ver o sol se por no horizonte, tingindo todo o céu daquele lugar espetacular em um degradê de cores que variava do azul ao turquesa, passando pelo laranja e pelo rosa cintilante.

— Talvez, tenhamos chegado um pouco tarde – comentou o mestre Jedi ao ver as primeiras estrelas surgindo no céu. – Vamos passar a noite aqui. Amanhã pela manhã, irei até Theed ver o que posso fazer.

O fato era que Qui-Gon falava quase que para si mesmo. Afinal, nem Obi-Wan e nem Satine faziam a menor idéia do porquê estavam lá. O Jedi apenas havia dito que precisava de uma nave, mas... eles já tinham uma...? De qualquer forma, os dois jovens estranhavam a forma como o mestre se comportava: desde que acordara do sono induzido por Quinlan Vos, Qui-Gon passava a maior parte de seu tempo meditando ou tendo idéias absurdas e incoerentes, como explorar um pântano inóspito sem nenhum objetivo aparente.

Por isso, naquela noite, quando Satine já estava dormindo, Obi-Wan procurou seu mestre. Havia muito que os dois precisavam conversar. Não apenas sobre aquele comportamento anormalmente estranho de seu mestre nos últimos dias. Mas também sobre a briga que haviam tido mais de duas semanas antes. Uma briga ainda sem resolução e que, em seu íntimo, ainda deixava o jovem aprendiz abalado. Não só por ainda se sentir ofendido, mas por se sentir culpado, principalmente com tudo o que se seguiu.

Qui-Gon estava do lado de fora da nave. Ele havia feito uma fogueira e estava sentado ao lado dela, envolto em uma coberta pra se proteger do frio noturno de Naboo enquanto observava as estrelas e se contentava em apreciar o som do vento e o crepitar das chamas esquentando a água para o seu chá. Sem tentar ser sorrateiro, Obi-Wan se aproximou de seu mestre. Ao notar os passos atrás de si, Qui-Gon virou o rosto para o lado para conseguir olhar para trás.

— Obi-Wan! – ele chamou. – Venha aqui, sente comigo. Quer chá?

— Por favor – disse o rapaz, sentando-se ao lado de seu mestre e se enrolando na coberta que ele mesmo trazia.

Qui-Gon retirou o bule das chamas e encheu a própria xícara (a única ali) e a entregou para Obi-Wan. O rapaz sentiu a porcelana esquentar as suas mãos ao tocá-la e, de forma semelhantemente satisfatória, sentiu o chá esquentar o seu corpo quando bebeu o primeiro gole.

— Mestre, eu acho que precisamos conversar – disse o aprendiz, por fim, logo após devolver a xícara a Qui-Gon.

— Sim, eu também acho – o Jedi concordou. – Na verdade, já devíamos ter conversado há um certo tempo.

Contudo, pela forma como Qui-Gon havia dito tais palavras (um tom pensativo, o olhar fixo no horizonte estrelado de Naboo), Obi-Wan tinha quase certeza de que os dois não estavam se referindo à mesma coisa. Por isso, ele resolveu se adiantar, antes que a conversa que planejava tomasse um rumo completamente oposto.

— Eu queria me desculpar – disse Obi-Wan. – Pela forma como me exaltei com você e como falei. Por mais que já tenhamos passado a ter uma relação muito mais próxima, você ainda é meu mestre e eu devo respeito a você. E continuo devendo respeito mesmo quando você deixa de ser meu mestre e passa a ser um pai pra mim. A forma como afrontei você em Takodona foi um desrespeito a você nesses dois sentidos. E eu peço desculpas.

Qui-Gon olhou para o rapaz. Havia satisfação e também surpresa em seu olhar. Quase como se estivesse... emocionado?

— Eu não imaginava que você me via como um pai – proferiu o Jedi. – Isso me deixa muito feliz. Você é um filho pra mim, Obi-Wan. Eu imaginava que esse sentimento era unilateral, mas fico profundamente feliz em saber que estava errado. E eu te desculpo. Na verdade, eu entendo o tipo de sentimento que você devia estar tendo em relação a mim durante a nossa briga em Takodona e, de certo ponto de vista, eu também gostaria de te pedir desculpas.

Obi-Wan olhou curioso para seu mestre que, em resposta, optou por um silêncio temporário enquanto oferecia ao seu aprendiz, mais uma vez, a xícara de chá. Obi-Wan aceitou em igual silêncio, esperando que Qui-Gon se explicasse.

— Eu não devia ter dito as coisas que disse – o Jedi começou. – Continuo achando as mesmas coisas que achava na ocasião, mas, seja lá o que você esteja sentindo por Satine... esteja eu certo ou não em meu julgamento... é algo real pra você. E, se isso te faz se sentir bem, não sou eu quem deve dizer se é certo ou errado. O que é certo ou errado pra você só você mesmo pode decidir. Claro que os mestres do Conselho tem suas próprias idéias quanto a isso e iriam me silenciar se soubesse que estou falando isso pra você. Mas, seja lá o que você decidir, eu quero que saiba que eu vou te apoiar e te ajudar. Se você quiser seguir o caminho Jedi e se tornar um cavaleiro, eu estarei com você como sempre estive. E estarei com você se quiser abandonar a Ordem e seguir o seu próprio caminho, seja com Satine ou com outra pessoa.

O aprendiz ouviu tudo aquilo em silêncio, quase mortificado. Depois da briga dos dois  no castelo de Maz, ele jamais imaginaria ouvir Qui-Gon dizendo essas palavras.

— Eu... agradeço a compreensão... mestre – Obi-Wan balbuciou, devolvendo a xícara.

— Eu só quero te pedir que, seja lá o que você decidir, que seja uma decisão consciente – Qui-Gon continuou. – Pense muito bem nas suas opções. Não quero que pense em mim ou em como eu vou me explicar para o Conselho. Esse problema é meu e dele cuido eu. Mas, pela Força, eu enfrentaria mil vezes o Conselho para não ver você infeliz porque se arrependeu de uma decisão tomada de forma impulsiva. Como eu disse, você é um filho pra mim, e imaginar um cenário desses é a pior coisa que eu posso pensar diante disso tudo.

Mestre e aprendiz permaneceram em silêncio por alguns segundos. Segundos nos quais Obi-Wan conseguiu sentir, no olhar e no sorriso de seu mestre, o quanto o Jedi o amava e se preocupava com ela. Um amor e uma preocupação que iam além da relação primordial dos dois. Um amor e uma preocupação no qual Qui-Gon apenas queria ver Obi-Wan feliz e bem, e pouco lhe importava se isso significava Obi-Wan seguir os caminhos Jedi ou não.

Naquele momento, não eram mestre e aprendiz. Os dois eram pai e filho.

— O que você sente por ela? – Qui-Gon perguntou, por fim.

E ali, sob a luz das estrelas de Naboo, o Jedi finalmente estava permitindo que Obi-Wan abrisse o seu coração para ele. Como ele havia tentado em Takodona e Qui-Gon fora insensível demais para permitir que ele o fizesse.

Obi-Wan engoliu em seco.

— Eu acho que não sei mais – ele respondeu da forma mais sincera que conseguiu. – Por um lado, as vezes eu acho que você está certo quando diz que eu só estou atraído por ela. Digo, eu sinto... por favor, não faça dizer isso em detalhes...

Qui-Gon riu, levantando a mão como se disse que Obi-Wan não precisava fazer aquilo. Ele havia entendido muito bem o que o rapaz quisera dizer.

— Mas eu também acho que não é só isso – o aprendiz continuou. – Na verdade, as vezes eu acho que é muito mais do que isso. Apesar do jeito mandão e da personalidade forte e dominadora que ela tem, eu me sinto bem perto dela. Na verdade, eu acho que é exatamente isso que eu gosto nela. Ela me faz sentir bem. Bem como eu acho que eu nunca me senti na vida. E, perto dela, eu não quero saber de mais nada que não seja ela. Mesmo eu não sabendo nada sobre ela. Digo... eu conheço ela há quase dois meses, mas, perto dela, eu me sinto tão eu mesmo como eu nunca me senti na vida... É estranho, não acha?

— Muito! – concordou Qui-Gon. – Mas acredite em mim quando eu digo que eu te entendo. E existe uma palavra pra isso, Obi-Wan. Uma palavra que explica toda essa sensação estranha que você tem.

O aprendiz permaneceu em silêncio, esperando, curioso, que Qui-Gon continuasse.

— Você está amando – o Jedi concluiu seu pensamento. – Porque o amor não é pra ter lógica ou sentido. É para ser estranho, irracional e... porque não?... impulsivo. Quer você queira ou não, quer você conheça detalhes sobre Satine ou não, o que você está sentindo por ela é amor. E desejo, também, é claro... faz parte também... mas, acima de tudo, amor. E quem seria eu se te julgasse por se sentir assim? Diante de tudo isso, você poderia sentir tantos sentimentos ruins... inveja, ciúmes, cobiça... mas você cedeu ao mais belo deles. E, por isso, mais uma vez, eu peço desculpas pelo que houve em Takodona. Eu jamais deveria ter te chamado de mentiroso. Aquilo foi errado em tantos níveis que eu não sei por onde começar a me explicar ou me desculpar.

Dito isso, Qui-Gon deu um gole do chá, olhando fixamente para o horizonte, no exato ponto em que era impossível distinguir se a fina faixa de luz que via era proveniente das estrelas ou dos prédios iluminados de Theed durante a noite. Mas Obi-Wan manteve o olhar fixo em seu mestre por alguns segundos, processando tudo o que havia acabado de ouvir.

Qui-Gon, em nenhum momento, havia lhe dito o que fazer. Ele estava dando ao rapaz a liberdade de escolher. E a confiança de que receberia apoio, independentemente de qual fosse essa escolha. E nada na galáxia poderia ser mais precioso e reconfortante do que isso.

— Obrigado, mestre – o aprendiz conseguiu balbuciar após um tempo.

Dito isso, Obi-Wan voltou seu olhar para a mesma direção que seu mestre.

— Mas acredito que haja outra coisa que tenhamos que conversar – interrompeu Qui-Gon.

— Sim – Obi-Wan concordou, estendendo a mão para Qui-Gon que, imediatamente, lhe passou a xícara.

Por cima da xícara, Obi-Wan encarou o seu mestre. Em silêncio, os dois contemplavam pensativos, em dúvida sobre o fato de estarem se referindo ao mesmo tema.

— Vai me falar sobre o que você viu durante o seu sono? – Obi-Wan arriscou.

— Precisamente – o Jedi confirmou.

— E o que foi?

Qui-Gon permaneceu em silêncio, pensando em como passaria aquela informação ao seu aprendiz.

— Eu não sei – ele foi o mais sincero possível.

Vendo a expressão de dúvida no rosto de seu aprendiz, Qui-Gon resolveu se explicar.

— Não era um sonho – ele continuou. – Eu estava lá. Completamente lúcido e consciente das minhas ações. Mas eu não sei que lugar era aquele. Não faço idéia de onde seja ou como voltar para lá. Mas eu ouvia vozes. Vozes do passado e... pelo menos, eu acho... do futuro.

— Do futuro? – Obi-Wan questionou, sem conseguir evitar encarar seu mestre como se ele estivesse enlouquecendo

Qui-Gon fez que sim com a cabeça.

— E, dentre várias coisas, eu acho que tive uma premonição da minha morte.

Obi-Wan se lembrava de Qui-Gon ter dito isso antes na nave. Mas não entendia como aquilo fazia sentido.

— Posso estar errado, mas acho que vai acontecer em um futuro breve – Qui-Gon arriscou. – E você estava lá, eu pude ouvir a sua voz enquanto eu morria. Mas, o mais curioso é que, no meio de tudo isso, eu ouvi uma voz que me mandava ir para Dagobah.

— E o que você encontrou lá? – questionou o rapaz. – Quando fomos atrás de você e você voltou à bordo da nave, não nos deu explicação nenhuma, mas disse que precisava de uma nova nave.

Qui-Gon parecia pensativo. E, mais uma vez, Obi-Wan soube qual seria a resposta.

— Eu não sei – Qui-Gon respondeu. – Eu vi uma figura.. uma pessoa... que se dizia um Sith.

— Um Sith?! – Obi-Wan arregalou os olhos e engasgou com o chá, deixando que o líquido quente escorresse de sua boca e molhasse as suas roupas.

— Sim – o Jedi confirmou, sem nem ao menos ter parecido notar o pequeno acidente com o chá. – E me disse algo sobre o retorno dos Siths estar se aproximando e sobre como não há nada que eu possa fazer.

O aprendiz ainda olhava com espanto para seu mestre, tentando imaginar como o homem poderia parecer tão calmo diante daquela informação.

— Mestre, eu acho que esse tipo de coisa deve ser informado ao Conselho – Obi-Wan arriscou. – Um assunto delicado desses, digo... É muito grave!

— E eles acreditariam em mim? – questionou Qui-Gon. – Me dariam ouvidos?

Obi-Wan não respondeu imediatamente. Por um instante, o rapaz tentou imaginar o que aconteceria se Qui-Gon solicitasse um encontro com o Conselho para comunicar o que vira. Ou seria taxado como louco ou seria acusado de estar usando um assunto desses para tentar desviar a atenção dos mestres do Conselho de seus atos falhos como Jedi.

— Não – foi o que o aprendiz conseguiu responder após ponderar um pouco.

— Mas havia mais uma figura – Qui-Gon continuou. – Não sei se era um homem ou uma mulher... nem se era um dos dois, na verdade... um ser esquisito, diferente de tudo o que eu já vi, que não emanava nem luz e nem trevas... e ele me disse para eu ir ao local de origem da Força no universo. Ele confirmou que a minha morte está sim se aproximando, mas que eu preciso passar por um treinamento. Que eu terei uma missão a cumprir após a morte.

Novamente, Obi-Wan arregalou os olhos.

— Mas isso é impossível – ele rebateu. – Como você poderá cumprir com algo se nós perdemos a nossa individualidade após a morte? Não é isso que mestre Yoda sempre diz? Que depois que morrermos, a Força em nós retornar ao universo?

— Exatamente – Qui-Gon respondeu. – É isso o que mestre Yoda diz. Mas eu te pergunto uma coisa... Será que isso é verdade?

Obi-Wan chegou a abrir a boca para responder. Mas, pensando melhor por um único instante, ele não o fez. O aprendiz entendeu o que seu mestre queria dizer e sabia que, por trás daquele questionamento, não existia apenas um desejo de se opor ao Conselho por pura e infantil pirraça. Havia uma dúvida genuína de alguém que já não mais acreditava na Ordem que o havia educado.

— Eu vejo o conflito que isso causa em você – Qui-Gon emendou antes que o rapaz pudesse dizer qualquer coisa. – Mas isso não é algo com o que você precise se preocupar. O fato é que estou atrás de uma nave e irei até a origem da Força na galáxia, seja lá onde isso fica. E, para isso, preciso de uma nave nova. Afinal, não sei que tipo de lugar é esse, muito menos se é seguro levar a Duquesa para lá.

— Então, se vamos para lá, quem vai proteger ela?

Qui-Gon olhou para ele e lhe sorriu timidamente. Obi-Wan já sabia a resposta.

— Eu? – ele questionou. – Acha que estou pronto?

— E por que não estaria?

— Bem, eu sempre fico lembrando de quando estávamos na mina de beskar, em Mandalore – Obi-Wan respondeu. – Foi você quem percebeu o perigo e conseguiu agir antes que Satine fosse atingida por aquele disparo. Se eu estivesse lá sozinho, ela teria morrido. Foi você quem a salvou, não eu.

— Você se cobra demais, Obi-Wan – Qui-Gon rebateu imediatamente. – Você está mais do que pronto para isso, mas a sua insegurança te impede de ver isso. Você é um excelente Jedi e tenho certeza de que vai conseguir fazer isso sem maiores dificuldades.

Obi-Wan engoliu em seco ao ouvir isso, sentindo-se, ao mesmo tempo, lisonjeado com o elogio.

— E para onde devo levá-la? – ele questionou.

— Um tempo atrás, você sugeriu irmos para Draboon – disse Qui-Gon. – E teríamos ido se não tivéssemos caído em Corellia. Talvez, esse ainda seja um bom destino. Aquele pedacinho de fim de mundo é tão esquecido e afastado do resto da galáxia conhecida que vai garantir uma posição de anonimato segura para a Duquesa pelo tempo em que eu estiver fora. Mais chá?

Obi-Wan levantou a mão em negativa.

— Não, mestre, obrigado – ele respondeu, estendendo a xícara de volta ao mestre enquanto bocejava. – Na verdade, acho que preciso ir dormir. Se vamos até Theed amanhã cedo, acho que preciso descansar um pouco.

— Eu concordo plenamente.

O aprendiz se levantou e desejou boa noite ao seu mestre. Havia dado apenas alguns passos em direção à nave quando foi, novamente, chamado.

— Sim? – ele se virou, para encarar o seu mestre.

— Amanhã, antes de irmos para Theed, vamos ter um treino de sabre de luz – disse Qui-Gon.

— Por quê? – ele quis saber.

Não que Obi-Wan estivesse julgando a decisão de seu mestre. Na posição de aprendiz, apesar de se considerar muito bom e hábil com a arma, ele sabia que ainda tinha muito a aprender. Mas faziam meses que os dois não realizavam um treino desses. Por que agora?

— Hoovar me derrotou em combate Mandalore – começou Qui-Gon. – Derrotou você e mestre Billaba em Veruna. Ele não vai desistir de caçar a Duquesa então, mais cedo ou mais tarde, nossos caminhos vão se cruzar. E, quando isso acontecer, vamos precisar estar treinados o suficiente em alguma técnica de combate que seja capaz de vencê-lo em duelo. Nosso treino começa pela manhã, logo após o nascer do sol.

— Sim, mestre – Obi-Wan fez uma rápida reverência. – Boa noite.

— Boa noite – Qui-Gon lhe sorriu.

Assim, o rapaz se afastou, retornando para o conforto aquecido do interior da nave enquanto Qui-Gon se mantinha do lado de fora, meditando sob a luz das estrelas de Naboo.

 

Havia um som repetitivo no ar quando Satine acordou na manhã seguinte. Uma estática estranha que se repetia continuamente, sem ritmo algum. Um som distante que, apesar de baixo, a impedia de voltar a dormir. Por alguns instantes, a Duquesa de Mandalore permaneceu de olhos fechados, tentando imaginar de onde viria aquele barulho que tanto a irritava.

Finalmente se dando por vencida, ela se levantou e saiu de sua cabine. Ao não encontrar nem Qui-Gon nem Obi-Wan à bordo, a jovem soube que os dois poderiam estar envolvidos e serem os culpados pelo som que a acordara. Pelo menos, haviam deixado café quente pronto na copa, ela pensou, contentando-se em encher uma xícara para si. Após dar o primeiro gole, ela se voltou para a saída da nave e, ao chegar lá, percebeu que a rampa estava baixada.

Imediatamente, suas retinas foram ofuscadas pela luz intensa do dia de Naboo. Conforme seus olhos iam se acostumando à claridade, ela conseguiu ver os arredores e perceber que a nave estava pousada em um extenso gramado verde cercado, ao fundo, por inúmeras serras cujos picos estavam cobertos por neve. O aroma de grama invadia suas narinas, sendo forte o suficiente para vencer o cheiro do café em suas mãos.

E, a mais de dez metros da nave, Satine avistou seus dois guarda-costas. Obi-Wan e Qui-Gon se encaravam, seus sabres de luz ativados em suas mãos, golpeando um ao outro sem nem perceber que eram observados. Sem tirar os olhos dos dois, Satine sentou-se na rampa, entretendo-se com o treino. Afinal, era a primeira vez que via um duelo de sabres de luz pessoalmente, uma oportunidade que não poderia perder.

— Soresu, Obi-Wan – Satine ouviu Qui-Gon murmurar enquanto ele circundava seu aprendiz, logo após repelí-lo com um empurrão de ombros. – Se vamos enfrentar Hoovar, devemos nos habituar ao seu estilo de combate. Usar a agressividade dele contra ele mesmo vai ser a nossa melhor alternativa e não tem uma forma de combate melhor para isso do que Soresu.

— Estou tentado, mestre – o Padawan limpou o suor da testa e assumiu uma posição de guarda. – Mas, definitivamente, esse não é o meu estilo de combate.

— Seus adversários não vão respeitar o seu estilo de combate – Qui-Gon o interrompeu. – Você é o Jedi. É dever seu conhecer e dominar todas as formas de combate. Você pode sim ter o estilo com o qual você é mais familiarizado, mas deve dominar todas elas.

Assim que terminou de falar, Qui-Gon avançou. Obi-Wan imitou o gesto. Os sabres de luz dos dois homens se chocaram no ar por algumas vezes e, antes que Satine pudesse entender o que estava acontecendo, o aprendiz caiu o chão.

— Levante-se – disse Qui-Gon.

Sem questionar, o aprendiz obedeceu.

— Agora, me ataque.

E, novamente, Obi-Wan obedeceu.

Diferentemente do rapaz, que avançou quando Qui-Gon o atacou, Qui-Gon se manteve parado enquanto Obi-Wan corria até ele. O aprendiz brandiu o sabre de luz acima de sua cabeça e, necessitando de apenas algumas movimentos com os pés, sem deixar de assumir a postura defensiva, o jedi conseguiu se desviar facilmente dos ataques de seu Padawan. As investidas e Qui-Gon eram pontuais e certeiras e, mesmo assim, Obi-Wan tinha imensas dificuldades em bloquear cada um dos golpes de seu mestre.

Por fim, o aprendiz caiu novamente.

— Entendeu o que eu quis dizer? – disse Qui-Gon enquanto estendia a mão para Obi-Wan, ajudando-o a se levantar. – Use o peso do seu adversário contra ele mesmo. Isso vai instabilizar a postura dele, mas não a sua. Para isso, você deve conter suas ansiedades em atacar e assumir uma postura defensiva. Seus ataques devem ser dados no momento certo.

— Eu estou tentando, mestre – Obi-Wan rebateu. – Mas não é tão fácil quanto parece.

— E por quê?

— Porque sempre há um momento em que é possível atacar – o rapaz respondeu. – Por que não aproveitar essas oportunidades?

Qui-Gon, assim que ouviu as palavras dele, soube com que tipo de problema estava lidando.

— Acha que consegue se deixar guiar pela Força completamente em um duelo? – ele perguntou.

— Talvez – Obi-Wan respondeu, em dúvida sobre suas habilidades.

Dessa forma, Qui-Gon avançou até o local onde os robes dos dois Jedis estavam caídos e, do bolso do seu, retirou uma faixa de tecido. Ele avançou e se posicionou atrás de Obi-Wan. Logo em seguida, o Jedi circundou o rosto do rapaz com a faixa, usando-a como venda.

— Se você não conseguir me ver, não vai ver as oportunidades em que pode atacar – Qui-Gon se explicou. – Se você se guiar pela Força, vai atacar no momento exato. E não se preocupe... – ele adicionou quando sentiu a ansiedade do Padawan. – Eu vou pegar leve com você.

Dito isso, o Jedi se afastou, posicionando-se frente a frente com o seu aprendiz. Os dois acionaram seus sabres de luz.

O efeito da venda foi imediato. Obi-Wan, incapaz de ver seu oponente, assumira uma postura defensiva semelhante a que Qui-Gon havia adotado na última investida. O mestre Jedi avançou lentamente em direção ao rapaz, cujas mãos tremiam ao redor de seu sabre de luz enquanto tentava usar a Força para compreender todo o ambiente à sua volta.

Qui-Gon atacou primeiro. Um movimento lento, suficiente apenas para ver se os sentidos de seu aprendiz estavam suficientemente sensíveis para que ele pudesse reagir. E estavam: de sua posição, Obi-Wan precisou de um único movimento para bloquear o ataque de seu mestre. Qui-Gon sorriu com o canto do lábio, satisfeito.

O Jedi atacou uma segunda vez, mais rapidamente. Novamente, Obi-Wan conseguiu bloquear o ataque, sem baixar a guarda. Estavam indo exatamente pelo caminho que Qui-Gon queria. O primeiro golpe de Obi-Wan veio apenas após o sexto golpe de Qui-Gon, um momento em que o Jedi precisou baixar a guarda e recuar.

— Muito bem – ele não conseguiu evitar o elogio, começando a circundar o rapaz. – Você está usando apenas a Força para se guiar ou está conseguindo ouvir os meus passos?

— Majoritariamente, a Força – Obi-Wan respondeu. – Mas confesso que ouvir seus passos ajuda muito.

— Muito bem – Qui-Gon respondeu. – Então você aprendeu o que eu quis te ensinar antes de cairmos em Corellia. Use a Força, mas não deixe de confiar nos seus sentidos. Mas, e se você não tiver mais sentidos?

Qui-Gon estendeu a mão para Obi-Wan. No exato instante, o aprendiz ficou agitado, virando-se para todos os lados, como se tentasse localizar o seu mestre no escuro.

— O que você fez? – Obi-Wan perguntou em desespero. – Eu não consigo ouvir nada!

Mas Qui-Gon não respondeu.

O Jedi apenas avançou e atacou. Sentada na rampa da nave, Satine se levantou em um susto, achando que Obi-Wan não conseguiria bloquear o golpe. Mas, no último segundo, o aprendiz se movimentou, usando a Força para identificar o perigo: as lâminas de plasma azul e amarelo se encontraram em pleno ar.

Nesse instante, o que era apenas um treino se transformou em um duelo. Qui-Gon aumentava cada vez mais a velocidade e a ferocidade de seus golpes e Obi-Wan apenas tinha tempo de se defender. Exatamente o que Qui-Gon queria...

Na defensiva, Obi-Wan apenas recuava enquanto Qui-Gon pregredia. Mas foi durante o mais violento dos ataques de Qui-Gon que o duelo virou: Obi-Wan girou em seus calcanhar, permitindo que seu mestre passasse em seco ao seu lado, quase perdendo o equilíbrio. Em um golpe tímido, porém certeiro, Obi-Wan desarmou Qui-Gon no momento em que seu pé surgiu em frente ao de seu mestre.

Qui-Gon tropeçou e caiu de joelhos. No instante seguinte, a lâmina azul do sabre de Obi-Wan parou a centímetros do pescoço do Jedi. O duelo havia acabado.

— Agora você entende o que eu quis te dizer sobre usar a agressividade do seu oponente contra ele mesmo? – Qui-Gon questionou, levantando-se, enquanto Obi-Wan retirava a venda.

— Sim – disse o aprendiz, visivelmente feliz com o seu feito, enquanto prendia o sabre de luz ao seu cinto. – Talvez Soresu não seja a pior forma de combate, afinal. Na verdade, é muito prática...

 

Nem Satine, nem Qui-Gon e nem Obi-Wan conseguiam entender porque as ruas de Theed estavam vazias. Havia um silêncio curioso no ar, como se algo estivesse para acontecer. Porém, conforme avançavam para dentro da cidade, um murmúrio se tornou audível. Um murmúrio que logo se tornou o som da explosão de mil vozes. Ao chegarem ao centro da cidade, na mais larga avenida, muito próxima ao colossal palácio real, os três perceberam o que estava havendo.

Uma multidão incontável de pessoas se aglomeravam nas laterais da avenida, gritando em comemoração enquanto uma música solene era tocada por uma banda que marchava em direção ao palácio. Logo atrás, cercada por um conjunto de soldados pomposamente vestidos, uma mulher era carregada em um uma liteira, vestindo um glorioso e plumado vestido verde. Sua maquiagem extremamente exagerada e carregada em quilos de pó de arroz, associada a sua sempre rígida e impassível postura, lhe davam alguns anos a mais, mas, mesmo assim, não conseguia esconder a sua pouca idade. Ao longe, os três conseguiam ver a quantidade incontável de jóias penduradas em suas roupas.

— O que está acontecendo? – quis saber Qui-Gon, perguntando para um homem ao seu lado.

— Está de brincadeira, não é? – o homem respondeu. – Ela é a nova rainha. Hoje é o dia da coroação.

Aos poucos, o trio observou a rainha ser carregada para dentro do palácio. Logo que as porta se fecharam, hologramas foram projetados na avenida, revelando o interior da sala do trono, onde a nobreza de Naboo observava a nova rainha descer da liteira e caminhar até o trono. E ela o fazia com graça e fúria, uma combinação incomum para alguém de sua idade.

Quando a rainha se virou, Satine abafou um gritinho, abafando-o com as mãos. Em seu rosto, uma expressão de genuína alegria.

Em pé em frente ao trono, a rainha observava seus súditos no salão. Nesse momento, um homem trajando longas vestes azuis turquesa se aproximou, carregando consigo uma coroa de louros prateada.

“Em nome de seu povo, você jura usar o seu poder para defender sempre o interesse comum, defendendo-os acima dos seus?”

“Eu juro”, foi a resposta.

“Em nome da glória de seu planeta, você jura defendê-lo em todas as circunstâncias, com a sua vida, se necessário?

“Eu juro.”

“Em nome de seus antecessores, você jura honrar o nome dessa Casa Real em um reinado de paz e prosperidade?”

“Eu juro.”

Durante todo o tempo, a rainha se mantinha firme. Sua voz era forte e poderosa, em um tom esbravejante e que impunha respeito. Em seu olhar, a fúria e a determinação que Qui-Gon vira em pouquíssimos governantes ao longo de toda a sua vida.

“Então, que você seja iluminada”, disse o homem e, imediatamente, a jovem se sentou sobre o trono. “Em nome da Alta Corte, eu declaro Rainha Amidala, governante de Naboo, imperatriz de Ohma-D’un e guardiã de setor Chommell.”

No instante seguinte, a coroa prateada foi depositada em sua cabeça, sendo perfeitamente encaixada ao redor de todos os adornos encrustados em jóias presos em seu cabelo. Quase que imediatamente, os presentes, dentro e fora do palácio, irromperam em aplausos.

A Rainha Amidala avançou pelo mesmo caminho que percorrera poucos instantes antes. Em questão de um minuto, o imenso portão do palácio se abriu, revelando, ao vivo, a agora coroada governante de Naboo para seu povo, que ainda a aplaudia.

Delicadamente, em um gesto muito cortês, ela levantou a mão, pedindo por silêncio. Seus súditos obedeceram imediatamente.

— Conhece ela? – perguntou Obi-Wan, quando a rainha começou a discursas.

— Sim – Satine respondeu. – Como sabe?

— Pela sua reação quando viu quem ela era – ele respondeu. – Deu pra ver que parecia feliz.

— A rainha e eu estudamos juntas – Satine se explicou, visivelmente realizada em assistir aquela coroação, sem tirar os olhos da rainha, tantos metros à frente. – Sabe, Mandalore é um excelente lugar para se aprender sobre guerra, mas um péssimo lugar se você quer estudar política. Numa tentativa de me educar para governar meu planeta, meu pai me enviou para estudar política em vários lugares da galáxia. Morei um ano em Coruscant, alguns meses em Corellia, um semestre em Felúcia e quase um ano aqui em Naboo. Conheci a rainha quando estudei no Academia Real de Theed. Ela era alguns anos mais nova do que eu, mas era brilhante de uma forma que eu jamais serei.

— Então, vocês eram amigas? – questionou Qui-Gon.

Satine, imediatamente, torceu o nariz.

— Talvez “amigas” seja um termo muito forte – ela respondeu. – Está mais para um “conhecidas muito próximas”.

Finalmente, quando a rainha Amidala parou de falar, toda a multidão aplaudiu. Pela forma como a coroação era tratada como um festa, era visível o quanto a nova rainha era querida pelo seu povo. E não só por ele, mas por uma Duquesa que, anonimamente, assistia sua velha conhecida em seu momento de maior glória.

 

— Sabe onde posso conseguir uma nave? – Qui-Gon questionou.

Estavam sentados em um café às margens do largo rio que cruzava Theed, cercado pelas construções imponentes e por inúmeras estátuas que compunham a paisagem da cidade, formando um imenso museu à ceu aberto composto por glória e esplendor.

O garçom, um droide de serviço que lhes servia comida e bebida, pareceu estranhar a pergunta.

— Dificilmente vão encontrar alguma garagem aberta – foi a sua resposta. – A semana da coroação da rainha é sempre um feriado no planeta todo, poucos comércios permanecem abertos. Receio que terão que esperar mais uns três dias até conseguirem encontrar uma garagem aberta para adquirirem uma nave.

Frustrado, Qui-Gon viu o droide se afastar. Sua única alternativa era se contentar com a comida e com a bebida à sua frente.

Talvez, aquela fosse a primeira vez desde Mandalore que o trio tinha uma refeição de verdade em que não precisavam comer a comida liofilizada da nave ou rãs selvagens caçadas às margens de um lago em Alderaan (claro, excetuando-se os poucos dias em que permaneceram em Serenno e em Takodona). Podia não ser a refeição mais glamourosa ou bem preparada da galáxia, mas, considerando os padrões aos quais estavam acostumados nas últimas semanas, aquilo era um banquete.

— Pense pelo lado positivo, mestre – disse Obi-Wan, tentando animá-lo, logo após engolir o primeiro pedaço do lanche que havia pedido. – Naboo é um planeta agradável. Podemos usar os próximos dias para descansar um pouco antes de partirmos. Melhor ficar preso aqui do que em Jakku, não?

— Colocando dessa forma, você faz parecer o melhor dos mundos – Qui-Gon riu. – Mas, talvez, você tenha razão. Depois dos últimos dias, acho que merecemos um pouco de descanso.

— Principalmente você – Satine disse. – Por mais que tente esconder, você ainda está mancando bastante depois de tudo o que te aconteceu em Veruna. O que você precisa agora é repouso.

Imediatamente, Qui-Gon olhou torto para Satine.

— O que foi? – ela quis saber.

— Gostei mais da justificativa que Obi-Wan deu – Qui-Gon se explicou. – Da forma como você fala, eu me sinto muito mais velho do que eu sou. Repouso... – ele completou com desdém.

Satine, sem entender que não passa de uma simples brincadeira, adiantou-se, envergonhada, para se explicar, enquanto Obi-Wan não conseguia conter o riso.

— Mas, no fundo, talvez você esteja certa, Duquesa – respondeu Qui-Gon. – Talvez eu realmente precise de um pouco de repouso. Mas não agora. Agora, existem coisas mais importantes que eu preciso fazer.

— Como conseguir uma nave nova?

E esse era o momento que Qui-Gon sabia que chegaria. Quando precisaria se explicar por ter que deixar de cumprir o seu papel de guarda-costas da Duquesa por um tempo. Sabe o que viria, Obi-Wan se manteve em silêncio, deixando que a conversa entre os dois seguisse sem sua presença.

— Sabe, Satine, a Força tem um jeito muito peculiar de se comunicar com as pessoas – o Jedi começou. – Com todos nós. Até mesmo com você que, até onde sabemos, não possui uma sensibilidade muito grande para o contato com a Força. Mas ela se comunica com todos nós, cada um à sua forma. E a maior parte dos Jedi pode sentir, ouvir e, as vezes, até ver o que a Força quer nos dizer.

— E eu me lembro muito bem que você disse ter visto a sua morte – disse Satine.

— Não exatamente – Qui-Gon rebateu. – Mas, sim. Eu tive uma premonição da minha morte e de outras coisas. E algo na Força me diz que há uma certa urgência em ligar todos os pontos disso antes que já não seja mais possível. Você me entende?

Satine encarou Qui-Gon por alguns segundos antes de, enfim, inclinar-se sobre a mesa e segurar uma das mãos do mestre Jedi entre as suas. Sim, ela entendia completamente. Porque, assim como Qui-Gon, Satine também tivera que tomar atitudes em nome de um bem maior. Ao deixar Mandalore para trás, ela também estava pensando em como isso poderia ou não resultar em um amanhã melhor, mesmo sabendo de todas as incertezas em sua atitude. Guardadas as devidas proporções, Satine sabia que a situação de Qui-Gon era a mesma que ela já estivera muito recentemente. E ela jamais pediria que ele fizesse outra escolha que não essa.

Mais do que ninguém, ela entendia.

— Faça o que for necessário – ela disse, por fim.

 

Talvez a melhor parte de terem se permitido estar em meio a uma cidade novamente foi a possibilidade de fazerem compras. Devido às festividades da coroação da nova rainha, não eram muitos os lugares que estavam abertos. Mas, ao menos, os poucos estabelecimentos funcionando foram mais do que suficiente para que eles pudessem comprar um jantar decente, muitas vezes melhor do que a comida liofilizada que tinham na nave e melhor do que caçar rãs novamente (não que as rãs em Alderaan estivessem ruins, mas, para Satine, aquilo havia sido uma experiência única na vida... e que ela gostaria de não repetir).

O primeiro deles a sair da nave naquela noite foi Qui-Gon. Enquanto o sol ainda se punha, ele montou uma fogueira. Quando o céu rosado deu lugar à escuridão salpicada de estrelas, o fogo já ardia e o mestre Jedi estava sentado na relva, fumando um cachimbo enquanto olhava para o horizonte. E Obi-Wan sabia muito bem o que aquilo significava: as poucas vezes em que ele vira seu mestre fumar aquele velho cachimbo empoeirado foram momentos em que o Jedi se encontrava imerso em seus pensamentos, sendo torturado por eles. Pelo que se lembrava, a última vez que o Padawan vira aquilo fora logo após Qui-Gon enfrentar o Conselho, logo depois de voltarem daquela fracassada e desastrosa missão em Dantooine.

Assim, em silêncio, o aprendiz se juntou ao seu mestre. Como esfriava, Obi-Wan entregou uma coberta ao seu mestre, que se enrolou nela, enquanto se sentava na grama ao lado dele, envolto pela própria coberta, deixando que ela e o fogo o aquecessem. E, ali, os dois permaneceram em silêncio. Um, perdido em seus pensamentos. O outro, preocupado, mas incapaz de interromper aquele momento e querendo estar presente, ser uma companhia enquanto Qui-Gon travava uma batalha mental contra si mesmo enquanto tentava entender o que estava acontecendo consigo mesmo. E, na Força, os dois se entendiam sem nem mesmo precisarem exteriorizar uma única palavra.

Apesar de suas diferenças, eles se entendiam. Como pai e filho.

Satine foi a última a se juntar a eles. Enrolada na própria coberta, ela jogou uma toalha de mesa para Obi-Wan, que a estendeu sobre a grama para que Satine depositasse a comida que trazia consigo: pães, queijos, geléias e o vinho barato e duvidoso que Qui-Gon havia comprado em Theed algumas horas antes. E, nesse momento, o mestre Jedi abandonou sua postura séria e pensativa, voltando a agir como ele sempre agira.

— Já que vocês dois estavam aqui fora, achei que poderíamos aproveitar a vista e comer aqui mesmo – Satine se justificou, estendendo a garrafa de vinho para o Jedi.

— E pensou certo – disse Qui-Gon.

Com um gesto, Qui-Gon fez a rolha sair sem mal tocá-la e, imediatamente, Obi-Wan se lembrou de quantas vezes tivera que ouvir longos discursos e broncas sobre o uso leviano da Força, exatamente como aquele. Mas preferiu não dizer nada. Afinal, ele e Qui-Gon haviam acabado de se entenderem. Não queria que algo besta como aquilo pudesse acabar levando a outra briga. Mas o próprio Jedi, percebendo o que se passava na cabeça de seu aprendiz, olhou-o de esgueiro e piscou ironicamente. Obi-Wan não conseguiu não rir.

— À sua saúde, Duquesa – disse Qui-Gon, entregando a garrafa para Satine.

Ela aceitou a garrafa e a levou à própria boca, bebendo um longo gole antes de devolvê-la para Qui-Gon, que repetiu o gesto. Obi-Wan a recebeu em seguida, bebendo um gole tão longo que só parou quando o álcool começou a irritar a sua garganta.

— Tem notícias de casa, Duquesa? – quis saber Qui-Gon.

— Só o que eu vejo na Holonet – respondeu Satine. – Em Takodona, Zaar me disse que havia autorizado um ataque a Botajef, para conter revoltosos. Parece que aconteceu dois dias antes de irmos até Veruna resgatar você. Mas não sei de mais nada.

— E você anda preocupada com a sua irmã, não é? – questionou Obi-Wan.

Satine fez que sim com a cabeça.

— Eu e Bo nunca fomos melhores amigas – ela se explicou, o olhar perdido nas chamas da fogueira. – Nós brigamos por qualquer coisa desde que eu me conheço por gente. Desde as coisas mais sérias até pelas maiores besteiras. Tem dias que até o jeito dela de respirar me irrita. Mas ela é minha irmã. Eu morreria por ela sem pensar duas vezes e eu não consigo imaginar uma vida sem ela do meu lado. É estranho, não acha?

— Nem um pouco – rebateu Obi-Wan.

— Mesmo? – Satine questionou, insegura.

Obi-Wan fez que sim com a cabeça.

— Nós, Jedi, não temos irmão – ele se explicou. – Quer dizer... não sabemos se temos ou não... Mas nós temos a nossa própria família no Templo... Uma família diferente, problemática e disfuncional... Mas uma família mesmo assim. E, por mais que os Jedi tentem evitar esse tipo de sentimento, é quase impossível não haver uma relação de amor e ódio entre nós em alguns momentos, ainda mais com tantos Jedi vivendo lá e dividindo o mesmo espaço. Esse sentimento é mais normal do que parece. Pelo menos, é o que eu acho que seja mais próximo da sua situação.

Nesse momento, Satine pousou os olhos sobre os dois homens à sua frente, lembrando-se do que já vivera com ela. Poucos dias antes, os dois haviam passado por uma briga horrível que chegou à agressão física e, mesmo assim, ela se lembrava muito bem de quando ouviu Qui-Gon dizer que quebraria o precioso Código Jedi para salvar a vida de Obi-Wan e se lembrava muito bem de como Obi-Wan não mediu esforços para resgatar Qui-Gon das mãos de Hoovar.

— Talvez você esteja certo – Satine concordou, por fim. – Eu só queria que ela me apoiasse mais, sabe... Talvez, se ela fosse menos insistente, nós duas teríamos uma relação bem melhor e as coisas estariam mais nos eixos do que estão agora.

— E você já se perguntou como seriam as coisas se você apoiasse ela com mais frequência? – questionou Qui-Gon.

Precipitadamente, Satine abriu a boca para protestar. Mas, sob o olhar das sobrancelhas arqueadas do Jedi, ela se conteve, finalmente entendendo o que ele queria dizer.

— Pelo pouco contato que eu tive com a sua irmã, ela me pareceu uma pessoa um pouco difícil de lidar – continuou Qui-Gon. – Mas, lembre-se de uma coisa... Todo conflito possui, pelo menos, três versões. A do lado A, a do lado B e a verdadeira. Considere isso com muito carinho em todas as decisões que for tomar como Duquesa. Lembra-se da nossa conversa na nave?

Imediatamente, Satine fez que sim com a cabeça.

— A Bo não é uma pessoa fácil de lidar – disse Satine. – Mas eu também não sou.

— Não – respondeu Qui-Gon, passando o cachimbo para seu Padawan.

— Nem um pouco – Obi-Wan confirmou, rindo.

Satine esboçou um sorriso tímido em resposta.

— Eu sinto falta dela todos os dias – ela concluiu, por fim. – Mais do que de Mandalore, mais do que de Zaar, mais do que qualquer outra coisa... Por tudo que é mais sagrado, eu daria a minha vida pra saber como ela está.

Nada na galáxia poderia doer mais do que a saudade de Satine. Durante todos os segundos de silêncio que se seguiram, ela apenas conseguia sentir um aperto em seu peito, incapaz de aceitar os fatos que estava longe de casa e de Bo-Katan por opção própria e, justamente por isso, não podia estar ao lado dela.

— E você? – ela quis saber. – Notícias de casa?

— Não estamos fazendo muito contato com o Conselho – respondeu Obi-Wan. – Instruções do próprio mestre Yoda. Ele nos disse para evitar ao máximo qualquer forma de contato, para evitar sermos rastreados.

— Não estou falando do Conselho – disse Satine, adiantando-se para cortar uma fatia do pão e se deliciando ao ouvir o estalido da casca grossa sendo partida com a faca. – Nem dos Jedi. Mas de suas casas. Seus planetas. De onde vocês são?

— No meu caso, falar do Conselho, é falar de casa – respondeu Qui-Gon. – Nasci em Coruscant a mais tempo do que eu gostaria de dizer. Minha casa é o Templo Jedi desde que me conheço por gente e não tenho nenhuma memória de épocas anteriores.

— E você? – Satine se virou para Obi-Wan, estendendo-lhe a mão para que ele lhe passasse o cachimbo.

Obi-Wan terminou de mastigar um pedaço de pão e deu um último gole de vinho antes passar a garrafa para Qui-Gon e, por fim, responder.

— Stewjon. Um planetinha decadente esquecido pela Força na periferia da Orla Exterior que não liga nada com lugar nenhum e não fez nada de marcante na história da galáxia, nem nunca fará.

Satine soltou a fumaça de seus pulmões, curiosa com o tom de desdém na voz de Obi-Wan.

— Você é a primeira pessoa que eu vejo que parece detestar seu planeta natal – ela comentou. – Já conheci pessoas que não tinham afeição nenhuma aos seus próprios planetas, mas você é a primeira pessoa que me parece sentir... repulsa. Por quê?

— A verdade é que Stewjon é uma terra sem lei – Obi-Wan esclareceu. – Famílias brigando por terras e recursos, arranjando casamentos e alianças para garantirem poder e aplicando a lei da forma que bem entendem e, inclusive, aplicando as próprias leis. O planeta é uma baderna completa, sem nenhuma liderança forte que estabilize as coisas.

— Como Mandalore – Satine concluiu.

— Como Mandalore – Obi-Wan confirmou, rindo. – Eu entendo você amar o seu planeta. Como Duquesa, não se espera nada menos do que isso. Mas, pessoalmente, eu não vejo motivos racionais para isso.

— Graças a Força – exclamou Qui-Gon. – Como diria meu antigo mestre, nosso lar é onde mora o nosso coração, não a razão. E é justamente por isso que é o nosso lar, não é? É onde nos sentimos bem, não onde nos dizem que devemos nos sentir bem.

Obi-Wan se calou. Primeiro, porque concordava com cada palavra. Segundo, porque sabia que aquele tipo de pensamento seria extremamente problemático para um Jedi (e, justamente por isso, ele se martirizava por concordar com aquilo).

— E onde é o seu lar, Qui-Gon? – quis saber Satine.

— Takodona – a resposta foi imediata. – Mas não no castelo de Maz. Perto dali, há uma cabana de caça abandonada próxima a um lago. Acredite ou não, não existe lugar na galáxia onde eu me sinta mais confortável do que naquela cabana. Um lugar perfeito para meditar e entrar em contato com a Força. E você, Duquesa? Onde é o seu lar?

Ao contrário de Qui-Gon, Satine demorou um pouco para responder.

— A cozinha do palácio de Keldabe – ela pensou um pouco antes de responder. – Algumas das melhores memórias da minha infância são daquele lugar, com as cozinheiras deixando eu e Bo experimentarmos os recheios e caldas dos doces antes mesmo de estarem prontos.

— Uma sábia escolha – comentou Qui-Gon, recebendo o cachimbo de Satine.

 

Satine olhava para o teto de sua cabine, acolhida pelo calor das cobertas que contrastava com o frio noturno de Naboo. Do lado de fora da nave, um silêncio espectral que congelava a sua espinha. Ela sabia o quanto seria perigoso fazer isso, mas queria fazer. Precisava fazer.

Como governante de Mandalore, ela tinha um dever com o planeta. Uma responsabilidade que ela abdicou temporariamente quando precisou ir embora, uma ferida de culpa em seu coração que era incapaz de cicatrizar. E, nesse momento em que ela tanto precisava de ajuda, Qui-Gon fora uma das pessoas que se prontificaram. O mestre Jedi atendeu ao chamado e foi de Coruscant até Mandalore para conduzi-la na mais imprevisível viagem de sua vida.

E, naquele dia, Satine sabia que a situação era oposta. Qui-Gon tinha um dever para com ela, mas ele sabia que algo mais importante se formava no horizonte. Algo que necessitava de sua atenção e não poderia esperar. Afinal, se ele estivesse certo quanto às premonições de sua própria morte, qualquer espera poderia ser fatal em seja lá o que fosse necessário ser feito. E, dessa vez, Satine sabia que poderia ajudar. Retribuir o favor.

Ela se levantou sorrateiramente. Sabia que não acordaria Obi-Wan, na cabine ao lado: o Padawan tinha um sono pesado e que não seria abalado por um barulhinho ou outro. Os pensamentos da Duquesa estavam no próprio mestre Jedi. Uma vez que eram raros os momentos em que Qui-Gon dormia, ela temia que ele pudesse pressentir sua movimentação ou (pior ainda) seus pensamentos. E ela sabia que, se fosse o caso, ele iria tentar impedi-la. Qualquer um o faria. Naquela situação, fugindo de caçadores de recompensas pela galáxia, deixar uma Duquesa andando à sós por ai era um risco incalculável.

Mas Satine sabia se cuidar. E sabia que, se estivesse dentro do palácio de Theed, estaria segura.

Logo após se vestir, ela jogou sua capa por cima das costas, cobrindo-se com o capuz. Ela abriu a porta de sua cabine e caminhou pelo corredor principal da nave na ponta dos pés, temendo ser pega no flagra. Mas, ela estava com sorte: ao passar pelo sofá, ela se deparou com um Qui-Gon deitado e adormecido.

A Duquesa sorriu, sentindo-se a pessoa mais sortuda da galáxia. Em instantes, estava fora da nave, caminhando na escuridão da noite de Naboo em direção às luzes de Theed. Poucos minutos depois, o sol nasceria, descrevendo uma fina faixa dourada no horizonte, acordando mestre e Padawan.

 

Houve um momento em que Obi-Wan não mais conseguia ignorar a luz do dia, entrando pela janela. A sua única opção para se manter em um ambiente escuro e aconchegante era jogar suas cobertas por cima do corpo, mas, para isso, tinha que aceitar o efeito colateral de que, em poucos minutos, as cobertas e a luz do dia estariam o fervendo em sua própria cama. Apenas quando a luz e o suor começaram a se tornar irreversivelmente desconfortáveis foi que o Padawan, finalmente, resolveu se levantar.

Flashes de memória da noite anterior ainda ocupava a sua mente. Ele se lembrava vagamente do momento em que Qui-Gon, já um pouco cambaleante com o término da garrafa de vinho, se retirou para o interior da nave. Também afetado pelo álcool, Obi-Wan não sabia quando aquilo acontecera, mas se lembrava perfeitamente de que a Duquesa se sentou ao seu lado e, após longos minutos com  cabeça apoiada em seu ombro, olhando para as chamas da fogueira, sussurrou-lhe um “Dance comigo”. Sua lembrança seguinte era de estar dançando com Satine ao som de grilos ecoando pela noite de Naboo, aquecidos pelas chamas da fogueira.

Ele se vestiu e saiu de sua cabine sem nem mesmo arrumar sua cama. Ao ver Qui-Gon desfalecido no sofá, o aprendiz resolveu não o acordar. Afinal, se o Jedi havia preferido dormir a meditar, era porque estava verdadeiramente cansado (e bêbado). Deixando-o para trás, Obi-Wan avançou até a copa, onde encontrou os restos de alguns alimentos que Maz Kanata havia lhes dado quando partiram de Takodona: dois últimos pedaços de pão, um pouco de manteiga, ervas para chá e um pote com frutos secos. Não seria o melhor, o mais variado e nem mesmo o mais farto café da manhã que ele já tivera na vida, mas seria suficiente. Mesmo assim, ele dividiu o pouco alimento que encontrara em três porções.

“E onde é o seu lar?”, Obi-Wan lembrava de Satine ter lhe feito essa pergunta enquanto dançavam em um balançar suave, monótono e ritmado ao redor do fogo. “Onde a minha missão me mandar ir”, ele havia respondido. “E pra onde a sua missão te mandar ir agora?”, Satine havia perguntado, e, naquele instante, o Padawan se lembrava de ver a Duquesa levantar o rosto (antes, apoiado em seu ombro) e encará-lo diretamente nos olhos. “Até você”, o álcool respondeu por ele, mesmo ele sabendo o quão terrivelmente inapropriado aquilo era.

Talvez, antes de deixarem Naboo, precisariam comprar mais comida. Sabia que as feiras livres de Theed eram bem famosas, fartas e muito conhecidas por seus produtos exóticos e a um custo justo. Poderiam abastecer as duas naves antes do fim da estadia no planeta. Na verdade, o ideal era que o fizessem ainda naquela manhã: pelas contas do Padawan, mal tinham comida para o resto do dia. E, definitivamente, ele não estava a fim de jantar rãs novamente.

Obi-Wan se lembrava claramente de Satine o encarando com carinho. O beijo que se seguiu, no entanto, ele tinha quase certeza que era invenção de sua mente, incapaz de dissociar desejo de realidade. Mas, se a sua mente não o estava enganando, nenhum dos dois rompeu aquele momento, inibidos por seus medos e deveres enquanto dançavam ao redor da fogueira. Eles compartilharam aquele beijo e, naquela copa, mesmo horas depois, Obi-Wan ainda sentia os lábios de Satine tatuado nos seus. Não... Definitivamente, não havia sido apenas invenção da sua cabeça.

— Bom dia – ele ouviu a voz e Qui-Gon, alguns minutos depois, entrando na copa e o retirando do mundo dos sonhos.

— Bom dia, mestre – Obi-Wan levantou os olhos de seu chá e olhou para a porta a tempo de ver um Qui-Gon descabelado e com os olhos inchados entrando no ambiente, sem mal conseguir ver por onde andava. – Pelo visto, dormiu bem.

— Sim – Jedi respondeu com a mão nas costas, em uma posição obviamente desconfortável. – Mas eu não tenho mais idade para dormir em um sofá. Parece que eu fui atropelado por um bantha.

Obi-Wan riu logo após dar um gole do chá, queimando a língua e a garganta.

— A Duquesa já está em pé?

— Acho que não mestre – o rapaz respondeu, levando um pedaço de torrada à boca. – Não vi ela desde que me levantei.

— Excelente – disse Qui-Gon, levantando-se e se servindo com um pouco de chá, mas com o olhar visivelmente cansado de quem havia bebido e fumado mais do que deveria na noite anterior, exaustoo e com um expressão de que o menor barulho que fosse poderia lhe causar uma crise de enxaqueca incurável. – Agora, seja um bom Padawan e prepare uma dessas torradas pra mim, por favor. Você empestou o ar com esse cheiro delicioso de manteiga e eu não quero passar vontade.

Éprajámextre— o Padawan respondeu, com a boca cheia, enquanto se levantava e se adiantava até o fogão.

 

A imensa porta de madeira do interior do Palácio Real de Naboo se abriu. Um dos membros da guarda real de Naboo foi o primeiro a se adiantar, ocluindo parcialmente a visão de Satine do corredor logo atrás dele.

— A rainha Amidala, de Naboo – o soldado anunciou.

Imediatamente, ele abriu caminho, permitindo que um grupo de pessoas adentrasse a sala. A maioria delas, damas de companhia, todas vestindo o mesmo traje azul. Um traje nada modesto, cheio de detalhes em seda e pequenos diamantes que mais pareciam gotas de água dispersas em toda a sua extensão. Mas um traje terrivelmente humilde se comparado ao da mulher que vinha logo a frente delas.

A rainha Amidala usava um pomposo vestido feito em babados e plumas. Ao redor de seu pescoço, tinha uma cor clara, azulada como o céu, que se tornava progressivamente mais escura conforme o vestido se estendia até seus pés, passando pelo turquesa, pelo roxo e, finalmente, pelo preto. O arranjo em sua cabeça era igualmente majestoso, com adornos no mais puro ouro e totalmente recoberto de safiras. Por debaixo de toda a maquiagem, a rainha tentava esconder sua pouca idade em uma expressão séria, porém compassiva.

Satine, imediatamente, fez uma referência.

— Majestade – ela a cumprimentou. – Sou a Duquesa Sa...

— Satine, do clã Kryze de Mandalore – completou a rainha em um tom sério, porém educado. – Seja bem vinda à casa da rainha.

— Da rainha? – perguntou Satine, sem entender do que aquilo se tratava.

— A rainha Amidala está em missão diplomática na Orla Exterior – disse a mulher. – Sou Sabé. Dama de companhia da rainha e sua sósia. Em que posso ajudar?

Imediatamente, Satine entendeu porque a rainha parecia não conhecê-la. Porque a mulher à sua frente não era a rainha e, de fato, não a conhecia. Talvez, ela não conseguisse o que havia vindo buscar.

Mas já estava lá. Não custava tentar.

 

Quando Satine pousou a nova nave que havia conseguido emprestada da Corte de Naboo, ela encontrou um Qui-Gon e um Obi-Wan desesperados, que procuravam por ela em um largo perímetro ao redor da nave sucateada que haviam conseguido em Corellia. Ao verem que era a Duquesa que pilotava a nova nave recém-chegada, os dois Jedis, finalmente, conseguiram se acalmar.

Ao ver que a Duquesa estava demorando mais do que o habitual para acordar e vendo que o chá estava começando a esfriar, Qui-Gon resolveu ir até a cabine dela para checar se havia algo errado. Ele bateu três vezes seguidas à porta, chamando por ela. Sem obter resposta, ele apertou o botão na lateral, fazendo com que a porta de metal deslizasse e, assim permitindo a sua entrada na cabine.

O caos se instalou quando o Jedi percebeu que Satine não estava na cama. No começo, ele tentou manter a calma e chamou por Obi-Wan. Juntos, os dois procuraram por toda a nave, mas não viram sinal dela. E, nesse momento, os dois deram voz às suas emoções e, em completo pânico, deixaram a nave, adiantando-se para a floresta ao redor do campo em que se encontravam, crentes de que era por lá que deveriam começar as suas buscas.

Estavam quase a ponto de contactar o Conselho Jedi para informar do desaparecimento da Duquesa quando um ponto brilhante no céu surgiu, se aproximando cada vez mais. Uma nave pequena, pouco mais do que um caça individual que, conforme baixava, revelou estar sendo pilotado pela própria Duquesa de Mandalore.

— Eu peço encarecidamente que deixe um bilhete na próxima vez que fizer algo assim – pediu Qui-Gon, que ainda suava frio, quando Satine, por fim, abriu a escotilha, olhando para os dois Jedi do alto e parecendo se divertir em vê-los pálidos de pânico e com tremores, tamanho o estresse que haviam passado nos últimos minutos. – Eu não tenho mais idade pra passar por esse tipo de emoção.

— Vou me lembrar disso – ela respondeu, sorrindo, enquanto descia ao solo e os dois Jedi se aproximavam.

— Onde conseguiu essa nave? – Obi-Wan questionou, curioso.

— Eu disse que era conhecida da rainha, não disse? – Satine piscou para ele. – Agradeçam à Casa Real de Naboo pelo presente.

— E à você – rebateu Qui-Gon, satisfeito, olhando para a nave que, em breve, o levaria sabia a Força pra onde.


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Notas finais do capítulo

Me contem o que acharam, meus amores!

Beijinhos!



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