Era domingo, o melhor dia para fazer um churrasco em família; ficar sabendo das fofocas sobre a vida dos outros; ver algum membro da família passar uma vergonha alheia por ter ficado morto de bêbado e saber das novidades para poder compartilhar nas redes sociais ou, em outros casos, sair espalhando para a vizinhança como se estivesse entregando as contas para pagar em porta, em porta.

Pois bem, naquele domingo a casa principal da família Lan estava lotada de amigos e familiares. Em cada canto da residência — que por sinal era bem luxuosa e espaçosa — tinha um grupinho falando das suas desgraças, as suas conquistas ou sabe deus o quê. Não muito longe dali, Wei WuXian estava ao lado seu marido Lan WangJi, com uma garrafinha em mãos que, quem olhasse, poderia afirmar que ele estava bebendo uma água, suco ou algo do gênero. Sendo que, na verdade, era sua cachaça. 

Mesmo que a família Lan tivesse mais de cem mil regras que proibia fazer isso ou aquilo, Wei WuXian fazia questão de quebrar todas elas. Por mais que seu marido falhasse em colocar tudo à risca, aquilo era mais inútil que camisinha no carnaval. Wei Ying se perguntava como poderia sobreviver aquele almoço, pois o seu sogro, Lan QiRen, que para Wei WuXian —  a morte tinha esquecido de buscar — era um pé no saco em tudo.

Até a comida era vegana e insossa. Ele não queria isso! O moreno queria comer uma carne assada e bem gorda, acompanhada de um copo bem gelado de sua cerveja favorita e uma boa música da atualidade, e não essas do tempo em que Pedro Álvares Cabral descobria um continente. 

Não era segredo para ninguém que seu sogro não ia com a sua cara desde quando o conheceu. Afinal, ele foi o seu professor na época do ensino médio, e digamos que Wei era o capeta na sala de aula, fazendo o Lan mais velho quase perder sanidade e o seu direito em dar aula, por quase jogar uma cadeira na cara de Wuxian. O pior para Lan QiRen foi quando os dois filhos, que eram os seus prodigiosos e seu maior orgulho, se apaixonaram por dois homens da mesma família. Naquele dia, quando ele descobriu isso, foi parar no hospital. 

Passaram por muita coisa para poder chegar nos dias atuais, sendo que agora Wei WuXian era casado no papel passado e tinha um filho de cinco anos chamado Lan Yuan, que era o seu xodó. O seu menino estava conversando com os dois primos que, também, eram os capeta quando se tratavam em deixar alguém maluquinho. 

— A gente foi 'pra Disney! —  exclamou Jin Ling empolgado. 

— Lá é muito legal! Vimos o Mickey! Brincamos com os brinquedos legais, e fomos até um castelo muito grande! — completou JingYi. 

Sizhui, que ouvia tudo, acabou ficando triste com tudo aquilo, pois o menino queria muito ter ido com os dois primos para a Disney, porém os seus pais não deixaram. Segundo eles: “vai que você se perde por lá, como vai voltar para casa? Não dá para vir andando e nem se viesse com algum parente do Maçãzinha, você não chegaria nesse ano.” 

Tristonho, o garotinho apenas sorria e concordava, até que chegou em um certo momento que os seus primos foram chamados por seus pais para comer. SiZhui virou-se de costas, indo em direção ao seu pai, WangJi, que estava em pé em um canto isolado, somente observando Wei WuXian enchendo a cara com o Sorriso do Imperador enquanto fazia uns Tik Tok com os amigos. 

— Papai! — Puxou a camisa do seu pai, querendo a sua atenção. 

Lan Zhan o pegou em seus braços.  

— Papai, eu queria ir para Disney. — pediu de forma dengosa. 

— Hum. Peça do seu outro pai, se ele concordar a gente vai. — disse. 

Os olhos negros de Lan SiZhui brilharam, pois com Wei WuXian as coisas eram muito mais fáceis, já que o seu outro pai vivia fazendo todos os seus gostos. Fora que o levava para altas aventuras que o pai inventava de fazer. Enquanto WangJi era mais severo consigo e negando quase tudo que pedia.  

— Obrigado papai! — Beijou a sua bochecha e correu atrás do seu outro pai.

Vendo que Wei WuXian estava distraído com seus dois amigos de pinga, e sabendo que não seria fácil ganhar a sua atenção no momento, o garotinho decidiu fazer uma cena digna de um belo ator mirim prodígio de Hollywood — coisa que ele aprendeu com o próprio papai. Ele simulou que tinha caído feio no chão, com isso a criança abriu um berreiro. Wuxian, que dublava umas vozes no Tik Tok, largou o celular e foi atrás da sua pequena cria. 

— Meu raio de sol, o que houve? — perguntou em um tom preocupado, enquanto colocava o seu menino em seu colo. Fazendo de tudo para que ele se acalmasse. 

— Eu… eu… caí… — Fungou tristonho. Mesmo sendo uma encenação, o choro era real. Wei WuXian secou as suas lágrimas, deu pequenos beijinhos em sua bochecha gorducha e disse palavras de conforto.

— Pronto, pronto, pronto, meu doce de brigadeiro. — confortou Wei, então o filho parou de chorar.

— Papa, eu quero ir para a Disney. — SiZhui decidiu falar. 

Wei Ying o encarou. SiZhui visitou mais a Disney em seus cincos anos de vida, do que ele que visitava os bares de esquina. 

— Vai pedir para o seu outro pai. 

— Ele falou para vir com o senhor. — disse. 

Uma ideia bem travessa veio na mente dissimulada de Wei. Há pouco tempo, o seu sogro veio encher a sua santa paciência por não sentar direito no sofá, pois ele parecia uma perereca andando de patins. Às vezes, Wei se perguntava por onde a morte andava, pois o que parecia era que ela esqueceu-se do velho maldito, já que ele estava fazendo horas extras na terra. Quando mais Lan QiRen ficava, mais um pé no saco ele era. Se o seu sogro não fosse tão chato, Wei o levaria para jogar dominó na pracinha com outros idosos, talvez umas amizades novas e uma fofoca sobre alheia o mantivesse entretido e ocupado. 

— Tudo bem, você pode ir, porém com uma condição… — Um sorriso zombeteiro se fez em seus lábios. 

— O quê? — Yuan tinha as suas orbes brilhando somente com a ideia que iria para a Disney. 

Wei Ying se aproximou no ouvido do seu filho e disse algo bem baixinho para a criança. 

— Só isso?! Muito fácil, papa! Eba! Eu vou para a Disney! Você é o melhor, papa. Amo muito você.  — SiZhui comemorou empolgado. 

O filho deu um beijo na sua bochecha, abraçou o mais velho e desceu de seus braços. Vendo a criança ir para outro cômodo, Wei WuXian permitiu-se rir que nem uma hiena com dor de dente.

— O que o satanás aprontou? — Escutou a voz do seu irmão mais velho, Jiang Cheng. 

— Nada… — Coçou a sua nuca. 

— Quem nada é peixe, quem deixa passar é ônibus, quem tem limite é estado, quem dispensa é exército. Você desconhece tudo isso, seu aprendiz do sete peles! 

Wei WuXian fechou a cara. Porém, o seu irmão o conhecia muito bem. Até mesmo quando ele pensava em aprontar Jiang Cheng já sabia.

— Algo simples… — jogou no ar.

— Devo ligar para IML? — Cruzou os seus braços olhando desconfiado para o seu irmão. 

— Sabia que é bom! Pode ligar, nunca se sabe… — Cheng deu um tapão no ombro do outro. — Aí! 

— Procura te orientar, seu satanás!

— Lan Zhan! O meu irmão me bateu! — Wei WuXian foi até o seu marido choramingando falsamente, e como era uma pessoa muito carinhosa quando tratava-se de seu Wei Ying, foi logo dando a sua maior atenção ao o esposo. Lan Zhan olhou feio para o seu cunhado, queria nem saber se ele namorado do seu irmão e cunhado. 

— Lá vem o gado. — falou Jiang Cheng, que logo foi atrás do seu namorado, antes que um certo gado viesse atrás dele.

[...] 

Todos que estavam na residência da família Lan estavam sentados à mesa, com caras desanimadas de quem acabou perdendo dinheiro em uma aposta ou na rua mesmo. Vendo a comida, que era só era uma sopa insossa, onde tinha mais água que um rio, Wei WuXian chegou a perguntar para si mesmo, se aquela comida foi saqueada de um hospital público, porque a aparência e o sabor eram o mesmo. Só olhando aquilo, sentiu o seu estômago revirar. A hora da refeição era a hora mais sagrada para a família do seu marido. As milhares de regras que ele não dava importância, eram bem aplicadas na hora da refeição. 

O seu sogro discursava algo, e Wei Ying nem fazia questão em prestar atenção nas palavras do velho. Preferia estar em casa deitado no sofá, em família, e assistindo alguma série maravilhosa na Netflix, comendo comida decente e, claro, com a sua cachacinha do lado. Na sua casa tudo podia, afinal ele que mandava na bagaça toda. Wei Ying estava quase caindo de sono, quando escutou pequenos passos correndo em direção a mesa. Olhou para onde vinha o som e se deparou com seu filho Lan SiZhui correndo animado com algo em mãos. 

— Vovô! Vovô! Vovô! Vovô! — gritou o menino e todos olharam para o pequeno Lan.

 — SiZhui, você sabe que é proibido correr, gritar e atrapalhar o vovô em casa? —  Lan QiRen arqueou uma sobrancelha para a criança. 

Todavia, o menino era cria de Wei WuXian, o fazendo nem sequer ficar com medo das broncas do avô. Do mesmo jeito que era uma ótima e doce criança, possuindo altas habilidades como de WangJi, ainda sim tinha os seus lados de um pequeno demônio solto. É filho de Wei WuXian, então não era de menos. 

Em uma das regras da família Lan dizia que as crianças não podiam comer juntos com os adultos, por isso elas comiam em outra ala e com algum funcionário da família vigiando. Lan QiRen olhou seriamente para WangJi, praticamente o acusando de não estar sabendo educar o próprio filho com as regras da família. Céus, não se educavam como antigamente, hoje qualquer coisa o Conselho Tutelar bate na sua porta, falando que é errado — mesmo que sua cria faltasse lhe dar um chute nas canelas. 

— Vovô! Vovô! Vovô! O senhor pode bater as botas? Porque se o senhor bater as botas, o papa Wei me leva para a Disney. — A criança ergueu um par de botas brancas para o seu avô e olhou de modo inocente e esperançoso. 

Inicialmente, a maioria da mesa ficou perplexa, mas logo o choque passou e todos começaram a tentar abafar os seus risos com as mãos, enquanto Wei WuXian fazia questão de rir de forma escandalosa.

— O quê, menino?! — Lan QiRen estava desacreditado que havia ouvido aquilo do seu neto. Ele pensou que estivesse surdo por conta da idade, pois não era possível. 

— O senhor pode bater as botas? Por favor, vovô, não custa nada bater as botas. 

Mais séries de risos eram ouvidos, QiRen olhou mortalmente para Wei WuXian. 

— Wei WuXian! 

— Meu sogro, o seu neto só quer que o senhor bata as botas. Não vejo um mal nisso, agora se o senhor pensou em outra coisa… 

— Você sabe muito bem o que significa, seu indisciplinado! Se aproveitando da ingenuidade da criança! 

— Mais é verdade, se o senhor bater as botas, eu levo o meu filho para a Disney. — provocou.

— Bate as botas logo vovô. Eu quero ir para Disney! — continuou a criança sem perceber o clima entre os adultos e ergueu as botas brancas para o seu avô. 

— Misericórdia. Você não é o cão, mas gosta de atentar. — falou Jiang Cheng. Nessas horas que ele agradecia por o seu irmão ser adotado, assim poderia usar isso em defesa, pois vai que pensam que todos da família tinha um parafuso solto. 

— Um sem vergonha! — retrucou Lan QiRen 

— Sou mesmo, o seu filho que o diga. — Piscou para o marido que mantia a sua cara de paisagem.

— Seu… 

Com isso, os dois começaram as suas afrontas. Lan Zhan nem sequer se importava, conhecia muito bem a peça com que tinha se casado. Contudo, algo chamou a sua atenção: o seu filho estava mastigando algo.

— Vem cá, Yuan. — chamou de forma séria. O garotinho foi até o seu pai. — O que você está mastigando?

— Bombom. — respondeu inocentemente.

— Você sabe que não pode comer doces. Abra essa boca e jogue isso fora. — repreendeu, porém quando ele abriu a boca do filho para tirar o doce, Lan WangJi sentiu a sua alma sair do corpo. 

Não era um bombom que ele comia, mas sim, uma camisinha. 

— Onde você arrumou isso? — A atenção de todos voltou-se para os dois, inclusive a de Lan QiRen.

— No quarto do titio XiChen. Ele tem muito bombom, papai. Tanto é que chamei o Ling e o JinYi para comer comigo. — Ao ter o nome citado, XiChen ficou pálido que nem um cadáver.

— Isso não é bombom, muito menos coisa para criança ficar mexendo! — WangJi repreendia o menino.  

— Então, o que é? Se não é bombom? — questionou. A maioria ficou em um silêncio estranho e desconfortável.

— É coador, meu filhote. — respondeu Wei WuXian tentando conter o riso. 

— Daqueles de café, papa? — perguntou inocente. A maioria queria rir, outros queriam jogar um tijolo em Wei Ying. 

— Quase isso… 

— Ele côa o que, papa? — SiZhui se aproximou de Wei. 

E, antes que ele fosse responder, Jiang Cheng o interrompeu:

— Já chega, caralho! Você fica quieto Wei WuXian! Vindo de você, não espero nada. Mas não traumatize o meu sobrinho. 

O Wei não disse nada. Não estava afim de ter um copo jogado contra si, vendo que seu filho estava com WangJi, o chamou. 

— Vem com o papa, A-Yuan. — chamou a sua criança, abrindo os seus braços. 

O menino correu para os braços dos seu pai, sendo pego em seu colo, abraçando o seu pescoço e deitando a sua cabeça no peito alheio. WuXian passou as suas mãos sobre os cabelos negros de SiZhui. Se o pior acontecesse, ele correria com a sua criança, ninguém ia jogar uma frigideira nele com o seu bebê no braço. 

— Será que poderíamos comer em paz? — XiChen disse em tom calmo, mesmo que suas bochechas estivessem vermelhas.

Os presentes ali da mesa concordaram. Entretanto eles escutaram gritos infantis vindo em direção a cozinha. 

— Parado, você está preso! — falou JingYi para Ling com um par de algemas felpudas de oncinha em mãos. 

Todos olharam para o objeto que a criança tinha em mãos. 

— Da onde tirou isso, seu atentado?! — perguntou Jiang Cheng nervoso e irritado.

— No quarto do titio XiChen. — respondeu de forma óbvia. 

— Você nunca vai me pegar! — Jin Ling puxou um chicote vermelho em mãos. 

— Meu filho! Isso não é brinquedo, desgraça! — Jin ZiXuan quase teve um infarto quando viu isso na mão do seu filho. De imediato, ele tirou isso das mãos da criança.

— Mas… — Ele iria chorar. 

Wei WuXian ria como condenando dos brinquedos adultos que as crianças acharam e ficaram brincando. Enquanto o seu cunhado morria de vergonha; todos se contorciam internamente com tamanha vergonha alheia; o seu sogro soava e abria a boca várias vezes sem ter o que dizer. Lan Zhan nem sequer se importava com tudo aquilo, ele só queria ir embora para a casa com a sua família. 

— Papa, eu vou para Disney? — SiZhui olhou para Wei WuXian. O menino fez beicinho quase chorando, o moreno apertou mais a sua cria que estava em seu colo. 

— Claro, meu bebê, porém… — Um sorriso zombeteiro se fez em seus lábios.

— Vovô, bate logo as botas! Eu quero ir para Disney! — SiZhui cruzou os seus bracinhos e olhou para o seu avô de forma emburrada. 

Não aguentando mais aquele circo dos horrores que tinha se tornado na sua casa, Lan QiRen acabou desmaiando.

— Papa Wei, o vovô dormiu, mas não bateu as botas. — lamentou o menino que tinha as suas orbes lacrimejosas. 

— Você vai pra Disney, meu filhote. — anunciou Wei para o garotinho que gritou de felicidades. 

Lan WangJi apenas balançou a sua cabeça imaginando o quanto ia gastar com eles dois. A sua carteira chorava, já prevendo o tamanho da fatura do cartão de crédito. Aquele almoço ficou marcado para a história da família Lan, já que muitos riam, choravam e jogaram as fofocas do almoço nas redes sociais — coisa que Nie HuaiSang fez. Tudo isso porque um garotinho queria ir para Disney.