Estudo do Caso de Helena Bertinelli escrita por EVE


Capítulo 3
desvia de mim os teus olhos, porque eles me perturbam II




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No bar, Dinah lidava de maneira indiferente com os flertes de desconhecidos, às vezes sorria para as ofertas de drinques ou tentativas de início de conversa e os dispensava, mas sempre havia algum insistente. 

Helena retorna com as bebidas na mão. 

Com o hálito de cerveja, ele - o infeliz insistente - as convida para casa dele e Helena observa a mão envolvendo seu ombro e principalmente aquela mão que desceu ao quadril de Dinah. 

No corredor para o apartamento, elas compartilhavam o caminho em silêncio. 

"Você mandou o cara para o hospital!" Dinah comenta, exaltada. 

Helena com a face vazia apenas acena a cabeça, em dias melhores ela ofereceria aquele sorriso satisfeito. 

"Eu estava controlando a situação." 

"Assim como controlou os outros dois antes dele?" Helena murmura. 

"Como vo-" Dinah cessa os passos e a encara, "foi de propósito, a sua demora?" 

Ela não responde, concentrada com as chaves na fechadura da porta e a abre. 

Dinah a segue até a cozinha e apenas observa Helena retirar algo da geladeira. "Você estava me vigiando?" Ela pergunta incrédula, mas recebe novamente o silêncio de Helena encostada na parede com o olhar baixo, enquanto beberica a água da garrafa. 

"Eu preciso ser observada? Por quê?" Dinah concentra o peso do corpo em um lado da perna e repousa a mão no quadril, ainda esperando alguma reação de Helena e uma das sobrancelhas é erguida. "...Ciúmes?" 

"Eu não estava com ciúmes." Helena murmura longe. 

Dinah recomeça. "Então, o que foi aquilo?" Ela diz para a mulher de braços cruzados justos ao corpo, sustentando mais um dos conhecidos silêncios. Por certo, ela esperaria Helena compartilhar as próprias palavras; ela esperaria, esperaria e esperaria, mas, por vezes os silêncios nunca foram assim, irritantes. "Responde, Helena!" Ela exige. 

A mão fechada quase se afunda na porta da geladeira. "Eu não estava com ciúmes!" Helena grita. O rosto avermelhado e o peito se elevando rapidamente. 

Alarmada e por reflexo, Dinah ergue os punhos e anda alguns passos para trás e a encara com semblante duro, ainda com as cenas anteriores do bar frescas na memória. 

Helena olha em direção à mulher de guarda alta em posição de ataque e depois para as próprias mãos. Não foi um soco bem pensado; ela flexiona os dedos e a mão lateja de dor. "Eu não estava com ciúmes." Helena repete, baixo como para si mesma. Outras palavras estrangeiras inflam contra a sua garganta, mas seu corpo lentamente entrava em um estado de exaustão. Ela cambaleia alguns passos para trás, segurando a mão dolorida, até encontrar a parede ou até um ponto em que não pode controlar os olhos marejados.  

Dinah lentamente se aproxima e toma o rosto de Helena entre as mãos. "Olhe para mim," ela pede, mas recebe uma recusa, "Você pode, por favor, olhar para mim quando estou falando com você?" 

Quando Helena decide elevar os olhos, Dinah os encontra desfocados, mas ainda procurando algo em sua face. Ela reposiciona com cuidado as mechas soltas atrás da orelha de Helena, limpa as lágrimas pesadas na bochecha dela e suspira para tudo aquilo que poderia sugerir sobre aqueles olhos. Mas, antes de qualquer conclusão, Helena a surpreende; se inclina e apoia a cabeça no ombro de Dinah e vários pedidos de perdão são sussurrados contra o pescoço dela. 

Incontáveis foram os segundos que permaneceu com aquela grande mulher em seus braços, domando as lágrimas e respiração seja com o silêncio ou a leve carícia nos cabelos dela.  Quando Dinah olha novamente o rosto de Helena, as perturbações antes encontradas no semblante dela, agora quase imperceptíveis. 

E então, Dinah decide mudar de foco para buscar as mãos de Helena e ambas se tornam atentas às duras linhas daquelas mãos e aos longos dedos calejados. Dinah também suspira para as palmas expostas. 

Ela percebe que Helena está controlando a respiração novamente - essa também era sua Helena, por vezes de ombros caídos ainda tentando encontrar uma reação - e com aquela Helena em suas mãos, Dinah eleva o olhar e encontra alguém que já conhecia, mas ainda permanece sem vocabulário. 

Dinah traz uma das mãos para os lábios e calma, beija as juntas avermelhadas dos dedos. "Eu não sei o que foi aquilo tudo." É macia a forma como ela diz as palavras espaçadas, para depois, repousar a palma em sua bochecha. "Mas, eu quero que você saiba que eu não preciso provar nada e menos ainda de proteção." Os olhos pesados e rentes aos de Helena completavam seu aviso. 

A atenção de Helena caía sobre a própria mão repousada e o semblante sério de Dinah, agindo como de alguém que é exposto ou coagido a entrar em contato com o aquilo que teme. E assim elas permanecem por alguns segundos; Dinah pensou em beijá-la, mas Helena retira a palma quente de sua bochecha. Dinah, por fim, suspira e pergunta se elas estavam bem. Helena limpa a garganta e apenas acena que sim com a cabeça, mas as mãos retornam aos punhos fechados e os olhos procuram outros lugares onde repousar bem longe da face de Dinah. 

Os ímpetos de agressividade não condiziam com o pequeno pássaro acuado na sua frente. Às vezes, a faceta de assassina ou da insensível guerreira parava abruptamente de funcionar e tudo bem. Ela também lidaria com essa Helena e seus centímetros a mais de altura e humor inconstante, mas, no momento, ela estava diante de uma fina flor, a qual no final do dia, a única exigência dela era compreensão.  

Enquanto Helena era metódica e organizada com seu número limitado de vestuário e combinações sempre sóbrias e em diferentes tons de preto ou seus produtos de higiene pessoal perfeitamente alinhados. Ela não se importava com os hábitos de Dinah - as calcinhas no box do banheiro ou os acessórios espalhados por toda casa. Ela desconsiderava o estado da geladeira; as matérias orgânicas desconhecidas criando o seu próprio ecossistema dentro de alguns vasilhames ou a considerável quantidade de garrafas secas de cerveja, mas sobre isso, sem problemas, elas teriam que comprar uma geladeira nova de qualquer jeito. 

Naquela noite, Dinah a esperou na cama. Após muita espera, ela decide procurar Helena no apartamento. Ali estava ela, uma filha da puta tão bonita, toda italiana - siciliana como era constantemente corrigida - encostada na amurada da varanda do apartamento e observando o tráfego sempre existente das ruas de Gotham. Uma ambulância na rua chama a atenção e é ignorada. Dinah anda em direção à mulher na varanda, mas para no caminho, quando percebe que Helena inclina a cabeça e murmura algumas palavras para o ar. Dinah silenciosamente olha de longe aquela mulher e se mantém assim por mais alguns segundos. 

Dinah já havia observado que Helena saía durante a madrugada, para onde? Só Deus sabia. As aulas de siciliano entraram em recesso, mas Helena sempre retornava com o café da manhã. As fugas da noite, justificáveis. Helena era repentina e de sono inconstante. 

Mas, os desaparecimentos durante a tarde... Eram também somente testemunhados por Deus e um padre intrigado com o comportamento incomum de uma jovem devota. Helena estava frequentando a Igreja de Santo Agostinho no centro de Gotham; ela se acomodava no quarto assento da fileira direita, e dali olhava Jesus, acima dela, grande e benévolo no altar da igreja. Ela não inclinava a cabeça para dizer as próprias preces, tampouco movia membro algum; e assim, seguia estática apenas examinando a Cristo e depois, partia. 


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