Problema complicado, solução simples escrita por Bianca Lupin Black


Capítulo 9
Capítulo 9


Notas iniciais do capítulo

Obrigada à AnneSalvatore pelo comentário no capítulo anterior.
Espero que gostem (e comentem também, para eu saber o que estão achando)!



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O garoto despenteado posava ao lado de uma blogueira loira com harmonização facial, ambos com menos roupa do que o recomendado. A garota tinha seus milhares de seguidores, e especulações sobre seu acompanhante misterioso podiam ser encontradas aos montes. Aquele tabloide online tinha alcance pouco maior do que os posts sobre unhas que ela via de vez em quando, contudo, tendia a crescer.

A porta do elevador abriu. A mulher desfilou para fora e adentrou o apartamento. O garoto da foto – agora com mais roupas – esfregava o dedo sem parar no telefone, o corpo estirado no sofá.

"E aí, mana?"

"Oi. Como foi sua noite?"

"Incrível. Mike e eu arrebentamos."

"Isabel acabou de me mandar isso", ela mostrou o post. O queixo dele caiu. "Ah!, e a agência recusou. Eles iam aceitar, mas mudaram de ideia por causa dessa foto."

Bufando, ele sentou. A agência de modelos era a cartada final para lançá-lo na mídia. Tinha até se arriscado com aqueles vídeos curtinhos e idiotas – por que ele deu ouvidos à Jenny? –, mas não deu muito certo.

"Papai e eu temos conversado há algum tempo."

"Mas por que..."

"Cala a boca", ela sibilou. "Ele pode lhe apresentar a pessoas influentes, em suas próprias palavras. As únicas condições são você morar com ele e frequentar a escola", ele revirou os olhos. "Faz quanto tempo que você está tentando? Oito meses? Umas semanas a mais ou a menos?"

"Quatro meses", ele corrigiu, abaixando a cabeça.

"Não faz diferença. Ou vai com o papai ou arruma um emprego. Porque eu não vou sustentar um aspirante a músico pelo resto da vida."

"Katie..."

"Não me venha com 'Katie'", ela cruzou os braços. "É hora de agir como o adulto que você diz ser."

"Ok, mas se não funcionar, eu posso voltar para casa?"

"Claro que sim", ela tocou a bochecha do irmão caçula. "Vai arrumar suas coisas. Comprarei uma passagem de ônibus para você. O quê? Achou que eu ia pagar para você ir de avião?", encarou a careta chocada dele. "Nem morta."

Enfiar roupas na mochila foi mais rápido do que cozinhar macarrão instantâneo. Ele gastou mais tempo encarando as paredes amarelas desbotadas – nunca pensou que faria isso. Todas as noites insones assombrando-o. Quantas letras ele não havia criado ali, aninhado no cobertor com a caneta entre os dentes, sonhando com os shows e premiações?

A chance foi palpável. Até Katie acreditava – e ela parou de acreditar no Papai Noel aos cinco anos! Mudar para uma cidade onde nem todo adolescente queria trilhar o caminho da fama parecia uma rota fácil de seguir. E era melhor morar com sua irmã do que com seu pai.

Um pouco de arrependimento pelas palavras duras cresceu em seu peito. Todas as pessoas que conheceu estavam conseguindo o que queriam. Pelo menos, era o que demonstravam.

Ele esperava uma recepção com luzes e beleza para sua última chance em Hollywood, recebeu um posto de gasolina cheio de motoristas mal-humorados e moscas. Apesar de mal-humorado e motorista, seu pai se destacava na multidão. Ele jamais admitiria, mas seu pai era a única pessoa que se encaixava em suas expectativas, ainda que o terno brilhante fizesse mais sentido em uma apresentação boêmia para ricaços.

Quando o garoto saiu do ônibus, o homem se esforçou para mostrar um sorriso e o filho até tentou fazer o mesmo.

"Vamos ficar presos aqui por algum tempo", o volante recebeu um tapinha.

"O que Katie disse a você?", o garoto cruzou os braços. Enquanto decidiam quem ficaria com a mala sem alça.

"Só que você precisava de ajuda para não acabar com a própria vida."

"E o que tem em mente?"

"Andei estudando o que produziu e bem, você precisa de mais pessoas."

"Eu sou um caso tão perdido assim?"

"Isso é para evitar justamente que se torne um caso perdido. Em vez de anunciá-lo como um possível novo astro, é melhor deixar que a indústria venha te buscar."

"Como se faz isso?"

"Tenho uma estratégia e um lugar para você tocar aos finais de semana."

"Sabe que eu toco guitarra e não piano, né?"

"Eu vi seus vídeos. Mencionei isso, não mencionei? Suas habilidades como instrumentista são excelentes, o vocal precisa ser trabalhado."

Obrigado pelo elogio e pela sinceridade, o garoto colocou um pé no painel. O motorista apertou os olhos, mirando a avenida e o semáforo recém-aberto para ele. Tudo para não encarar o rapaz sem educação. A jornada perdeu uns bons minutos – a sanidade mental deles agradecia.

"Casa legal", o garoto comentou, jogando a mochila no ombro.

"Bem-vindo ao lar, filho."

O apartamento de Katie caberia três vezes só na sala de estar. A decoração saltava aos olhos em tons de roxo e cinza. Fotos impressas no tamanho de outdoors exibiam seu pai em trajes de festa, ao lado de homens e mulheres tão exuberantes quanto ele.

A sala de jantar contava com uma mesa longa e doze cadeiras, tudo feito de madeira nobre. A cozinha tinha paredes brancas e aço inox por todos os lados.

Peças de arte ocupavam cada espaço disponível no corredor do primeiro andar. Tinha até um quadro que Katie compraria, caso ganhasse na loteria.

"Sua mãe me convenceu a comprar esse. Foi um ótimo investimento."

"Ela convenceu um monte de gente a fazer um monte de coisas."

Ele tinha seu próprio banheiro, além de uma janela gigante com vista para o letreiro da cidade em seu quarto de paredes azul-escuro, que devia ser o cômodo mais neutro, sempre pronto para um hóspede.

Deixou o corpo cair na cama, os lençóis tinham cheiro de recém-lavados, com o mesmo amaciante que ele e Katie usavam. Seu coração começou a bater mais devagar conforme o perfume familiar descia até seus pulmões.

"A apresentação é amanhã à noite", o homem falou antes de virar as costas numa pirueta e descer a escada.

E foi assim que o garoto passou suas primeiras horas na casa nova: ensaiando. Os dedos agradeceram quando seu pai o avisou que estavam prontos para sair, no dia seguinte.

The Late Hollywood Club era ainda mais luxuoso do que a casa, com uma estética anos 20, cheio de coisas prateadas e plumas.

"Ah, Diego", disse o homem para o garoto que ajeitava um vaso de flores. "Conheça meu filho, Robert."

"Pode me chamar de Bobby", ele não esqueceu de sorrir e piscar.

"Pode cuidar dele, Diego? Preciso resolver mais algumas coisas antes de abrir."

"É claro, Caleb", sorriu enquanto seu chefe virava as costas. "Os bastidores ficam por aqui."

Diego o guiou por um longo corredor, cheio de saletas em cujas portas lia-se "camarim". Passaram por mais da metade até encontrarem um vazio.

"Tem suco e água no frigobar", ele avisou, ajeitando o fone no ouvido. "Quer alguma coisa para comer?"

"Não, eu não estou com fome."

Quando Diego saiu, Bobby sabia que Peter verificaria o menu da noite e que Jessica seria a responsável por checar os convites. Ele só não sabia quem eram Peter e Jessica.

A guitarra destinada a ele era azul, para combinar com os outros instrumentos, e muito mais leve que aquela que sua mãe lhe dera dois aniversários atrás.

Sentia falta de Adèle. Em algumas noites, sonhava com ela e ao acordar, se perguntava se o preço que pagou valia a pena.

No momento em que a oportunidade de morar com Katie em Portland surgiu, ele arrumou alguns pertences, disse adeus aos poucos amigos – não na melhor das situações –, beijou o rosto da mãe e encarou a viagem de quinze horas.

Estando de volta, não fazia a menor ideia de por onde Adèle andava. Ligações eram maçãs e a caixa postal era a cabeça de Newton, infalível.

A lista de músicas da noite foi colada atrás da porta, ao lado de um cabide com o figurino. Azul-marinho não era sua cor favorita, mas tinha que dar o braço a torcer: o colete brilhante sobre a camisa branca caia muito bem nele.

"Você entra em dois minutos", foi o único aviso que recebeu.

Fechou os olhos, respirou fundo, contou até sessenta duas vezes e vislumbrou os refletores ofuscantes.


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