Under Our Stars escrita por StarSpectrum


Capítulo 9
Capítulo IX - O Guardião da Floresta




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Leshy, a criatura da floresta, grunhe em nossa direção, sua boca imensa se mantém aberta e sua postura é como a de um animal selvagem. Olho pra Flann, ela mantém seus olhos focados no monstro. Ela respira fundo antes de virar as adagas para trás, e sair em disparada, tão rápida quanto o vento, em direção ao Leshy, até chegar em uma de suas pernas. Em um único giro, ela corta com as duas adagas, rasgando a perna do monstro como se fosse apenas um punhado de folhas. O Leshy finalmente reage, até parece que ele não havia percebido ela se movendo para perto dele, e então tenta agarrar Flann com uma das suas mãos enormes. Flann rapidamente dá um salto para trás, evitando ser pega, e então um salto para frente, cortando o Leshy bem no estômago. Que estranho. Ambos os golpes foram diretos e aparentemente profundos, mas ele não derramou uma gota de sangue. É como se não possuísse um corpo por baixo de todos aqueles cipós e pelos.

Leshy contra-ataca, ou ao menos tenta. Flann se mostra rápida o bastante para se esquivar de qualquer tentativa do monstro de agarrá-la. Em um momento, Flann finca uma de suas adagas no monstro e a usa como impulso para dar um imenso salto por cima do Leshy, e o golpeia bem nas costas. Percebo que seus olhos brilham em escarlate logo antes dela esticar a sua mão, e a adaga de antes atravessar o monstro para chegar até a mão de Flann. Tão... TÃO LEGAL‼ Ela cai graciosamente no chão, como se fosse leve igual uma pena, e percebo que na ponta da adaga que foi puxada, tem algo se movendo. Não consigo ver exatamente o que é, mas parece ser um tipo de inseto. Ela atingiu esse inseto de dentro do Leshy quando puxou a adaga?! QUE INCRÍVEL‼

Flann joga o inseto no chão e o esmaga com o pé. O monstro grita, parece que dessa vez realmente sentiu dor. Ele então enterra de uma vez ambos os seus braços no solo, e sinto todo o terreno tremer. Raízes começam a quebrar o solo, e se movem em direção à Flann em rápida velocidade. Ela pula para trás para se esquivar, e então corre para uma árvore e a escala rapidamente com suas adagas, as raízes a perseguem árvore acima, envolvendo o tronco inteiro, e em um único puxão, o Leshy arranca a árvore do chão e a arremessa para longe, na minha direção!

Acabo me abaixando por puro reflexo, e o tronco cai logo atrás de mim. Olho para trás, e não vejo Flann em lugar nenhum. A fera ruge, e eu olho em sua direção, e então, o monstro começa a correr em quatro patas, bem na minha direção! Começo a me levantar e me preparo para dar um golpe bem dado no estômago desse monstrengo. Quando a fera se aproxima, ela abre ainda mais sua boca enorme, mas antes que eu possa fazer qualquer coisa pra me defender, algo a atinge primeiro, uma única flecha vermelha que faz o Leshy recuar imediatamente. Olho para trás, e Flann está de pé no tronco, segurando um arco.

"Flann!" – Digo, é tão bom ver que ela está bem.

Flann aponta o seu arco para o monstro. O arco não possui linha, e ela não carrega flechas, mas ela faz o movimento de puxar uma flecha mesmo assim. Uma pequena luz vermelha se forma de entre seus dedos, que então se transforma numa flecha completamente vermelha. Uma linha também se forma, da mesma cor que a flecha, que se estica conforme é puxada. Flann então dispara a flecha, e vejo que o Leshy parece sentir muito mais dor do que quando ela usou as adagas, gritando e se contorcendo por inteiro. Ela desce do tronco e então juntas as duas mãos no meio do arco, e o torce, desprendendo seu meio e se separando nas duas adagas que ela estava segurando antes!

"STAR! SE ABAIXA!" – Ela grita, eu olho para trás, e percebo que estou prestes a ser pega pelas raízes do Leshy.

Sinto um surto de adrenalina percorrer o meu corpo, e minhas pernas se preparam para um salto por puro instinto, em um momento minhas pernas queimam como se pegassem fogo, mas antes que eu possa fazer qualquer coisa, Flann imediatamente cai graciosamente em minha frente, adagas prontas para o combate, e começa a cortar as raízes o mais rápido que pode, mas acaba sendo presa por todas elas e puxada para perto do Leshy, que a levanta pro alto e começa a apertá-la com as raízes. Flann grita de dor.

"FLANN!" – Grito, e me preparo pra correr com a faca em mãos.

"STAR!" – Ela grita de volta – "SAIA DAQUI AGORA!

"VOCÊ NÃO VAI CONSEGUIR SE SOLTAR SOZINHA!" - Grito de volta, e começo a correr em direção ao Leshy.

O monstro parece focado na Flann, pois não me percebe até que eu chegue perto e corte a sua perna, assim como Flann fez. Em um instante, o Leshy me golpeia com seu enorme braço e sou arremessada para longe, meu corpo inteiro dói tanto quanto naquele beco. Eu nem percebi que ele mexeu o braço pra me atacar. Me levanto, e percebo que Flann está sendo cada vez mais apertada nas raízes da fera, sendo completamente envolvida por elas.

"STA..." – Ela força a voz pra fora – "ACERT... A... NA... CABE... ÇA..." - Ela conseguiu dizer, antes das raízes cobrirem toda a sua cabeça.

As raízes que a envolvem começam a descer, lentamente entrando no solo. Tenho que agir rápido! Atingir na cabeça? Então é isso que eu vou fazer! Começo a correr, segurando a faca em minha mão com força. Corro o mais rápido que posso, mas dessa distância, não vai dar tempo de atingir o Leshy antes da Flann sumir no subsolo. Preciso ir mais rápido, preciso... de um impulso! Espero que não seja uma ideia estúpida, porque vou fazer mesmo assim. Em um salto, viro para trás e aponto a minha mão na direção contrária, e me concentro para disparar uma única rajada de energia, que me faz ser arremessada em alta velocidade na direção do Leshy. Esbarro nas costas do monstro, e por puro reflexo enfio a faca em sua nuca. O monstro começa a envolver seus cipós em mim, e começo a ficar desesperada. Respiro fundo, e apoio a palma da minha mão no cabo da faca, e me concentro para mais uma rajada de energia, que lança a faca atravessando a cabeça da criatura, que ruge e me solta. Caio no chão e percebo que Flann também foi solta. A criatura grita e cai no chão, os cipós se contorcendo como loucos. Flann imediatamente puxa um papel de dentro do vestido, corta seu dedo com uma das adagas, e escreve no papel, fazendo aquele mesmo ritual contra os Usui. Ela deixa que o pedaço de papel caia sobre o Leshy, que acaba queimando e virando cinzas em meros instantes, assim como os Usui. Acabou.

Solto um suspiro, e vejo que Flann puxou um pequeno frasco de dentro de seu vestido, o abriu, e bebeu o conteúdo. Ela então joga o frasco no chão e o quebra com o pé, se virando em minha direção logo em seguida. Flann se aproxima, com uma expressão séria no rosto, e percebo que ela possui um corte na bochecha, que está sangrando bastante.

"Flann, a sua bo..." – Antes que eu sequer termine de falar, o ferimento na bochecha de Flann começa a se fechar, e ela limpa o sangue com a manga do vestido – "...checha? Mas como...?"

"Star. Você se arriscou muito vindo para cá. Me desobedeceu, colocou a sua, e a minha, vida em risco." – Ela me encara, e então suspira – "Mas... você também mostrou grande coragem e habilidade. Eliminar um Usui, qualquer um faz, mas disparar algo com força o bastante para perfurar o crânio de um LeshyIsso sim é impressionante."

Acabo abrindo um leve sorriso, e encaro a palma da minha mão. Então esse poder que eu possuo... não são meras faíscas de luz. É algo poderoso... E se eu consigo fazer algo assim, sem ter nem ideia de como brigar contra essas criaturas... Talvez se eu tivesse um pouco mais de ajuda, eu poderia fazer muito mais. Ajudar muito mais.

"Flann!" – Ela arregala os olhos, como se não esperasse que eu chamasse assim do nada – "Será que você poderia me ensinar a lutar?"

"Não." - Fria e seca.

"Por que?!" – Protesto – "A gente ia se dar muito melhor acabando com uma criatura assim se eu soubesse lutar!"

"A gente? Não tem a gente." – Ela aponta pra nós duas – "Eu estava nessa sozinha. Você se meteu no meio, e me atrapalhou o bastante pra eu ser pega. Não posso matar esses monstros e ficar de babá pro seu 'treino'".

"M-mas Flann! Esse é o ponto! Se você me ensinasse a brigar, você não ia ter mais que me proteger!"

Flann fica em silêncio por um momento – "...Vou pensar no seu caso."

"Isso!" – Jogo os braços pro ar em comemoração.

"Não vá ficando animada. Mesmo que eu aceite, não vamos ficar juntas por tanto tempo assim."

"Não... não vamos?"

"Já se esqueceu? Vou até Auster, farei o que tenho que fazer, e vou seguir em frente. Você vai ficar por lá, o que, alguns dias e depois voltar?" – Ela dá as costas e começa a andar, em direção de onde viemos – "Não vamos ser mestre e estudante viajando por aí." - Acabo ficando em silêncio. É verdade, eu não vou poder continuar com ela. Mas talvez eu possa convencê-la a me ensinar pelo menos um pouco do que ela sabe.

Sigo a Flann pela floresta. Percebo que o tronco das árvores e as suas folhas estão secando. Tão de repente? Paro, e pego uma das folhas secas.

"Que estranho... não estamos no outono, e me lembro bem que não havia folhas secas quando eu vim por aqui."

"Ah, isso?" – Flann se manifesta – "É o que acontece quando se mata o centro de mana de uma floresta. Ela começa a morrer."

"Espera... o que?! A gente matou o coração da floresta?!"

"Eu não chamaria de coração... Um coração não pode ser trocado, o que pode acontecer nesse caso. Outra criatura, outro guardião, vai proteger essa floresta. O que matamos era o antigo guardião, corrompido... por algo."

"Corrompido? Pelo o que, os Usui?"

Ela nega com a cabeça – "Algo bem pior." – Ela continua andando – "É isso o que estou investigando de região em região."

[...]

Seguimos adiante, e finalmente saímos da floresta. Ori e o velho carroceiro estão sentados na grama recém-cortada, conversando. A carcaça do buffagru ainda está ali, sendo beliscada por um bando de corvos, mas o cheiro não está tão revoltante quanto antes.

"Não removeram a carcaça?" – Flann pergunta.

O velho se levanta e bate nas pernas pra remover a grama – "Minha filha, olha o tamanho dessa joça! Eu vou dar é a volta!"

"E o tráfego, como fica?" - Ela pergunta.

O velho bufa – "Ninguém passa por essas bandas não! No máximo, só no final do mês, sabe? Recolhem o cobre daquela vilazinha lá trás e levam pro Rei de Ferro."

Rei de Ferro...? Aquele que governa Demir...

Flann limpa a garganta e aponta para a estrada de onde viemos – "Sua predição está mal ajustada, veja."

Olhamos para onde ela aponta, e da estrada vem cavalgando três soldados, com armaduras prateadas. Um surto de ansiedade percorre meu corpo, tenho certeza de que são os soldados de Demir.

"R-rápido!" – Grito – "Tenho que me esconder!" – Me viro para correr em direção a floresta, mas Flann logo agarra meu braço.

"Você não consegue correr mais rápido que isso sem chamar atenção. Só tem um lugar que você pode se esconder, e você não vai gostar."

Acabo engolindo seco, e Flann me puxa em direção a carcaça.

"NÃO!" – Grito, mas Flann continua me empurrando – "NÃO, NÃO! ISSO NÃO!"

"São cavaleiros do rei, não vão querer sujar suas fantasias de prata com sangue podre!"

"EU não quero me sujar de sangue podre!" – Começo a me debater, mas Flann consegue facilmente me controlar e me empurrar até que eu caia dentro da carcaça.

Meu estômago revira só de sentir a textura, a carne parece derreter ao meu toque, o cheiro só piorou, e o desespero me preenche quando sinto pequenas larvas se mexendo entre meus dedos. Quero gritar, mas logo ouço o galopar de cavalos se aproximando. O galopar cessa devagar, e consigo ver a borda do capacete de um dos cavaleiros.

"Boa tarde, cavaleiros. Em que posso ajudá-los?" – Flann pergunta.

Silêncio.

"Nós fomos notificados de uma criatura misteriosa perto da floresta. Seria este buffagru o sujeito?" – Um dos cavaleiros pergunta, com uma voz rouca, grossa, e abafada pelo capacete fechado.

"Não." – Flann responde – "A criatura devia ser o Leshy que matei há uns minutos antes de vocês chegarem."

"Você matou um Leshy sozinha?"

Flann não diz nada.

"Como?" — Outro soldado se manifesta, ele soa jovem e surpreso.

Percebo que o terceiro soldado se aproxima da carcaça, e eu imediatamente me agacho, tentando me esconder o melhor possível, entrando um pouco mais aonde eu acredito ser as costelas do buffagru. Minha mão acaba deslizando, e eu caio de costas num amontoado de órgãos e carne, e as larvas começam a subir pelos meus braços, indo pras minhas roupas. Desespero toma conta, e eu me seguro pra não gritar. Não ouço mais nada no lado de fora, e só me concentro em não gritar e sair correndo daqui de dentro. Depois do que parece ser uma eternidade, percebo que o cheiro está piorando. Eu olho para as minhas mãos e braços, e as larvas estão caindo sozinhas, mortas. O que... tá acontecendo?

"Ugh. O cheiro está horrível. Vamos voltar e relatar que tem uma carcaça a ser removida." – O cavaleiro mais próximo da carcaça diz.

Os outros dois cavaleiros concordam, e ouço os cavalos trotando. Os trotes se distanciam e aumentam para um galope, e enfim... nada. Silêncio novamente. Me arrasto até o buraco da carcaça e coloco a cabeça pra fora. Flann está olhando direto pra minha direção, enquanto Ori e o velho carroceiro estão já em cima da carroça. Flann se aproxima e oferece uma mão. Eu aceito e saio de dentro da carcaça, com manchas pelo corpo e na roupa, e um cheiro horrível.

"Ah, então o cheiro ruim era você." – Flann diz, e eu só a encaro diretamente nos olhos.

"Ha. Ha." – Digo sarcasticamente enquanto olho ao redor – "Droga, não tem nenhum lago aqui por perto?"

"Se aguentarmos até Auster, te pago um banho decente." – Vejo Flann levar a mão ao nariz – "Acho que por esse cheiro, te pagariam pra você se lavar."

Não digo nada, só encaro Flann bem no fundo dos olhos, enquanto ela abre um pequeno sorriso e caminha até a carroça. Eu a sigo, e me aproximando da carroça, percebo o velho tapando o nariz também.

"Eita, minha filha! Que futum, parece que o boizão ali morreu de novo!" – Ele diz enquanto balança a mão na frente do rosto.

Ignoro o comentário e subo na carroça logo atrás de Flann. Subindo, percebo Ori com ambas as mãos no nariz, me encarando como se eu fosse a criatura mais horrenda que ele já viu.

"O-ori? Meu cheiro tá tão ruim assim?" – Pergunto, enquanto me sento no lugar onde eu estava.

"VOCÊ TÁ CHEIRANDO A COCÔ!" – Ori grita, e desperta uma gargalhada no velho carroceiro.

"QUEEEE??" – Começo a fungar em meus próprios braços, tentando sentir algum cheiro. Será que meu nariz ficou ruim ou eu que me acostumei?

A carroça começa a andar, dando volta pelo buffagru, e eu fico na ponta enquanto Flann e Ori se juntam no outro lado da carroça. Adentrando a floresta novamente, percebo que não há mais raízes tortas e saltando para fora do solo. Quase não há mais folhas secas, e a floresta parece estar bem mais... verde? Nos aproximamos da clareira onde eu e Flann enfrentamos o Leshy, passando logo ao lado dela. Vejo por entre as árvores que dentro da clareira há um animal: Um daqueles cervos coralinos que haviam corrido pelo campo. Mas este é diferente. Ele é maior, com pelos mais longos, uma longa cauda, e chifres mais robustos. Ele está pastando, mas para de comer por um momento, levantando a cabeça e olhando diretamente em nossa direção. Sinto um calor no peito ao ver uma criatura tão bela. Um certo... alívio.

"Qilin." – Flann diz, suavemente. Eu me viro pra ela, e ela está encarando a criatura. Ori parece não se importar. Flann então dá um sorriso e olha pra mim – "Parece que vai ficar tudo bem afinal."

Eu sorrio de volta. A floresta está voltando ao normal, e acredito que seja porque esse Qilin é o novo guardião. Uma criatura pacífica, que nos traz a certeza de que vai ficar tudo bem.

[...]

Passar pela floresta demorou mais do que eu esperava. Saímos dela, o sol ainda está de pé, e parece ter passado do meio-dia. Vejo Flann apoiada na carroça, com Ori deitado em suas pernas. Olho para a estrada adiante, e vejo um vilarejo logo em frente.

Aponto pra lá – "Auster? Já estamos chegando?"

"Você..." – Flann começa a falar, mas para por um momento pra negar com a cabeça – "Você realmente não conhece nada do lado de fora da sua vila?"

"N-não..." – Evito olhar diretamente pra ela.

Flann dá um longo suspiro – "Lá é Novak, um pequeno vilarejo construído há pouco tempo, isso se já terminaram as obras. Pelo o que ouvi falar, vai ser mais um vilarejo comercial, como a sua vila."

"Vila comercial..." – Penso um pouco. Por causa das minas de cobre perto de casa...? - "Mas... o que tem de valioso por perto?"

Flann olha para a floresta de onde viemos – "Aquilo."

Olho pra trás, encarando a floresta – "...a floresta?" – Me viro pra Flann, que acena com a cabeça.

"A madeira dessas árvores é conhecida por ser resistente, porém leve. Perfeita pra cabos de armas..." – Flann começa a acariciar a cabeça de Ori – "Só não imagino o porquê de não expandirem a sua vila pra coletar esse recurso. A floresta não fica longe de Theresa."

Ficamos em silêncio por um momento.

"Flann...?" – Pergunto, e ela olha pra mim – "Podemos dar uma passadinha em Novak?"

Ela abre um suave sorriso – "Não vejo por que não." – Ela se vira pra trás – "Viu, nós podemos fazer uma parada em Novak?" – Flann pergunta pro velho carroceiro.

"Ah, a Cordélia vai amar descansar um pouco, né, Cordélia?" – O velho carroceiro se inclina levemente pra acariciar o cavalo que nos leva. Ou melhor, égua.

Ori resmunga antes de abrir os olhos. Ele me encara, antes de arregalar os olhos e se levantar rapidamente. Percebo que suas bochechas ficaram um pouco mais escuras. Ele se vira, olhando a estrada adiante, e então solta um bocejo.

"Me diz..." – Começo a falar, e ambos olham pra mim – "Você vai me ensinar a fazer aquilo com as adagas?" – Digo, olhando pra Flann.

"Aquilo... o que?" – Ela pergunta.

"Aquilo que você fez, de puxar a adaga de longe!" – Mexo as mãos tentando imitar o movimento.

"Ah..." – Ela desvia o olhar.

Vejo que Ori a encara, esfregando os olhos devagar – "Você sabe manipular metal...?" – Ele pergunta.

"Claro que não." – Ela diz, dando uma leve risada – "Mal sei manipular terra, imagina conseguir manipular metal!"

"Hã..." – Abro a boca pra falar, chamando a atenção dos dois – "Manipular... metal?"

Flann e Ori trocam olhares e então Ori fica me encarando com os olhos arregalados.

Ori abre a boca pra falar algo, mas trava por um momento antes de continuar – "Você... " – Ele limpa a garganta – "Você soltou aquela explosão de fogo, mas não sabe o que é manipular metal?"

"Correção: A explosão que a Star causa, não é exatamente fogo." – Flann diz, e eu e Ori olhamos pra ela – "...o que? Eu não faço a menor ideia do que seja." – Ela se apoia na carroça, com as mãos na nuca – "Mas fogo não é."

"Se não é fogo, o que é...?" – Pergunto, olhando pras palmas das minhas mãos.

"Se quiser tanto saber, pergunte pra alguém em Novak." – Flann diz.

"Vou fazer isso assim que pararmos." – Digo, e aceno com a cabeça.

"Espera, parar?" – Ori pergunta, e se levanta para olhar o vilarejo adiante – "A gente vai parar?!"

"Qual o problema?" – Flann pergunta.

"A gente não pode parar! Temos que seguir até Auster!" – Ele diz, claramente frustrado.

"Acho que é tarde demais pra isso, garoto!" – O velho da carroça diz – "Já estamos chegando!"

[...]

Descemos da carroça assim que o velho carroceiro a para perto de um estábulo. Eu olho ao redor, para dentro do estábulo, vejo uns dois... três cavalos, tão grandes quanto Cordélia. Logo ao lado do estábulo, está sendo construída a muralha ao redor do vilarejo. Dois homens Satyr enormes carregam grandes troncos em seus braços, com uma estrutura de madeira e cordas levantando tronco por tronco, formando a muralha. Acompanho a muralha com os olhos, e vejo que o portão já está à postos, e aberto. Percebo Flann já andando em direção ao portão.

"Ei, espere por mim!" – Digo, apressando o passo pra alcançá-la. Eu paro no meio do caminho, olhando pra trás, e vejo Ori sentado na ponta da carroça. Eu me aproximo dele, e percebo que ele está encarando o chão, balançando as pernas. – "...Ori?"

"Huh?" – Ele logo levanta a cabeça e olha pra mim.

"Tá tudo bem?" – Pergunto.

Ele olha pros lados, e depois volta a olhar pro chão – "Eu... preciso chegar em Auster logo." – Ele leva a sua mão até o próprio pescoço – "Pode ter alguém por aqui..."

"Ori..." – Fico o olhando por um momento. Uma criança desse tamanho, querendo fugir pra um refúgio, com tanto medo de ser encontrado... Isso é cruel demais. Levo a minha mão até o seu ombro, e sinto ele recuar de leve antes de me encarar. Eu abro um sorriso, o melhor que consigo esboçar – "Não vou deixar que aconteça nada com você. Eu prometo."

Ori arregala os olhos, e percebo que suas bochechas escureceram. Ele deixa escapar um sorriso, e depois uma leve risada. Ele volta a olhar pra mim, com um grande sorriso, mas com as sobrancelhas franzidas – "Obrigado."

Meu coração se aquece com seu sorriso, e sinto um alívio quando ele desce da carroça, me acompanhando quando começamos a andar em direção ao portão. Flann está nos esperando.

"Chegamos!" – Digo – "Podemos ir!" – Abro um sorriso, e dou uma espiada pra dentro do vilarejo. É diferente, mas... muito familiar. Tirando a falta de muralhas, não é diferente de Theresa. Mesmo tipos de casas, mesmo tipo de gente. Talvez tenha algo de diferente... - "Aonde a gente vai ir primeiro?"

Flann me encara em silêncio por um momento – "... a gente?"

"...huh?" – Inclino a cabeça.

"Eu vou ir dar um alô pra um amigo. Fica a vontade pra passear por aí." – Flann diz, e começa a andar pra dentro do vilarejo.

"E-espera! Eu não conheço ninguém daqui"

"Não é esse o ponto de sair pra passear?" – Flann responde, e dá as costas, andando vilarejo adentro – "A gente se encontra depois!"

Coço a nuca. Ela realmente me deixou aqui e que se dane. Me viro pro Ori, que está com os braços cruzados.

"Então..." – Suspiro – "O que quer fazer?"

"Hm?" – Ele se vira pra mim – "Ir embora daqui, talvez? Quero chegar em Auster logo."

"Bom..." – Olho em direção ao estábulo, e vejo que o velho carroceiro está levando Cordélia para o pasto – "Acho que vamos ter que esperar."

Ori suspira – "Não era você que tava querendo saber que tipo de mana você manipula?"

"Hm..." – Olho pras palmas das minhas mãos – "Será que alguém aqui sabe explicar pra uma leiga como eu...?"

"Bom. Quando se quer saber mais sobre magia, geralmente perguntam pras gárgulas." – Ele diz.

"Gárgulas?" – Pergunto, e Ori acena com a cabeça.

"Elas são como... guias? Sempre respondendo qualquer pergunta que você escreve em um rolinho de papel. É assustador, e eu nunca descobri como funcionam, ou como sabem o que sabem."

"E como eu posso encontrá-las...?"

Ori olha ao redor – "Não acho que deve ter uma por perto... essa vila está em construção ainda, só vi essas gárgulas em templos ou vilarejos importantes." – Importantes?

"Você busca respostas—"– Uma voz vinda de trás começa a falar conosco de repente e eu e Ori imediatamente nos viramos, com Ori levando a mão para sua faca. Percebo uma figura baixa, encapuzada, com grandes orelhas peludas escapando pelos lados do capuz – "—e eu as ofereço." – A figura estende a mão por debaixo da sua capa, uma mão pequena e felpuda, mas com garras.

Ori alivia a sua pose defensiva, e se aproxima devagar da figura, abaixando a cabeça para tentar ver por debaixo do capuz – "...eu não acredito." – Ori dá um passo pra trás – "Doran?"

"Você o conhece?" – Digo, e Ori concorda com a cabeça. Eu solto um suspiro de alívio.

"O que aconteceu com você?!" – Ori diz, segurando Doran pelos ombros – "Você sumiu! Eu olhei pra trás, e você não estava mais lá!"

"...Ori." – Doran começa a falar – "Você não vai acreditar..."

"Mas eu sobrevivi a uma das piores experiências da minha vida."

 

 


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