You've got the love escrita por Fanfictioner


Capítulo 3
I wanna hold your hand


Notas iniciais do capítulo

EEEEEI! Estranho me ver por aqui hoje? Nem é terça-feira, o que rolou?
Resolvi publicar esse capítulo como bônus hoje, já que é meu aniversário! *-* O aniversário é meu e o presente fica com vocês, podendo ler YGTL alguns dias antes do esperado haha.

AVISO MEGA IMPORTANTE: Esse capítulo contém narrações de violência, nada explícito, mas que podem conter gatilho, então cuidado.

Vamos conhecer um pouquinho mais da história por detrás do nosso músico em ascensão predileto, e entender seus fantasmas e probleminhas. Espero que gostem!



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(narração de Sirius Black)

Eu imaginava que depois do aniversário de Remo, depois de finalmente termos ficado, minha obsessão por ele teria passado, porque geralmente é assim que acaba acontecendo comigo.

Primeiro um desejo intenso e a necessidade obsessiva de conseguir ficar com a pessoa, e então um tédio absurdo sobre ela e uma vontade de desaparecer subitamente de sua vida, mesmo sabendo que é bem moralmente errado. Eu só não era uma pessoa muito afetuosa em relacionamentos românticos, nem tinha vontade de um namoro longo e duradouro como James e Lily tinham.

Eu enjoava das pessoas com facilidade, e o que me atraía era o desafio até ficar com elas.

Mas é claro que Remo Lupin precisava ser a exceção à regra e vir bagunçar todo um sistema ordenado de galinhagem e encontros casuais. Bem, não literalmente, óbvio! Mas num sentido amplo. Ele não empatava encontros meus com ninguém, mas eu simplesmente tinha perdido meu ânimo por flertar com os homens bonitinhos que apareciam no pub.

E, sendo bem honesto, tinham aparecido muitos homens bonitinhos no pub naquelas semanas. Certo, bonitinhos é ridículo, tinham aparecido muito homens gostosos para porra, mas o problema é que eu estava quase imune a eles.

Depois de ficar com Remo eu passara a ter uma bizarra vontade de continuar ficando com ele, mais e mais e mais... eu nem mesmo imaginava como podia ser ficar com alguém tantas vezes a ponto de conhecer a boca da pessoa perfeitamente, e UAU! A boca de Remo era um espetáculo de boa, e eu estava me orgulhando de conhecer cada cantinho e poder beijá-lo da maneira exata que eu sabia que ele gostava.

Certo, isso foi absurdamente gay, mas continuando...

Quanto mais tempo eu conseguia roubar com ele, fosse indo vê-lo na faculdade, fosse ele indo em minha casa me ajudar com a arte para meu EP, todos esses momentos sempre pareciam insuficientes, e eu sabia que estava me tornando piegas e clichê, e parecendo James nas semanas antes de começar a namorar com Lily. Mas o que eu podia fazer?!

O governo devia fazer avisos sobre a dependência química à Remos Lupins que eventualmente aparecessem na vida dos jovens, perdendo iPods em cafés, porque ela era claramente muito mais perigosa do que a dependência ao álcool ou ao tabaco.

Principalmente quando eles gostavam de rock e eram uns filhos da mãe gostosos, com carinhas de santinhos que, na real, escondiam uns demônios sacanas.

Remo Lupin seria tranquilamente a minha ruína enquanto cafajeste assumido.

— Afinal, uma pergunta de caráter essencial e que vai defini-lo como pessoa. – perguntei com seriedade.

— Manda. - ele comentou numa tarde de sábado, deitado ao meu lado no sofá cama do meu apartamento.

— Qual seu Beatle favorito?

Ele riu e pareceu pensar um pouco antes de responder, me deixando curioso.

— Paul. Não, acho que George. Sim, definitivamente George.

— George Harrison? Você está brincando! – resmunguei, olhando-o nos olhos. – Ele é, tipo, o Beatle mais sem sal! Sério, acho que ele chega a desmaiar de pressão baixa!

Remo abriu uma gargalhada e eu fiquei observando o sorriso dele no processo.

Ah, Deus, eu ia me foder tão bonito.

— Mas é, juro. Não sei, alguma coisa nele me chama atenção, me sinto representado. Coisa de estilo mesmo. E o seu?

— John, óbvio.

— Por que é que não me surpreende? O cabelo é algum cosplay? Ou tara pelo Beatle morto? – agora fora ele quem, facilmente, arrancara um riso de mim.

— Você lembra que o seu Beatle também está morto, né? – debochei, embora ele só tenha me mostrado uma careta. – Mas não, só tenho uma identificação pessoal mesmo.

— O que exatamente? A coisa do “faça amor não faça guerra”? Ou a parte da Yoko Ono?

Aparentemente John Lennon não estava no top três Beatles de Remo.

— A parte de ser brilhante, protagonista, ter uma voz maravilhosa...

— Aí já é uma percepção pessoal, né, Black? – debochou ele, me dando um chutinho e me fazendo gargalhar.

Eu gostava dessa leveza que era estar ali deitado, falando amenidades e teorias idiotas com Remo. Foi natural engatarmos em uma série particularmente boa de beijos e amassos que, confesso, me deixou excitado de novo. Mas antes que a coisa pudesse evoluir, Remo acalmou tudo e ficou apenas fazendo um carinho no meu cabelo, olhando o nada.

— Eu devia ir embora... está escurecendo.

O sol realmente estava se pondo, havia um colorido rosa alaranjado cobrindo o céu, e a lua estava timidamente visível, me dando vontade de abrir a lente do telescópio e ver o que eu conseguia enxergar no céu.

Mas o cheiro de Remo deitado do meu lado era um atrativo bem melhor.

O peito dele subia e descia numa cadência monótona e preguiçosa de respiração, e um de seus braços estava atrás da cabeça, enroscado em uma almofada, enquanto o outro agora arranhava de leve as minhas costas.

— Fica um pouco mais... – pedi, me inclinando sobre ele e deixando alguns beijos pelo pescoço pálido demais. – A gente pede uma pizza, joga alguma coisa. Você pode falar que os pais da Lily convidaram você para o jantar.

Eu podia sentir Remo amolecendo embaixo de mim, quase cem por cento rendido ao convite. Então, ele me empurrou de volta contra a cama, deu um beijo profundo e se levantou, pegando a camisa dele, que estava jogada sobre o pufe.

— Eles não acreditariam, a família da Lily geralmente sai para comer fora aos finais de semana. E eu preciso estudar, de qualquer modo.

Juro que queria me concentrar no que ele estava dizendo, mas a visão de Remo arrumando os cabelos na frente do espelho e colocando a camisa levemente para dentro da jeans me tirava do sério. Eu poderia agarrá-lo ali mesmo, daquele jeito!

— Você estuda demais. – disse eu, fechando os olhos e respirando fundo para me levantar.

— Alguém precisa aprender as técnicas de arte que fazem a ilustração do seu EP, não é? – debochou ele, calçando-se. – Eu vejo você amanhã?

— Vou esperar. E vou tentar avançar mais naquelas lições de como usar a ferramenta de colagem.

Ele deu uma piscadinha assertiva, em incentivo.

— Boa noite, Almofadinhas.

Puxei-o para um último beijo, um pouco mais demorado do que o de sempre, e então Remo vestiu o casaco, pegou sua mochila e foi embora, me deixando parado na entrada do apartamento, vendo o sol se por.

Eu estou tão tremendamente fodido com esse garoto!

***

Apesar de ser final de semana e, teoricamente, estarmos mais livres, eu mal falei com Remo até perto da hora de ir para o Três Vassouras, no domingo de noite. Ele tinha avisado que estaria muito envolvido com seu portfólio, que devia ser entregue até o final do mês, em uma semana, e eu não pretendia atrapalhá-lo.

 

[Eu – 18:07]

Estou indo para o pub, você vai, né?

Hoje não deve ter muito movimento

Mas vou cedo mesmo assim

Até já, Rem :)

 

Mas Remo não tinha me respondido até quando cheguei no trabalho, o que foi muito incomum, já que ele, em geral, era muito eficiente em conversar por redes sociais. Mandei uma outra mensagem e não obtive respostas, e perto das 19h, antes de começar a tocar, eu liguei.

A chamada foi rejeitada no segundo toque, e eu estranhei, ficando meio confuso. Minutos depois, senti meu celular vibrar no bolso, com três mensagens de Remo.

 

[Lupin iPod – 19:09]

Desculpa, não vai rolar

Tive uns problemas e imprevistos

A gente se fala amanhã

 

Bem, certamente não era a mensagem mais esclarecedora do mundo, e eu continuava sem entender o porquê do sumiço de Remo, embora tivesse quase certeza de que se devia à pressão que a faculdade estava colocando sobre ele nessa última semana.

Continuei a trabalhar normalmente, tentando não pensar demais nele, ciente de que essa preocupação só existia porque eu estava envolvido com ele até o pescoço, e não conseguiria fugir facilmente.

As coisas que meus hormônios me faziam passar por um homem bonito eram ridículas!

Por isso eu preferia ser galinha. Era menos dor de cabeça para os dois lados. Mas Remo Lupin era o tipo de pessoa que não me deixaria escolha e que estava se enroscando em mim como um canto de sereia. E o pior, eu estava literalmente apertando o botão de “Estou ciente e quero continuar” a respeito disso.

Na segunda e na terça-feira foi difícil conciliar nossos horários, e eu não pude passar na UAL em momento algum porque estive envolvido em compor músicas e conversar com um produtor musical que me ouviu tocando no Três Vassouras e queria marcar uma reunião.

Eu estava empolgado com essa repercussão que minha carreira estava prestes a ter e queria muito compartilhar tudo com Remo, terminar a arte do EP, sair para comemorar. Mas estávamos apenas trocando algumas mensagens, e tudo estava sendo corrido demais.

Quinta-feira seria o aniversário de James, e ele pretendia comemorar na sexta, já que no dia estaria enfurnado o dia inteiro no hospital em aulas e estágios, então eu sabia que, com certeza, veria Remo pessoalmente ao menos naquele dia, se trocasse a folga do final de semana para sexta.

— Será que você pode parar de comer os docinhos antes de as pessoas sequer chegarem, Almofadinhas?! – resmungou James, arremessando um pacote de marshmellows em minha direção.

— Eu fo fom fome! – respondi, com a boca entupida de jujubas.

Não parecia que tínhamos 22 anos, porque tínhamos o mesmo comportamento de garotos de 16. A sra. Potter vinha da cozinha com uma bandeja de canapés para colocar na mesa da sala de jantar, aonde arrumávamos tudo. 

— Meus meninos estão tão chiques! – disse ela, ficando na ponta do pé para dar uma fungada no cabelo recém lavado do Pontas, e então vindo para me dar um beijinho na bochecha. – Meu James com 22 anos! E quase um médico! Eu tenho tanto orgulho, querido!

Dei um risinho e sai para buscar os guardanapos, dando um pouco de privacidade para James e a mãe que, embora fossem minha família adotiva, mereciam esse momento mãe e filho a sós.

E é claro, eu não queria cutucar velhas feridas.

Assim como a de James, minha família era bem abastada e até meio importante, envolvida em cargos políticos e ações empresariais; mas, diferente dos Potter, minha família não era nada afetuosa, e sempre que possível substituía a necessidade de carinho e atenção com presentes caros e financiamento de viagens. Não que eu estivesse reclamando, claro! Mas a vida era muito fácil para homens ricos e brancos, como os da minha família.

Exceto que, quando se está nesse meio, há uma expectativa de que você seja exatamente o que esperam. Talvez mais, mas nunca menos. E eu nunca soube lidar bem com essas expectativas. A  rebeldia sem causa (exceto talvez a absurda falta de afeto durante toda a infância) começou ainda novo, quando eu desafiava meus pais de maneira velada, e foi ganhando proporções exageradas.

Algumas brigas eu ganhava e meus pais simplesmente desistiam. Outras eu era comprado, ciente de que o era, e apenas aceitava a barganha, momentaneamente. A faculdade de música foi uma das batalhas que eu venci, dado que ninguém esperava que um Black se tornasse artista. Seria “ralé demais até para você, Sirius”, conforme minha mãe dissera quando a carta da faculdade chegou.

Mas eles acabaram pagando meu primeiro ano mesmo assim.

No entanto, a sexualidade fora uma batalha que eu perdera. Eu sabia que era gay desde novo, sabia como simplesmente se sabe que é hétero. Nunca tivera a menor atração por meninas, e nem mesmo cogitei ficar com uma. Não havia aquele tesão em peitos, como a maioria dos meus amigos da época tinha. Havia um tesão em garotos, em seus corpos fortes nos treinos esportivos, e em suas mãos habilidosas com instrumentos musicais. Qualquer garoto. Qualquer um era suficiente para acender meu corpo em brasa.

Aparentemente, além de gay, eu sempre fora galinha também.

Ficar com meninos era natural, e quando James e Frank, meus melhores amigos de escola, descobriram, eu percebi que, também para eles era natural, embora não tivessem a mesma sexualidade que eu. Porém, com meus pais a batalha não seria tão simples, e eu sabia.

De alguma maneira intuitiva eu sabia, e quando meu irmão Régulo, dois anos mais novo, apareceu em casa com sua primeira namoradinha, aos 14 anos, eu soube que o cerco ia se fechar para o meu lado logo em breve. Eu pretendia contar, realmente pretendia. Mas as coisas se encaminharam de outras maneiras.

No final do último ano de escola, depois de já estar aprovado na faculdade, eu fui pego matando aula para ficar com um garoto. A diretora, Umbridge, mandou chamar meus responsáveis, e não teve o menor tato em identificar o gênero do meu ficante para meus pais. Foi um completo caos e drama, com minha mãe se abrindo em prantos desnecessariamente na frente da diretora e eu desejando sumir dali, de tanta raiva.

Primeiro eles tentaram ser amáveis, os meus pais. Começaram com um papo de entenderem que aquilo era para eu receber atenção, e que não era necessário, que eles já tinham aceitado minha faculdade e tudo... mas quando e insisti que não ligava para o fato de eles amarem Régulo mais e que eu era de fato gay, foi um chilique.

Durante umas semanas o assunto não foi mencionado em casa, como se fosse desaparecer e eu fosse me transformar em hétero se a pauta não fosse levantada, e eu não estava lá muito sentido por isso. Mas quando a faculdade já estava a pleno vapor e eu saia com vários meninos, meus pais vieram tentar barganhar, e isso me enfureceu.

— Você pode ser gay, Sirius. Ninguém aqui é preconceituoso. Mas você não precisa escancarar isso para ninguém! Não queremos você trazendo seus namorados em casa, nem precisa ficar beijando homens na nossa frente para provar nada. Você pode ser gay sem obrigar as pessoas a ver! E por favor, tenha respeito pela sua família! Você não pode deixar que viremos assunto de fofoca porque agora você escolheu beijar bigodudos! – dissera meu pai em uma das conversas.

Mas as namoradas de Régulo podiam subir e descer livremente as escadas da nossa casa usando biquíni, podiam dormir lá quando quisessem, e ninguém nem mesmo o repreendia pelos gemidos altos que ele e a companheira eventualmente dessem, deixando claro para todos o que estavam fazendo porta a dentro. Mas claro, ai de mim se fosse visto beijando um homem.

Hipócritas.

Eu suponho que poderia ter ficado lá, se estivesse disposto a recusar minha sexualidade e não beijar mais meninos. Se estivesse disposto a arranjar uma namorada que minha mãe aprovaria de alguma maneira, se eu fosse capaz de ser a pessoa que meus pais esperavam que eu fosse. Eu poderia ter ficado lá, nessas condições. E acabaria desenvolvendo transtornos psiquiátricos, sendo infeliz minha vida toda e, provavelmente, acabaria com uma overdose na piscina de casa.

Mas eu escolhi ser feliz e confrontar eles. E, eu viria a descobrir, foi uma das coisas mais difíceis que eu fiz.

A situação foi ficando insustentável, comigo levando reprimendas diariamente, já que tudo que eu fazia era “gay demais” para minha família, e quando eu finalmente levei uma surra de meu pai, uma única, eu saí, fugindo e levando o que me pertencia.

Euphemia e Fleamont Potter não pensaram duas vezes em me acolher, se tornando meus segundos pais, e eu recebia tanto amor e carinho quanto James, mas as feridas que minha família tinha feito eram profundas.

Todos os gritos, as acusações, a surra, que fechou um dos meus olhos em inchaço e fez meus dentes abrirem meu lábio de fora a fora, tudo isso ainda doía, lá no fundo. E em momentos como esse eu lamentava não ser mais amado.

— Sirius, traz copos! Mary chegou! – berrou James da sala.

À medida que nossos amigos iam chegando tudo ia ficando mais animado, e só faltava que Lily, Dorcas e Remo saíssem da faculdade e aparecessem, para que pudéssemos estar todos finalmente reunidos.

Quando Lily chegou, havia uma caixa de presente enorme em suas mãos e Remo e Dorcas ajudavam a carregar garrafas de refrigerante e outras bebidas. Enquanto James estava muito ocupado em ser beijado e abraçado pela namorada, eu me adiantei e fui ajudar a recepcionar todos.

— Tragam as garrafas aqui! – pedi, pegando um engradado de cerveja das mãos de Dorcas e colocando-o no refrigerador. – Boa noite, Aluado.

Ele me deu um selinho e então nos juntamos a nossos amigos, bebendo cerveja e comendo os canapés deliciosos que a mãe de James fizera.

— Eu estou muito estressada, só preciso que esse trimestre acabe de uma vez! – gemeu Lily, deitando a cabeça no ombro de James. – Meu portfólio ainda está, tipo, na metade, e eu estou muito enrolada para acabar tudo até segunda de tarde.

Dorcas começou a comentar seu processo criativo e eu desviei minha atenção para fazer alguns cafunés em Remo, que estava calado e meio abatido. Seus olhos estavam fundos e com olheiras marcadas, e a expressão dele era uma mescla de preocupação e cansaço.

— Você parece acabado... não está pegando pesado demais? É só uma nota, Rem. – perguntei baixinho.

— Está quase acabando, semana que vem entramos nas férias de primavera e vou descansar.

— Mas tem outra coisa preocupando você, não tem? Eu conheço você, Lupin.

— Deixa isso para lá, Sirius... me conta da reunião com o produtor musical, como foi? – disse ele, desviando o assunto e dando um sorrisinho desanimado, aprumando a postura no sofá.

Eu estava incomodado que ele não falasse o que vinha acontecendo, principalmente porque não tínhamos nos visto desde sábado e eu sentia como se estivéssemos distantes, mas se Remo não queria falar, eu não insistiria.

A festa continuou e todos dançamos no videogame de James, comemos da torta de carne que Tia Euph preparara e conversamos bastante. Remo e eu até mesmo conseguimos alguns momentos a sós ao ir buscar mais doces na cozinha, trocando um amasso particularmente bom e privado ali, mas algo estava diferente.

Eu me sentia diferente em relação a Remo, estava preocupado com ele e sentira sua falta absurdamente naquela semana. Queria tê-lo visto mais, feito um esforço maior por isso e, principalmente, queria saber o porquê de ele estar estranho e distante de mim, já que costumava ser ele o mais atencioso e carinhoso de nós dois.

Sim, eu estava virando um emocionado. Eu nem mesmo tentava negar mais.

Perto das dez ele foi embora, preocupado em chegar em casa no horário certo. Mary, melhor amiga de Lily e próxima de James, foi embora em seguida, pois viajaria no outro dia, e Frank e Alice, nossos amigos da época de escola, a acompanharam. Dorcas e Peter foram também, uma vez que Lily e eu dormiríamos na casa de James e já estava tarde para outras visitas.

— Foi divertido, não foi? – perguntou James enquanto recolhíamos copos e pratinhos para lavar. – Aliviou um pouco dessa tensão de final de trimestre que todo mundo ‘tá sentindo.

— Demais! – disse Lily guardando as sobras de comida em potinhos e guardando na geladeira. – Só queria poder dormir muito amanhã, estamos todos tão exaustos... o Remo então! A carinha dele hoje estava me dando pena.

— O que houve? Ele não falou comigo direito essa semana...

— Ele não conta. Mas sabemos que tem alguma coisa, porque ele chegou super abatido na segunda, e com esse monte de trabalhos, ele obviamente não melhorou nadinha.

Eu fiquei ainda mais pensativo e terminei logo de organizar o que faltava. No fim, já passava da meia noite e estávamos Lily, James e eu sentados na sala, bebendo as últimas cervejas que tinham sobrado. Estava tarde, estávamos todos cansados e meio bêbados, e eu estava pensando demais em Remo, de maneira que aquelas palavras saíram naturalmente de mim.

— Eu acho que gosto de Remo.

— É claro que gosta, Almofadinhas! – disse James gesticulando com a garrafa, olhando para mim como se eu estivesse falando algum absurdo. – Você é amigo do Remo, e se não gostasse dele não estariam ficando.

— Eu gosto mesmo do Remo, Pontas. Eu acho que amo o Remo, acho que quero estar sério com ele. – disse, com o olhar meio perdido e reflexivo.

— Ai que bonitinho, Sirius!!! Vocês dois são tão fofos, e vão ser um casal tão lindinho! Eu estou tão animada! – disse Lily, exageradamente feliz, provavelmente pelo efeito do álcool. – Vocês podem ser os padrinhos do nosso filho.

— QUE FILHO?! – perguntamos eu e James, igualmente nervosos e assustados.

Lily caiu na gargalhada.

Quando nós tivermos um filho, James... no futuro, quando tivermos um filho, Sirius e Remo podem ser os padrinhos. Imagina, vai ser a única criança com dois padrinhos! – respondeu ela, para nosso alívio, soando muito sonhadora.

— Eu não precisava desse susto agora, Lil. – James murmurou, apertando o peito e jogando a cabeça para trás, no sofá, nervoso.

— Nós precisaremos estar juntos primeiro, Ruiva.

— Pede ele em namoro então, Almofadinhas... você não quer? – eu assenti, meio inseguro. – Então pede, ué! Remo está muito na sua, não vai recusar!

A conclusão simples demais de James me animou naquela noite, e eu fui dormir empolgado com a perspectiva de que ia pedir Aluado em namoro.

***

No dia seguinte, menos bêbado e mais racional, eu concluí que meus sentimentos por Remo deviam, certamente, ser genuínos, porque a ideia de pedi-lo em namoro continuava na minha cabeça mesmo findado o efeito da bebida.

Era estranho, pela primeira vez na vida, pensar que eu queria criar laços e afeto com alguém. Não era meu jeito, e nunca parecera que se encaixaria na minha rotina, sempre muito prática e sozinha. Mas, como tudo que acontecera até ali, com Remo era diferente.

Eu sabia que estaria enrascado na primeira vez que ele passou a tarde na minha casa, trabalhando em artes, e tudo que eu conseguia pensar era que queria agarrá-lo. Estava sendo uma experiência surrealmente boa, e eu não conseguia pensar que algum dia deixaria de sentir essa atração intensa por Remo, ou parar de desejá-lo em todos os aspectos, físico, psicológico, emocional, artístico e musical, e em todos os outros que eu ainda descobriria.

Remo era uma espécie de droga na minha corrente sanguínea.

Uma parte de mim era muito impulsiva e queria dirigir minha moto até a casa dele naquele exato momento e pedi-lo para namorar comigo, mas outra parte, a menor, era racional, e me dizia que não podia agir assim.

Provavelmente porque me cérebro já estava meio prejudicado pelo efeito de estar apaixonado por Lupin, eu acabei optando por ter o bom senso de não submeter Remo a uma coisa tão impactante quanto um pedido de namoro justamente na semana em que estava mais atolado com entregas de trabalhos e portfólios, provas e apresentações.

Eu sabia que durante seu recesso seu recesso, especificamente no feriado de Páscoa, em duas semanas, ele viajaria com os pais para um retiro espiritual ou coisa do tipo, mesmo a contragosto, então, no fim das contas, eu tinha mais ou menos três semanas para planejar tudo.

Ou decidir se eu queria desistir dessa ideia e manter minha boa vida de solteiro, como eu devia realmente ter feito.

Durante esse tempo, as coisas avançaram muito em termos profissionais para mim, e eu estava quase conseguindo firmar um contrato com o produtor musical que me financiaria um álbum de lançamento. Não um EP, um álbum inteiro!

Bem, desde que eu tivesse material para isso até o final de abril.

Com todos os compromissos meus e de Aluado, foi natural que nosso tempo juntos se apertasse, ainda mais ao se aproximar a viagem dele com os pais. Continuávamos juntos, sempre que possível ele ia por algumas horas ao Três Vassouras para me assistir tocar, e em seu primeiro sábado de férias ele passou um dia inteiro em meu apartamento, quando tivemos a chance de matar um pouco as saudades.

E liberar uns hormônios também.

Remo Lupin era literalmente tudo que eu passava a semana desejando, tê-lo deitado do meu lado, cochilando, era uma sensação tão boa que eu pensava que devia virar um elogio. Eu estava completamente afogado em tudo que ele era. Afogado em seus sorrisos, em seus beijos, na sensação de nossos corpos suados se enroscando, em meus sentimentos por ele.

Merda, merda, merda! As coisas não deviam ter chegado àquele ponto! Eu estava muito rendido!

Além disso, eu compunha como um insano, escrevendo letras e mixando demos no meu computador durante o dia todo, tocando no pub até a madrugada e dormindo poucas horas por dia, mas estava feliz como nunca.

Remo, por mais distante que estivesse desde a semana do aniversário de James, me apoiava completamente, ouvindo todos os áudios que eu o enviava pedindo opiniões, e juntando referências para trabalharmos na arte do meu álbum, que agora realmente seria lançado.

A cada dia mais eu me convencia de que precisava pedir Remo em namoro, porque era simplesmente a coisa mais certa em minha cabeça. Eu queria ser o namorado dele, e queria que ele fosse o meu namorado.

Era a única pessoa que eu queria nessa função.

E ao mesmo tempo havia uma vozinha em minha cabeça que ficava latentemente perguntando “Por que ele está distante?” e afirmando “Ele cansou de você”. Seria a maior das ironias que Remo tivesse cansado de mim justamente quando era a primeira pessoa que fazia eu querer ficar.

Na semana em que ele viajou para o retiro de Páscoa, quando só podíamos trocar mensagens durante o horário de seu almoço e jantar, eu me juntei com James e Lily algumas vezes e planejei como eu gostaria que fosse o pedido.

Queria que ficasse claro para Remo o quanto ele virara minha vida de ponta cabeça, e o quanto eu estava deixando de ser o Sirius solteiro e muito namorador justamente porque estava muito apaixonado por ele. Por mais clichê que isso soasse.

Felizmente meu casal de amigos era a própria diabetes de tão doce, e não me julgariam por preparar um pedido de namoro clichê.

As aulas de Remo retornaram na terça-feira, e não tínhamos nos visto até então. Eu organizei para que continuasse assim até sexta-feira, quando deveria pedi-lo em namoro, e Lily foi essencial nessa parte. Todos os dias ela inventou algo que deixou Remo muito ocupado até a hora de ir para casa, evitando que ele acabasse indo me ver ou coisa do tipo.

Durante a semana, eu dei a ele duas referências do que pretendia fazer, enviando a ele uma música dos Beatles que eu remixara, a qual pretendia usar para fazer o pedido, e disse que estava de folga na sexta-feira e gostaria de sair com ele para fazer algo diferente.

Na sexta-feira, Lily foi para a faculdade com um pequeno envelope que devia colocar, secretamente, na mochila de Remo. Eu sabia que ele sempre levava o iPod e fones de ouvido para a universidade, então tinha certeza de que tudo daria certo.

Quando as aulas acabaram, e Lily me mandou mensagem avisando isso, eu imediatamente liguei para ele.

— Sirius. Eu não esperava! Como você está? – perguntou ele animado.

— Muito bem, Aluado. Escute, eu tenho coisas planejadas para hoje, e preciso que você colabore para dar tudo certo. – disse de um jeito que mesclava o riso e a autoridade.

— Tudo bem, general.

Eu ri antes de continuar, sentindo uma ansiedade boa.

— Você e eu vamos jantar nesse endereço que eu acabei de enviar, fica tranquilo é perto da sua casa. Lily ligou para sua mãe e perguntou se você poderia jantar na casa dela para comemorar o aniversário da irmã dela.

— Petúnia? Mas ela não faz aniversár... aaaah! Okay, entendi. Nossa, você pensou em tudo! – e eu quis rir do momento de compreensão dele.

— Vamos ter algumas horas livres, então pode pegar o metrô para esse endereço que eu logo vou chegar lá também.

— Mas que mistério todo é esse, Almofadinhas?

— Até já, Remo.

Eu reservara uma mesa no Caldeirão Furado, um restaurante estrela Michelin para comemorar nosso pedido de namoro, e tinha preparado tudo para que Remo soubesse do pedido na hora exata. Conforme eu supus, ele mandou mensagem dizendo que tinha chegado, e eu liguei uma outra vez.

— Mas o qu-

— Já estou chegando. Dentro da sua mochila tem um envelope que a Lily colocou aí. Nele tem um papel com um QR code, você poderia escanear ele com seu iPod e ouvir enquanto me espera, por favor?

— Sirius. – ele disse, meio impaciente, meio curioso, e eu podia ouvir o riso em sua voz.

— Anda logo, vai, criatura.

Então Remo cedeu e disse que faria. Eu fiquei na linha até que ele dissesse que tinha escaneado e daria play, então desliguei e dei play em meu celular também. Eu estava dentro do restaurante, esperando a hora de sair e, então, pedir Remo, porque jamais faria isso em frente a um monte de desconhecidos.

Havia mixado um áudio (que eu fizera upload em uma plataforma de streaming) contendo uma parte da regravação da música dos Beatles e acrescentado um voice over meu, e esperava, sinceramente, que Remo gostasse de ouvir tanto quanto eu tinha gostado de produzir.

“Oh yeah I’ll tell you something, I think you’ll understand. When I say that something… I wanna hold your haaand! É isso mesmo, Remo Lupin. Eu estou remixando uma das suas músicas favoritas para dizer que I wanna hold your hand. Quero segurar sua mão nas gravações de álbuns, e nas provas de final de trimestre também; quero segurar sua mão em casa, no pub, com nossos amigos, e em todo lugar, para todo mundo poder ver. Quero segurar sua mão, como seu namorado. Você quer segurar a minha?”

Conhecia Remo o bastante para saber que ele estaria concentrado no que ouvia e não me veria chegar, com uma caixa de chocolates na mão, para estar junto quando ele ouvisse que eu o estava pedindo em namoro.

Sabia que era brega e totalmente piegas, e que eu poderia simplesmente ter perguntado para ele em alguma conversa banal do cotidiano, mas para mim era especial. Eu nunca tinha me apaixonado, e nunca tinha desejado namorar ninguém, e agora que queria, eu esperava me dedicar a isso cem por cento.

Remo estava virado para a rua, esperando que eu aparecesse, então quando dei um assobio e o chamei, ele levou um susto e me olhou com uma expressão arregalada.

— Aceita, Aluado? – perguntei, cheio de expectativa.

— Sirius... – ele me olhou confuso, e de repente eu vi toda a distância das últimas semanas refletidas no olhar dele. – Eu não posso fazer isso... não agora.

— Como...

Alguma coisa dentro de mim tinha despencado, e estava caindo, caindo.

— Desculpa, Sirius... eu não posso fazer isso agora. Minha vida tá uma loucura, e eu não posso simplesmente namorar com você agora. – disse ele, perturbado.

— Deixa eu entender, você está terminando comigo? – eu estava apático porque não tinha entendido ainda.

Eu estava sendo rejeitado? Por que estava doendo tanto, de repente? Era nova para mim essa sensação esquisita do peito estar sendo comprimido quase a vácuo, deixando uma dor latente e muito incômoda. Eu não queria levar um fora, eu gostava muito de Aluado para isso.

— Preciso de um tempo, Sirius. Sinto muito, eu gosto de você. Muito... mas eu não posso.

Ele fez um carinho no meu braço e foi embora, me deixando com a caixa de chocolates na mão e uma reserva, agora inútil, em um restaurante caro. Em algum lugar entre minhas costelas havia um aperto quase sufocante, caindo fundo em um lugar inacessível, e meus olhos ardiam um pouco.

Que ótimo, eu estava me ferrando tanto quanto sabia que ia acontecer se eu realmente me apaixonasse por Remo.

Eu queria voltar semanas atrás e não ter me envolvido antes de ter  sequer transado com ele (porque por mais que eu negasse, eu sabia que tinha me envolvido naquele primeiro beijo), nem saído outras várias vezes depois, nem passado tanto tempo olhando o sorriso dele. Porque agora essas memórias, passando rápido demais na minha cabeça, estavam doendo tanto quando a surra do meu pai.

Mas não era físico, então eu não podia fazer nada para estancar. E, porra, estava doendo muito!

Só queria segurar a mão de Remo, como todo mundo fazia com seus companheiros. Por que tinha que ser tão complicado?


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Notas finais do capítulo

O que rolou com o Sirius vai ser abordado um pouquinho mais a fundo no próximo capítulo, mas desde já... opiniões? Apostas sobre essa mudança brusca do Remus, de repente? Vejo vocês nos comentários, beijoooos



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