Casamento da Morte escrita por HatsuneMikuo


Capítulo 10
Capítulo 10


Notas iniciais do capítulo

AVISO DE GATILHO: Estupro



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... 

Uma criança feliz é uma criança que olha para os passarinhos e sorri imitando-os na esperança que eles respondam de volta, como se estivesse falando a língua dos pássaros assobiando.  

Sabia assobiar, aprendeu sozinha. Mas não foi como aprender piando e dança.  

Desde pequena fazia aula de ballet, música e pintura em tela.  

Não entendia porque toda semana tinha que ir arrumada como princesa na igreja, mas gostava de ver o coral cantando.  

Mais madura, era ela que tocava o órgão da igreja, seus professores diziam que se dedicasse bastante ela seria uma notável artista.  

Não tinha limites para sua felicidade, seus pais nunca a viram triste ou chorando.  

Seu primeiro espartilho ficou lindo em seu corpo. Ele acentuava a cintura e ressaltava os seios, dando atmosfera adulta ao seu sorriso juvenil.  

Dona de uma voz deslumbrante, seu canto era como uma ninfa grega. Aprendeu com seus tutores várias canções, mas ela insistia em cantar músicas que inventava na hora.  

Muitas delas falavam sobre amor.  

E foi com amor que ela começou a se desvencilhar de suas obrigações. 

Foi com amor que conheceu uma sombra de um homem que dizia que se apaixonou à primeira vista.  

Foi ficando embriagada de amor que acreditou que seria seu destino casar com ele.  

Mas foi a primeira vez que viu seu pai furioso e sua mãe gritar. Não gostaram nada de saber que um homem entraria em sua vida por debaixo dos dogmas da igreja.  

Ele nem mesmo era de sua religião, nem mesmo aparentava ser um bom pretendente. A única filha que eles criaram com todo dinheiro que tinha, investiram em sua educação e etiqueta, entregue nas mãos de um ninguém? Jamais.  

A trancaram no quarto como forma de punição, ela jamais veria aquele homem novamente. Jamais...  

“Então vamos fugir” 

“Já que seus pais não nos querem juntos” 

"Eles são contra o nosso amor” 

“Não quero me afastar de você” 

“Você é única para mim” 

“Você me faz tão bem” 

“Eu sou o único que te faz feliz” 

“Sua mãe está te colocando contra mim” 

“Seu pai quer me ver longe de você” 

“Não deixe eles te deixarem para baixo” 

“Você é única para mim” 

“Você não me ama?” 

“Você realmente me ama?” 

“Então vamos fugir, para longe deles” 

“Você não precisa deles, eles só atrapalham o nosso amor” 

E então ela chorou, desabou, seus pensamentos desmoronaram dando acesso a raiva, fúria, angustia. Sentimentos que nunca sentira antes.   

Ela não cantava mais 

Não dançava mais.  

Não fazia mais as suas preces.  

Só queria saber de seu amado. 

Estava com raiva de seus pais, e estava determinada em fugir com aquele rapaz. 

Viveria sua própria vida com seu amado, teria uma família com ele, teria filhos e ensinaria as meninas a dançar e os meninos a cantar.  

Era isso que pensava.  

Seguiu as ordens de seu namorado como se fosse um soldado obedecendo. Reuniu o máximo de dinheiro, joias e prataria que conseguisse, precisavam de dinheiro para sair daquela cidade e viver sua própria vida ao lado dele.  

Esperar que todos da casa durmam e apaguem as velas para poder sair escondido. Despistar de todos nas ruas e esperar na estrada que ele conseguiria uma carroça e assim poderiam partir em viagem.  

Ela queria mais além, abriu um baú antigo que tinha um belíssimo vestido branco de seda bordado de noiva que sua mãe guardava para o dia do casamento da filha única.  

Vestir sozinho era difícil, mas conseguiu e caiu como uma luva. Aprendera a abotoar o espartilho sozinha e a andar com salto alto, e iria assim vestida para o local combinado, queria fazer uma surpresa ao seu amado.  

Apenas com uma mala cheia de roupa, dinheiro que pegara do cofre de papai e as joias da caixinha de joias da mamãe. Os preciosos talheres de prata da gaveta da cozinha. O candelabro de bronze da mesa do altar.  

As horas passavam, estava escuro e nada dele. Nada passava por aquela estrada.  

Criada na luz com todo cuidado do mundo, ela nunca desconfiava ou chegou a conhecer os perigos da escuridão. 

Seus pais nunca ensinaram que ela não deveria andar sozinha na rua, e que nunca deveria ficar até tarde da noite fora. Nunca ensinaram que uma dama não pode andar sozinha, nem mesmo dentro de casa.  

Ela era como uma presa fácil para gente cruel.  

O óleo da lamparina já estava se esgotando e nada dele aparecer. Pensou em voltar para casa, ficou preocupada, o que será que aconteceu? Será que se perdeu? Será que estava no local certo?  

Insegurança, dúvidas, medo tomavam conta de si. Mas ela resolveu esperar.  

Esperar... 

Esperava... 

E esperou.  

Até que passos de cavalo podiam ser ouvidos, barulho de rodas de carroça eram audíveis.  
Ele não mentiu, ele veio mesmo com uma carroça. Estava pronta para partir, mas algo em si fez seu estomago gelar.  

Ele estava na carroça, mas haviam mais pessoas lá.  

Recuou, será que não era ele? Se confundiu? Mas ele chamou seu nome, será que aqueles homens iriam com ele?  

Começou a ficar com medo quando eles desceram. Algo estava de errado, era para ser só eles. Por que eles a chamavam? Quem eram aquelas pessoas? Por que estavam ali?  

Por que começou a correr para o bosque? Estava com medo, mas seu vestido atrapalhava. 

Eles... 
Eles correram atrás de si.  

Eles a pegaram.  

Eles rasgaram o seu vestido.  

Eles apertaram seu pescoço. 

Eles... 

Pegaram a mala com todas as coisas... 

Eles...  

Eles fizeram... 

Éris chorava e pedia para que aquele pesadelo acabasse. Queria acordar desse sonho ruim... 

Por que essas memórias estão voltando para sua mente? 

Por que teve que reviver tudo aquilo? 

Estava sendo castigada por ter desobedecido seus pais? Teve que passar por tudo isso para aprender a lição?  

Por que tinha que ter sido tão cruel? 

Por que...? 

... 

.. 

Papai, mamãe... Me escutem por favor... Me desculpem, eu deveria ter ouvido vocês, eu deveria ter ficado em casa e ter me afastado dele... Papai, você brigou comigo pelo meu bem... Mamãe, por favor não fique triste... Eu perdi seu vestido de noiva.  

Eu não deveria ter feito o que ele me pediu... O dinheiro do cofre, as joias da família...  

Mamãe... Papai... Eu quero voltar pra casa..., mas eu não posso... 

Me deixaram aqui sozinha, eu não queria ficar sozinha na vida, e aqui estou...  

Mamãe... Papai, eu morri...  

Minha vida foi tirada de mim... E ninguém veio me salvar.   

Ninguém apareceu quando eu gritei por socorro.  

Ninguém parou quando eu pedi para pararem... 

Ninguém veio quando eu pedi... 

... 

Mas hoje alguém veio. Alguém apareceu e me tirou dessa escuridão depois de tanto tempo chamando por alguém.  

Ele me pediu em casamento, ele recitou os votos para mim e colocou um anel de ouro em meu dedo.  

O meu braço esquerdo que quando estavam jogando terra em mim, me enterrando, eu consegui colocá-lo para fora da terra numa fagulha de vida que restava em mim.  

Mamãe, eu queria que você estivesse aqui. Papai, eu queria você ao meu lado.  

Eu disse sim para ele.  

Eu aceitei a sua mão.  

Eu estou tão feliz...  

Ele me tirou dessa escuridão... Mas ele foi tirado de mim... Pessoas cruéis tiraram meu amado de mim.  

Eu estou sozinha novamente, mas eu ainda estou com o anel de casamento em meu dedo...  

Eu ainda estou casada com ele...

... 

Tempos depois a borboleta parecia exausta de tanto tentar voar e caiu de costas no chão sem se mover mais. Parecia que morreu dessa vez, ela já estava fraca mesmo. Abaixou-se para pega-la e verificar, ela estava parada na sua mão.  

Ao seu redor o cheiro pútrido era iminente, mas de alguma forma estranha estava acostumado com o odor. A estrada que levava parecia que terminava perto de uma igreja. Não reconhecia o local, mas pela arquitetura parecia uma igreja católica. Tinha sombras próximo ao local, mas o que chamou sua atenção foi um amontoado de tecido branco e alguém deitado no chão. Se aproximou e reconheceu os cabelos ressecados compridos. Só podia ser ela.  

— Éris...?— Disse acuado. Não tinha certeza do que fez voltar até ela, talvez a borboleta a guiou até ela. 

A cadáver olhou para trás, ainda estava deitada no chão desde aquela hora abandonado. Estava sem os olhos, mancha de lágrimas negras marcavam os olhos e parte de seu rosto estava seca e com a caveira quase a mostra, isso não assustou o rapaz, mas deixou a noiva bem envergonhada.  

Éris... É você?  

A noiva tapou o rosto com os dedos esqueléticos, não queria que ele a olhasse naquele estado.  

Vá embora...— pediu com voz chorosa. Não estava se sentindo bem depois de recobrar todas as memórias de quando era viva até a hora de sua trágica morte.  

O rapaz olhou o anel de ouro em seu dedo de esqueleto. Tinha que tira-lo dali, mas não tinha vontade de fazer isso.  

Por que...?  

Porque você não deveria estar aqui, você está vivo...! E eu estou...  

— Éris!— Pediu para que ela parasse pois não estava entendendo nada naquele lugar.  

Ela se arrumou a se levantar, desajeitadamente com o vestido longo saiu correndo em direção a igreja. As sombras desapareceram como fumaça quando ela atravessou os portões de madeira.  

Assim como estava viva, Éris correu de quem ela esperava, correu de quem chamava seu nome. Mas dessa vez ela estava morta, não tinha floresta para fugir da estrada agora, mas tinha uma igreja católica que era sua única opção.  

O rapaz olhou para borboleta em sua mão e olhou novamente para o portão da igreja.  

Será que deveria seguir a noiva? Por que a borboleta o guiou até ali?  

O que deveria fazer...? 

E o que era aquele mundo onde estava? Que sonho estranho demais. 

Isso se era tudo um sonho 

... 

 ..

.


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado da leitura. ♥
Não esqueçam de favoritar e deixar um review. ♥



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