Recomeço escrita por JN Silva


Capítulo 1
O despertar


Notas iniciais do capítulo

Olá pessoal!
Essa fanfic já foi postada uma vez neste site, mas a excluí por não gostar do rumo que ela estava tomando.
Decidi, portanto, reescrevê-la.
Espero que gostem!
Boa leitura :D



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Quando Snape finalmente abriu os olhos, sorveu o ar com toda a força que possuía em seus pulmões, como quem acabava de emergir de um profundo e demorado mergulho. E foi então que se deparou com uma escuridão incomparável. Poucos minutos antes, vivera um dos momentos mais aterrorizantes e dolorosos de sua vida. A serpente de Voldemort rasgara-lhe o pescoço a duros golpes, com suas presas afiadas e venenosas. Sempre fora um homem forte, de coragem, mas quando Nagini saltou sobre ele, envolvendo-o e esmagando-lhe os membros, o terror que sentiu pareceu sobressair sobre a própria dor física dos ferimentos.

Estranhamente, porém, no momento de agora, o homem não se lembrava de nada daquilo. Embora pouco tempo pudesse ter passado (não era possível dizer) entre o expirar de outrora e seu despertar para esta nova realidade, sentia-se como se acordasse de um sono de cem anos. Uma espécie de letargia ainda dominava seu corpo, e sua mente funcionava de forma lenta. Era como se acordasse de um coma profundo.

Pouco a pouco, pequenas fagulhas de consciência começavam a voltar em sua mente. Um pequeno formigamento nos dedos o fez mover levemente a mão e, naquele momento, era como se só então percebesse que a possuía. Percebeu também que respirava, e, por meios dessas pequenas percepções, lentamente se dava conta de sua existência. Era como se renascesse.

Algum tempo depois, no entanto, sua mente começava a buscar memórias e consciências mais profundas. Uma cena ia se formando aos poucos em sua mente, como se sonhasse; inicialmente vaga e disforme, mas, aos poucos, ganhando consistência e nitidez, até que se constituísse, de fato, em lembrança. Uma casa velha e poeirenta, um ser indistinto com quem conversava e uma... serpente. Por fim, conforme a lembrança ganhava profundidade e completude, também sua compreensão se aprofundava, e foi como se voltasse a si. A partir de então, não apenas esta, mas muitas outras lembranças começaram a povoar sua mente.

Lembrou-se do medo, do salto da cobra sobre ele e as presas afiadas cravadas em seu pescoço. Tão logo o veneno entrou em contato com sua corrente sanguínea, suas pernas perderam a força e ele caiu, sentindo o próprio corpo enrijecer. Dentro de suas veias, seu sangue queimava. A respiração se tornava mais dificultosa, os batimentos cardíacos perdiam a cadência e ficavam mais lentos, ao mesmo tempo em que sua visão oscilava, escurecendo e voltando. Pequenos espasmos convulsivos o faziam trepidar, conforme o veneno se misturava ao seu plasma sanguíneo. Aquela nunca fora um cobra comum, Snape sabia bem disso. Não só pela sua espécie nunca conhecida, seu comprimento mais extenso do que qualquer outro réptil, mas porque percebia-se, naquele animal, uma compreensão e consciência quase humanos, além, é claro, de Voldemort ter feito dela uma horcrux. Colocara nela toda a sua maldade e obscurantismo, fazendo da serpente um objeto maligno.

Lembrava-se da expressão fria de Voldemort, completamente desprovida de culpa ou tristeza por aquela execução. O estranho ser proferiu apenas um “Lamento”, sem, no entanto, lamentar de fato, deixando-o sozinho para morrer naquela fria sala, sob o Salgueiro Lutador. Severo Snape não era um homem ingênuo. Sabia que iria morrer um dia, como qualquer homem mortal. Só não imaginava que seria naquele momento e muito menos daquela forma. Por mais que soubesse que sempre fora um simples objeto na mão de Voldemort, assim como os demais Comensais da Morte, e que seu mestre não desejava nada além de poder, naquele momento, foi como se compreendesse de fato o que significava isso. Sentiu-se usado, traído e abandonado, ainda que soubesse que aquele ser das trevas era incapaz de sentir estima e amizade por qualquer outro ser que não fosse a si próprio (e até disso Snape tinha dúvidas). Sentia-se como um animal que, tendo servido a vida inteira ao dono, no momento da velhice, já sem serventia, era condenado ao abate. Sem nenhuma gratidão, respeito ou reconhecimento.

Mas não era momento para reclamar ou se surpreender com isso. Sabia bem, ainda que de maneira vaga, que havia possibilidade de ser morto uma hora ou outra por aquele que chamava de “Milorde”. Sabia também que estava colhendo os frutos de sua própria escolha, afinal, foi por vontade própria que ele decidira fazer parte do tenebroso clã de Voldemort. Ninguém o obrigara. Embora tivesse sido influenciado desde a mais tenra idade a esse respeito por amigos e colegas mais velhos, nunca fora forçado a isso. Foi porque quis. E agora, no momento em que agonizava, ele se dava conta de sua enorme insensatez. Mas não havia mais nada a fazer, senão aceitar, com resignação, a morte que se avizinhava. No entanto, se houvesse uma última oportunidade, uma derradeira possibilidade de mudar toda a sua história e, consequentemente, aquele destino cruel, Snape faria tudo diferente. Naquele momento, sua consciência se tornava mais sensível. Lembrava-se, com dor e amargor, das terríveis atrocidades que cometera. Das vidas que tirara, das pessoas que torturara e machucara, da imundície moral na qual se metera. Das atrocidades que não impediu, das boas pessoas que afastou de si, de todo o ódio destilado contra pessoas inocentes, tudo em nome de seu egoísmo, ressentimento, imaturidade. Naquele tempo, tinha sempre viva na memória as lembranças do quanto sofrera, das humilhações que aguentara, das rejeições e agressões que sofrera, utilizando-se dessa mágoa como combustível para tornar-se alguém cada vez pior, na tentativa ser temido e reconhecido como um grande bruxo, nem que para isso tivesse se enlamear na pior das corrupções. No momento derradeiro, no entanto, percebia que ele, Severo Snape, tinha feito sofrer muito mais do que ele próprio tinha sofrido, tinha arruinado muito mais a vida de suas vítimas do que ele tivera sua vida arruinada. E que culpa elas tinham, afinal? Seu ódio e seu egoísmo o deixara cego, e só agora ele percebia isso.

Enquanto seus batimentos cardíacos diminuíam a frequência e sua respiração se tornava mais fraca, seu remorso ia mais longe. Mesmo o menor de seus desvios pesava-lhe como um fardo. Mesmo naquelas situações em que, antes, considerava ter tido razão. Sentia-se sem ar. O peito apertado. Mas nem mesmo abrir a gola da veste conseguia, uma vez que já se encontrava completamente sem forças. “Memento mori”, ouvira uma vez, expressão latina que significava “lembre-se da morte”. Era uma expressão da qual (segundo ouvira falar) algumas pessoas se utilizavam, como estímulo para buscar viver uma vida mais digna e, assim, se preparar adequadamente para o momento da morte. Naquele momento em que se encontrava, entretanto, tal expressão estava fixada na mente do homem. “Lembre-se da morte”... ele estava morrendo! Só agora se dava conta que ele era nada, e que seus talentos e habilidades, ou o prestígio e admiração que conquistara em vida, não podiam salvá-lo. Sem ter o que fazer, apenas exclamou, num fio de voz, um pedido de perdão, sem saber para o quê ou para quem, sentindo interiormente necessidade e desejo de redenção.

Sim, no momento de agora Snape se lembrava com precisão de tudo isso. As memórias de outrora estavam mais nítidas em sua mente do que nunca.  E em meio a esses pensamentos, uma segunda lembrança surgiu, mais suave, mais doce e quem sabe, até mesmo, feliz. Logo que o terrível ser ofídico deixou a sala, aproximou-se o Menino que Sobreviveu. Mesmo que houvesse odiado ter de olhar para aquela face idêntica à de Tiago Potter por longos anos em Hogwarts, poder contemplar pela última vez os olhos verdes idênticos aos da única mulher que amou fora um verdadeiro consolo. A única coisa que Harry Potter herdara de Lílian, em sua aparência, foram os olhos. Extraordinariamente verdes, como os de sua mãe. Naquele momento, Snape não conseguira sentir ódio do garoto; por incrível que pareça, sentiu-se em paz por poder ver o menino uma última vez. E foi com aquela lembrança que tudo desapareceu e seus olhos não viram mais nada. E logo depois, ele acordara ali, em meio àquela escuridão. Foi então que caiu em si.

— Estou... morto? – murmurou para si mesmo, com estranheza.

A ideia de pós-morte parecia-lhe muito estranha. A de estar morto, também. Nunca nem sequer imaginara o que ocorreria consigo depois que morresse. Levou a mão ao pescoço, apalpando-o. Não havia mais nenhum ferimento. A dor desaparecera também. Desceu a mão para os ombros e o peito, amassando as vestes. Estavam secas. Não havia mais nenhum sinal de umidade de sangue. O homem estranhou. Então, percebeu que estava deitado. Não deitado sobre algo plano ou palpável. Simplesmente deitado, sobre lugar nenhum. Não havia nada debaixo de si, nenhum apoio. Flutuava no nada, apenas.

O silêncio era extremo. O único som que ouvia era o de sua própria respiração. A escuridão ao seu redor era intensa. Não enxergava absolutamente nada. O negrume daquela escuridão parecia muito mais intenso do que qualquer outra que já tivesse presenciado.

Começando a se incomodar com aquela situação, vasculhou os bolsos das vestes, em busca da varinha, na tentativa de trazer alguma luz para aquele lugar, se é que se poderia chamar de lugar. Não encontrou nada. Levou as mãos ao redor do corpo, para ver se ao menos a encontrava perto de si. Novamente, nada encontrou. Sentiu uma pontada de insegurança. Sabia que, sem a varinha, estava em uma situação bastante vulnerável, já que o objeto constituía o seu maior instrumento de defesa contra qualquer possibilidade de perigo. Mas, fechando os olhos (o que não fazia diferença nenhuma), respirou fundo e procurou acalmar-se, pensando no que fazer. Haveria algum modo de sair dali. Tentou pronunciar o feitiço sem a varinha mesmo.

— Lumus! – disse, com convicção.

Nada aconteceu. Snape esperou mais alguns minutos; tudo continuou como antes. Tentou mais uma vez:

— Lumus Maxima!

Novamente, sem sucesso. Fez uma última tentativa:

— Lumus Solem!

A escuridão permaneceu a mesma. Aquilo era estranho.

Sem ter o que fazer, esperou. Esperou por muito, muito tempo. Então, ocorreu-lhe um pensamento estranho: ali, parecia não existir tempo. Tudo era sempre igual. Um lugar vazio e esvaziante, se é que essa palavra existia. Porque estar ali parecia consumir sua própria existência.

Quando um calafrio percorreu-lhe o corpo, Snape percebeu que sentia frio. Puxou a capa para junto do corpo, tentando se aquecer. E continuou a esperar, deitado, se perguntando que lugar estranho seria aquele, sem luz, sem som, sem calor. A resposta estava mais próxima do que nunca, e foi de sua consciência que ele ouviu uma voz lhe responder...


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Notas finais do capítulo

Espero que tenham gostado
Até a próxima :D



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