Pieces Into Place escrita por éphémère


Capítulo 4
Capítulo III


Notas iniciais do capítulo

OI PESSOINHAS DO MEU CORAÇÃOOO

Primeiramente, quero pedir perdão pela demora. Além de ter tido um leve bloqueio criativo no qual eu n conseguia escrever NADA do que imaginava pra essa fic, trabalhei em um projeto de Scorose com a Tahii. Pra quem tiver interesse, a fanfic já foi publicada e se chama Chemie, entrando no meu perfil vocês terão fácil acesso a ela. Amamos escrever esse projetinho, e foi o que me ajudou a sair do bloqueio criativo!

Agora, aos agradecimentos. Fiquei muito feliz de verdade com todos os reviews que recebi no capítulo passado, e mesmo que tenha agradecido a cada um umas 20 vezes, não acho que foi suficiente, então: obrigada do fundo do coração pelo apoio! Amo cada um de vocês, que comentam, que acompanham e que favoritam, e é isso que me motiva a continuar.
Agradecimento especial à MBFigueiredo por favoritar a história, OBRIGADA OBRIGADAAA!!!

Esse capítulo também é mais compridinho, mas é basicamente de transição pras coisas começarem a acontecer de verdade pro nosso casal maravilha. Sem mais delongas, vamos ao capítulo??/

Espero que gostemmm, e nos encontramos nas notas finais ♥



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Sentada ao lado de Astória, Rose apertava a mão da mulher com firmeza, esperando que dessa forma passasse algum conforto uma vez que a morena tinha acabado de contribuir com a própria versão dos acontecimentos e derramara algumas lágrimas no processo.

Sua caderneta flutuava acima da mesinha de centro, posicionada para que todos vissem o que era escrito — na sala, predominavam o barulho da pena de repetição rápida cortando o pergaminho, da chuva açoitando as janelas e da voz ligeiramente lúgubre de Draco, que ainda tinha o nariz um pouco vermelho.

— Assim que a Batalha de Hogwarts terminou, até o silêncio fazia barulho. De onde eu estava, o céu parecia cinza, mas não por causa de nuvens. Não, era por causa da poeira de toda aquela destruição que ainda estava no ar. Me lembro que, por algum motivo, minha primeira reação foi olhar para baixo e ver a sujeira grudando em algo pegajoso nas minhas roupas. Qualquer coisa depois disso passou muito rápido e ainda tenho tudo como um borrão na minha cabeça, mas de uma coisa lembro muito bem: alguns aurores nos mantiveram sob custódia em nome do Ministério, mais especificamente da Suprema Corte dos Bruxos.

“Entendo o porquê de tanta comoção, e fizeram um ótimo trabalho capturando a maioria de comensais, já que poucos conseguiram de fato fugir. Mas Pio Thicknesse tinha caído e, sem um Ministro, a Suprema Corte dos Bruxos não teria o poder para fazer algo antes que um novo fosse eleito. Claro que você deve imaginar que não foi isso que realmente aconteceu, não é mesmo? Listaram nossos sobrenomes em ordem alfabética, e começaram os julgamentos baseados em uma emenda supostamente deferida há séculos. Podem nos chamar de muita coisa, mas não somos burros, e sabemos que inventaram aquilo em cinco minutos, principalmente porque, sabe... chegava a ser inconstitucional. Prenderam muitos representantes de família, confiscaram tudo o que tinham e deixaram suas famílias sem nada.

“Não demorou para que Kingsley Shacklebolt fosse eleito, mas foi o suficiente pra que muitas das sentenças dadas não pudessem ser retiradas. Ele com certeza foi um anjo; ainda que não pudesse fazer muito, agendou novas sessões de julgamento e ajudou com aquilo que estava a seu alcance. Minha família, por exemplo, teve muita sorte: Harry Potter em pessoa compareceu naquele dia e testemunhou a nosso favor, relatando que apenas saiu com vida da Floresta Proibida porque minha mãe o encobriu. Foi provado, também, que meus pais não tomaram parte nas batalhas travadas naquele dia. Tivemos que pagar uma quantia absurda ao Ministério, sem dúvida, mas o que valia mais que qualquer coisa nós ainda tínhamos.

“É claro que o Profeta Diário não perdeu tempo e começou com as conjecturas e os disparates de sempre. Houve uma ocasião, inclusive, em que peguei para ler uma coluna do Cuffle e não consegui conter a raiva. Falava mal da ideologia de sangue-puro, reduzia as famílias de ex-comensais a um tapete na Travessa do Tranco... E estamos falando de Cuffle, que ajudou o Ministério de Thicknesse na produção em massa daquela cartilha, “Sangues-ruins e os Perigos que Oferecem a uma Sociedade Pacífica de Sangues-puros”! Acontece que o Profeta é o jornal mais vendido da Grã-Bretanha, então as pessoas acabaram comprando aquilo, afinal, estavam exaustos, carregavam sabe-se lá quantas cicatrizes... Precisavam de justiça, sabe?

“Shacklebolt condenou aquela atitude, obviamente. Fez uma declaração pública, defendendo que a justiça já havia sido feita pelo Ministério, que a paz e a união nesses momentos difíceis devia ser maior que qualquer outra coisa, que não poderia haver espaço para o preconceito, o ódio e coisas do tipo. O Profeta passou a ficar em rédeas curtas com o Ministro, mas sempre publicavam pelo menos uma matéria bastante sugestiva. Desse jeito, a sociedade bruxa foi filtrando a tolerância que tinha por nós até que não restasse mais nenhuma, apenas o puro preconceito.

“Por isso me candidatei para trabalhar no Departamento de Aplicações das Leis Mágicas: queria fazer a diferença. E sua mãe, Rose, que já trabalhava lá quando entrei, foi uma das pessoas que mais me ajudou, que mais me ensinou. Ainda que eu a tenha chamado de sangue-ruim nos anos que estudamos juntos, ainda que eu tenha dificultado tanto a vida dela, foi a única pessoa naquele departamento que sempre esteve ali por mim. Me sinto muito envergonhado quando penso a respeito e acredito que ainda tenho uma enorme dívida com ela, mas tudo o que posso dar é minha eterna gratidão.

Quando Draco ficou em silêncio, o ar na sala parecia denso e pesado, e Rose se sentia um pouco tonta. Sabia que o que lera a respeito não era cem por cento verídico, ainda mais com os constantes lembretes de seus pais, seus tios e seus avós, que faziam questão da nova geração saber da verdade. Ainda assim, não conseguia conceber a ideia de que deixaram tanto de fora. Nenhum dos livros de História da Magia contavam essa versão dos fatos.

Com os olhos fixos na mão que Astória passou a segurar, tentava normalizar a respiração enquanto, com os lábios entreabertos, procurava algo para dizer, mas nada saía de sua garganta. Não julgava ser possível existirem palavras suficientemente adequadas para expressar tudo o que estava pensando e sentindo. Seus ombros pareciam pesar duas vezes mais.

— Você é como sua mãe, querida — Astória disse, baixinho, despertando Rose de seu torpor ao acariciar suas costas; olhando naquela direção, a ruiva encontrou aqueles olhos verdes, gentis e firmes, que reiteravam o que era dito — Justa, ponderada, inteligente e extremamente corajosa. É algo que sua presença emana, entende?

Rose acenou afirmativamente com a cabeça e sua visão embaçou com as lágrimas que começavam a brotar. Quantas pessoas que não mereciam passar por tudo o que tinham passado continuavam mantendo um sorriso no rosto, assim como os Malfoy faziam?

Piscando com força algumas vezes, inspirou fundo e engoliu o nó que se formou e passou a entalar sua garganta. Se recusava a chorar, principalmente na presença de Scorpius Malfoy. Lembrando da presença dele, levantou a cabeça, olhou-o brevemente e, ao encontrar prontamente aqueles olhos cinzentos fixos sobre si, sentiu o coração errar uma batida. Não conseguia entender o que carregava as feições do loiro daquela forma, mas não prolongou-se muito para descobrir o que era — rapidamente, desviou a atenção para o Sr. Malfoy.

— Não sei nem como começar a agradecer por tudo que fizeram por mim hoje, mas já é tarde e vocês precisam descansar, então vou tentar — soltando uma risada fraca enquanto segurava a ardência nos olhos, ela se levantou — Obrigada Sra. Malfoy por, além de me entregar seu relato com tanta diligência, ter me acolhido de forma tão gentil essa noite. Adorei as conversas que tivemos, e precisamos ir ao Florean’s Fortescue um dia desses! Obrigada, também, Sr. Malfoy, por me receber tão bem e por me confidenciar sua história dessa forma; prometo usá-la de forma justa. E Scorpius... bem, foi bom te ver.

A intensidade do que acabara de dizer a pegou desprevenida tanto quanto pegou os Malfoy, ainda mais pela última parte, que lhe escapara sem permissão e era, não podia negar, completamente verdadeira. Sentiu as orelhas preencherem-se de calor, e agradeceu a Merlin por seus cabelos ocultarem-nas à medida que sentia o olhar de Scorpius pesar sobre si e fazer sua pele arder. Com a atenção de Astória, de Draco e de todas as fotos que revestiam a parede também voltadas para ela, parecia que tudo à sua volta pausara no tempo e que sua cabeça flutuava.

No instante seguinte, Astória e Draco a abraçavam com ternura, despejando uma chuva de elogios, incentivos e até mesmo de agradecimentos sobre ela, que foram muito bem retribuídos. Ficou, também, incumbida de mandar lembranças à sua mãe e aos seus tios, Harry e Gina, e de puxar a orelha de Albus para que lembrasse de sua promessa.

Já no hall de entrada, calçando os próprios sapatos e vestindo o próprio casaco amarelo, o celular, a caderneta e a pena de repetição rápida nos bolsos internos, pausou por um momento. Não pretendia voltar ali tão cedo, então tomou um tempo para memorizar as feições da mulher que a tratou como uma velha amiga e do homem que a abraçou com sinceridade e mostrou-lhe um lado fragilizado que, ao que supôs, não era conhecido por muitos. Olhando por cima dos ombros de Draco, memorizou também o jogo de porcelana de Astória, a parede de fotos e o perfil reflexivo de Scorpius que, ainda sentado no sofá, tinha os cotovelos apoiados nos joelhos, os dedos inquietos mexendo no último botão de sua camisa e a atenção fixa em algo muito interessante na mesinha de centro.

Como acontecera cinco anos atrás, sequer chegaram a trocar alguma palavra de despedida.

Logo Rose já estava dentro do carro, e os contornos de Draco e Astória, ressaltados contra a luz da porta de entrada, lhe acenavam. Girando a chave no contato, acenou de volta, engatou a ré, levou as mãos ao volante com firmeza, olhou para a parede de tijolos tomados pela hera à sua frente. Fora uma noite excessivamente longa e o misto de sentimentos que inundavam sua cabeça numa torrente bastante confusa causavam uma sensação estranha, mas havia uma felicidade latente ali no meio, inegável, que colocava em evidência a satisfação de dever cumprido. Já nem pensava mais na efetivação, apenas nas famílias que ajudaria caso seu artigo chegasse a ser publicado.

Seu carro, porém, protestou no que pareceu um rosnar de desaprovação e não saiu do lugar. Rose tentou de novo e de novo, mas por mais que o carro rosnasse e tremesse, não se movia um centímetro sequer.

Era como se um balde de água fria tivesse sido despejado sobre sua cabeça. Quando, após várias tentativas, finalmente deu-se por vencida, enterrou o rosto nas mãos e tentou pensar em algo. Seu pai saberia o que fazer caso o motor tivesse dado pau, certo? Esperançosa, olhou para a porta de entrada dos Malfoy, mas apesar de continuar aberta, não havia mais nenhum sinal do casal que antes se despedia. Era só o que me faltava, pensou enquanto resmungava e voltava a dar partida no carro.

Uma batida repentina na janela ao seu lado fez com que Rose pulasse no lugar, sentindo o coração parar ligeiramente antes de voltar a bater. Com as sobrancelhas franzidas, olhou naquela direção enquanto soltava um suspiro pesado. Debaixo da chuva que ainda caía, Scorpius apoiava o antebraço contra o carro e a olhava irritado, gesticulando para que ela abaixasse o vidro.

Mais uma vez naquele dia, seu coração errou uma batida antes de voltar, três vezes mais rápido.

Podia entender aquela carranca; estava encharcado dos pés à cabeça. No entanto, aquele rosto a paralisou e tirou completamente sua capacidade de discernimento. Seu peito, gelado com uma expectativa crescente, alimentava seus pensamentos, que por sua vez traziam à tona a última vez que estivera tão próxima assim dele, o luar banhando aqueles cabelos de prateado, ressaltando aquelas maçãs do rosto...

Scorpius voltou a bater contra o vidro da janela com um quê de impaciência, e dessa vez ela o atendeu, ainda que um pouco receosa de que ele pudesse ver o efeito que causava nela. Precisou fazer força para olhar nos olhos do Malfoy sem prestar atenção na forma que seus cabelos grudavam contra a testa e a nuca, na água que pingava de seus cílios extensos, da ponta do seu nariz e dos seus lábios, ou mesmo naquela camisa social, agora praticamente transparente, que colava em sua pele.

— Está atolado — disse simplesmente, apontando para as rodas dianteiras do carro.

— O... o que?! — atordoada como estava, Rose quase atropelou Scorpius com a porta ao abri-la de supetão e correr para constatar aquilo.

Os pneus estavam quase que completamente submersos na lama escura do jardim. Andando até a parte traseira do carro, a ruiva notou que, ao forçar o carro a sair do lugar tantas vezes seguidas, acabou atolando metade das rodas traseiras também. Endireitando a postura, jogou a cabeça para trás, fechando os olhos enquanto algumas gotas geladas atingiam seu rosto. Sentia a raiva voltar a inundar seu corpo, praguejando ao vento num grunhido inaudível. Por que é que tinha de haver uma relação diretamente proporcional como aquela, em que uma coisa só podia dar muito certo se outra desse muito errado?

E o que faria agora? Não podia voltar para casa sem o carro dos pais, e qualquer feitiço que lançasse para tirá-lo dali não sairia muito convincente, considerando a chuva que obstruía o caminho. Além do mais, o tiraria dali apenas para voltar a atolar no meio do nada?!

A porta dianteira do carro bateu. Rose não percebeu que a deixara aberta até aquele momento, quando olhou para a origem do ruído e viu Scorpius em pé ao lado da lataria escura, examinando os pneus com o mesmo semblante reflexivo de alguns minutos. As gotas de chuva que pingavam em seus ombros largos espirravam para todos os lados, e ele parecia estar emoldurado por pequenas faíscas líquidas.

— Vamos lá pra dentro — cortando o silêncio, o loiro acenou a cabeça para Rose, indicando a porta de entrada. Sem esperar por uma resposta, deu as costas e sumiu através do batente.

Uma onda fria percorreu Rose da cabeça aos pés, e ela precisou chacoalhar-se brevemente antes de conseguir dar um primeiro passo. Experimentava uma sensação diferente de fracasso, e um gosto amargo parecia inundar o interior de sua boca. De volta ao hall de entrada, Scorpius já estava seco, com exceção dos cabelos, e parecia esperar por ela enquanto, de braços cruzados, recostava-se contra a porta do armário de casacos.

— Mesmo sem chuva, você não conseguiria levitar aquele carro sozinha — sem folga, começou a disparar informações em Rose, que demorou ainda mais para processar o que era dito — Considerando que não vai parar tão cedo, sugiro que espere até o dia seguinte, quando poderemos te ajudar.

— Passar a noite aqui?! — a pergunta escapou dos lábios de Rose com um tom mais incrédulo do que seria considerado educado. Para falar a verdade, muitas falas pareciam escapar de seu controle aquela noite, principalmente na presença dele.

— Não precisa se preocupar — assegurou, os enormes olhos azuis-acinzentados parecendo solidários ao desespero que a expressão da ruiva provavelmente deixou transparecer — Nada vai acontecer, e temos um quarto de visitas suficientemente confortável. Venha, vamos avisar os meus pais.

Lançando em Rose um feitiço secante, deu-lhe as costas e andou na direção do corredor ao lado das escadas sem olhar para trás para verificar se era seguido. Trocando rapidamente os sapatos pelas pantufas de antes, ela foi naquela direção vagarosamente, sentindo os joelhos protestarem e pesarem um quilo a mais a cada passo.

A cozinha era bastante ampla para uma família de três pessoas. Revestida de armários escuros que contrastavam contra o azulejo claro do chão, havia uma ilha diminuta com três banquinhos e uma passagem que, ao que parecia, dava num solário fechado e convidativo. Talvez houvesse um quintal mais além, mas Rose não saberia dizer.

De costas para a porta da cozinha, o Sr. e a Sra. Malfoy conversavam sobre uma gaveta quebrada, que parecia insistir em cuspir todo o seu conteúdo para fora. Com o barulho da louça lavando sozinha na pia, não pareciam ter percebido a presença do filho ou da ruiva ao seu lado.

— Mãe, pai — Scorpius chamou, andando até a ilha. Quando viram Rose parada ali perto, pareceram profundamente surpresos, mas a receberam de volta com um enorme sorriso.

— Rose! — Astória exclamou, examinando-a discretamente — Aconteceu alguma coisa? Você parece tão pálida!

— O carro dela atolou lá fora — diante do silêncio de Rose, foi Scorpius que tornou a falar; entendendo a pergunta que já se formava no olhar do pai, acrescentou — Os pneus estão bem fundos na lama, teríamos que ajudá-la com o feitiço de levitação.

— E de qualquer forma, é melhor que façamos isso amanhã, não é? — a pergunta de Draco pareceu retórica, uma vez que respondeu logo em seguida — Sim, de fato, a estrada não deve estar numa situação melhor e ela provavelmente atolaria no meio do nada se fosse embora agora.

— Bom, já estávamos subindo mesmo, então vamos aproveitar para ajeitar o quarto de visitas. Venha, querido, amanhã mexemos nessa gaveta. Talvez só não tenha sido um dia bom para ela. Boa noite, meus amores!

E quando Rose percebeu, estava sozinha na cozinha com Scorpius, que girou sobre os calcanhares para ficar de frente para ela. Como na maior parte das vezes, seu rosto era indecifrável e seus olhos, expressivos, pareciam querer dizer muito de uma vez.

E Scorpius de fato queria, só não sabia por onde começar. Como esteve e por onde andou nesse intervalo de tempo? Conseguiu o emprego onde queria? Conseguiu convencer a mãe a ter um cachorro? Tinha algum namorado? Estava absolutamente linda, ele mesmo não conseguia parar de olhá-la, então era certo que tinha. Só percebeu que mergulhara os dois em um silêncio desconfortável quando as bochechas dela preencheram-se de vermelho e seus olhos miraram o chão. Inspirando mais do que precisava, Scorpius olhou para o lado, fingindo um interesse profundo na louça do escorredor.

— Está com fome? — voltando o olhaa para Rose de soslaio, viu-a jogar o rosto para o lado e franzir o cenho, então prontamente tentou se justificar — Quero dizer, Albus me contou que você ficou o dia inteiro procurando por alguma entrevista, então deduzi que...

Com uma risadinha que causou calafrios, Rose andou na direção dele e apoiou-se em uma das banquetas que circundavam a ilha. Sua mãe estava certa: a ruiva parecia mais pálida que um fantasma, e seu rosto era pura chateação. Tinha até mesmo um bico formando-se a partir de seu lábio inferior.

— Albus costuma te contar sobre os passos que dou, é?

— Só quando está preocupado.

As pálpebras dela pareciam pesadas quando o olhou rapidamente, como se quisesse checar alguma coisa. Era difícil entender o que se passava na cabeça dela; ainda que seu rosto fosse um dos mais expressivos que Scorpius conhecera, seus olhos permaneciam uma incógnita.

— Estou faminta — respondeu por fim, o canto dos lábios puxando um sorrisinho que durou pouco mais de dois segundos.

Scorpius assentiu levemente e levou as mãos à gravata bagunçada, indo até a geladeira. Precisava manter os dedos, ou melhor, a mente ocupada — não importava qual era a intensidade daquela vontade que sentira em chegar mais perto, abraçá-la, iluminar aquele rosto com um sorriso, tinha que reprimi-la. Sem contar que não sabia se conseguiria segurar a língua, uma vez que esperara tanto para ter a oportunidade de passar determinada noite a limpo.

Enquanto o loiro fazia uma série de barulhos pelo cômodo às suas costas, Rose brincava com uma das linhas soltas de seu casaco. Sentia-se irremediavelmente patética: seus cabelos ainda molhados faziam-na estremecer de frio em intervalos, as ideias que pipocavam na sua cabeça sobre passar a noite não cediam espaço para que pensasse direito e, envolvida como estava no perfume forte que Scorpius deixou ao seu lado, não parava de inspirar fundo.

Quanto à bagunça de sentimentos e sensações de antes, não saberia dizer onde teriam ido parar. Afinal, quando se misturam vários tons de tinta, o resultado sempre será um tom escuro e indefinido.

Que ironia! Poucas horas atrás, estava surtando por estar a caminho dos Malfoy, por pensar na possibilidade de reencontrar Scorpius, por apreensão em não conseguir fazer uma entrevista sequer e ter que mudar a proposta de última hora. Agora, Scorpius cozinhava algo para ela, e era ali que dormiria.

A noite que já parecia interminável estendeu-se mais um bom bocado.

Aproveitando enquanto o Malfoy se ocupava em silêncio, Rose puxou o celular das vestes e discou o número da mãe, mas a ligação caiu na caixa postal no mínimo três vezes. Contentou-se em apenas deixar uma mensagem e esperar um berrador em resposta, isso na melhor das hipóteses.

Para Albus, mandou apenas uma foto de Scorpius. Esperaria até a manhã seguinte para explicar o resto. Lembrava vagamente de ter perguntado se o loiro não tinha que descansar, e dele responder brevemente que não trabalhava aos sábados, então não precisaria dormir cedo. No entanto, ficaram envoltos em silêncio a maior parte do tempo.

Enquanto comia, olhava diretamente para Scorpius e não poupava elogios ao prato. Estava verdadeiramente gostoso: as batatas macias, o bife suculento, os cogumelos que combinavam muito com todo o resto. Mas a melhor parte era, de longe, ver o rosto dele, um pouco vermelho por conta da temperatura alta do fogão, e o sorriso sincero enquanto agradecia.

Aquele momento com o Malfoy mexeu em tudo nela: suas orelhas queimavam, suas mãos tremiam, sua boca secava cada vez mais, seu estômago revirava. Apesar disso, tudo saiu muito melhor do que imaginava, e a madrugada preencheu-se com uma conversa bastante agradável sobre times de quadribol, personalidades públicas, antigos colegas de sala e outros tipos de amenidades. A tensão que pairava entre os dois, quase tão sólida quanto uma parede, os acompanhou em cada troca de olhares, em cada sorriso, em cada pretensão de esticar o braço e tocar o outro, é claro, mas não passou disso. Rose sequer se lembrava por que se desesperara tanto com a possibilidade de encontrar Scorpius.

Deixando a louça para lavar sozinha, ela foi guiada escada acima.

O segundo andar da casa consistia num corredor estreito cheio de portas, decorado aqui ou ali por mais algumas fotos de família e um ou outro vasinho de plantas, que Rose lembrava vagamente de ter visto nas estufas da professora Sprout. Andaram, então, até pararem na frente da penúltima porta do corredor, a qual Scorpius foi cortês o suficiente para inclinar-se e abrir.

— Essa última porta, ao lado do seu quarto, é o banheiro. Pode ficar à vontade para tomar um banho, escovar os dentes, ou o que quiser. Ah, e caso precise de mim — gesticulando brevemente com a mão, ele indicou a porta diretamente na frente do quarto de visitas —, estarei no meu quarto.

Deixando-a sozinha no corredor, Scorpius desapareceu por trás da porta.

Balançando a cabeça ligeiramente para se livrar do sorriso bobo que começou a se formar, Rose fechou os olhos e foi ao banheiro. Como Scorpius sugeriu, decidiu fazer tudo o que tinha direito depois de um dia tão cansativo e de uma noite tão extensa. A água quente do chuveiro pareceu derreter seus braços e livrar seus joelhos de qualquer resquício de dor. Não havia nada a ser feito a respeito do hematoma em um deles, mas ele tinha uma cara muito melhor do que a ruiva pensara. Depois disso, escovou os dentes com o dedo mesmo e passou longos segundos encarando o próprio reflexo enquanto penteava os cabelos.

Ao abrir a porta do banheiro, o vapor acompanhou-a no corredor. Suas bochechas ostentavam um leve tom escarlate por causa da temperatura da água, seus cabelos despontavam em todas as direções e seus olhos passeavam de um lado para o outro. Levando uma das mãos aos lábios enquanto tentava pensar direito, foi traída pelos próprios pés.

Foi parar na porta do quarto de Scorpius num piscar de olhos, e já tinha dado duas batidinhas nela quando recuperou o controle do próprio corpo. Tudo o que veio a seguir foi tão rápido que Rose sentiu-se zonza — Scorpius abriu a porta, seus olhos aumentaram um pouco de tamanho com a surpresa, qualquer que fosse ser sua fala interrompida pela voz de Rose, um pouco esganiçada pelo nervosismo:

— Podemos conversar?


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Notas finais do capítulo

E entããããão?? Gostaram? Espero que sim aaaa

Também espero ansiosamente encontrar todos vocês nos reviews, têm sido ótimo poder conversar com vocês dessa forma!
Obrigada por ler e pelo apoio :3 ♥

Beijinhos ♥



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