Digimon Zero - The Lost Gate escrita por Anelim Marhizee


Capítulo 2
Episódio 01 – Portão Anônimo


Notas iniciais do capítulo

Cinco dias depois, ressurjo das minhas próprias cinzas (haha,brincadeirinha). Vou me esforçar para atualizar toda semana, sério TwT
Obs.: esse capítulo (vou chamar os capítulos dessa história de episódios, como se estivesse narrando os acontecimentos de um anime serializado) foi dividido em várias partes e cada uma delas têm um nome respectivo ao(s) personagem(ns) que protagoniza(m) nelas. As datas que aparecem no topo de cada uma das narrações representam a época em que escrevi as partes desse episódio, não a cronologia real da fanfic, que se inicia em 1992, não em 2020. (Qualquer dúvida é só dar um toque)
Boa leituras, brigadeiros do meu coração ^3^



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Uma Coca e muitas Lágrimas

 

Era 1º de janeiro de 92, um dia comum como outro qualquer da vida de Haruka. Bem, pelo menos devia ser, mas a mãe dele se certificou de que não fosse assim, inventando naquela manhã de ir visitar os pais dela. Haruka não tinha nada contra sua avó, o problema era seu avô, Viktor, um milionário que não dava a mínima para a própria filha (o garoto sabia que o velho não gostava da mãe dele por ela ter se casado com um japonês, xenófobo como era). Haruka queria não ligar para isso, como suas irmãs conseguiam, mas ele não aguentava toda vez ser ignorado pelo avô (Viktor fazia questão de tratá-lo com indiferença na frente da avó e da mãe do garoto). Toda vez que Viktor olhava feio ou largava Haruka falando sozinho, o garoto sufocava de raiva e tristeza.

Não aguento mais… Pensava Haruka, girando um canudo em seu copo de Coca Cola. Seus olhos acompanhavam o movimento giratório das pedrinhas de gelo no líquido preto cheio de gás, enquanto seus pensamentos navegavam por sua consciência conturbada com a ideia de viajar para a Rússia. O voo seria às 10h da manhã, dali a uma hora, o que dava tempo o bastante para o menino elaborar uma medida de escape. Eu não vou a lugar nenhum. Não quero ver aquele velho mesquinho nem pintado de ouro.

A mãe e as irmãs de Haruka haviam deixado ele numa lanchonete com todas as bagagens e disseram que voltavam já, já. Na certa, foram comprar lembrancinhas. Ele comprara um globo de neve e um ursinho panda de pelúcia para a avó, para o caso de ficar no aeroporto para o voo — gostava muito da vovó Anastasya. Se pudesse, ficaria o tempo todo de sua estadia em Moscow falando com ela, mas não podia. Em momentos assim, detestava ter tantas irmãs e detestava ainda mais ser o caçula e o único garoto da família (esses dois detalhes faziam Haruka passar por uns maus bocados, nunca sendo levado a sério e sendo tratando como uma criancinha. Só Vanya, a mãe dele, e Suya, a mais nova das irmãs dele, que não o subestimavam assim).

— Haruka, Haruka! — Ele escutou por cima da música em seu walkman, e alguém o sacudiu pelo ombro com urgência. O menino tirou os fones dos ouvidos e olhou para o lado, dando de cara com Suya (se sentiu melhor só de vê-la). — Cadê todo mundo? — Ela tinha um saco plástico em mãos, dava para ver a ponta de um caderno saindo por ele e uma cartolina enrolada. Outra volta na papelaria, Suya-chan? A irmã tinha uma obsessão por cartolinas, folhas de caderno e canetinhas brilhantes e passa com frequência em papelarias. Fazia de tudo com o que compra, de origamis a agendas artesanais (nas horas vagas, Haruka desenhava com ela).

— Foram comprar lembrancinhas — Haruka se limitou a responder, suavizando seu rosto para a irmã não perceber o quanto ele estava emburrado.

— O que foi? Tá tudo bem com você? — Mas não adiantou muito. Suya sempre foi boa em desvendar coisas através das expressões das pessoas, quase como se lesse mentes.

Ela e Haruka possuem os mesmos rostos de bochechas redondas, olhos repuxados grandes e lábios carnudos (ele não gostava de ter lábios tão grossos. Isso atraia o tipo de atenção das meninas que o deixava encabulado), a grande diferença estava nos cabelos — os dela são mechas negras tão lisas que rejeitam todo tipo de prendedor e os dele estavam tingidos de um louro quase dourado e estavam cortados no estilo tigelinha (no momento, arrepiados com quilos de gel). Qualquer um que olhasse, diria que eram irmãos (às vezes, chegavam a achar que eles eram gêmeos). Quem me dera ser gêmeo dela. Haruka gostava de imaginar como seria, os dois completando as frases um do outro e coisas do tipo.

De todas as meninas, Suya era com quem se dava melhor, que não o achava frágil por ele ser meigo nem o assediava por ser bonito. Ela usava uma camiseta azul, macacão jeans e tênis de estampa jeans. Tinha os cabelos soltos, tirando por dois coques no topo da cabeça (lembravam orelhas de gato. Isso fez Haruka cogitar em deixar o cabelo crescer para tentar aquele penteado. Descartou a ideia logo em seguida. Ele não ficaria bem).

— Tô, tô bem, sim.

— Não precisa mentir para mim, Haru-chan. Eu sei que está assim por causa do nosso avô. Não quer ver ele, eu entendo. Também não sinto vontade nenhuma de ficar cara a cara com aquele velho ranzinza.

— Você me conhece muito bem, não é mesmo? — Ele não estava nem um pouco surpreso por ela ter adivinhado aquilo. Além de suas habilidades quase telepáticas, ela o conhecia bem.

— Fica frio, irmãozinho. — Ela deu um soco de leve no ombro dele. — Vai ser só quatro dias. O que são quatro dias versus trezentos e sessenta e um? A gente consegue. Bebe logo a sua Coca, porque daqui a pouco mamãe, Kiyoko e as outras estão de volta e teremos que ir.

— É… — Espero que elas se lembrem de trazer alguma coisa para mim. Por mais que não gostasse de admitir, Haruka gostava de ser bajulado. Matou sua Coca com apenas mais quatro goladas e chupou as poucas gotas que tinham se acumulado no canudo. — Acabei — Pôs o copo na bancada da lanchonete enquanto mastigava as pedrinhas de gelo que tinham sobrevivido ao gás da Coca. Geralmente, bebia três copos daquele, mas não dessa vez. Preciso ficar sozinho um pouco.

— Caramba, que veloz! — surpreendeu-se Suya. Haruka sorriu para ela, fingindo estar bem. O consolo dela ajudara um bocado, mas ele ainda sentia como se um monstrinho cruel brincasse com seu coração, tentando abrir um buraco em seu peito a cada vez que pensava no avô (coisa que acontecia a quase todo momento).

— Banheiro. Já volto — avisou à irmã, saindo da lanchonete.

— Cuidado para não se perder, tolinho — brincou Suya antes dele se afastar.

— Não vou me perder, sua bobona. — Haruka teve que respirar fundo para não desmoronar na frente de sua onee-san. Quem me dera ser despreocupada que nem você, Suya-chan. Colocou de novo os fones nos ouvidos e escolheu uma música em seu walkman. Ele cantarolou o ritmo inicial de Smells Like Teen Spirit, de Nirvana, a melhor música lançada das mais tocadas no rádio atualmente.

De fato, foi ao banheiro — àquela altura do campeonato, já desistira de fugir —, ao banheiro mais longe possível da lanchonete (não queria dar de cara com Suya ou qualquer uma de suas outras irmãs o esperando do lado de fora). Trancou-se numa cabine e parou de se controlar, deixando as lágrimas saírem. Chorar foi libertador (sempre o ajudava a lidar melhor com a dor).

Tinha o problema com o avô, e isso incomodava bastante, porém Haruka sofria muito mais com a ausência do pai. Ele morrera como um herói da nação, servindo na polícia de Tóquio, mas de que adiantou se esforçar tanto? Se tivesse me escutado daquela vez, ainda estaria aqui com a gente. Para mim. Haruka sempre se culpava por não ter impedido o pai de ir à delegacia no último dia que pôde conversar com ele. Era uma manhã chuvosa de quinta-feira, final de 1986. O céu desabava, a tempestade era tão intensa que quase curvava os troncos das árvores. Mesmo com o tempo terrível, seu pai fora trabalhar.

Na tarde daquele mesmo dia, sua mãe foi convocada a ir ao hospital onde seu marido estava internado. Haruka queria ir junto, mas a mãe não deixou, e ele teve que ficar em casa com Suya, de oito anos, Yui e Tomoyo — outras das irmãs de Haruka, a primeira de nove e a segunda de onze. Antes que sua mãe voltasse para casa, eles viram no telejornal o que tinha acontecido com seu pai: houve uma intensa perseguição de carros, e seu pai estava na única viatura atrás dos bandidos — eles tinham acabado de assaltar uma joalheria. Um pouco antes dos ladrões serem pegos, o pai de Haruka levou três tiros, um pegou em um braço (nada fatal), outro foi de raspão e um pegou muito próximo a uma artéria importante na axila direita. Não deu para saber muito mais, apenas que a situação dele era grave.

Algumas horas depois, veio à confirmação por sua mãe. Seu pai passara por uma cirurgia, contudo não resistira. Ouvir que ele não estava mais entre os vivos quase fez Haruka enlouquecer. Sem saber, ele quase o salvara. Se eu não tivesse deixado ele sair! Ah, oyaji, por que o senhor me deixou? Preciso tanto de você agora. Já fazia mais de cinco anos que o incidente acontecera, mas o tempo não deixava nada melhor — só aumentava a tristeza e a saudade.

— Por que teve que ir tão cedo? Quando estava aqui, era mais fácil para lidar com aquele velho rabugento. Tão mais fácil! — Haruka choramingou, abraçando seu corpo trêmulo. Sentia frio, apesar de estar usando a jaqueta jeans mais grossa que tinha. Haruka sabia que não adiantava ficar remoendo o passado, que isso não traria seu pai de volta (aquele fardo era grande para um menino tão jovem carregar). Segurou com uma mão frouxa os óculos de aviador que trazia no pescoço e os passou por cima da cabeça, para em seguida os encarar (um dos últimos presente que seu pai o dera, numa vez que Haruka encheu a paciência dele dizendo que viraria piloto de avião quando crescesse. O garoto em sabia ainda queria tentar isso). Que saudade, papai…

— Tenho que vol- voltar — falou num fio de voz, levantando da tampa do vaso fechada, enfim conseguira parar de chorar. Não tentou se livrar das lágrimas que marcavam suas bochechas e olhos, lavaria o rosto na pia, e dane-se se alguém visse. O que importa é que mamãe, Suya, Yui, Tomoyo, Kiyoko, Natalya e Ivana não vejam. Sua mãe e Suya provavelmente o consolariam, já as outras irmãs na certa pegariam no seu pé, chamando-o de fofinho ou coisa parecida (não que Haruka não gostasse de ser chamado de fofinho, mas não curtia ser taxado de frágil e mimado, coisas de que Natalya adorava chamá-lo).

Por mais que eu queira, não vou fugir. Vou encarar o velho Viktor e dar um abraço na vovó Anastasya. “A única forma de lidar com um problema é o enfrentando”, essa é uma das regras básicas para encarar os desafios feitos pela vida. Vou fazer isso de cabeça erguida. Pensou Haruka todo confiante, abrindo a porta da cabine e levando o maior susto. O que ele viu foi bem diferente do cenário do banheiro masculino do Shin Tokyo Kokusai Kuko em que se encontrava.

Um espaço de um azul muito escuro que ondulava feito água e possuía manchas coloridas feito petróleo se erguia diante dele. O espaço era preenchido por anéis de fitas compostas por zeros e uns de pixels que rodavam sem parar, se encaixando e soltando uns dos outros de forma incontrolável, formando combinações infinitas (000, 0001, 1000, 10101010 e assim por diante). O que é isso? Haruka só conseguiu pensar tamanho fora o susto que levara.

Curioso como qualquer criança da sua idade, ele estendeu a mão. Uma vez que seus dedos tocaram o espaço cheio de números digitais, uma força invisível o enlaçou pela cintura, içando seu corpo magro do chão — o garoto nem teve tempo de gritar.

A última visão que Haruka teve antes de perder os sentidos foi de ser cercado por aquela galáxia de códigos binários tão brilhantes quanto estrelas.

#         #         #

“Avisei que não seria uma boa ideia!”

 

— Ah, que droga, pai! Por que temos que ir pro Japão? Já combinei de ir com minha galera pro cinema amanhã. Vai ficar feio se eu não marcar presença — reclamava Joseph. Não importava se seu pai era um arquiteto de renome e se ele fora convocado por uma empresa japonesa por seu trabalho impressionante, Joseph tinha sua vida para viver e não pretendia passar as férias inteiras fora do Brasil. Como passaria todo janeiro sem a companhia dos amigos? Vou ficar doido desse jeito!

— Filho, é um projeto muito importante, e seu pai recebeu o privilégio de participar. Não podemos deixá-lo sozinho por um mês, querido — explicava a mãe, mas o garoto não seria levado na conversa tão facilmente. — Vai ser divertido, eu garanto.

— Você não pode garantir nada. — Em horas assim, Joseph odiava por ela não trabalhar mais de cabelereira. Depois que o tivera, ela virara dona de casa. Mamãe, por favor, entenda meu lado, eu só tenho doze anos! Não posso ficar sem minha turma da bagunça!

— Respeite sua mãe, rapaz! Diga a seus amigos que não poderá ir. O voo sai às 22h, temos que arrumar as malas — disse seu pai, incontestável. Com esse aí nem adianta conversar. Raramente, o pai fazia o que Joseph pedia, e esse não era um dos casos que essa tática funcionaria.

— Não quero. Não quero ir e não vou! — Cruzou os braços, deitando no sofá. Daqui ninguém me tira!

— Joseph…

— Deixa, Martha. Querendo ou não, ele vai ter que ir. Vamos arrumar as coisas dele. — Nem aí para as necessidades do filho, Roberto levantou da poltrona e saiu andando. — Vem me ajudar, por favor. — Pior que vê-lo ir, foi ver sua mãe ir na onda dele.

— Não importa o que façam, eu não vou. — Seus pais podiam fazer a força que quisessem, ele não ia a lugar nenhum!

A birra de Joseph não durou nem mais dois minutos, e nos próximos oito minutos, ele estava dentro de um táxi, a caminho do Aeroporto Tom Jobim. A mãe, falante como de praxe, enchia o motorista com assuntos do cotidiano, enquanto o pai lia um livro sentado ao lado do filho. Ele quer ter certeza de que eu não vou me jogar do carro ou tentar escapar quando o próximo sinal fechar. Se tinha uma coisa que irritava Joseph era o fato de seu pai ser tão astuto. Até o momento, ele rememorava a conversa que tivera com Paulinha, sua melhor amiga, há poucos minutos.

— Não vou poder ir no cinema. Vou ter que viajar pro Japão por causa do trabalho do meu pai, cê acredita? Eu sei, é a maior roubada. Valeu pela força, Paulinha, você é dez. Tenho que ir, te ligo depois. Tchau! — desligou logo, não dando espaço para a amiga continuar a falar (se desse trela, ela ficaria falando até o dia seguinte). Devolveu o celular do pai, um verdadeiro tijolo eletrônico cheio de botões, e ficou no seu canto, observando a paisagem que corria lá fora como um rio de construções urbanas com alguns pontos de vegetação. Vai ser chato pra cacete… Ele já imaginava. Fora que não era chegado em animes e coisas do tipo, se sentiria um inepto no Japão (ele não sabia nem inglês, quem dirá japonês! Se tinha uma coisa que Joseph não conseguia era aprender rápido outros idiomas. Já custara enfiar espanhol e francês na cachola). Tô lascado.

Bem, pelo menos seria só um mês. Só um mês. O que poderia dar errado?

Levou um tempinho para chegar a seu destino, já que eles moravam em Del Castilho — o taxímetro não teve piedade, rodando sem parar até o carro estacionar em frente ao aeroporto. Ainda falei pra gente pegar busão! Joseph sentia falta de quando era pequeno e seu pai ganhava menos, a vida não era tão confortável, mas eles pegavam muito mais ônibus e economizavam dinheiro. Mas quem era Joseph para opinar? Quando eu crescer, não vou dar uma de otário que nem meu pai. Essa era uma promessa que cumpriria com certeza.

Joseph aproveitou que os pais foram fazer o check-in e correu até os telefones públicos do aeroporto, que ficavam do outro lado do saguão — a pressa era tanta que quase derrubou a mochila das costas. Discou o telefone de Jurema, sua outra amiga, e esperou impacientemente que ela o atendesse. Esqueci de avisar que não vai dar pra eu ir na festa de aniversário dela na sexta!

— Alô?

— Não desliga, Jurema! Sou eu, o Joseph!

— Zezinho? Tá ligando da onde?

— Não me chama de Zezinho, é ridículo. — Ele inflou as bochechas, irritado.

— Joseph é José do inglês, então Zezinho serve perfeitamente. — Ela nunca perde a chance de tirar onda com a minha cara.

— Eu não era pra ter ligado. Tcha-

— Pera aí, eu tô só brincando contigo, amigo. — Ela acreditou mesmo que eu ia desligar? Por mais chateado que ficasse com alguém, Joseph nunca era o primeiro a desistir de uma amizade. As pessoas que me abandonam. — O que houve?

— Tô no aeroporto com meus pais. Vou ter que ir pra Tóquio e só volto em fevereiro.

— Tóquio, no Japão?!

— Não, Tóquio da Coreia. É claro que é no Japão, cabeça de vento! Enfim, daqui a pouco eu parto. Não vou poder ir no seu aniversário, foi mal.

— Tudo bem, Josy. Quando você voltar, a gente se vê e sai com a galera, ok?

— Beleza. Ei, não me chame de Josy! É nome de menina!

— Ah, é só um apelido carinhoso, não seja tão chato. Ei, Jo- Jo- se- se- — A voz de Jurema começou a falhar, e ele ouviu um chiado irritante, parecido com o crack-crack de milhares de cascas de ovos sendo pisadas por uma multidão com o som de estática de um rádio mal sintonizado ao fundo.

— Alô? Ei, Ju, o que foi? O que houve com a sua voz? — Então o chiado foi substituído por um monte de tup, tup, tup. — Merda, a ligação caiu! — Infeliz, Joseph pôs o telefone de volta no gancho. Ao se virar, deu de cara com aquilo.

A sua frente havia um portão de porta dupla que parecia feita de água brilhando com a luz do sol. Nunca vi água se comportar dessa forma. Joseph pensou fascinado (ele amava química e física, e aquilo ia contra tudo que estudara sozinho nos livros do escritório de seu pai), não conseguindo se mover tamanha era sua admiração pelo elemento estranho diante de seus olhos.

Pontos e arcos luminosos brilharam pelo portão, e os traços reluzentes se tornaram símbolos das cores do arco-íris, lindos e únicos (Joseph podia ter complexo de macho alfa, mas era chegado em arco-íris, docinhos e calendários com imagens fofinhas). Ele não olhou em volta, nem aí para o que as outras pessoas estariam pensando com o surgimento mágico de um portão tão sobrenatural ou da reação dele. O menino tocou numa das portas com a palma aberta (não é que ela era de água mesmo?!).

O portão estremeceu, e suas portas se mexeram, abrindo para dentro. Joseph perdeu o pouco equilíbrio que tinha e caiu, por pouco não perdendo sua mochila, a única bagagem que levava consigo. As portas se fecharam a suas costas, trancando-o naquele universo de estrelas travestidas de códigos binários. O que tá acontecendo?! Só conseguiu pensar, sua voz não saía, não importando o quanto gritasse. Ainda avisei que não seria uma boa ideia! Ele olhou ao redor abismado, nunca vira algo tão espetacular em toda a sua vidinha miserável.

Não passou nem dez segundos antes de cair num sono profundo.

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Lua de Açúcar

 

Lua amava sua vida: tinha ótimos amigos, pais maravilhosos e suas coleções — ela colecionava fotografias de pássaros e paisagem, miniaturas de porcelana e madeira e coisas tão delicadas quanto essas. Podia não ser rica, mas não precisava mais do que suas coleções e de Inu, seu cachorrinho branco de pelúcia, para ser feliz (por sorte, Albert não o descobrira ainda, porque ela sempre mantinha a porta do seu quarto fechado a cada vez que tinha que sair dele, menos em dia de limpeza).

A manhã de Lua começou superbem por causa daquela ligação. Eram seus tios de Moçambique — a terra natal da mãe da garota —, avisando que fariam uma visita a ela naquele começo de ano. Eles eram muito legais, e ela gostava demais deles. Não via a hora de abraçá-los e ouvir tudo que eles tinham a dizer para ela. Eles chegariam dali a duas horas, às 10h. A menina não se aguentava de tanta emoção. Calma, coraçãozinho! Ela já tinha acabado de se arrumar e só esperava a mãe acabar de se aprontar para buscar os tios no aeroporto. A mãe e Albert.

A menina estava na cozinha, terminando de arrumar a lancheira de seu almoço (ela podia ser magrela, porém comia que nem um camelo. Passaria mal se não tivesse uma quentinha estratégica). Sua mãe fora pegar alguma coisa no quarto (talvez algum presente para tia Amanda) e disse que já voltava. Será que a titia e o titio vão me reconhecer? Eu mudei um pouco desde os sete. Já fazia quatro anos que não se viam. Seria uma maravilha esse reencontro, ela já podia sentir.

Foi nesse instante que Albert entrou no recinto. Lua só o notou quando ele pegou uma das salsinhas cortadas em forma de polvo da lancheira dela.

— Ei, me devolve! — Ele se afastou depressa dela, mastigando rápido e já engolindo.

— Já engoli. A não ser que queira que eu vomite. — Os olhos dele tinham um brilho cruel. Ele tem olhos verde-água, tem a pele clara e é alto, alto o suficiente para dar petelecos na testa dela (bem diferente de Lua, que é morena e baixa e tem olhos castanho-escuros quase pretos). Eles não tinham nada a ver, só os cachos dos cabelos iguais, os dele louros e os dela castanhos escuros beirando vermelho.

— Vai com a gente, Albert? — Lua escolheu mudar de assunto. Ela sabia que ele iria junto, só queria provocá-lo um pouco.

— Me chame de onii-san. Ainda sou seu irmão mais velho.

— Sim, onii-san. — A menina forçou um sorriso, sentindo que engolia um pedaço de chocolate muito, mais muito amargo. Se ela pudesse, ficaria bem longe de Albert. Ele conseguia ser tão desagradável que ela preferia ser filha única. Ele era meio irmão dela por parte de mãe, seis anos mais velho que ela (o pai dele era um carteiro estadunidense, e o pai dela um veterinário japonês). Depois do pai de Albert se divorciar da mãe de Lua, ela viajou para o Japão. Foi no inverno de 1979 que Hiroshi e Carla se conheceram; e logo viraram melhores amigos, depois namorados e então estavam casados, e nasceu Lua, dois anos depois deles se unirem em matrimônio. Albert não gostou nada da nova vida no Japão e sempre dizia que sentia falta de seu “amado “USA”. Se isso fosse tudo, Lua conviveria com o irmão numa boa. Porém, Albert era um parasita! Sempre fingia ser um bom filho para o senhor Hiroshi e conseguia arrancar dinheiro dele (o pai de Lua era extorquido por Albert e nem se dava conta! Isso a deixava com raiva, e se tinha uma coisa que era difícil, era deixar essa menina com raiva).

— Você não se importaria de me dar esse potinho, não é? — ele perguntou, já pegando o grande pote no qual Lua pusera a maior parte de seu almoço. Não, minhas batatinhas com carne! Ela estufou as bochechas, bolada, vendo o irmão pescar um garfo da cesta de talheres embaixo do armário das louças. Ele virou de frente para Lua e, sem piedade alguma, destampou o pote e começou a comer, olhando com deboche para ela.

Ele vivia atormentando a irmã caçula, furtando parte da comida que ela preparava para ela, fazendo rasgos em algumas roupas dela, quebrando os brinquedos de uma forma que só soltasse as peças ou saísse a espuma quando ela tocasse (ele aproveitava os sábados para estragar os brinquedos e pelúcias, o dia que geralmente era feita a limpeza na casa). Albert era traiçoeiro, acima de tudo malvado. Lua ficava injuriada com as traquinagens que ele vivia aprontando, mas não falava para os pais porque nunca conseguia arranjar evidências que provassem que o irmão a infernizava.

— Ei, isso é meu!

— Sai, pirralha. — Ele a empurrou, quase a jogando no chão. — E prepara uma quentinha para mim, senão arrebento outra Hello Kitty sua.

— Racista. Racista desalmado… — disse Lua, a cabeça baixa, a voz colorida por ira.

— Olha a língua, garota. Primeiro que não sou racista, não tenho nada contra minha mãe, que é uma mulher negra maravilhosa, e nada contra o senhor Hiroshi, um padrasto muito legal, por sinal. Meu problema é você, uma nanica irritante que ama docinhos de coco, corações, unicórnios e coisas doces do tipo. Você me enoja, uma irmã desprezível que não é digna nem do ar que respira. Meu problema é sua personalidade, não sua cor. Agora que estamos estendidos, prepara minha quentinha. Sem choradeira. Odeio quando você chora — Albert disse quase sem parar para respirar e foi embora, levando o “prato” principal do almoço de Lua consigo.

Naquele momento, pensamentos horríveis infestaram a mente de Lua — ela quis arrancar os olhos de Albert, quis prendê-lo de cabeça para baixo na sacada do quarto dele, quis amarrá-lo a uma das árvores que havia em frente à casa/clínica deles (sim, o pai de Lua tratava dos animais no próprio lar) e fazê-lo assistir seus pertences sendo reduzidos a um monte de cinzas numa pilha em chamas. O que eu estou fazendo? Eu não sou assim! Se fizesse coisas tão terríveis, estaria descendo para o mesmo nível de Albert, talvez me tornasse até pior que ele! Assustada com a própria face cruel recém-descoberta, ela foi preparar a quentinha de Albert e arrumar outro pote para pôr mais batata e carne para ela mesma. Ah, como eu queria que isso acabasse. Seria bom passar férias em algum lugar bonito e exótico, cercada por seus amigos e bem longe de Albert. Papi e mama podiam vir juntos. Ia ser tão emocionante! Só de pensar daquele jeito, ela conseguiu voltar a sorrir, e quando sua mãe voltou à cozinha, não encontrou a filha com os olhos cheios de lágrimas.

Seu pai fechou a clínica, e juntos, no carro da família — um Ford 84 renovado —, rumaram para o Aeroporto Internacional de Tóquio.

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Chegaram lá alguns minutos antes do avião em que estavam tia Amanda e tio Akilah pousar — quase que não chegam antes deles, graças ao engarrafamento que pegaram em Higashi Kanagawa. Ficaram esperando no saguão principal do aeroporto, sentados num dos bancos perto da saída de desembarque. Lua foi com Hiroshi comprar sundaes na pequena loja de sorvete que tinha numa parte bem movimentada do aeroporto. Eles não pararam de falar durante todo o percurso (os dois sempre conversavam muito quando estavam sozinhos. Além de terem gostos e hobbies semelhantes, a doce menina adorava biologia e sonhava em fazer algo na área da medicina quando crescesse).

O pai dela tinha acabado de pagar os sorvetes quando Lua sentiu um vento as suas costas. Os olhos dela arregalaram, e ela se virou para trás, tomando cuidado para não derrubar os sundaes que segurava. Aquela ventania não era só um vento passageiro, era mais forte do que os ventos que Lua já sentira na vida (quase um furacão) e ele não era inexplicável — ele vinha de dentro de um portão de porta dupla que devia medir quase dez metros. As portas entreabertas pareciam feitas de água sem gravidade, de pé como portas de concreto, e símbolos incompreensíveis nadavam e boiavam pelo portão aquoso. O que é tudo isso? O que tá acontecendo?!

As portas se abriram de uma só vez, e antes que Lua pudesse falar com seu pai novamente, as brisas fora do comum a enlaçaram feito braços invisíveis e a arrastaram para dentro do portão (os sundaes nas mãos dela acabaram no chão). As portas se fecharam. Depois de cinco segundos, Lua perdeu os sentidos.

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Uma Dupla Nada a Ver

 

Tila achava que sua manhã não podia piorar, até seu avô Aristóteles vir avisando que teria de fazer uma viagem de última hora para Seul. Ele iria lá para assinar um contrato com uma empresa coreana especializada em cosméticos, exatamente a praia do avô de Tila. Como ele era o responsável por Tila e o irmão dela, Salen, os dois teriam de ir juntos com ele.

Muito melhor ficar no conforto do meu quarto com minha guitarra e minhas fita-cassetes do que me deslocar pro outro lado do mundo. Seul ficava meio longe de Florença, afinal. Mas Tila não tinha escolha. Por mais que quisesse permanecer na Itália, sabia que não adiantaria tentar argumentar com Aristóteles. Esse velho é um orgulhoso nato. Ele não vai abrir mão dessa viagem de jeito nenhum. De repente, as férias de Tila estavam tomando um rumo totalmente diferente do que a garota planejava (uma maldita falta de sorte! As férias são uma época muito relevante para pré-adolescentes feito ela).

Se não fosse por Salen, morreria de tédio antes de pisar em território coreano. Seria prazeroso ficar por horas a fio conversando com seu irmãozinho (ele era uma ótima companhia, do tipo de pessoa com quem se é difícil não ter assunto para conversar).

Dois toques na porta puderam ser ouvidos, então perguntaram:

— Tila, já acabou de arrumar suas malas? — Por falar em Salen…

— Quase acabando!

— Já terminei com minhas malas. Quer ajuda?

— Se puder, agradeço. — Ele entrou no quarto sem demora, indo até a irmã, solícito. Salen não tem nada a ver com ela (apenas os narizes pequenos se lembravam). Ele tem cabelos ruivos escuros cortados no estilo tigelinha, rosto pontilhado por sardas, olhos de um azul-ciano raríssimo e uma testa grande que vive coberta por uma franja.

— Oi — disse ele meio tímido, do jeito único dele.

— Oi… — Tila cumprimentou de volta, fechando sua bolsa de alça à tiracolo. Ainda faltava duas de suas três malas para serem arrumadas e não tinha o menor ânimo para isso. Não fez o menor esforço para esconder a raiva que tinha daquela viagem de última hora.

— Não se aborreça com o vovô, maninha. Ele não faz isso por maldade. — Salen pegou algumas blusas da irmã jogadas sobre a cama e passou a dobrá-las.

— Eu sei. Negócios são negócios, afinal. — Tila deu de ombros e afagou os cabelos lisinhos do caçula. — Relaxa, Salen. Eu tô legal. E aí, fez alguma conta matemática mirabolante?

— Não. Só concluí vinte cubos mágicos e aprendi três kanjis nos últimos quinze minutos.

— Só isso, sério? — brincou Tila, nada espantada. Já estava acostumada com os talentos sobre-humanos de Salen.

— Estou me sentindo lerdo. Já fui mais rápido que isso. Não sei se vou conseguir atender às expectativas do vovô. — Ele sentou na ponta da cama, Tila foi se sentar a seu lado (esse era um dos momentos de desabafo de Salen, e momentos assim não podiam ser ignorados, senão dentro de poucos minutos ele acabava em lágrimas. Devia ser dureza ser tão novo e ter tanta cobrança na escola por ser tão genial).

— Que papo é esse de expectativas, Salen? Vovô Tely não cobra nada de ninguém, só que a gente acompanhe ele até outros países, às vezes. E sempre nas férias, só aconteceu uma vez dele nos arrastar para a França durante as aulas.

— Foi no equinócio de março de 89, eu só tinha cinco anos.

— Saudade, minha vida era mais fácil.

— Você tem apenas doze anos, a média dos jovens dessa idade não recebem obrigações complicadas. No seu caso, basta estudar e não se esquecer de fazer o dever de casa.

— Engraçadinho… — disse a menina e deu língua para ele. — O que vamos fazer na Coreia?

— Tem tanta coisa lá. Depois que vovô assinar a papelada com a nova filial da Moonlight Ltda., vamos poder dar uma volta e conhecer várias cidades. Sempre quis visitar Jeju.

— Sua curiosidade não tem limites?

— Minha sede de aprender que é sem limites. Amo estar informado sobre as coisas. Ora, já está na hora — ele desconversou, fingindo consultar um relógio de pulso (não tinha nada em seus braços, fora um bracelete preto com o símbolo do Nirvana). Ele levantou, guardando as blusas dobradas na mala. — Vamos acabar logo aqui, antes que vovô venha correndo chamando por seus netos lesos.

— Leso? Quem ainda diz isso? — Ah, esse Salen e seu vocabulário de palavras pitorescas. Essa característica da personalidade do irmão era estranha ao passo que era um charme. Isso, somado à inteligência rara e à carinha delicada que nem porcelana, faz dele o nº1 na lista da maioria das meninas de sua idade. Quando crescesse, seria um gênio elegante nada sutil e muito gentil (coisa que preocupava muito Tila). Droga, só falta eu virar uma daquelas irmãs que morrem de ciúmes do próprio irmão. Só de pensar nisso já ficava zangada.

O trio não levou tempo nenhum para chegar ao Aeroporto di Firenze-Peretola, já que ficava pertinho da casa do vovô Aristóteles. Vai ser um saco. O lado bom seria que provaria comidas novas, no caso de Salen, fotografar já seria o bastante (o irmão sempre andava com uma câmera portátil em sua mochila, pronto para tirar fotos). Espero que ele não tire foto minha. Só se ele saísse na foto também.

Esperar foi uma chatice sem tamanho — paciência não era uma das virtudes de Tila —, mas foi suportável graças ao pequeno Salen (ele era muito baixinho, detalhe que o deixava mais fofo que qualquer outro garotinho de oito anos; pelo menos, para ela). Ficaram brincando de jogo da velha enquanto aguardavam a hora de embarcar no avião.

— Ganhei de novo — disse Salen, o tom brando, quase cândido.

— Ah, você tá de sacanagem com a minha cara! Como você faz isso?! Mesmo quando eu tento suas táticas, você vem e acaba comigo.

— Sinto muito, maninha, estou jogando limpo. Qualquer um de nós pode perder ou vencer.

— Ai, cansei. Vamos mudar de jogo. — Aquela seria a quinta vez. Sudoku, jogo da velha, baralho, game boy… O DNA de Salen parecia não ser equipado com a capacidade de errar que nem as pessoas comuns. Às vezes, Tila o invejava.

— O que quer agora? Tenho algumas opções aqui dentro. — Ele abriu um dos pequenos bolsos de sua mochila de viagem, guardando o bloco de notas e os lápis que usaram para o jogo da velha.

— Quantos jogos você tem na manga? Sua mochila não devia já estar sem espaço?

— Quando soube que íamos sair em viagem, tive que me preparar.

— Que tal comermos alguma coisa? Bateu uma fome de repente. — Tila até estava com fome, mas estava mesmo era farta de perder tantas vezes seguidas. Isso fere meu orgulho. Perdia às vezes para o irmão, mas nunca tantas vezes daquela forma! Talvez esteja na hora de atualizar minhas táticas de batalha… Às vezes, só às vezes, a garota queria saber se seria capaz de montar um plano para uma batalha na vida real. Vai sonhando, Tila…

— Está bem, maninha. — Os dois se puderam de pé e foram falar com o avô, que falava num dos telefones públicos do saguão de embarque.

— Vovô, a gente vai comprar lanches. Vai querer alguma coisa? — quis saber Tila.

— Aceito, sim, meu bem. O que vocês escolherem está bom para mim. — Tila deu de ombros e puxou Salen consigo. — Cuidado para não se perderem, crianças!

— Quantos anos ele acha que eu tenho? — Vou fazer treze logo, logo, não sou mais criança!

— Ele vê você como criança e vai continuar me vendo como uma quando eu tiver sua idade. Adultos que se importam com seus filhos e netos são sempre assim. — Salen pegou Tila de surpresa. Ele sempre tem uma resposta na ponta da língua. Que droga! — Olha lá, maninha, crepes — a voz dele era serena, mas os pulinhos que deu e os olhos gigantes com que mirava a lojinha de salgados e doces folheados mostravam o quanto ele queria comer aqueles crepes.

— Que crepe, menino. O Burger King é melhor.

No fim das contas, Salen conseguiu convencer a irmã, e compraram dois crepes para cada um, um salgado e outro doce, e garrafinhas de refrigerante — o mesmo para o avô. Logo eles estavam de volta à parte do saguão do aeroporto onde aguardavam pelo voo, Tila comia seu crepe de chocolate e morango e Salen dava pequeninas mordidas no seu de maçã e canela. Eles andavam de mãos dadas, uma mania que tinham desde que Salen tinha aprendido a fazer multiplicações de pouco (quando ele tinha só dois anos, uma verdadeira fera nos cálculos). Seu avô estava sentado no banco em que os irmãos estavam antes, falava agora no seu telefone celular que parecia pesar uma tonelada (Salen sonhava com o dia que os celulares virariam aparelhos leves, suaves ao toque e sem botões. Ele ainda tinha todo um caminho de tentativas e êxitos pela frente).

Tila e Salen foram até Aristóteles vagarosamente, saboreando seus crepes em silêncio, nenhum dos dois tinha pressa (eram 12h57, faltava mais de uma hora para o voo). Até que Salen quebrou o doce silêncio:

— Ando pensando numa ideia que tive, Tila.

— E o que é?

— O projeto de um celular do futuro. A tela dele funcionaria à base de toques e ele teria acesso à internet, permitindo que as pessoas falassem umas com as outras pelo mundo todo.

— Nossa, que sonho ousado, Salen.

— É sonho só por enquanto.

— Mas você precisaria de uma tecnologia muito avançada. Acho que é inviável fazer algo assim com o que temos hoje em dia.

— Vou dar um jeito de tornar isso real. Não vou desapontá-la, maninha.

— Confio em você, Salen. — Você consegue. Ela acreditava no irmão, sabia que ele era capaz de inventar coisas que mais ninguém imaginaria (que nem o aviãozinho de latão movido à manivela que ele inventou usando só sucata. O garoto levava jeito com mecânica e física). Não é à toa que ele já está prestes a entrar pra quinta série.

Distraídos com seu bate-papo sobre coisas de um suposto futuro distante — eles já tinham terminado seus crepes doces —, os irmãos nem se deram conta daquilo até estar em cima deles.

Um portão com mais de cinco metros de altitude surgiu à direita deles, as portas escancaradas com um vento sobrenatural vindo do lugar para onde elas conduziam. Aconteceu tudo muito rápido: as lufadas de vento contornaram a dupla de irmãos, até engolfá-los numa espécie de tornado, arrastando-os para dentro do portão — tudo que Tila pôde fazer foi abraçar seu irmãozinho (eles desmaiaram assim que cruzaram as portas). A passagem se fechou com um baque molhado proveniente das marolas d’água que cobriam as portas de rocha e cristal, e o portão tremulou, desaparecendo como uma miragem no deserto.

Tudo que sobrou dos irmãos Gewandsznajder foi a sacola plástica de refrigerante e o saco de papel com crepes embrulhados para viagem caídos no chão do aeroporto.


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Notas finais do capítulo

Sem nada a dizer, só que espero vê-los nos comentários (kkk, brincadeirinha. Só de você ler, já fico feliz e me dar força para seguir adiante)
Beijos, brigadeirinhos ^3^



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