Equilibrium escrita por Diane


Capítulo 6
Capítulo 5 - Verde limão




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Bem, eu sabia o que iria ver. Eu conhecia as vozes, mas mesmo assim tinha a esperança que fosse engano. 

Tinha um garoto rindo no meio do corredor enquanto segurava um carregador de celular surrupiado. Ele continuava igualzinho como me lembrava: bem mais alto que eu, com cabelo preto bagunçado e olhos azuis escuros. Bonito, mas insuportável e crush eterno de Layla — É, pelo menos não posso falar que ela tem mau gosto estético. 

Não preciso dizer que ele parou de rir imediatamente e a pele dele ficou mais pálida ainda. Uma sobrancelha dele subiu, ele encarou o interior do quarto e falou algo em linguagem labial que parecia suspeitosamente com "Vanessa, fudeu". 

Dois segundos depois, ele parecia recomposto e nem um pouquinho chocado. Afinal, é todo dia que se descobre que sua arqui-inimiga de infância é uma rainha reencarnada. 

— Boa noite, senhoritas — ele se curvou em reverência para minha mãe e se mandou do corredor, descendo as escadas o mais rápido possível.

— Audacioso — Idia murmurou. 

Infelizmente, eu não tinha nada na minha mão. Aquele ângulo era perfeito para acertar algo na cabeça dele. 

— O que que f… — Vanessa saiu do quarto para ver e deu de cara comigo. 

Abri meu sorriso mais angelical.

— Oieee. 

Se ela fosse cristã, certamente teria feito o sinal da cruz.

— Hum, alguém pode me trazer a verdadeira Diana, por favor — a criatura teve o disparate de olhar ao redor e perguntar. 

Minha mãe bufou. Desconfio que ela não tenha paciência para jovens.

— Só temos essa para hoje. 

Acho que ela ainda não estava acreditando ainda. Não a culpo, eu também nunca imaginaria que os dois fossem descendentes de deuses. Só de pensar que as criaturas sabiam daquilo o tempo todo e omitiram na minha cara, dava vontade de socar os dois.

— Bom, vou deixar você aqui mesmo. Tchau — minha mãe falou.

E em um passe de mágica, ela sumiu. Vantagens de ser uma deusa. Fiquei com a maior cara de trouxa olhando o espaço vazio onde ela estava antes. Enfim, dei os ombros e tentei atravessar a porta do meu quarto.

 

É, ênfase no tentei. Vanessa estava barrando a porta. Olhei para cima, porque, infelizmente, ela também era mais alta que eu. 

Bom, acabei de notar que estou esquecendo da descrição física. É, ocorre, parece tão natural narrar os fatos que esqueço que vocês nunca viram as pessoas referidas. 

E lá vamos nós: Vanessa tem olhos verdes e é ruiva, provavelmente natural, já que eu me lembro dela com essa cor de cabelo desde os 12 anos. Ela não tem sardas, ou se tem, as cobre com maquiagem. 

Suficiente, né? Agora voltando aos fatos, aquela criatura estava barrando minha porta.

— Me deixe entrar — Revirei os olhos. Eu era grandinha o suficiente para não ter que arrastar ela da minha frente. 

— Eu não pedi para dividir o quarto com você.

 

— Provável que tenha pedido para dividir o quarto com a Diana. Tcharaaaam.

Foi nesse momento que ela saiu da porta. Inocentemente, pensei que a criatura tinha tido um lapso de aceitação e entrei.

 

— Presidente, pega! 

 

Fechei os olhos. Impossível.

E no entanto, lá estava Presidente Au au, inteiro, intacto, com mais de 18 anos, um chihuahua ainda rosnante. Alguém sabe o tempo útil de vida dessas coisinhas malignas?

Spoiler: Pepito ainda vive apesar de todas as adversidades que você verá ao longo da série de livros. Teve humano, marem, vrykolakas e até deuses tomando no rabo, mas o chihuahua ficou inteirasso. C'est la vie. 

Aquela coisinha começou a rondar meus tornozelos enquanto tremia. Parecia um híbrido entre demônio, rato e uma máquina de lavar de qualidade duvidosa.

Idia se colocou na minha frente e rosnou. Não foi aquele rosnado-silvo padrão de gatos, era algo mais para um rugido de leão. Eu levei o maior susto, Vanessa deu um pulinho para trás e o cachorro correu para debaixo da cama — não antes de soltar um latido de desafio. 

Rugidos a parte, era tranquilizante saber que havia um antídoto para o monstrinho. 

Vanessa podia me odiar pra cacete, mas ela amava aquela coisinha esquisita — Ok, admito que até sinto uma simpatia por aquele ratinho — e eu a gata éramos um risco para o cachorro. Então, ela o retirou de debaixo da cama e se mandou do quarto.

Aparentemente, o quarto era só meu, pelo menos por uma noite. 

O lugar era espaçoso, tinha uma janela grande que dava para a paisagem de fora. Isso era um tanto perturbador, aquele cenário de céu escurecendo e coberto de brumas. Discretamente, — não preciso de bullying de certa felina — fechei as cortinas.

Tirando a janela com vista para cenário estranho, o quarto era legal. Grande, com as paredes cor de creme e tinha duas camas. Uma estava bagunçada e tinha lençóis roxos e a outra estava impecável e com lençóis novos. Como não havia um segundo guarda-roupa, supus que a cama branca era a minha e tinha sido uma adição de última hora. 

Admito que fiquei fuçando o quarto por um tempo e isso não foi de todo inútil. Vanessa tinha algumas barras de chocolate guardadas no frigobar. Eram ótimas e tinham rótulo em alemão. Provavelmente chocalete suíço. 

Em resumo, passei a noite falando maldades com uma gata falante enquanto me entupia de chocolate. Eu fui dormir feliz, estava em uma dimensão mágica, era uma espécie de feiticeira e ainda era reverenciada. 

 

Clichê, mas a sensação era gostosa como trufas de menta. 

 

No dia seguinte, o quarto estava verde.

É, exatamente o que você leu. Parede, piso, cortina, lençóis, cobertas e até o interruptor estavam em diferentes tons de verde limão. Juro que até o rejunte do piso parecia tom musgo. 

Parecia um quarto dos pesadelos. Eu sou traumatizada com a cor verde porque quando era mais nova, Vanessa e Alex colocaram uma substância verde na minha pasta de dente e aquilo fez meus dentes ficarem neon por um tempo. Ok, isso certamente não parece impactante para você, mas aquilo era quase impossível de ser retirado. No início, era ridiculamente artificial, mas depois de umas escovadas, os espaços entre meus dentes ficaram amarelo esverdeado em contraste com o resto branco.

Não havia fio dental que resolvesse, minha dentista quase teve que arrancar o esmalte das minhas presinhas. Até hoje, com meu alto conhecimento de Química, não sei ao certo qual foi a maldita substância que aqueles animais usaram. 

Respirei fundo. Não iria ser um quarto tingido — Aliás, como ela causou essa mudança de cor? — que iria me expulsar de lá. O meu espírito interior da pirraça estava invocado.

— Ela deve ter pedido ajuda para algum marem — Idia disse — Não está tão ruim, mas se eu fosse você, ficava esperta. 

Ninguém nega os conselhos de uma gata falantee aprontar alguma era bem a cara de Vanessa. Fui particularmente cuidadosa, testei a pasta de dente no mármore da pia, esperei um minuto antes de entrar no chuveiro — desperdício de água, sei, mas como poderia garantir que não iria começa a chover aranhas? 

Admito que comecei a ter reflexões malignas quando achei água oxigenada no armário do banheiro. Mas meu lado sensato dizia: ignore ela, tente ser madura uma vez na vida. 

Meu lado sensato era chato, normalmente, quem desempenhava o papel de consciência — vulgo, barreira para minhas maldades — era Layla, mas como ela não estava lá, o lado sensato resolveu assumir. Depois disso, tive uma longa divagação de como contar para Layla que eu era a filha de uma deusa. 

E, particularmente, contar sem parecer uma alucinada. No entanto, eu tinha dúvidas se a sociedade de descendente de deuses nos deixavam abrir a boca para mortais. 

Quando já estava arrumada de uma forma ok — o máximo que dava, afinal, mamãe nem tinha mandado minhas roupas pelo sedex divino, então, eu não tinha muita opção além da roupa do dia anterior que estava um tanto suja de areia e terra. É, eu parecia uma austera feiticeira poderosa reencarnada — dei de cara com Layla na porta. 

Existe um ditado popular: todo mundo sabe que um corno é corno, menos o corno. Nesse caso, eu era a maldita corna. Era provável que até o sorveteiro soubesse sobre minha ascendência divina, menos eu. 

Me senti patética. Eu conseguia entender porque Vanessa e Alec ocultaram isso de mim o tempo todo, eles não gostavam de mim, então, me submeter a uma existência de mortal enquanto eu podia ter poderes devia parecer divertido para eles. Algum tipo de pagamento karmico, sei lá. Minha mãe tinha seus "motivos" dúbios, mas, era minha mãe. O ser humano tem uma tendência irracional a perdoar a mãe.

— Até tu, Layla? — suspirei. 

— Desculpe — ela sussurou e entrou no quarto — Como foi passar mais uma noite com a Vanessa?

Então, não foi a primeira vez que divido um quarto com a criatura e seu monstro. Uma vez, fomos selecionadas para uma olimpíada internacional de matemática e a equipe resolveu economizar verba, ou seja, dois alunos em cada quarto. Como éramos as únicas meninas, ficamos juntas. Foi uma semana adorável. No primeiro dia, ela resolveu que não iria dar descargas e eu resolvi me vingar deixando minhas calcinhas penduradas no chuveiro. Isso gerou uma onda de pirraças. Misteriosamente, todas minhas calcinhas — aquelas calcinhas de florzinhas e 0% sexy, bem vovó mesmo — voaram janela abaixo. Outro mistério igual foi como o iPhone novinho de Vanessa ficou entupido no encamento do hotel. 

Enfim, Layla era esperta. Tentou me desviar para pensamentos divertidos para me fazer esquecer que eu estava irritada com ela. 

— Você sabe que isso foi como roubar minha carta de Hogwarts e tacar fogo nela, certo?

Ela ergueu as mãos, exasperada. 

— Não seja dramática — Layla estava vestida totalmente de preto e com um sobretudo branco, com o cabelo e olhos pretos asiáticos e a pele clara, ela parecia um tabuleiro de xadrez — Eu simplesmente não podia contar. Sua mãe me proibiu, apesar de eu não saber que ela era Nix, meus pais diziam que ela era extremamente poderosa e não era bom discordar. Você não sabe muita coisa sobre descentes de deuses, eles são excêntricos. Nem as Parcas sabem o que ela podia ter feito se eu abrisse a boca.

Vou ser sincera, eu não caia muito nessa história. Mamãe nunca foi um anjo, mas também não era o tipo de ser cruel que arranca a língua de uma criatura boca aberta. Aquilo era bem mais de Layla do que da minha mãe, minha amiga era filha de uma chinesa e um russo altamente conservador e ortodoxo — e como descentes de deuses, eles deviam ser bem mais velhos que aparentavam — ela praticamente foi criada para ser obediente. Layla tinha sincero pavor de desrespeitar autoridades. 

Ela continuou falando, bem seria:

— Meus pais resolveram ficar um tempo entre mortais por um motivo. Descendentes de deuses tendem a serem caóticos e prolongam brigas por séculos. Nós não estávamos afim de desrespeitar os limites de uma marem que emanava altos níveis de energia.

Revirei os olhos. 

— Não há nada que possa ser feito agora — ela continuou, com a maior calma do mundo — Vamos comer café da manhã?

Como eu não sabia o caminho e Idia estava cochilando na cama angelicalmente, resolvi seguir ela até o refeitório. Bom, se eu tivesse um prenúncio de como seria o dia, eu não teria saído da cama. 




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Notas finais do capítulo

Olá, meus fantasminhas. O que estão achando? Melhor que a versão anterior? Minha narração melhorou? As cenas parecem realísticas? (não há nada que eu odeie mais em uma história do que a sensação de artificialidade)



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