Um Lugar Para Chamar De Lar escrita por David Leonardo


Capítulo 1
Um




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UM

Sugawara observou por certo tempo todos aqueles avisos de despejo próximos à porta; todos ainda lacrados, já que o mesmo não tinha coragem de abri-los. Às vezes pensava não ter necessidade. Sabia do que se tratava, então por que abrir?

Com um suspiro pesado, ele calçou seus tênis e saiu. Ao ver o melhor amigo que já o esperava na frente de sua casa, não conseguiu conter o sorriso. Todos os dias, naquele mesmo horário, os dois iam para a faculdade juntos. Eles consideravam uma tradição que jamais podia ser quebrada, quase um momento sagrado.

“Já faz exatamente dez minutos que estou esperando. Por que não atendeu o celular?” Questionou, entregando o capacete a Koushi.

“Precisa fazer esse drama?” Ele revirou os olhos e colocou o capacete em seguida.

Daichi odiava quando Sugawara revirava os olhos.

“Se falar mais alguma coisa, você vai a pé para a faculdade.” Ameaçou, mas ambos sabiam que era apenas da boca para fora.

“Apenas ligue essa moto e vamos, não quero chegar atrasado.” Abraçou a cintura do amigo, sabendo que ele aceleraria com toda a potência que a moto tinha.

“Céus. Por que ainda somos amigos?”

“Porque você não vive sem mim!”

Daichi deu a partida e acelerou assim que chegaram na avenida principal.

Não demorou muito até que chegassem ao campus da faculdade. Apesar de fazerem cursos diferentes, os blocos ficavam no mesmo prédio. Sugawara cursava arquitetura, decidido a seguir a mesma carreira do seu pai. Daichi cursava música; mais por hobby, já que a sua família era dona de uma rede de condomínios.

Sawamura sempre teve tudo que queria; um completo playboy da zona nobre da cidade, mas o que o diferenciava dos demais burgueses era o fato de ele ter apenas amigos de classe média-baixa.

“Hoje não vou poder vir te buscar. Tenho um encontro.”

“Quem é a corajosa?” Suga riu, fazendo deboche.

Daichi puxou o capacete das mãos do amigo com toda força.

“Sou o homem mais bonito que você já conheceu.” Gabou-se.

Na realidade, ele não mentiu. De todos os amigos do estudante de arquitetura, Daichi era o mais bonito. Talvez pelo fato dele nunca estar desarrumado ou pelo sorriso encantador ou até mesmo pelo ar de badboy por andar em uma moto Harley-Davidson Street Bob e pela sua tatuagem no pescoço.

Mas Sugawara nunca admitiria isso.

Despediram-se e tomaram rumos diferentes, mas assim que o acadêmico de música chegou à sala, sem perceber, digitou uma mensagem para o albino pedindo conselhos sobre o que usar para o encontro. De fato, um dependia do outro e essa relação nunca iria mudar.

[...]

Tanaka gemeu de dor quando sentiu mais uma vez o taco de golfe bater contra suas pernas. Seu pai não media a força e já se podia notar algumas manchas vermelhas na pele. Sua mãe, por outro lado, apenas chorava diante daquela situação abusiva.

Não era a primeira vez naquele mês que seu pai o batia, mas Tanaka nunca desistiria de seu sonho de ser ator, não importava quantas vezes ele apanhasse.

“Você é uma vergonha para essa família.” Seu pai gritou, cuspindo algumas gotas de saliva no rosto do jovem.

“Não me importo com o que as pessoas pensam sobre mim.” Refutou.

Seu pai acertou mais duas vezes o taco em suas pernas ao ouvir o atrevimento do filho. Em momento algum Tanaka derramou lágrimas; não daria esse prazer ao outro.

“Se você não desistir dessa bobagem de ser ator não o considerarei mais como meu filho!” O senhor Ryunosuke ameaçou como em todos os confrontos passados, no entanto Tanaka sentiu que dessa vez era verdade.

“Marido, não diga isso, por favor.” Sua mãe suplicou, pois também percebeu a seriedade nas palavras proferidas.

“Esse é meu sonho, pai. Não vou desistir.”

“Então saia da minha casa e só volte quando tirar essa estupidez da sua cabeça.” Ele apontou para a porta.

A senhora Ryunosuke caiu no chão, de joelhos. Tanaka mordeu o lábio inferior com força, sua garganta estava seca e seus olhos marejados; ele os fechou enquanto respirava fundo e, quando abriu novamente, tinha sua expressão confiante, o que só aborreceu mais ainda seu pai.

“Eu irei, não se preocupe. Quando eu for um grande ator você sentirá orgulho de mim, pode ter certeza disso.” Ele encerrou sua fala sem nenhum arrependimento.

Andou em direção à porta e, sem olhar para trás, saiu de casa.

[...]

Era quase o fim da aula quando Sugawara recebeu uma ligação de um número desconhecido, que ele recusou. Aquela aula de Urbanismo necessitava de uma atenção maior de sua parte e qualquer desvio poderia ser prejudicial.

Quando o professor liberou a turma ele acessou a caixa de mensagens do celular e começou a escutar tudo atentamente. De seus olhos começaram a escorrer lágrimas sem parar, seu coração estava tão acelerado que parecia que podia perder a força a qualquer momento.

No impulso, acabou discando o número de Daichi, mas não houve resposta. Tentou mais algumas vezes até desistir. Provavelmente ele já estava a caminho do seu encontro e desligou o celular para não ser incomodado.

Desesperado, Suga começou a correr pelos corredores do prédio esbarrando sem querer em algumas pessoas durante o percurso. Ele precisava chegar o mais rápido possível.

Na sua cabeça, aquela infeliz mensagem não parava de se repetir.

Esclareço que, devido à falta de pagamento, a desocupação do imóvel ocorrerá imediatamente. Essa ação judicial retoma o imóvel como bem legal do Estado. Agradecemos a compreensão.

Seu pai havia morrido há alguns meses e o dinheiro que recebia no emprego de meio período no restaurante não era o bastante. Diversas vezes tentou conseguir um emprego melhor, no entanto a faculdade não o permitia ter tempo suficiente.  Por sorte a instituição era pública, pois se fosse particular Suga já teria trancado o curso.

 Sua melhor alternativa seria pedir abrigo ao seu melhor amigo por um tempo. Daichi não negaria esse favor a Suga, principalmente pelo fato do acadêmico de música morar sozinho em uma casa grande com diversos quartos vazios. Ele definitivamente o ajudaria.

 

 


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