Filhos da Noite escrita por CM Winchester


Capítulo 2
Capítulo 1 – PARCEIROS




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Estava atrasada. Muito atrasada. Mas minha vida era assim agora, fora de meu controle.
Corri pelo corredor da escola com a mochila pendurada no ombro. Procurei a sala de biologia com fervor sabendo que não poderia chegar atrasada mais uma vez ou o professor não me deixaria entrar.
Não que eu me importasse com isso. Mas tinha uma pessoa que eu não poderia decepcionar logo agora que ela estava me ajudando. Dobrei o corredor e senti um baque na minha cabeça sendo seguido pela dor na bunda quando aterrissei no chão.
Olhei para cima observando a pessoa que tinha me derrubado, desde os tênis até os cabelos. Ele sorriu ao estender a mão. Eu nunca o tinha visto estudando na escola. Tinha que ser aluno novo. Tinha os olhos verdes e um sorriso torto. Seus cabelos eram castanhos puxado para um acobreado.
— Tudo bem? – perguntou-me.
— Estou atrasada. - Respondi colocando as mãos no chão e levantando sozinha, sem sua ajuda.
— Pelo sotaque é britânica. Agora entendo. As pessoas de lá andam na contramão. – sorriu.
— Nossa que original. – revirei os olhos.
Estava morta de vergonha. E olha que isso era novidade para mim. Mas o jeito que ele me olhava fazia eu querer ter vindo bem vestida para a escola hoje. Não com uma típica roupa mais largada. Eu estava com uma calça jeans boyfriend, uma camiseta gola V roxa, tênis Nike skatista roxo com branco e boné preto por cima dos meus cabelos que eram ruivos e tinha algumas pontas pintadas de azul e que estavam compridos até demais.
Sabia que tinha um corpo bonito. Muito bonito. Afinal, fazia ginástica artística, além de andar de skate. Tinha asas tatuadas nas costas, uma ferradura no pulso e uma tatuagem na virilha. Sim. Eu tinha uma tatuagem de coração perto da minha vagina. Além de um piercing na orelha.
Arrumei meu boné e passei por ele, afinal, estava atrasada.
Entrei praticamente tropeçando na porta bem na hora que o sinal tocou. Parei ao notar uma Barbie e um Ken colados no quadro negro. Estava de braços dados e praticamente nus. Haviam folhas coladas em algumas partes específicas.
A cima deles estava escrito: BEM-VINDO A REPRODURAÇÃO HUMANA (SEXO).
— Quer se sentar Srta. Crawford? - O Treinador McConaughy perguntou.
Caminhei até a carteira onde estava acostumada a me sentar e encarei Nora e Vee.
O Treinador pegou seu apito e assoprou.
— Assentos, time!
— Esqueceu o despertador? - Nora perguntou e eu lancei um olhar matador a ela. - Desculpe.
Alguém bateu na porta e me virei para olhar o garoto que eu tinha esbarrado no corredor.
— Biologia? - Ele perguntou.
— Sim. Sr.?
— Benjamin Archibald. - Ele entregou um papel ao treinador que assentiu.
— Pode se sentar com... - Ele observou a sala até notar que o único lugar vago era ao meu lado. - Com a Srta. Crawford.
Meu coração deu uma leve parada quando o vi se aproximar da minha carteira. Sentou-se ao meu lado, mas não tive coragem de encara-lo.
Eu sempre tive uma certa facilidade para ler mentes, já estava até acostumada com isso. Aconteceu quando fiz 13 anos. Eles apareceram e se tornaram mais fortes depois do acidente. Há um ano estava em um carro com minha família. Um acidente e fui a única sobrevivente. Sem parentes vivos somente uma carta onde passavam minha guarda para a mãe de Nora que era melhor amiga de minha mãe.
Mas não ler a mente dele me deixou intrigada. Ao mesmo tempo em que eu não me importava com isso.
— Vocês podem não ter percebido que sexo é mais do que uma viagem de quinze minutos ao banco traseiro do carro. - O Treinador começou a falar. - É ciência. E o que é ciência?
— Uma chatice. - Alguém gritou do fundo da sala.
— A única aula que estou reprovando. - Outro falou.
— Nora? - O Treinador perguntou a encarando.
— O estudo de alguma coisa. - Ela respondeu e ele parou na sua frente colocando o dedo na mesa.
— O que mais?
— Conhecimento ganho através de experimentos e observações.
— Com suas próprias palavras.
— Ciência é uma investigação.
— Ciência é uma investigação. - O Treinador esfregou as mãos juntas. - Ciência exige que nós nos transformemos em espiões. Uma boa investigação precisa de prática.
— Assim como sexo. - Alguém do fundo da sala comentou e eu mordi o lábio tentando na rir.
— Isso não será parte da lição de casa de hoje à noite. - O Treinador falou apontando para o garoto. - Nora, você está se sentando ao lado da Vee desde o começo do ano. - Nora assentiu. - Ambas estão no eZine da escola juntas da Srta. Crawford. - Elas assentiram. - Aposto que conhecem bastante uma sobre a outra.
Éramos um trio bem diferente, que chamava atenção. Vee tinha um cabelo loiro acinzentado, olhos verdes e era meio gordinha. Já Nora era seca que parecia aquelas modelos virada só em pernas, tinha os olhos cinzas e os cabelos cacheados. Enquanto eu era a ruiva de olhos azuis, branca como a neve.
Vee e Nora se conheciam desde criança, assim como Nora e eu. Só que eu sempre morei em Londres. Nossa amizade cruzava o oceano por anos. E a única coisa que mantinha minha amizade com Vee era Nora. Por que tinha vezes que eu não a suportava.
— De fato, aposto que cada um de vocês conhece a pessoa sentada ao lado bem o bastante. Vocês escolheram os assentos que escolheram por uma razão, certo? Familiaridade. Que pena que os melhores detetives evitam familiaridade. Ela entorpece os instintos investigativos. E é por isso que hoje vamos criar um novo mapa de assentos.
— Mas que porcaria! - Vee reclamou. - Estamos quase no final do ano. Você não pode mexer nesse tipo de negócio agora.
— Posso mexer nesse negócio até o último dia do semestre. E se você reprovar na minha aula estará de volta aqui no ano que vem onde estarei mexendo nesse tipo de negócio novamente. - Ele assoprou o apito de novo. - Cada parceiro sentado no lado esquerdo da mesa a esquerda de vocês mova-se um assento para frente. Aqueles na fileira da frente sim incluindo você Vee movam-se para os fundos. Menos o Sr. Archibald. Pode se manter ao lado da Srta. Crawford.
Lá se foi o plano de ir me sentar com Nora. O aluno que foi transferido no mesmo ano que eu passou pela minha carteira lançando um olhar para o garoto ao meu lado e depois sentou-se ao lado de Nora.
— Você não me disse seu nome. - Lancei um olhar ao cara ao me lado.
— Nicolle. Mas todos chamam-me de Nikki.
— Reprodução humana pode ser um assunto pegajoso... - O treinador falou.
— Uiii! - Os alunos reclamaram.
— É preciso um manuseio maduro. E como toda ciência, a melhor abordagem é aprender a investigar. Pelo resto da aula, pratiquem essa técnica descobrindo o quanto puderem sobre seu novo parceiro. Amanhã, tragam por escrito suas descobertas e acreditem em mim, vou checar a autenticidade. Isso é biologia não inglês, então nem pensem em inventar suas respostas, isso não é ficção. Quero ver interação e trabalho em equipe real.
— Então? - Benjamin falou.
— O que? - Perguntei e sorriu.
— Além de britânica e linda. Tem algo mais que queira me dizer?
— Não sou boa com palavras. - Expliquei. - Comece por você.
— Pode me chamar de Ben. E eu duvido que tenha mais coisas para se contar do que você tem.
— Eu que duvido disso. - Devolvi o encarando.
— Por que veio morar aqui?
— Órfã. - Respondi prontamente e ele ficou me encarando. - Perdi minha família em um acidente de carro. - Expliquei.
— Sinto muito. - Falou me encarando.
Era meio vago o seu "sinto muito", mas tinha algo mais. Era como se ele estivesse tentando entender o que tinha acontecido.
Pela primeira vez eu desejei poder ler a sua mente.
— E você? - Mudei de assunto.
— Negócios. Pretende voltar a Londres?
— Como sabe que eu morava em Londres?
— Um chute.
— Eu pretendo fazer faculdade...
— De medicina. Apesar de saber que isso é só uma ideia dos outros. Você não quer fazer faculdade.
— Não quero? - Perguntei franzindo a testa.
— Não. Aposto que você queria ser musicista.
— Não. - Menti apesar de amar tocar.
— Você toca algum instrumento? – perguntou-me.
— Violoncelo. Como sabe? - Ele segurou meus dedos e mostrou as marcas. Observador. Chegava me dar um arrepio na espinha.
Passou a língua no lábio superior e sorriu.
— É fácil de desvenda-la.
— Ao contrário de você. - Retruquei e acabei notando que ele ainda segurava a minha mão, então a puxei.
— Pode me dizer algo sobre você? - Pedi.
— Não tenho um endereço fixo. Mas já morei em Londres.
— Se mudou quando?
— Hum... Quando era mais novo.
— Como perdeu o sotaque?
— Vivi em muitos países.
— Quantos anos você tem? - Ele sorriu.
— Por que a pergunta?
— Fala como se fosse muito mais velho do que aparenta ser.
— Tenho 18 anos. Morava em Los Angeles, antes de vir para cá.
— Eu iria perguntar se você toca algum instrumento, mas não faz o seu tipo.
— Não sou muito fã de música clássica. Mas temos um gosto em comum, não se preocupa. Eu também gosto de cavalos.
— Como você sabe que gosto de cavalos? - Ele acenou para meu caderno que tinha na capa um cavalo correndo.
Muito observador, depois tocou meu pulso onde havia uma ferradura de cavalo.
— Estou errado?
— Não. É que... Deixa para lá. Minha família tinha uma fazenda aqui. Quando passávamos as férias para cá, era acostumada a cavalgar. Desde criança sempre gostei mais de cavalos até mais do que de carro ou moto. Acho que nasci no milênio errado. - Debochei sorrindo, mas ele não sorriu.
Ficou em silencio.
Ouvi o sinal tocar e ele levantou rapidamente fechando seu caderno e saindo apressado.
Levantei juntando as minhas coisas e fechei a mochila enquanto me encaminhava para a porta a tempo de ouvir os gritos de Nora.
— Eu não vou ligar! Nunca!
— Tudo bem? - Perguntei.
— Você terminou a sua coluna para o prazo de amanhã? - Vee parou ao nosso lado. - Estou pensando em escrever a minha sobre a injustiça do mapa de assentos. Fiquei com uma garota que disse que tinha acabado um tratamento para piolho essa manhã.
— Meu novo parceiro. - Nora apontou.
Vi que ele tinha agarrado o braço de Benjamin e o feito parar no corredor. Eles conversavam. O parceiro de Nora tinha uma expressão séria enquanto o meu parceiro tinha um sorriso debochado. Eles trocaram algumas palavras e saíram caminhando juntos.
— O veterano transferido? Acho que ele não estudou o bastante da primeira vez. Ou da segunda. - Vee a encarou. - Na terceira ele tem sorte.
— Ele me dá arrepios. Ele conhecia a minha música. Sem qualquer dica, ele disse, “Barroco”. - Nora fez uma imitação do que parecia ser a voz dele.
— Chute de sorte?
— Ele sabia.... Outras coisas.
— Como o quê?
— Tipo como me enlouquecer. Vou dizer ao Treinador que ele tem que nos trocar de volta.
— Vai nessa. Eu podia ter um gancho para o meu próximo artigo no eZine. “Segundanista Defende-se.” Melhor ainda, “Mapa de Assento Leva um Tapa na Cara.” Humm. Eu gostei.
Segui para a minha próxima aula. Encontrei com Benjamin algumas vezes e ele sempre sorria para mim quando me via. Por alguma razão aquilo me deixava nervosa. Muito nervosa.
Depois da aula tive acesso ao estúdio de música da escola. Fui direto ao violoncelo e o peguei. Ensaiei algumas músicas.
Mas sentia a presença de alguma coisa. Olhei em volta e não vi nada.
Senti um arrepio atrás da nuca. Joguei os cabelos para trás do ombro e levantei. Guardei o violoncelo e peguei as minhas coisas. Já estava quase anoitecendo quando sai da escola.
Ainda sentindo que alguém me observava, entrei no carro e fui embora dali.


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