Meu Mundo Zumbi escrita por Rafaella Nunes


Capítulo 1
Capítulo Único




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Não importa meu nome, de onde sou, ou porque resolvi contar isso a vocês, mas devo dizer que em um mundo caótico como o que me encontro, não se tem muito o que fazer e o tédio por si só poderia ser explicada minha vontade de escrever este relato.

Eu vivi há pouco tempo em um um mundo zumbi, no qual me sentia perdida, não existia ordem ali, em lugar algum se via vida, nem sequer um resquício do que havia existido, e mesmo que eu soubesse que nada daquilo fazia sentido, que toda aquela bagunça não deveria acontecer, tudo o que eu conseguia fazer naquele momento era observar de fora. Me sentia completamente derrotada.

Lá, ouvia murmúrios diversos, aos quais eu não distinguia, enquanto sentia ser consumida, mas de uma forma diferente do que eu esperava, com muito mais lentidão, dor e desespero do que eu esperava, e, focada no sofrimento que isso me trazia, não conseguia me concentrar no fato de que aos poucos me transformava naquilo que mais temi nos últimos tempos.

Estava sendo devorada aos poucos por um ser peculiar, que eu já conhecia e com o qual lutava desde que me descobri sozinha nesse mundo apocalíptico. Sim, um zumbi, e aquilo era tão aterrorizante, tão doloroso, que eu quis chorar, gritar, rezar, fugir, mas como disse, estava incapacitada de qualquer coisa.

E então, depois de pouquíssimo tempo, não era mais eu no meio de todo aquele movimento, todos aqueles corpos desconhecidos, percebi então que havia completado a transformação e apesar de eu continuar existindo consciente dentro daquele corpo, quem o controlava já não era eu.

Talvez estejam querendo saber como era esse zumbi. Pois eu vou avisar, não esperem que eu descreva com perfeição o físico dele, porque nem mesmo eu saberia dizer, já que não o vi com os olhos de meu corpo, por estes já estarem sob o comando desse monstro, eu o vi pelos olhos da minha mente, debilmente viva dentro de seu extenso domínio.

Só posso dizer que em primeiro plano existia uma criatura gélida, que não parecia um monstro por fora, mas que eu, olhando de dentro, podia perceber o quão horrenda era. Aquilo se deslocava com leveza e graça fora do comum, falava de tal forma rígida, sem emitir opiniões verdadeiras sobre qualquer que fosse o assunto, mantinha a coluna ereta e postura altiva, mostrando uma auto-confiança enorme, mas onde ninguém podia ver era que se mostrava como realmente era.

Na verdade era um gigante na pequenês do medo, um magistrado da insegurança, um amante fiel da casta ansiedade, com talento sobrenatural para o ilusionismo, um péssimo conhecimento sobre a atuação e dotado de conhecimentos em níveis transcendentais da magnífica e bela arte do formalismos.

O medo, importante parte de si, fundamentava toda a personalidade estática e lisa que colocava para fora, ativando a habilidade ilusionista para tirar a atenção de todos os seus defeitos, mantendo todo possível julgamento, que era previsto pela ansiedade, longe da cabeça das pessoas.

Fazia isso de forma tão rígida e contida que, apesar de não enxergar, abria brechas para que os outros ali presentes julgassem, da mesma forma, a inespressividade, como o fariam se estivessem assistindo a uma novela. Pensando melhor, acho que a criatura sabia muito bem disso, afinal, era detalhista demais para algo do tipo lhe passar desapercebido, provavelmente só julgou melhor ser julgada pelo que não tinha do que pelo que tinha, se é que existia algo em si que valesse ser julgado.

Ah! Falando em detalhismo, ainda não esclareci a última característica que descrevi e não pense que deixei por último por um acaso, não, essa é mais peculiar de todas, a que, em especial, merece uma análise mais profunda. Ela é, definitivamente, antiga e muito bem planejada, estudada, difundida e sua característica mais sublime é a delicadeza e o carinho com que trata a falsidade.

Penso que talvez tenha ficado um tanto quanto estranha essa afirmação feita acima, mas deixe me expressar melhor. A arte dos formalismos é a mais pura e sublime forma da hipocrisia, que por sua vez tem formas diversas, mas que se sente muito mais estável dentro dos tons formais.

Isso porque eles foram criados exatamente nos contornos perfeitos do fingimento e isso é fácil de ser constatado, pois é presente especialmente entre as camadas sociais mais segregacionistas e entojadas, independentemente de quem são elas em cada sociedade, cada época.

Para compreender melhor essa ideia, basta saber o motivo delas serem as donas dessa arte milenar, que consiste em nunca querer mostrar quem são, pois se mostrassem, seria possível ver que não há nada de notável ou extraordinário relacionado a elas, não como fazem parecer aos olhos de todos, por isso criam todos os códigos, regras e os seguem à risca, para esconder a normalidade e insignificância que têm por dentro.

É desse artifício que esse zumbi usa mais e com grande facilidade, algo que me leva a refletir se ele não é um zumbi das altas classes, afinal, se vale da mesma insegurança deles, com o "bônus" de estar mais vulnerável.

Devem estar se perguntando "mas como ela está escrevendo se perdeu o controle de seu corpo?" e por mais incrível que possa parecer, a resposta é: o monstro recuou. Depois de ter me contaminado e dominado, ele decidiu descansar, possivelmente por suas ações demandarem muita energia, mas antes de me deixar voltar ao controle de mim, ele me disse em tom debochado que aquele não era um adeus, mas um até logo.

Porque se foi? Para onde foi? Não consigo saber e talvez nem queira procurar, pois quem procura, acha e por não sentir nenhuma saudade dele, minha única preocupação é mantê-lo afastado, mas até quando vou conseguir?


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