Desabafo escrita por MidMoony


Capítulo 1
Capítulo Único




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Levantei com o despertador gritando e fui até a cozinha sem nenhum ânimo. Fiz ovos mexidos, uma das poucas coisas que sei, e encarei a cafeteira esquecida no canto da pia. Fazia algum tempo que eu não ousava tocar nela. Era provavelmente a coisa favorita dele quando ainda namorávamos, e eu nunca conseguiria fazer um café tão bom quanto ao que ele fazia. Senti algumas lágrimas quererem fugir dos meus olhos. Eu sinto tanta falta dele! Do seu jeito doce de me acordar, dos cafés da manhã exagerados que ele sempre fazia com medo de que eu ficasse com fome até o almoço, de como ele ficava lindo com a boxer rosa bebê e um tanto justa e avental amarelo enquanto se concentrava ao preparar suas deliciosas panquecas. Eu não acredito que deixei tudo isso escapar. Ainda não acredito que perdi ele.

Sai de casa com pressa para não me atrasar de novo e passei na casa de Quinn, meu melhor amigo e também quem me dava um copo de café todas as manhãs. Pois é, eu não fazia mais café em casa, mas não conseguia ficar sem. Eu fingia ás vezes que o café que Quinn me dava havia sido feito por ele, embora eu soubesse que isso era praticamente impossível, e o sabor bem diferente.

Segui pelas ruas passando perto da casa em que ele morava, e vi seu irmão guardar algumas coisas no carro. Ele havia ido embora já havia duas semanas, e dentro de alguns dias seria seu casamento. E eu não conseguia acreditar nisso.

Nós namoramos durante dois anos. Eu nunca disse que o amava, e ele também não. Mas tinha sentimentos, sabe? E eu sempre vacilava com ele. Mesmo assim ele me aturou por dois anos. Perdoava minha bebedeira, meus deslizes e escorregões. Não éramos de briga, nunca fomos. Ele sempre foi um cara calmo, e eu um sem noção. Ele não era a pessoa mais bem falada da cidade, não mesmo. Suas roupas sempre muito curtas e justas, seu cabelo sempre com cores chamativas, seu jeito um tanto oferecido... Mas ele nunca ligou para o que falavam dele. Ele dizia que não podia fazer nada se metade da cidade o queria. Eu ria e respondia que só eu podia tê-lo. Na época isso era verdade. E embora usasse roupas provocantes e tivesse um jeito dado, ele não era uma puta. Eu até o tratava assim, mas ele não era, em nenhum momento foi. Comigo ele sempre foi uma cara doce, atencioso, carinhoso. E eu? Eu mandava ele parar de viadice. E então ele me olhava um tanto magoado e agia como um qualquer, bem do jeito que eu gostava. E eu percebi isso tarde. Ele queria ser tratado com uma princesa, e eu o tratava como uma prostituta, como alguém que só servia para me dar prazer. Eu sei que magoava ele. Às vezes seus amigos perguntavam do porque dele deixar eu o tratar assim. Ele olhava sem graça e dizia ser só brincadeira minha. Mas eu deveria ter prestado atenção em seu olhar machucado.

Todos seus amigos o amavam. Tinha uma bela voz e adorava sair pra cantar. Era um ótimo piadista, e seu humor negro agradava muitas pessoas. Amava a arte e a culinária. Pintava quadros e fazia tortas de maçã e framboesa. Não trabalhava fora, mas já havia se formado em duas faculdades. Ele era bastante querido por aqui.

Lembro-me bem do dia em que ele me deixou oficialmente. Nós havíamos tido uma leve discussão, eu havia bebido muito em uma festa, a qual eu não o levei, e acabei ficando com alguns caras. Ele não ligou pra isso, ele apenas insistiu que estava tudo bem, desde que eu fosse a uma viagem para o interior, no aniversário de uma tia dele. E eu não fui, não quis ir. Eu pensei estar cansado do pouco drama que ele fez tentando me convencer e o dispensei. Disse que precisava de um tempo sozinho. Ele foi embora triste e eu não me senti culpado por isso. Ah, Gerard era dramático demais! Pelo menos, eu pensava assim. Eu deveria ter notado o quão sortudo eu era por ter aquele cara, quase todo mundo da cidade o queria. Mas eu nem ligava pra isso. Sabia que Gerard sempre seria meu, sempre voltaria pra mim, e por isso o tratava de qualquer jeito. Eu fui um idiota, um babaca.

Ele partiu no sábado cedo e me ligou algumas vezes durante a tarde. Não atendi a nenhuma das ligações. À noite saí pra balada, enchi a cara e beijei alguns estranhos. Voltei pra casa de madrugada e dormi. No domingo durante a tarde sem nada para fazer, decidi ligar pra ele. O número deu indisponível, e por mais que eu tentasse, ele não atendia nunca. Pensei em ligar para o irmão dele, mas lembrei de que não tinha o número de Mikey. Achei que nunca fosse precisar.

Passado uma semana, na segunda-feira, passei cedo em sua casa. Eu estava bravo e queria saber do porque dele ter me ignorado durante uma semana inteira. Fui recebido por uma Donna apreensiva e quando entrei na cozinha, sem ser convidado, me deparei com um rapaz baixo e tatuado, bonito também, que ria enquanto tomava café e conversava com Mikey e Donald. Gerard estava sentado ao seu lado e pude ver que o rapaz acariciava distraído sua coxa, enquanto conversava. Gerard estava mais bonito do que eu me lembrava, havia cortado o cabelo e usava roupas largas. Quem o visse ali nunca diria que era aquele mesmo rapaz que parecia uma moça o qual eu namorei.

Ele me encarou sem graça e pediu licença ao se retirar da cozinha. O rapaz desconhecido perguntou por algo e ganhou um olhar como resposta, ficando com o semblante preocupado e me fazendo ter certeza de que ele sabia quem eu era. Nesse dia eu soube que não teria mais Gerard. Ele me contou que aquele rapaz era Frank Iero e que trabalhava como piloto na marinha. Se conheceram na festa de aniversário que eu não fui. Gerard disse que estavam namorando, e eu quase surtei.

—Tão rápido assim?

—Frank é uma boa pessoa e me tratou bem desde o primeiro instante. Não acho que o tempo deva ser um empecilho. Não quando você se apaixonada por apenas um olhar. – ele respondeu um pouco frio. E Gerard nunca havia sido frio comigo.

Fui embora inconformado, e achando que isso era só uma fase. Gerard estava chateado e queria me dar o troco, e era só isso. Mantive isso em minha cabeça pelos próximos oito meses, os quais quase nem vi passar me afundado em bebidas, festas e corpos desconhecidos. Então, um dia enquanto eu estava no mercado ouvi duas pessoas conversando animadas sobre casamento. A moça que eu sabia se chamar Lindsey, por ser amiga de longa data de Gerard, estava animada conversando sobre vestidos e flores para decoração. O rapaz que estava de costas tinha o cabelo preto, não tão curto e totalmente bagunçado. Usava uma bermuda jeans justa e uma camiseta regata verde. Roupas comuns, pensei. Mas quando esse rapaz virou, eu quase surtei. Era simplesmente Gerard ali. Gerard que sempre tivera cabelos de cores escandalosas e usava roupas curtas e agarradas demais estava ali, com um visual mais discreto e indiscutivelmente mais belo. Me ver não foi do agrado dele, e ele ao menos tentou disfarçar isso. Confirmou o casamento e contou que estava indo embora naquela mesma semana.
Por bocas de amigos em comum eu soube que a família de Iero era rica. Seu pai era um ex oficial da marinha e seu filho seguiu seus passos, embora preferisse pilotar o navio.

Alguns dias antes do casamento Gerard me mandou uma mensagem, pedindo para ficarmos bem. Conversamos durante algum tempo, eu liguei para ele, e pude notar que há anos eu não o via tão feliz assim. Gerard casou, e mudou bastante. Agora aparentava ser um homem maduro e responsável. Adotaram duas adoráveis garotinhas, as quais eu vi uma vez quando ele veio passear na casa de seus pais.

Soube mais tarde que o rapaz deixou a profissão de lado para se tornar professor de música e conseguir passar mais tempo com a família, e que Gerard finalmente começou a dar aulas de artes, ele havia se formado nisso quando ainda namorávamos, mas nunca havia se interessado em trabalhar na área. Soube também que adotaram um menininho recentemente.

Já faz oitos anos que não tenho mais Gerard. Oito anos que eu não uso mais minha cafeteira. Oito anos que eu me praguejo por ter perdido a pessoa que mais me fez chegar próximo do tão falado amor.

Enquanto eu seguia para o trabalho, meu celular vibrou. Era uma mensagem dele. Nela, ele me pedia para parar de me culpar. Pra eu ir atrás de ser feliz. Que nossa experiência havia sido boa, mas que nós precisávamos seguir em frente. Que ele estava feliz, que Frank era o melhor homem do mundo, mas que também queria me ver feliz. Talvez ele soubesse que eu havia me metido com drogas, alguém deve ter contado a ele. Guardei as palavras dele pra mim e segui em frente. Na hora do almoço uma leve garoa me fez escolher a lanchonete mais próxima do meu trabalho, já que não daria pra seguir até a casa de minha mãe. Entrei afobado no local e acabei esbarrando em alguém.

— Me desculpe, eu... – me interrompi ao ver o rapaz em minha frente. Era um pouco mais alto que eu e tinha belos olhos puxados, por certo tinha descendência asiática. Um sorriso bobo se formou em minha face ao ver seu rosto bonito e confuso e logo ele sorriu de volta.

—Não foi nada. A propósito, eu sou o Rick. – o moço disse me estendendo a mão.

—Bert. Bert Mccracken. – respondi ainda um tanto bobo. O rapaz riu e acabamos sentando na mesma mesa, e conversamos pelo resto do almoço. Rick parecia ser um rapaz legal, e eu seguiria o conselho de Gerard. Eu me daria uma chance, e dessa vez faria tudo certo.


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