English Boy escrita por Kiki, Tyke


Capítulo 3
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Oooi
Trazendo mais um aí



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Sentia a brisa fresca da manhã entrar pela janela e bater no meu corpo. Eu estava deitado em minha cama usando apenas uma bermuda para não suar demais durante a noite. A luz já invadia o quarto pela janela me despertando suavemente. Virei para o lado da parede onde podia fugir um pouco da luz e tirar mais alguns cochilos. Então algum desaforado bateu na porta. Apertei os olhos sem acreditar que alguém queria nos acordar de manhãzinha e em pleno recesso de aulas. Até considerei que estivesse sonhando, mas as batidas eram persistentes.

Abri os olhos, passei a mão no rosto e me virei para o outro lado do quarto. Danilo estava enrolado em um lençol fazendo cara feia de sono.

ꟷ Vai ver. ꟷ ele me disse.

ꟷ Vai você. ꟷ retruquei.

ꟷ Não, vai você. ꟷ ele enfiou a cara no travesseiro ficando de bruços.

ꟷ Já sei. Vamos ignorar. ꟷ peguei meu travesseiro e coloquei em cima do rosto.

Quem me dera essa ideia tivesse dado certo. Por poucos segundos pairou um silêncio e então veio mais batidas persistentes.

ꟷ Vai lá, Luca!

Eu tinha que aceitar que essa pessoa não tinha desconfiômetro e que Danilo era um folgado.  

ꟷ Saco! ꟷ bufei.

Levantei da cama movido pela força do ódio e abri a porta dando de cara com, é claro, James. Grande surpresa!

Bom dia! ꟷ ele ainda teve coragem de sorrir.

O que você quer? ꟷ respondi talvez rude demais, mas não me preocupei. De qualquer forma ele nem se ofendeu.

Eu não estava conseguindo dormir por causa do calor. Então eu pensei que você poderia me mostrar a escola.

Agora? ꟷ disse descrente.

Sim, você não pode? Porque eu posso ir falar com a diretora Cuesta e ver se…

ꟷ Tá! ꟷ o interrompi. ꟷ Ok, só vou me vestir. ꟷ fechei a porta na cara dele.

Não consegui identificar se ele tinha acabado de me ameaçar ou não. Entretanto, se ele fosse até a Paloma o trem podia complicar para mim. Em questão de minutos eu seria chamado na sala dela para tomar uma bronca.

Eu precisava descontar minha irritação em algo e meu amigo foi o alvo mais próximo. Dei uma travesseirada em Danilo que resmungou, mas continuou enrolado no lençol.

ꟷ Eu vou matar esse cara! ꟷ sussurrei para ele.

Danilo riu e virou para parede. Peguei minhas vestes no armário e me troquei. Sai do quarto e James me esperava em frente.

Onde quer ir primeiro? ꟷ perguntei cheio de tédio.

Café da manhã? ꟷ ele passou a mão na barriga.

Eu não sentia fome quando tava puto, mas se era o que ele queria. Fomos para o Bandejão que estava quase deserto. Na pista de comida tinha muitas opções para matar a fome. Me servi como de costume: um copo até a metade de café, pão de queijo e um pedaço de bolo de chocolate.

Sentei na primeira mesa no caminho. James tomou o lugar a minha frente. Eu evitava olhar pra ele só de raiva por ter me feito acordar tão cedo durante o recesso. Mas a cada gota de cafeína que caia no meu sangue fui apaziguando até ficar mais calminho. Observei James disfarçadamente e vi ele torcer o nariz para o que tinha em seu copo.

Que chá esquisito.ꟷ falou abandonando o copo na bandeja.

ꟷ Mate? ꟷ perguntei retoricamente, afinal era a única opção.

Pela cor da bebida no recipiente deduzi que ele tinha colocado leite e estremeci só de imaginar o gosto. Eu sabia que, segundo Danilo, no país dele era costume tomarem chá, entretanto, eu mesmo não entendia nada do assunto. Eu nem gostava de chá.

Não gosto muito de café.ꟷ ele declarou.

Parece que éramos um belo oposto do outro. Eu já tinha conhecido pessoas que não gostavam da bebida escura e eu sempre achava estranho não gostarem. Mas era suspeito da minha parte já que eu precisava de café para viver como precisava de água.

Tenta algum suco. ꟷ propus a ele. Tinha várias opções de suco na pista.

James ponderou um pouco, levantou e depois voltou com um copo de suco de laranja e uma fruta cor-de-rosa.

O que é isso? ꟷ ele me mostrou a fruta.

Ela tinha a casca escamada e a coloração de um rosa bem vivo. Por dentro, eu sabia, que também seria rosa ou branca. Aquela fruta costumava ser mais consumida pelos alunos que vinham da região central do continente.

Se não me engano, se chama pitaya. ꟷ falei.

Tem gosto do quê? ꟷ James deu uma fungada na casca.

Não sei, tem gosto de… pitaya ꟷ não encontrei outra resposta. James me deu um olhar irônico antes de tentar morder a fruta. ꟷ Não come a casca. ꟷ fiz uma careta de desaprovação.

Peguei a pitaya da mão dele e com a minha faca cortei ao meio, aquela era branca. Então devolvi a ele, para que comesse somente a polpa. James provou um pedaço e parou analisando o sabor.

Huum! Tem gosto de nada. ꟷ ele averiguou e continuou comendo.

Eu quase ri, mas então lembrei que fui tirado da cama cedo e a contragosto. Fiquei em silêncio. James tentou puxar assunto algumas vezes, mas eu não tinha muita vontade de responder, então apenas murmurava.

Tem bastante frutas. ꟷ ele dizia.

Aham.

Algumas eu nunca vi. ꟷ tentava de novo.

Aham.

Dado um momento, para o meu alívio, ele desistiu. De repente percebi que ele estava olhando para cima feito um bobo. Na hora até pensei que ele tinha algum problema de cabeça.

Onde é entregue o correio? ꟷ me perguntou.

Nos quartos. ꟷ respondi.

Oh! Em Hogwarts é entregue durante o café da manhã.ꟷ ele deu um sorrisinho.

Fiquei imaginando que caos seria as aves invadindo o refeitório lotado e jogando cartas nos alunos. Seria muito provável que elas defecaríam nas comidas, porque como um dos meus professores disse uma vez: “aves existem pra cagar”. Até pensei em perguntar a James se isso acontecia, mas escolhi ficar quieto. Quando terminamos de comer, devolvemos as bandejas e saímos do refeitório.

E agora, para onde quer ir?

Tem campo de quadribol?

Sim ꟷ suspirei a resposta.

Mais um da laia do quadribol. Eu não era um grande fã do esporte. Em todos esse anos na escola, pisei uma vez no campo e foi para acompanhar Danilo ao teste de um dos times, o Tamã Mirim.

Descemos para o campo que ficava bem perto orla da floresta. Caminhamos até a marcação central ficando entre as duas arquibancadas altas. James olhou tudo em volta como uma criança e me falou todas as diferenças com o campo de Hogwarts. Eu não dei a mínima, não é a toa que nem lembro mais.

Ao sairmos de lá,  sugeri passarmos na estufa de Herbologia que era o mais próximo. A estufa era muito verde com suas intermináveis espécies de plantas. Do lado de fora tinha uma hortinha do professor Afonso e um jardim de flores. James não pareceu tão interessado nas plantas como no quadribol.

Guiei James para contornarmos o Prédio Principal, por fora, até a entrada da frente, ou portal leste. O arco da entrada era maior que todos os outros. Tudo muito ornamentado, a entrada da escola era a parte mais bonita. Ela dava de frente para um laguinho com águas muito azuis. Sobre o lago erguia-se uma ponte atravessando do portal até o gramado em frente.

Ladeamos o muro dourado da escola e passamos pela ponte para chegar ao Biotério. Na construção arredondada guardavam criaturas que seriam usadas em aulas práticas. Não podíamos entrar sem autorização, então observamos de fora.

Em seguida levei James ao Viveiro, onde ficavam as aves que poderíamos utilizar para enviar cartas. O Castelinho tinha uma política de controle dos animais em seu domínio, pois ocupávamos uma área muito próxima das vidas silvestres. Por isso, não podíamos levar nossas próprias aves ou qualquer outro animal. Quando conheci Danilo, a seis anos, aquela foi sua principal crítica a nossa escola, porque na escola do pai dele podiam levar até o porco de estimação se quisesse.

Eu e James retornamos para o Prédio Principal e o levei para o terceiro andar. No caminho demos uma olhada nas salas de aula, não tinha nada demais nelas. Chegamos na porta da grande Biblioteca de Conhecimentos Mágicos e Afins, a maior de toda a América Latina. A abreviação oficial do nome era BiCoM, mas todos a chamavam estupidamente de Bibicom. Entrei com James, passando pelos dois bibliotecários, e paramos no centro. Ela era como todo o resto da escola, feita de pedra. Ocupava quase três andares do Castelinho, mas só tinha entrada pelo terceiro. No primeiro piso havia uma área comum muito parecida com o Centrinho. Para chegar nos andares onde ficavam os livros, rampas se erguiam do chão, interligando todos os pisos.  

Uow! ꟷ James exclamou olhando a estrutura. ꟷ É lindo! Tudo aqui é lindo. ꟷ ele estava muito entusiasmado.

Aham ꟷ murmurei.

O mais interessante da Bibicom era seu feitiço que impedia todo e qualquer som de ecoar muito alto. Daquela forma até podíamos conversar dentro da biblioteca sem incomodar os outros.

Eu poderia te pedir um favor? ꟷ o garoto ao meu lado perguntou esperançoso.

Er...sim. ꟷ disse com receio do que seria.

Me ajuda com o português? Ontem a noite eu estava reparando em vocês conversando. Achei parecido com o espanhol, então, acredito que consigo pegar rápido. ꟷ ele me pediu com um sorriso cheio de dentes.

Claro, mas talvez Danilo possa te ajudar melhor nisso. ꟷ tentei fugir oferecendo meu amigo para o trabalho.

Ah, eu não quero incomodá-lo. E como você é meu guia achei que estaria disposto a fazer isso. ꟷ ele sorriu de novo. Pensei em estrangulá-lo.

Eu queria responder: “You think errado, otário!”, entretanto, no lugar eu disse:

Ok.

Era meu último ano. Eu não queria mais problemas depois do que houve com Marco. Imaginei rapidamente o que aconteceria se James reclamasse de mim para Paloma. Poderia acontecer nada ou eu poderia me danar. Na dúvida, o melhor seria fazer o que James queria, afinal não era esse paspalho que veio dos cafundó que ia me encrencar esse ano.

Podemos começar hoje?

Com esse pedido, adicionei “abusado” na lista de “Coisas que Não Gostei em James Potter”.

Não acho que… ꟷ comecei a dar minha justificativa, e eu tinha mesmo uma.

Eu gostaria de aproveitar essa semana antes das aulas começarem. ꟷ James insistiu sem me deixar terminar.

Está bem. ꟷ respondi com um suspiro ꟷ Pode ser as duas horas, no Piso dois?

Onde é isso? ꟷ ele fez uma careta de confusão.

Aqui, segue as placas. ꟷ mostrei as placas da biblioteca que indicava o caminho para cada um dos cinco pisos.

Quando James confirmou o local e o horário, dei as costas para ele e caminhei para a saída da Bibicom. Ele veio correndo atrás de mim e me acompanhou persistente.

Onde você vai agora? ꟷ ele perguntou.

Tenho coisas para fazer. ꟷ respondi monótono.

Que coisas?

Jesus! Que garoto curioso ele era. Fiquei irritado por ele me cobrar satisfações e ainda estar me seguindo.

Pessoais. ꟷ respondi aborrecido.

Ah entendo. ꟷ James continuou atrás de mim. Depois de um tempo ele disse hesitante ꟷ Acho que não sei voltar para o alojamento sozinho.

Bastava que ele encontra-se a Grande Escadaria e seguisse para a saída oeste. Mas estávamos no meio do terceiro andar, passando por confusos labirintos de corredores. Lembro que no primeiro ano vivíamos nos perdendo naqueles andares até achar a escada. Eu sabia que James poderia se virar, mas se fosse assim não teriam me colocado para cuidar dele. Senti um pouco de vergonha, talvez eu estava o tratando muito mal.

Estou indo para lá. ꟷ  falei sem parar de andar.

James continuou me seguindo e desse jeito nós fomos. Minha consciência me martelava por ter sido um cuzão com ele até aquele momento. Por que minha mãe tinha que ter me dado tanta educação? Foi inevitável segurar o que estava preso na garganta e acabei pedindo:

Desculpe. ꟷ esperei que James entendesse o que eu quis dizer.

Tudo bem. ꟷ ele sorriu. Com isso considerei que ele sabia do que eu falava.


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