A idéia que Kaoro me deu foi bem boa, eu estava prestes a fugir e voltar para o orfanato. Não tínhamos combinado as coisas certas, mas sabíamos que logo fugiríamos.

Kaoro ia junto comigo, eu não queria que ela se arriscasse, mas ela insistiu muito e acabei cedendo. 

— Foi a minha idéia, eu vou junto! – Murmurou no final de nossa conversa.

Então iríamos juntas procurar meu Eichi, só precisávamos de um plano, não apenas um plano, um excelente plano. Como essa casa era bem fechada e cheia de seguranças, precisávamos ser espertas.

O dia para isso também teria que ser pensado. Com toda a certeza teria que ser em uma dia de semana, meus pais adotivos quase nem vinham para a casa e seria mais fácil.

Antes da fuga precisamos de um plano, essas palavras fizeram a cabeça de Kaoro trabalhar muito. Ela era muito inteligente, bem mais do que eu.

Quando eu a chamava de esperta, ela retrucava. Falava que não adiantava nada ser esperta, que era mais importante cantar. Sempre me pedia para que eu cantasse.

— Acho que já formulei um plano. – Murmurou depois de uns dois dias de nosso plano inicial.

— Já? – Perguntei espantada.

— Já! Eu conheço essa casa como ninguém, você sabe disso...

— Sim, você mora aqui bem antes que eu!

— Pois é isso mesmo que nos vai ajudar! Sei de um buraco no muro que pode nos livrar.

— Buraco no muro? Eu nunca vi, e olha que já caminhei por todo o muro de casa...

— Mas você nunca caminhou dentro de minha casa...

Era verdade, Kaoro morava numa casinha no fundo de minha casa. Morava com sua mãe, realmente eu nunca entrei na casa dela.

— Mas como pode ter um buraco lá?

— Na verdade não é um buraco, é meio que um alçapão. É fechado por um piso de madeira, nunca o abrimos mas...

— Mas dá para fugir. – Completei o pensamento.

— E ninguém vai ver!

Era o plano perfeito, não tinha como negar. Com toda a certeza nem notariam a nossa falta, só iam perceber quando chegasse o fim de semana.

Mas tinha algo que nós duas ainda não tínhamos pensado. E se pegarem agente? Poderia ser difícil nos pegarem na saída, mas e depois? Não iria dar confusão a Kaoro?

— Kaoro, e se nos pegarem? Você pode ser despejada, você sabe disso!

— Não vão nos pegar, posso garantir.

— E se eu for sozinha até o orfanato? Você me ajuda, mas para escapar!

— Gostaria de ir com você... – Falou fazendo bico.

— Vamos ver, ainda precisamos arrumar um dia!

Pensei um pouco, hoje era domingo, não teria nem como pensar em fugir. Meus pais adotivos provavelmente estavam passeando lá fora ou algo parecido. Daria muito na cara.

— Amanhã? – Kaoro perguntou.

— Amanhã? – Perguntei um pouco incrédula. – Dá tempo?

— Não precisamos muito de tempo, o plano está certo.

— É verdade, mas queria levar minhas roupas...

— Eu te ajudo a arrumar tudo, esse é meu serviço!

E foi isso que começamos a fazer. Peguei poucas roupas, as mais importantes. Como sabia que chegando lá teria minhas coisas velhas, tentei economizar espaço.

O que eu precisava fazer hoje era descansar, como Kaoro me disse. Precisava dormir bem, e acordar bem cedo amanhã para escapar.

Deitei na minha cama e a única coisa que consegui ver foi o rosto de Eichi, sorrindo ao me ver... Ele era tão lindo, parecia que agora eu podia visualizar melhor sua face.

Tinha lindos cabelos, lisos e sedosos, na cor de mel. Seus lábios eram grossos e macios. Nariz totalmente esculpido, combinando com as faces macias. Mas os olhos, os olhos sim eram o que mais me deixava apaixonada!

Eichi tinha lindos olhos azuis! Quando eu os olhava, a única coisa que vinha na minha mente era o céu estrelado junto com a lua. Acho que seus olhos refletiam o amor pelo universo! De tão infinitos que eram.

Acordei com as batidas desesperadas de Kaoro, eu precisava correr e muito. Ela rapidamente me deu algo para comer e corremos para sua casa.

Sua mãe, por sorte, já tinha se levantado. A casa estava totalmente vazia, e poderíamos  sair tranquilamente pela passagem.

Ela me mostrou exatamente o que fazer. Consegui convencê-la a ficar, por isso ela me ajudou com tudo. Eu teria que entrar no alçapão, teria um espaço escuro, logo após eu subiria alguns degraus chegando à luz do dia.

Quando eu fizesse isso, teria que correr antes que alguma pessoa me visse. Ela voltaria ao normal, com seus afazeres diários.

— Tem certeza que não quer que eu vá?

— Tenho Kaoro, não quero te prejudicar.

— Tudo bem então, tome essa lanterna para que você possa enxergar direito.

Peguei a lanterna enquanto ela abria o alçapão. Realmente ali era tudo muito escuro, por isso já liguei a luz apontando o caminho.

Antes de me afogar na escuridão, dei um abraço muito apertado nela. Essa seria uma das coisas ruins de fugir, eu nunca mais veria minha amiga!

— Vou sentir sua falta! – Murmurou.

— Eu também vou, saiba que é a minha melhor amiga!

— Digo o mesmo! – Lagrimas saíram de seus olhos, e os meus também se encheram.

Respirei fundo e desci pela pequena escada ao alçapão. Logo depois que fiz isso, ela abaixou a tampa para que eu ficasse imperceptível.

Realmente tudo era muito escuro, a minha sorte era que tinha a pequena lanterna. No fundo eu estava com medo.

Caminhei pouco até chegar na escada que Kaoro tinha me instruído que levaria para fora. Já podia ver alguns raios de sol saindo de lá.

Minha ansiedade tomou conta de mim, e comecei a andar mais rápido. De fora vinha um barulho de carros, e eu sabia que estava bem perto da liberdade.

Logo pude ver as nuvens do céu, foi ai que eu me apresei mesmo. Nem acreditei quando sai completamente da casa, eu estava livre! Livre para o meu amor!