Sorriso Insano escrita por LoneGhost


Capítulo 22
Hora do show


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura ^^



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 Ele continuava me olhando assustado.

—O que você está fazendo aqui?- indagou.

Balancei a cabeça.

—O que... VOCÊ está fazendo aqui?- perguntei confusa.

Thomas olhava para mim chocado e não me respondeu.

—O que você veio fazer aqui?- insistiu.

—Que roupas são essas?- retruquei.- Thomas, você parece um... mímico macabro!

Eu estava dizendo o que me vinha à cabeça. Estava realmente confusa.

—Meu nome não é Thomas... não mais. Me chame de Jack.- finalmente respondeu, sem, de fato, responder.

O que ele estava dizendo? Um misto de ansiedade e raiva começou a tomar conta de mim, enquanto eu me estressava e sentia vontade de fazer várias perguntas ao mesmo tempo, mas nada saía de minha boca.

—O que raios está acontecendo?!- quase gritei.

—Shhhhh...- ele colocou o dedo indicador sob o nariz.- Fale baixo.

Ele chegou mais perto da janela e ficou mais próximo a mim. Ele parecia o mesmo de várias semanas atrás, mas com muita maquiagem preta e branca no rosto e uma roupa esquisita.

—Eu...- ele começou a dizer- consegui encontrar essas pessoas e entrar para esse circo. Mas eu pensava em me livrar de Jeff...

Eu nem o esperei terminar.

—O que?!- eu o interrompi- Você me abandonou, é isso?! Me deixou sozinha?!

Meu coração batia rápido de nervosismo. Era aquilo mesmo que estava acontecendo? Ele havia fugido sem me avisar para simplesmente livrar a própria pele e me abandonar? Eu não estava acreditando.

—Calma, me deixe explicar...- ele parecia ansioso.- eu... eu me juntei a esse grupo para ter uma chance maior de lutar contra Jeff. Eu criei um personagem aqui dentro... Jack Risonho. Eu sou outra pessoa agora e na hora certa, eu iria saber como agir, e ia saber quando te buscar também.

Meus olhos já estavam lacrimejando. Eu não conseguia acreditar em nada que ele dizia, porque simplesmente não fazia sentido nenhum. Coloquei as mãos na cabeça, fechei os olhos e respirei fundo para tentar entender tudo o que ele estava dizendo, mas falhei miseravelmente.

—Como encontrou essas pessoas?- falei, tentando parecer calma.

—Eu os vi de longe, antes de... partir.- falou e senti um pouco de culpa em seu tom de voz.- Eu precisava me juntar a eles para conseguir pensar em alguma coisa, longe de tudo.

—Longe de mim também?

—Não... é claro que não. Eu só...

—Então por que não me trouxe junto...?- perguntei baixo.

Ele franziu as sobrancelhas e balançou a cabeça.

—Hã... eu...- gaguejou.

—Eu não sei por que depositei tanta esperança em você, mesmo sabendo, lá no fundo, como você era. Eu nem te conhecia direito antes e agora... você diz que é outra pessoa...

Eu senti as lágrimas escorrerem em meu rosto. Thomas, ou seja lá quem era, tentou se explicar.

—Wendy, eu me importo com você. Me desculpe, mas me deixe fazer isso. Eu vou nos tirar dessa vida.

—Eu nem sei quem você é mais!- gritei.- E não me importo também.

Eu ainda não entendia direito o que estava acontecendo ali, mas dei as costas e saí. Eu não queria mais estar com aquele traidor.

—Espere!- ele gritou.- Para onde você vai?

Parei de andar e me virei.

—Para algum lugar longe de você.- falei.

Sua expressão tornou-se triste e então percebi o quanto ele estava mudado.

—Eu...- ele começou.- eu não quero ficar longe de você. Eu não posso.

Aquilo cortou o meu coração. Senti lágrimas de ódio escorrendo em minhas bochechas.

—Mentiroso.- concluí.

Me virei e saí dali. A única coisa que pensava em fazer era acabar com aquilo de uma vez. Não queria mais saber de Thomas. Nós passamos por tantas coisas juntos e ele simplesmente... me descartou como lixo. Aquilo era inacreditável.

 Quando voltei para o lugar onde Jeff e Liu estavam esperando, Jeff estava com a máscara na cabeça e me encarou de uma maneira que me fez pensar que ele podia ver através de meus olhos.

—Por que seus olhos estão tão vermelhos?- perguntou.

Pensei que devia ter esperado as lágrimas secarem antes de aparecer na frente dele de novo e deixar aparentemente claro que estava chorando.

—Hã... há pouco, quando o vento soprou, senti algo entrando em meus olhos e começaram a lacrimejar.

Porém, a resposta pareceu convencê-lo.

—Hm. Tanto faz.- ele disse.- O show vai começar daqui a alguns instantes.- sorriu mais que o normal.- Está preparada?

Respirei fundo e sorri, tentando parecer empolgada.

—Estou.- falei.

Ele riu.

—Ótimo. Vai ser tudo perfeito.

 Esperamos mais um pouco e eu já estava me acostumando com os braços expostos ao frio. Eu podia ouvir  plateia dentro da cabana rindo e se divertindo, enquanto os apresentadores falavam talentosamente no palco. Ouvi quando chamaram Thomas.

“Senhoras e senhores, agora com vocês... Jack Risonho!”

—Vamos agora.- Jeff falou.- Liu, corra ali na frente e mate quem estiver de guarda na entrada. Eu e Wendy vamos entrar pelos fundos da barraca.

—Certo.- Liu disse e saiu.

—Vamos.- Jeff disse para mim, levantando-se e colocando a máscara.

Coloquei a minha sobre o meu rosto também e o segui.

 Fomos silenciosamente até a parte de trás da barraca e entramos depois de passarmos por uma fina cortina de seda vermelha. Quando entramos, percebi que aquele não era de fato o camarim, acho que os membros do circo se vestiam em outros lugares antes das apresentações, mas vi alguns espelhos e cabide com roupas coloridas. Pessoas vestidas de palhaços, ginastas, acrobatas, bailarinas, fantasias, andavam por ali, sem fazer muito barulho, provavelmente para não interromper o show que estava acontecendo. À nossa frente se estendia uma enorme cortina vermelha fechada, que parecia se bem pesada e que, provavelmente, dava acesso ao palco. Uma mulher velha vestida com roupas indianas veio em nossa direção.

—Você é o mágico? Não se parece muito com um, mas...- ela perguntou para Jeff.

Ele olhou rápido para mim, parecendo perdido, sem ter o que responder. Eu não sabia qual era sua expressão por conta da máscara, mas queria ter visto. Percebi que ele já estava colocando a mão no bolso para, provavelmente, pegar a faca. Coloquei rapidamente minha mão sobre a dele, impedindo-o. Olhei para a mulher e sorri.

—Sim, ele é. Esse figurino será importante para a apresentação.

A mulher o olhou de baixo pra cima.

—Estão terrivelmente atrasados. Mas esperem ali no canto, o número de vocês é o próximo.- ela disse.

—Tudo bem.- falei.

Ela saiu de perto de nós e comecei a sentir um frio na barriga.

—Salvou nossas peles, dessa vez.- Jeff disse.

—E se o mágico de verdade chegar?

—Damos um jeito.

Não estava tão certa disso.

 Depois de um tempo esperando de pé, sem me mover, notei que Jeff não conseguia para quieto e, parecendo hiperativo, se sentava no chão, se levantava, balançava as pernas, se alongava, respirava rápido e pareceu tonto em certo momento.

—O que você tem?- perguntei, já agoniada.

—Eu não aguento estar perto de tanta gente. Eu preciso fazer alguma coisa. Eu preciso...

—Matar?- sugeri.

Ele colocou a mão no meu ombro.

—Exatamente.- falou.

O transtorno antissocial dele era muito comum, afinal, aquele era o assassino Jeff.

—O que fazer? Eles são muito... normais.- falou e deu uma risada nervosa.

“Você também já foi normal.”  Me segurei para não dizer... mas talvez eu estivesse errada.

 

 Ouvi risadas de crianças enquanto Thomas (ou seja lá quem ele fosse) se apresentava. Parei e pensei que ele poderia nos impedir de entrar no palco e me preocupei. Me virei pra Jeff.

—Ei... há algo que precisa saber.

Eu falava em um tom calmo e tentando encontrar as palavras certas. Ele virou-se para mim.

—O que foi?- a voz abafada por conta da máscara.

Engoli em seco.

—Precisamos ser discretos ao subir ao palco... ou melhor, não podemos deixar essa pessoa que está se presentando agora nos ver.

—Por que?- ele pareceu impaciente.

—Porque... essa pessoa é o Thomas.

Ele ficou olhando para mim em silêncio por alguns instantes e depois olhou para frente, sem dizer nada. Eu nem imaginava o que ele poderia estar pensando, por conta da maldita máscara que cobria seu rosto, e não pude ver sua expressão. Engoli em seco novamente e, de repente, eu não desejava mais tanto a desgraça de Thomas. Mordi os lábios de preocupação.

—E então, o que vamos faz...

—Shhhhhh...- ele me interrompeu, sem olhar para mim.

E não disse mais nada.

“Inferno” pensei.

 Quando o show de Thomas acabou, eu ouvi aplausos e gritos felizes. Eu queria saber o que ele fazia para deixar as crianças tão contentes. A velha que antes falara conosco, se aproximou novamente dizendo:

—Se apressem! Agora é a vez de vocês!

E nos empurrou para perto da grande cortina vermelha, por onde Thomas estava saindo. Ele estava com um nariz falso em formato de cone, pintado de preto e branco.  Arregalou os olhos quando nos viu, mas Jeff foi rápido demais. Segurou nos babados da gola dele e o puxou para perto de si, brusco, mas estranhamente discreto e murmurou algo em seu ouvido. Tentei me aproximar para ouvir.

—Não me faça adiantar sua morte.- ouvi Jeff sussurrar.

Ele falou rapidamente e votou a andar e eu o segui, passando por Thomas. Ele ficou parado, nos observando passar pela cortina, com uma expressão assustada. Balançou a cabeça negativamente para mim, como um pai decepcionado, mas naquele momento, ele era a minha decepção.

“Vamos ver o que vai fazer... Jack.”  pensei.

Seria burrice sair gritando por aí que o assassino local mais procurado estava infiltrado ali? Ele sabia que seria. Estava a bastante tempo ali para saber que seria. E novamente, a insana adrenalina começou a tomar conta do meu ser.

 Quando atravessamos a cortina, percebi que, a poucos metros, havia outra à nossa frente. Talvez a que atravessamos primeiro servia como um plano de fundo, para que a plateia não pudesse ver o camarim. Mas essa segunda cortina era um pouco mais alta, já que devíamos subir uma pequena escada para dar de frente à ela. Subimos cinco degraus e estávamos em cima do palco, com a cortina fechada à nossa frente. Ouvi o apresentador falar ao microfone.

—Senhoras e senhores, agora com vocês... o mágico de Hawkshead!

E as cortinas se abriram. O clarão cegante e quente do holofote iluminou  meu rosto e pude ouvir gritos e aplausos. De canto de olho, vi que Jeff fazia uma pose inicial para se apresentar, então também fiz uma: Dei um grande sorriso, joguei a cintura de lado e coloquei uma mão nela e a outra mão pra cima, a típica pose de ajudantes. Eu sabia o que estava fazendo ali até aquele momento, mas quando olhei aquelas crianças sorrindo e gritando, senti meu sorriso se desfazer e de repente, tudo parecia estar em câmera lenta. Eu sempre adorei crianças e eu as estava fazendo sorrir naquele momento, e eu amava isso. A inocência estampada naquelas faces de bochechas rosadas era fascinante. Os dedinhos seguravam balões, algodões doces e saquinhos de pipoca, enquanto seus pais os seguravam firmemente nos braços, como se nunca quisessem soltá-los, para aquela alegria durar para sempre. E logo me veio à mente que, em instantes, eu acabaria com a felicidade e tornaria aquelas mentes puras em trevas e sombras. Em morte e tragédia. Eu era o mal naquele momento.

 E vendo aquela agitação toda, meus olhos se dirigiram para um local no palco onde estavam duas pessoas. Duas pessoas que eu conhecia muito bem.

Meu pai e meu irmão.

Meus olhos se arregalaram. Jeff continuava acenando para as pessoas, que nos assistiam como se fossemos as melhores celebridades do mundo.

—Sabe como dizem...- Jeff sussurrou para mim, sem parar de acenar ou tirar os olhos da plateia.- A alegria do palhaço é ver o circo pegar fogo.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por chegar até aqui.
Nos vemos no próximo capítulo ♥



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