Entre o Amor e a Razão escrita por padu


Capítulo 15
Capítulo 14




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Elisabeta encarou os dois rapazes mantendo uma expressão confusa e, ao mesmo tempo, chateada. Ficou surpresa ao constatar que Camilo, morador recente do Vale do Café, não só sabia o nome, como também parecia íntimo do até então desconhecido. Olhou de relance para o tal de Roberto e notou que ele continuava mantendo um sorriso cínico nos lábios. O típico sorriso de homens que não conseguem ouvir "não" de uma mulher. Elisabeta Benedito julgava este o pior dos sorrisos, e o pior dos homens também.


— Desta vez você errou feio. – Camilo disse, enquanto se aproximava de Roberto. – A senhorita Elisabeta Benedito é uma moça comprometida, e eu, se fosse você, não me arriscaria cortejá-la novamente. – O Bittencourt bateu de leve no ombro do homem, antes de adverti-lo – Além disso, o felizardo tem quase dois metros de altura. 

Camilo encarou Roberto por alguns instantes. Pela expressão que apresentara no momento, o homem parecia estar assustado, ligeiramente nervoso e arrependido. Os dois rapazes se conheceram na época em que ambos faziam faculdade de Direito em Paris. Não eram melhores amigos, longe disso, mas haviam aprontado muito pelas ruas parisienses. Em suma, eram apenas dois brasileiros que queriam aproveitar o melhor que a juventude, o dinheiro e a noite na cidade luz poderia oferecer. Porém os anos passaram, as responsabilidades da vida adulta vieram e cada um seguiu seu rumo. Naquela noite, em pleno Vale do Café, numa situação completamente oposta ao que  já haviam passado, os dois se deram conta do quanto o mundo é pequeno. Ambos não se viam desde a formatura.


— Me desculpe Senhorita Benedito. Não quero parecer ofensivo, mas sua estonteante beleza me encorajou à aproximação.  Agora sei que a senhorita é comprometida e que fui um idiota. – Roberto disse, pausadamente. Depois retirou o chapéu e fitou Elisabeta por alguns instantes. Ela, no entanto, lhe retribuiu um olhar indiferente, pois não havia engolido o episódio.


Enquanto o rapaz tentava disfarçar o desconforto causado por ele próprio; Charlotte e as quatro irmãs Benedito concentravam suas atenções à cena que aos poucos foi se tornando o atrativo da noite.


— Aceito suas desculpas não por ser comprometida, mas pelo fato do senhor reconhecer que agiu como um completo idiota. – Elisabeta disse, num tom de voz alto e intimidador. Em seguida, pegou sua bolsa do balcão e se dirigiu até o outro lado do estabelecimento, onde suas irmãs e cunhada estavam. As meninas se mostraram bastante agitadas. Fizeram dezenas de perguntas aleatórias. Perguntaram quem era o rapaz, o que ele queria. Elisabeta estava se segurando para manter a calma e paciência com elas, pois estavam apenas curiosas e isso era comum. Principalmente naquela idade em que quase tudo é motivo de emoção e divertimento. Mas a verdade é que Elisabeta já havia se irritado o suficiente e a única coisa que ela queria no momento era voltar para casa. “Aquele dia não podia terminar pior!” – ela resmungou enquanto retomava seu controle.


— Boa noite, senhoritas. - Camilo retirou o chapéu, cumprimentando o grupo. – Elisabeta, vim me desculpar pela atitude de Roberto. É um antigo colega de faculdade cabeça-oca que nunca mede as consequências dos atos. – disse, voltando-se para Elisa. O rapaz mantinha o olhar veemente preocupado.


— Não se preocupe Camilo, está tudo bem! Obrigada por ter chegado bem no momento certo. Evitou que eu desse um pisão nele e quebrasse o salto do meu sapato. – Elisabeta fez uma careta.

As meninas involuntariamente riram com o comentário dela. Camilo também.


— Seria um ótimo castigo. - Disse ele, mantendo um sorriso. - Uma autodefesa bastante eficaz.


— Sim! Somos cinco meninas, mas temos nossas habilidades. – Os rostos subitamente encararam Jane. A garota corou logo em seguida ao perceber que havia interrompido a conversa. E sentiu-se ainda mais envergonhada ao constatar que o jovem Camilo a encarava atentamente, assentindo com a cabeça. O rapaz desviou o olhar dela e disse, mantendo um sorriso largo:


— Elisabeta, trago boas notícias! Darcy me telefonou hoje à tarde e disse que estará de volta ao Vale ainda essa semana. Ele telefonou para sua casa, mas você não estava. Então me deixou o recado. Coincidentemente nos encontramos aqui.


Um sorriso iluminado invadiu a face da jovem. E então ela voltou a suspeitar que aquele dia fosse sim terminar bem melhor.


— Ah! – Elisabeta disse, em um suspiro. - Nós estivemos entretidas o dia inteiro. Saímos de casa cedo da tarde. – O sorriso permanecia estampado em sua face enquanto falava. – Muito obrigada pela informação, Camilo. Estava ansiosa por notícias de Darcy. Infelizmente ele também nunca pôde atender meus raros telefonemas... – ela fez uma breve pausa. – Podemos combinar um chá amanhã à tarde em minha casa! O que você acha?  - Sugeriu, empolgada.

Camilo fora pego de surpresa com o convite, mas por alguma razão ele adorou a oferta.


— Me parece uma excelente ideia. – respondeu, satisfeito. Após trocar mais algumas palavras, despediu-se das meninas, solenemente. Ao falar com Jane, sentiu uma corrente elétrica invadir seu corpo quando tocou a mão enluvada da jovem. Era algo incrível. Uma sensação nova, até. Jane lhe retribuiu um sorriso tímido. Aquele sorriso fez as pernas de Camilo tremer e ele se sentiu imediatamente confuso. Era algo inédito e ele estava gostando da sensação. Afinal de contas, em uma conversa em particular que teve com Darcy, o jovem confessou ao amigo que Jane Benedito era a moça mais bela que ele já havia visto em toda sua vida. Mas ele não esperava que aquela beleza e doçura pudessem enfeitiçá-lo de tal modo e em tão pouco tempo.

•••

O chá da tarde sem dúvidas fora um dos acontecimentos mais inusitados para as Benedito nos últimos dias. Ao aparecer na porta, levando consigo uma delicada caixa de bombons; Camilo Bittencourt teve a agradável surpresa de ser recebido por Dona Ofélia. A senhora olhou para o rapaz e,  em seguida, para a embalagem que ele tinha em mãos. Havia um brilho nos olhos dela. O jovem sentiu-se sem jeito e acabou entregando os chocolates - que seriam para Jane - a ela. Ofélia recebeu a caixinha com um sorriso largo emoldurando o rosto e encheu Camilo de regalias e pompas durante a tarde inteira. Ela já sabia sobre sua visita e fez questão de recebê-lo da forma mais gentil possível em sua casa. Ordenou que as quatro filhas, exceto Elisabeta, dedicassem horas para ficarem ainda mais belas em seus melhores vestidos e penteados. O modo casamenteiro da matriarca estava mais do que ativado e prontíssimo para entrar em ação.


— Camilo, meu jovem, soube que ontem à noite você livrou minha Elisabeta das garras de um casanova. 

A conversa entre o grupo ia agradavelmente bem. Até o momento em que Dona Ofélia teve a brilhante ideia de tocar no assunto que rendeu horas da noite anterior. Ela literalmente obrigou Elisabeta a contar em detalhes tudo que havia se passado. Ofélia não perdeu a oportunidade de dar uma bronca na filha e de alertá-la sobre seu compromisso com Darcy e sobre o que as pessoas do Vale poderiam falar a seu respeito. Entretanto, Elisabeta deu de ombros. Para ela, os comentários alheios não faziam a mínima diferença.


Camilo deu uma risada contida e educada. É uma verdade absoluta que Ofélia havia acertado em cheio! Roberto se encaixava perfeitamente na categoria de mulherengo. Camilo por fim concluiu que era impossível não se divertir com a forma íntima e excêntrica com que Ofélia Benedito desenvolvia as conversas. Aos poucos ele foi se sentindo mais à vontade na casa e naquelas companhias. Aquela senhora tinha o dom de envolver as pessoas por possuir um carisma inigualável. De certa forma, ele já se sentia um tanto confortável  perto daquela família. Por consequência, ele pôde entender perfeitamente o que fazia Darcy se sentir cada dia mais feliz e o porquê dele querer manter aquela felicidade intacta. Independente de qualquer coisa.

 
— Eu acho que dei apenas uma ajudinha, dona Ofélia. Elisabeta sabe se defender sozinha muito bem. Não é mesmo, Elisa? – Camilo disse, em tom divertido. Em seguida deu uma piscadela e Elisabeta sorriu, balançando a cabeça. – Ouvi falar que as garotas Benedito possuem ótimas habilidades para sair de qualquer situação embaraçosa. – Ao concluir seu pensamento, olhou diretamente para Jane. Um olhar altamente penetrante, quase cúmplice. A moça inclinou a cabeça de lado, meio sem jeito. As outras meninas sorriram e começaram a cutucar a loira, discretamente. Aos poucos, todos puderam se dar conta que as trocas de olhares entre Camilo e Jane eram recíprocas e mais frequentes que o normal. Sempre que um dos dois falava alguma coisa, por mais boba que fosse, intuitivamente lá  estava o outro admirando, contemplando, se apaixonando por cada palavra, gesto, opinião...


Camilo se despediu três horas depois. O ambiente estava romântico, leve e agradável assim como um campo verde repleto de flores. Jane subiu para o quarto suspirando como quem sentia o aroma de cada uma delas. Era a primeira vez que um rapaz mexia tão intensamente com seus sentimentos. Elisabeta entrou no quarto em seguida, cantarolando uma famosa marcha nupcial. Jane apenas revirou os olhos, não podendo esconder o sorriso.

 - É impossível que eu suba ao altar antes de você, Elisabeta – ela disse, com firmeza. 

— Eu não teria tanta certeza assim. A última vez que vi olhares tão apaixonados foi quando assisti a um filme de romance em Londres. – A irmã mais velha retrucou de bom humor. 

— Ah, é  mesmo? Então, nesse caso, você e Darcy Williamson poderiam ser os protagonistas deste filme aí... Pois parecem dois bobos apaixonados quando estão próximos um do outro. Aliás, quando estão separados também. Talvez até mais se eu levar em conta o seu jeito sempre que fala sobre a falta que sente dele. – Retrucou pensativa.

 
— Ok, Jane Benedito, você venceu! Amo Darcy e estou morrendo de saudades dele. Mas vamos, me diga, ou melhor, me confesse. – Elisabeta dirigiu à Jane seu olhar mais travesso. – Você e Camilo... Hein?

Elisabeta viu o rosto de Jane começar a parecer um pimentão, de tão vermelho.


— Estamos iniciando uma amizade, Elisa. Ele é um rapaz agradável...

— Agradável? – Elisabeta arqueou uma das sobrancelhas, fingindo surpresa. – É. Realmente eu não poderia esperar uma resposta mais alagada de uma pessoa tão modesta quanto você, Jane Benedito.

— Gentil... Atencioso... – fez uma pausa torturante e respirou fundo. – E... Bonitinho. Satisfeita Senhorita cupido?! – Questionou, sorrindo.

Elisabeta balançou a cabeça, provavelmente estava se acabando de rir por dentro diante da pureza da irmã.

— E que está pouco a pouco roubando o coração da minha irmãzinha. Não é? – ela engatinhou até a cabeceira da cama, onde Jane estava. Suas mãos estavam como duas garras, presumindo uma sessão de cócegas.

— Para, Elisabeta! – Jane ordenou, escondendo o rosto com as mãos –, não quero confundir as coisas.  Vou dar tempo ao tempo.


— Tempo ao tempo... Sei. – a mais velha comentou, divertida. - Quero ser a madrinha hein? Somos quatro, mas sou prioridade.

 
Jane sorriu.

 Segundos depois se levantou, dirigiu-se até a irmã e a abraçou. No fundo ela queria que aquele devaneio de Elisabeta se concretizasse. Por que não?

•••


Elisabeta decidiu manter-se completamente focada no trabalho. Pois, quando a mente está conturbada, o trabalho costuma ser uma ótima válvula de escape. Foi com esse pensamento que Elisabeta estabeleceu suas atividades diárias nos dias que se seguiram. É certo que ela havia prometido momentos de diversão às irmãs e a Charlotte, mas ela se sentia em dívida com Felisberto. A cada dia seu pai prolongava as horas de trabalho no escritório. Parecia estar sempre cansado e atarefado. Muitas vezes ele não conseguia largar os afazeres cedo e perdia momentos de descontração em família no jantar. Aquilo atingia diretamente a consciência de Elisabeta. O tempo com seu pai era tão precioso. Ela o amava tanto. Desta forma, fazer vistorias na fazenda ao lado dele, apesar de ser uma atividade um tanto cansativa, passou a ser algo bastante prazeroso para ela.

 As plantações de café estavam belíssimas. Os concorrentes que se preparassem. O ano prometia uma colheita satisfatória e a praga que havia atingido parte delas era um problema finalmente resolvido. Felisberto e Elisabeta voltavam para casa sempre no fim da tarde, depois de uma longa jornada de trabalho. Pai e filha presenciavam diariamente um pôr do sol magnífico. Aquela imagem divina era o símbolo que marcava a infância de Elisabeta. Das tantas vezes em que ela fazia aquele mesmo trajeto com o pai nos seus cinco ou seis anos de idade. Na quinta-feira Felisberto e Elisabeta chegaram a casa no início da noite, completamente exaustos. Ele subiu para o quarto para tomar um banho relaxante. Ela permaneceu na sala tentando conter a felicidade. Darcy havia acabado de telefonar.

Céus! Que saudade da sua voz Elisabeta Benedito.


Darcy sabia perfeitamente que a saudade era recíproca. Mas a resposta em forma de pergunta que  Elisabeta proferiu o fez suspeitar que a saudade que ele sentia era ainda maior:

— Somente da voz?

Seria um jogo ou ela realmente estava falando sério?

Houve um silêncio entre os dois.

Elisabeta balançou a cabeça, dando uma risada sugestiva. O que Darcy Williamson, com seu jeito todo introvertido, responderia? Ela tentou imaginar...

— Você está tentando me torturar, Elisabeta? Não faça isso, por favor! – Ele exclamou, quase em súplica.


— Possivelmente... Quando iremos dissipar essa tortura? – Ela perguntou, sendo surpreendida por um longo suspiro de Darcy. A moça aceitou aquele som como resposta.

Apesar da conversa quase íntima; Elisabeta estava a ponto de quebrar o clima e perguntar sobre o desenrolar da reunião que o namorado havia tido com Julieta. Mas aquela ligação era tão preciosa que ela simplesmente ignorou a ideia por completo. Mesmo que soasse um tanto egoísta, ela torcia para que ele também evitasse falar sobre negócios. Pelo menos naquele momento.

— Amanhã! Deixo São Paulo hoje mesmo, esta noite.— Para a surpresa de Elisa, ele respondeu animadamente sua pergunta anterior.

E ela mal podia esperar pelo amanhã. Aliás, eles.


Darcy perguntou por Charlotte e, nessa ocasião, Elisabeta aproveitou para lhe contar tudo o que ocorreu durante a semana. As aventuras e também as desventuras vividas. Na intenção de provocá-lo um pouco mais, Elisabeta comentou sobre o ocorrido na casa de chá alguns dias antes. Ela não se conteve ao perceber que, pelo tom da sua voz, Darcy estava mordido de ciúmes do outro lado da linha. Ela riu durante alguns segundos e logo ele caiu na risada também. Por sorte Roberto já havia regressado ao Rio de Janeiro. Camilo havia informado que ele estava no Vale do Café apenas a trabalho. Enquanto mantinha-se entretida, Elisabeta ouviu passos mais do que familiares vindo em sua direção. Ofélia logo descobriu que era Darcy na linha e, abruptamente, tomou o telefone da mão da filha. Como de costume, começou uma longa conversa com o genro. Quando Elisabeta pegou o telefone de volta, Darcy e ela apenas se despediram com as palavras mais românticas e açucaradas que ambos conheciam bem.

Duas horas depois daquele telefonema Darcy pegou suas malas, passou na mansão Bittencourt e se despediu de Julieta. Apesar da pressa, a Rainha do Café pediu alguns minutos ao sócio para lhe informar que Susana havia aceitado sua proposta e estava de malas prontas para viajar a capital. Darcy sentiu-se aliviado diante de tal notícia. Ficou satisfeito por saber que, apesar das atitudes altamente questionáveis, ainda existiam resquícios de bom senso em Susana Adonato.

 A estrada que liga São Paulo ao Vale do Café não estava em seu melhor  estado. Devido às últimas chuvas, a situação era quase de calamidade pública. Havia buracos e muita lama para todos os lados. Mesmo com muitos contratempos, Darcy não imaginara o que estava por vir. Seus últimos dias em São Paulo haviam sido de muito trabalho e sua mente estava cheia. De repente, uma neblina intensa começou a cair. Darcy acionou o para-brisa, mas sua visão estava turva e embaçada. O rapaz não sabia definir ao certo o que havia atravessado seu caminho. Através de um reflexo ele girou a direção o mais rápido que pôde para desviar do que parecia ser um animal de grande porte. A ação foi rápida, Darcy conseguiu desviar a tempo e o animal saiu correndo pela mata. Mas a velocidade fora tão grande que o carro não se manteve em equilíbrio o suficiente para prosseguir viagem.


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Notas finais do capítulo

Feliz 2019, gente!

Que seja um ano cheio de positividade para tods nós. ♥



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