Nada é eterno escrita por Lisa Granger


Capítulo 1
Único




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O vento bate nas minhas costas jogando meu cabelo pra frente, que se enlaça e desenlaça em frente aos meus olhos, irritada coloco algumas mechas atrás da orelha e continuo a andar, tão devagar quanto posso sem que precise admitir para mim mesma que estou enrolando. Olho ao redor no exato momento que passo em frente a vitrine de uma loja e no reflexo vejo que minhas orelhas saem do meio do cabelo parecendo orelhas pontudas de elfo e até isso me traz a lembrança da risada dele, abaixo a cabeça e abraço meu próprio corpo, andando mais rápido na esperança de espantar a lembrança e a dor que vem com ela.

Um bom tempo se passa até que eu levante o olhar do passeio e quando o faço vejo que estou chegando perto da casa dele, respiro fundo e diminuo ainda mais o passo, pra que fingir, eu estava mesmo enrolando e por que não o faria? È claro que teria que encarar a verdade uma hora outra, mas não precisava ser logo, o quanto eu pudesse atrasar, eu atrasaria. Minutos se passam até que eu finalmente chegue em frente a casa dele, travo e a fico observando por longos minutos a fachada da frente, parada na beira da calçada, com os braços ainda me envolvendo, o cabelo chicoteando na frente do rosto. As janelas estão fechadas é claro, ninguém estaria ali agora, estariam todos no ... no ... é, eu ainda não consigo dizer, porque dizer ou mesmo pensar seria admitir o que aconteceu e ainda não estou pronta para isso. Será que levaram a irmã dele? Não, óbvio que não, não há motivo para uma criança tão pequena passar por isso, ela nem entenderia o que está acontecendo.

As lembranças vem se arrastando até que tomam conta dos meus pensamentos e eu já não possa escapar. Lembro dele me ensinando a cozinhar, ou melhor, tentando e rindo dos meus erros mas sem perder a paciência, até que eu finalmente desisto e ele toma conta enquanto eu só observo. Lembro de mais tarde ele me beijando e eu rindo fingindo tristeza por não poder mais duvidar da sua sexualidade, ele revirando os olhos e me olhando com aquela expressão irritada que eu conheço tão bem, avançando ainda mais na noite nós dois na cama, eu enroscada nele, uma mão dele me fazendo carinho e a outra apoiando a cabeça, eu o olho e sorrio dizendo que nossa primeira vez não poderia ter sido melhor, seus olhos brilhando pra mim daquele jeito safado que demonstra que ele sabe disso, nós conversando até adormecer ...

Meus pensamentos são interrompidos e só então eu percebo as lágrimas escorrendo silenciosamente pelo rosto, as seco com uma mão enquanto pego o celular que vibrava no bolso do casaco e recuso a ligação. Guardo novamente no bolso e volto a caminhar, os passos alternando entre rápidos e lentos, ao mesmo tempo que queria fugir dali correndo sabia que quanto mais rápido andasse mais rápido chegaria á um destino pior. Levanto o olhar e estou passando em frente ao campo aberto e por um segundo posso ver nós dois andando ali, eu emburrada por ele ter me acordado em plena madrugada mas ainda sim o seguindo, não que tivesse opção, pois ele me puxava pela mão e essa visão me faz parar abruptamente, trombando com um homem que vinha atrás que sai resmungando, e eu percebo isso com a pequena parte do meu cérebro que não está totalmente concentrada nas visões que aparecem no campo.

São flashes que aparecem e somem, nós dois brincando de pegar (ele ganha), caindo na grama rindo, depois se aquietando e observando as estrelas sentados na grama, eu apoiada em seu ombro e vão continuando até aquele momento, quando eu disse que o amava, não pela primeira vez, mas quando ele soube que era do jeito que faria nós dois darmos certos e finalmente acabam com nós indo embora de mãos dadas.

As lágrimas voltam a escorrer e dessa vez eu não as seco, simplesmente volto a andar, agora apressadamente, porque eu quero que aquilo acabe logo pra eu poder voltar a me isolar, a fugir de tudo que me lembre ele, pra fugir da minha vida.

Não demora muito para que eu veja os portões cinzas ao longe, cada vez se aproximando mais até que estou de cara com ele e não consigo forçar minhas pernas a se mover, meus olhos vagam até o amontoado de pessoas ao longe e eu vejo os olhos dela, amendoados e desesperados, eles que me libertam da paralisação e eu volto a andar, me desviando dos obstáculos e finalmente chegando ao seu lado, seguro sua mão e enlaço nossos dedos, mostrando que estava ali com e por ela deixando minha dor de lado e fugindo de mim e me escondendo nela,  finalmente ergo o olhar a tempo de ver o caixão ser abaixado lentamente.


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