O Intruso escrita por thierryol1


Capítulo 9
Esqueletos no Armário




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/767726/chapter/9

"Se a gente nunca mais se ver, mamãe, eu espero que você saiba: eu te odeio."

 

10 Anos Atrás

Um incêndio extremamente violento queimava uma casa nos subúrbios de Salt Lake City. Bombeiros corriam pra todo lado tentando salvar as casas próximas.

Na casa morava uma mulher, seu noivo e sua filha adotiva, de quinze anos. A garota foi à única sobrevivente.

A garota foi mandada para um abrigo e ficou lá até seus dezoito anos, quando recebeu a herança de sua mãe.

As pessoas tinham pena dela: uma garota tão jovem, devia ser terrível perder os pais num incêndio acidental. Mas eles nem imaginavam que Lucie Freewood era uma adolescente que guardava muitos segredos.

*****

— Sua desgraçada!

Rebecca se virou e fez uma cara muito assustada quando viu Lucie chorando segurando uma faca.

— Você... O tempo todo...

— Não é o que você tá pensando! E-eu... – Rebecca tentou se explicar, mas Lucie avançou pra cima dela.

— Você matou Happy! Você o matou! EU VOU TE MATAR SUA VAGABUNDA! – Berrou Lucie, com lágrimas descendo dos seus olhos.

Lucie tentou acertar a faca na garota, que desviou.

— Eu não matei cachorro nenhum!

Rebecca correu até a cama e pegou sua bolsa, mas Lucie foi atrás e tentou acertar a faca pela segunda vez na outra garota. Ela desviou, mas a faca cortou a alça da bolsa, que caiu e espalhou um monte de páginas do diário de Lucie, além de uma coleção de borboletas.

— Por que você está com as minhas coisas?

Rebecca hesitou por um momento.

— Me responde sua miserável!

— POR QUE VOCÊ É A ASSASSINA!

Lucie mudou sua feição de fúria para confusa.

— O que disse?

— Eu gravei toda conversa que você teve com Amanda. Eu fui até a polícia e perguntei para um amigo meu que é policial qual eram as evidências que eles tinham contra o assassino da borboleta, e então eu vim aqui pra pegar tudo que pudesse servir de prova contra você. Mas aí eu achei o seu cachorro morto e tentei reviver ele.

— Sua desgraçada.

Lucie atacou Rebecca com a faca mais uma vez. Ela conseguiu desviar, mas a faca fez um corte superficial em seu rosto.

— Sua maluca! ASSASSINA! – Rebecca começou a gritar.

Lucie abaixou a faca. Algumas gotas de sangue pingaram no chão.

— Por que você está fazendo isso?

— Por que você é uma doida psicopata e eu vou impedir que você machuque Abel!

Lucie franziu a testa.

— Abel? Isso tem a ver com ele não é mesmo?

Rebecca se calou.

— É. Você gosta dele e não suporta saber que eu sou mais próxima dele do que você jamais será!

— Cala a boca!

— Pois deixe eu te contar uma coisa: eu e Abel estamos quase namorando. – Disse Lucie, sorrindo.

— CALADA! – Rebecca tampou os ouvidos.

— Ele nunca vai se interessar por uma vagabunda invasora igual você.

De repente Rebecca apenas olhou friamente para Lucie e começou a rir.

— Ah é? E você acha que ele vai se interessar por alguém que já tentou se matar? Ou por alguém que é bipolar? OU POR ALGUÉM QUE JÁ ABORTOU UM FILHO?! – Rebecca começou a jogar várias páginas do diário de Lucie no chão, rindo. – Com o que eu tenho aqui, posso até não conseguir te incriminar, mas com Abel você também nunca terá chance de ficar. E eu sei que você sempre precisou de alguém pra te amar, não é mesmo Luciezinha?

— Cala a boca.

— Aqui, escrito muito bem: "Eu me sinto um lixo. Eu não consigo me amar, e duvido que alguém consiga. Nem minha mãe me amou. E sinceramente, eu também nunca a amei. Eu jamais vou conseguir perdoar ela pelo que ela fez."

— Cala a boca. – Lucie parou de chorar e olhou séria para o chão. Suas mãos começaram a tremer.

— Olha, aqui nessa página está escrito outra coisa: "Comecei a ver o homem sem rosto novamente desde que parei de tomar minha medicação. Estou com medo de estar enlouquecendo e ir parar num manicômio. Ele está cada vez mais perto de mim. E eu acho que sei quem ele é."

— Cala a boca...

— Opa, essa aqui eu ainda não tinha lido: "É como se eu estivesse vivendo um inferno. Aquelas memórias não saem da minha cabeça. Eu achei que ia ser livre depois de tudo que fiz mas não está sendo bem assim. Todo dia eu estou tendo pesadelos que me fazem lembrar tudo que aconteceu. Eu queria só ter paz. Será que morrendo eu vou conseguir?" – Rebecca olhou para Lucie com um sorriso. – Então, me fala mais, o que te aconteceu?

— Cala a boca...

— O que foi que você fez? Hein Lucie?

Lucie pegou seu celular e levou até o ouvido. Rebecca ficou séria.

— Amanda... – Lucie fez uma voz quase inaudível. – Mande a polícia pra cá, rápido... Rebecca me esfaqueou. Por favor, me salva...

Dizendo isso ela desligou subitamente o telefone. Rebecca estava chocada.

— Você está louca? Você que tentou me esfaq--

Antes que Rebecca terminasse de falar, Lucie enfiou a faca na sua própria barriga e a jogou na direção de Rebecca. A garota pegou a faca e começou a gritar.

— Você... Você é maluca!

— Acho melhor você começar a correr...

Os olhos de Lucie estavam diferentes, sem brilho. Rebecca também notou que a voz dela estava diferente, mais grossa.

— SOCORRO! ABEL! ALGUÉM ME AJUDA! – Lucie começou a gritar.

Rebecca jogou a faca no chão e saiu correndo. Lucie escondeu a bolsa debaixo da cama.

Após alguns minutos Lucie escutou a porta abrindo e Abel gritando por ela. Sua camisa estava toda vermelha. Havia uma poça de sangue no chão do seu quarto.

Lucie não aguentou nem por um segundo a mais: suas vistas escureceram, e ela caiu no chão, desmaiada.

*****

Lucie acordou numa cama. Seus olhos demoraram um pouco até se ajustarem a luz. Amanda estava cochilando numa poltrona do lado da cama de hospital onde Lucie estava repousada.

— Amanda? – Disse Lucie, com uma voz seca.

A garota despertou da poltrona e andou até o lado de Lucie.

— Que bom que você acordou. Eu estava preocupada com você. – A garota pegou na mão de Lucie.

Antes que Lucie pudesse dizer algo, o detetive Fischer e o policial Caleb entraram abruptamente no quarto.

— Lucie Freewood. Fico feliz que tenha acordado. Você poderia responder algumas perguntas pra gente? – Indagou Fischer.

— O que? Vocês não tem respeito? Ela acabou de acordar! – Amanda falou aumentando sua voz.

— Você, moça, poderia esperar lá fora com o policial Caleb? Preciso fazer algumas perguntas para você também. – Fischer respondeu, friamente.

Amanda fechou a cara e saiu com Caleb. Fischer ficou alguns minutos parado, olhando nos olhos de Lucie, que nada falou.

— Então, você pode me explicar o que aconteceu? – Lucie respondeu, quebrando o silêncio.

— Engraçado, eu estava esperando que você me explicasse o que aconteceu...

— Eu... Eu não me lembro.

— Não se lembra? – Questionou Fischer, intrigado.

— Bem... A última coisa que me lembro é de chegar em casa e encontrar o corpo do meu cachorrinho. E então... Eu realmente não me lembro, é como se uma parte da minha memória tivesse sido apagada.

O detetive suspirou fundo e se sentou onde Amanda estava se sentada.

— Bem, você ligou para Amanda e disse que Rebecca tinha entrado na sua casa e estava te atacando. Ela rapidamente ligou para a polícia e foi correndo até lá. Quando ela chegou, encontrou você desmaiada, com um corte profundo na barriga.

— Rebecca me atacou? Por que ela faria algo assim? – Lucie estava muito confusa. Ela não conseguia se lembrar de nada.

Fischer olhou a garota com um olhar frio.

— Bem, mas tem várias coisas que não se encaixam nessa história. Como o fato do seu cachorro tem sido encontrado morto de uma forma extremamente parecida com os assassinatos que estão ocorrendo com os membros do clube de literatura. Ou o fato do símbolo do serial killer ser uma borboleta em forma de caveira, um símbolo bem parecido usado pelo Ceifador no seu livro O Escultor de Pesadelos.

Lucie arqueou uma sobrancelha.

— Espera... Você está querendo dizer o que? Que eu sou suspeita? É isso? – Lucie levantou suas mãos, num gesto de protesto.

— O que é isso senhora Freewood? Onde você sujou suas mãos com tanta ferrugem? – Perguntou Fischer, ao ver as mãos de Lucie completamente sujas.

— Hm? – A garota inspecionou suas mãos. Aparentemente ela não havia visto essas marcas de ferrugem em suas mãos. – Eu não sei. Mas isso não importa, podemos focar por favor? Eu sou mesmo uma suspeita?

Fischer suspirou fundo e sorriu.

— Bem, é muito cedo para acusar você ou Rebecca, visto que não temos o depoimento dela ainda. Mas sabe o que eu acho mais estranho? É o fato de Rebecca ter aparecido na delegacia algumas horas antes do, hm, incidente de vocês, e ter dito que você era a assassina e era louca, que estava vendo vultos e ouvindo vozes e tudo mais. Eu não acreditei, lógico. Mas ela disse que ia conseguir provas.

— O que... O que você está insinuando?

— Eu? Não estou insinuando nada, apenas gostaria de deixar claro esse fato. Ah, achei bem estranho também que a faca que Rebecca supostamente usou também tinha suas digitais. Estranho né?

Lucie estava perplexa. Ela não conseguia acreditar que era suspeita.

— Bem, enquanto não tivermos o depoimento dela continuaremos de olho em você, senhora Freewood.

Lucie estava prestes a falar algo quando o celular de Fischer começou a vibrar freneticamente. Ele fez um sinal com a mão e se levantou, indo atender a ligação no banheiro. Após alguns minutos, ele voltou, sério.

— Bem, parece que vamos continuar de olho em você por um bom tempo.

— O que quer dizer?

— Rebecca finalmente foi encontrada, mas duvido que ela possa nos dar alguma informação do que aconteceu. – O detetive passou a mão nos cabelos, aparentemente transtornado.

— Ótimo, onde ela está?

Fischer olhou sério para Lucie por alguns instantes, antes de subitamente responder:

— Rebecca foi encontrada morta, na saída da cidade. Parece que foi suicídio.

*****

— Então, você é amiga de Lucie há muito tempo?

— Não, somos amigas apenas há algumas semanas. – Amanda respondeu, com um sorriso.

— O que você acha que aconteceu?

— Eu não sei... Lucie e Rebecca tiveram algumas desavenças ultimamente.

— Hm. Interessante... Mas eu acho melhor deixar Fischer fazer as perguntas pra você. Ele pode ser bem, digamos, resmungão com seu serviço. – Caleb disse, sorrindo.

Amanda riu levemente. Os dois ficaram em silêncio alguns segundos, esperando o detetive terminar de interrogar Lucie.

— Você gosta de ler? – O policial perguntou, apontando para um livro que Amanda estava segurando em suas mãos.

— Bem, eu estou no clube de literatura, né?

— Ah é mesmo, haha!

Amanda deu uma risada baixa.

— Mas este aqui é um livro que Lucie escreveu. Na verdade é o primeiro livro dela. Eu comecei há ler algumas semanas, terminei ontem à noite.

Caleb trocou seu sorriso simpático por uma feição mais séria.

— Você disse que terminou ele ontem? Será que você se importaria de me emprestar? Deu-me curiosidade agora para saber como Lucie escreve.

Amanda respondeu positivamente e entregou o livro para o policial.

O Escultor de Pesadelos.

Caleb leu a sinopse do livro, mas quando estava prestes a comentar algo com Amanda, a porta do quarto de Lucie foi aberta subitamente. Fischer saiu, e disse para Caleb que era hora de ir. O policial se despediu de Amanda com um beijo no rosto e agradeceu pelo livro.

Quando estavam caminhando pelos corredores do hospital, Caleb falou:

— Você não ia interrogar Amanda?

— Temos um assunto mais urgente para cuidar agora. Rebecca aparentemente se matou na saída da cidade, enforcada no alto de uma velha caixa d'água.

— E por que você não deixou alguém cuidar disso? Nós não estamos focados no assassino da borboleta?

Fischer continuou andando em silêncio por alguns instantes. Então ele falou:

— Se meu palpite estiver correto, esse suposto suicídio está diretamente ligado ao assassino.

Os dois continuaram marchando para a saída do hospital. Quando passaram pela porta principal, Fischer falou:

— Deixe para flertar com os outros quando não estiver em horário de serviço, Caleb.

*****

Meia hora depois, Caleb e Fischer chegaram ao local onde o corpo de Rebecca estava pendurado. Caleb ficou apenas andando de um lado pro outro, enquanto Fischer realmente procurava por qualquer pista. Vários minutos depois, o detetive gritou:

— Caleb! Você pode por favor subir e ajudar os policiais a retirarem o corpo?

— Não achou nada chefe?

Fischer ficou calado. Caleb sabia que aquela era a maneira dele dizer 'não'.

O policial se apressou e começou a subir pelas barras de ferro enferrujadas da antiga caixa d'água. Após algum tempo, ele conseguiu descer o corpo e os paramédicos e policias estavam levando-o.

— Esperem! – Gritou Fischer.

Ele chegou perto da maca onde o corpo estava e inspecionou as mãos.

— Caleb, venha aqui. Mostre-me suas mãos.

O policial se aproximou, sem entender nada. Fischer sorriu aos observar as mãos de Caleb.

— Ela não se matou, estamos realmente numa cena de homicídio, como eu havia pensado.

— Como assim chefe?

— Suas mãos estão cheias de ferrugem. Algo óbvio visto que você escalou uma caixa d'água antiga. Mas as mãos de Rebecca estão extremamente limpas, então seria impossível ela subir e se enforcar sem sujar as mãos. O que significa que o assassino deixou esse detalhe passar quando encenou o suicídio.

Caleb estava surpreso.

— Bom, isso pelo menos significa que Lucie é inocente. Podemos excluir ela da lista de suspeitos.

Fischer se virou para o policial e sorriu.

— Caleb, quero que você consiga as gravações das câmeras do hospital onde a senhora Freewood está.

— Hm? Tudo bem, mas para quê?

— Caleb... Nesse momento, Lucie Freewood é nossa maior suspeita.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "O Intruso" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.