Hey, Angel escrita por Bianca Vivas


Capítulo 1
Hey Angel


Notas iniciais do capítulo

Essa fic é um pedido da Mariana Dias. Ela é livremente inspirada na música Hey Angel do One Direction.
Espero que gostem. Especialmente você, Mari!



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Heitor olhou para o céu acreditando que, em algum momento, a veria ali, entre as nuvens azuis. Havia dias que ela não aparecia, a menina de cabelos escuros. Ele sentia sua falta, sentia falta da doce proteção que ela lhe trazia e do brilho que emanava. Mas a menina parecia não se importar, não havia sinal de suas asas no céu de verão.

A noite chegou e Heitor desistiu de esperar. Foi caminhando para dentro perguntando-se o que ela estaria fazendo naquele momento. Será que o observava de alguma maneira? Será que, vez ou outra, ela se perguntava o motivo dele olhar tanto para o céu? O motivo de todos os humanos mortais encararem a superfície azul e distante?

Ele sacudiu a cabeça para chacoalhar os pensamentos que tinha para fora dela. Óbvio que a resposta para suas perguntas era não. Ele era um idiota de pensar que ela se importava tanto assim com ele. Anjos tinham mais o que fazer do que se perguntar os motivos dos humanos terem ações tão estranhas.

Mesmo assim, ele ainda queria que ela se importasse. Ele gostava dela. Ela vinha sendo sua única amiga desde sempre. Não podia abandoná-lo. Não podia ficar no passado.

Foi então que Heitor sentiu um calafrio passar por seu corpo. Será que ela estava rindo dele naquele exato momento? Estaria a menina de cabelos negros e asas brancas olhando para baixo, para a Terra, e rindo do fato dele ficar se apegando ao passado? Só podia ser isso. Ela não vinha porque o desprezava.

Ele era apenas um humano, que não deixava o passado ir embora. Não vivia o futuro. Ela era um anjo, feita para propósitos muito maiores do que poderia prever a vã filosofia da humanidade.

Heitor começou a chorar, então. Gostaria de ser igual a ela. Desprendida. Livre para voar de alma em alma, de canto em canto. Chorou até seu nariz entupir e ele ter de limpar o catarro na roupa azul clara.

Durante o choro, sentiu que suas emoções o dilaceravam.

Foi aí que percebeu: talvez seu anjo sentisse uma espécie de inveja dos humanos. Talvez, ela quisesse ser igual a ele, sentir tudo muito intensamente. Porque as emoções eram muito bonitas, muito brilhantes. Ele gostava de sentir. Talvez ela também quisesse sentir. E se afastara porque não suportava vê-lo sentindo tudo aquilo sem ter pensamentos ruins.

Mal esse pensamento terminou de se formar em sua mente, Heitor voltou a chorar.

Imaginou seu anjo tentando virar humana. De todas as formas. Como deveria ser doloroso para ela. Viu, perfeitamente, seu rosto translucido tingido de vermelho. As lágrimas caiam e ele não podia limpá-las. Os fios negros emaranhavam-se no rosto molhado e ele não podia arrumá-los. Teve vontade de gritar para ela:

⸺ Você está tentando vir para o outro lado?

De fato, gritou. Em seguida, fechou os olhos e voltou a chorar. Era um choro silencioso.

⸺ Algumas vezes ⸺ disse uma voz melodiosa.

Heitor, então, abriu os olhos e levantou a cabeça. Quase gritou, tamanho o susto que levou ao ver, parada em frente a ele, a menina de cabelos negros. Ela esboçava um sorriso triste e tinha lágrimas em seus olhos azuis. Suas asas, quase translúcidas, estavam caídas. Sua aura emanava tristeza, confusão e certa melancolia. Ainda assim, Heitor a achava a menina mais bonita da Terra e do Céu.

⸺ Algumas vezes, Heitor ⸺ ela repetiu ⸺, algumas vezes eu quero passar para o lado de cá.

A menina cobriu o rosto com as mãos, então. Heitor viu seu rosto pálido ganhar um tom vermelho, igual ao da sua imaginação. Ele teve mais vontade ainda de chorar. Ela era sua musa. Sua protetora. Seu anjo. Não suportava vê-la sofrer.

⸺ Não chore ⸺ ele se aproximou dela. ⸺ Não chore, por favor. Ser humano não é tão legal quanto parece.

O Anjo de Heitor abaixou as mãos. Ela deu um leve riso e diminuiu ainda mais o espaço entre os dois. Só parou de se arrastar para frente quando estava próxima o suficiente para tocar o rosto do garoto. E assim o fez. Passou seus dedos macios sobre a face dele e, depois, segurou suas mãos.

⸺ Eu não estou chorando por querer ser humana ⸺ ela explicou. ⸺ Eu só estou chorando porque vocês, humanos, gostam de desperdiçar o presente que lhes foi dado.

⸺ Presente? ⸺ Indagou Heitor.

⸺ Sim, Heitor. A vida. O maior presente que o Pai Celestial poderia entregar a qualquer alma ou anjo.

Foi aí que Heitor entendeu tudo. Ela não se sentia ressentida por não ser humana. Ela se ressentia por ele ser humano. Não de um jeito ruim e invejoso. A inveja era um pecado e anjos não possuíam pecados. Eles eram seres puros, cheios de virtudes. O sentimento de seu anjo vinha da Benevolentia ⸺  a virtude latina oposta a inveja.

A Benevolentia era, em outras palavras, a empatia. Era o amar sem egoísmo, a compaixão, a bondade voluntariosa. Graças a essa virtude, ela era capaz de se ressentir por ele ser humano. Porque Heitor, ao ganhar toda a capacidade de sentir as mais diversas emoções, se recusava a viver quando sentia a dor do mundo na própria carne.

Heitor, o menino que tinha um anjo, desperdiçava sua vida e se entregava ao sofrimento ⸺ sempre. E não apenas ele. Boa parte da humanidade era assim. Eles desperdiçavam o presente da vida que receberam daquele que arquitetara o universo muito antes de descerem à Terra.

⸺ Eu queria poder ser mais como você ⸺ ele soltou, sem nem pensar, a beira das lágrimas novamente.

Seu anjo, porém, nem ouviu. Já havia desaparecido. Deveria ter voltado para o lugar celestial onde os anjos ficavam quando não estavam observando a vida humana. Um lugar onde eles não precisavam se preocupar com as vidas humanas, não precisavam proteger os serezinhos idiotas que desperdiçavam o maior dos dons: a vida.

Heitor suspirou. Queria que ela voltasse. Queria falar de novo com ela. Sentir seu toque, ouvir a melodia de sua voz. Ela o visitava tão pouco agora... Havia uma época que a via todos os dias, em quase todos os lugares. Em seus piores momentos, ela estava lá.

Quando ia ao bar, após um dia excruciante de trabalho e mais uma briga com sua mãe, ela estava lá. Sempre a encontrava sentada em sua mesa favorita, com um batom vermelho e o cabelo jogado de lado. Ela continuava lá, mesmo quando ele já tinha tomado doses demais de gim e começava a falar besteiras para o garçom. Angel só segurava sua mão e o ajudava a ir até o banheiro.

Ele nunca entendia como ela conseguia entrar no banheiro masculino, mas ela sempre conseguia. Lá, ela sentava ao lado da privada com ele, enquanto ele vomitava. Depois, o conduzia até o carro. E, mesmo que no fundo da sua mente ele soubesse que não deveria dirigir daquele jeito, algo o dizia que nada iria acontecer: ela estava com ele.

Quando começava a dirigir, olhava no espelhinho e a via ali, sentada no banco de trás do carro, tinha vontade de confessar-lhe que a amava. A amava com todas as suas forças. Não sabia o motivo para aquilo, eram raras as vezes que ela falava com ele. Normalmente, seu anjo ficava calado, observando. A segurança e a paz que ela trazia, no entanto, a faziam ser a mulher mais encantadora de seu mundo.

⸺ Vai ficar tudo bem, Heitor, eu te prometo ⸺ era o que ela dizia, no fundo de sua mente, toda vez que falava algo.

Normalmente, isso acontecia quando ele estava deitado na cama, chorando, por algum motivo bobo. Ela ia para a cabeceira da cama e passava as mãos pelo cabelo de Heitor. E, quando ele ouvia aquela voz melodiosa no fundo de sua mente, dizendo que tudo ficaria, era como se o mundo ganhasse vida novamente. A voz dela fazia tudo ficar bem.

⸺ Heitor ⸺ chamou uma voz, mas não era a voz de seu anjo. Era outra voz, mais velha e nada melodiosa.

O menino se virou e se deparou com uma mulher que deveria ter uns cinquenta anos mais ou menos. Ela usava óculos quadrados e minúsculos e segurava uma bandeja nas mãos.

⸺ Está na hora de seu remédio ⸺ disse a mulher.

Heitor enxugou os olhos vermelhos da lágrimas que chorara e pegou a pílula que a mulher lhe entregara.

⸺ Você continua se encontrando com a Angel, Heitor? ⸺ ela perguntou.

⸺ Não tanto ⸺ ele respondeu. ⸺ Ela quase não visita mais.

⸺ E por que você está chorando? Achei que tínhamos chegado a um acordo de que seria bom ficar sem vê-la por um tempo.

⸺ Eu sei. ⸺ O menino enxugou as lágrimas remanescentes e olhou para o teto do quarto. ⸺ É que as vezes eu me pergunto se ela olha para o céu de vez em quando, ele está tão estrelado agora...

Heitor engoliu a pílula e continuou fitando o teto, com um sorriso meio triste, meio feliz.


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