Jason desconfiou que alguma estava estranha quando Bizarro começou a sorrir no corredor. Os dois estavam voltando do supermercado, cheios de sacolas de compras, já que não tinham nada no apartamento, tendo passado as últimas semanas numa missão no Oriente Médio.

— Por que está sorrindo como se tivesse visto o carrinho do sorvete? - Jason perguntou, cauteloso.

— Vermelho tem visita. - Bizarro disse, enquanto ele abria a porta. - O passarinho.

Jason gemeu, passando pelo amigo rumo a cozinha. Passarinho era o apelido que Bizarro tinha dado para Damian, e por mais que ele gostasse da cara azeda que o menino fazia quando ouvia isso, não estava com vontade de brigar com o caçula da família. Seu único desejo era comer alguma coisa e dormir por horas.

— Oh, isso é estranho. O passarinho está cheirando engraçado, Vermelho tem que consertar, não gosto disso. - Biz disse, enrrugando o nariz.

Jason ficou alerta e colocou as compras sobre o balcão a tempo de ver Artemis entrando na cozinha com cara de poucos amigos.

— Ele atirou um livro em mim. - Disse ofendida. - Está ferido, só queria ajudar.

Jason amaldiçoou baixinho, já andando rapidamente para seu quarto. O nariz de Bizarro era muito melhor que os dos humanos comuns, sentiu o cheiro de Damian cheio de uma acidez comum em filhotes estressados ao entrar na casa, enquanto Jason só percebeu quando entrou no quarto. O menino estava deitado em sua cama, coberto até a cabeça.

— Damian? - Chamou, se aproximando da cama. - O que aconteceu?

O menino não respondeu.

— Arty me disse que você está ferido, quero que me diga o que aconteceu ou vou ligar para o Alfred para saber. - A pior ameaça para qualquer morcego funcionou como mágica, e o menino destampou a cabeça.

Jason fez um esforço para não rosnar, com raiva. Seu irmãozinho era um ômega como ele, mas totalmente treinado pela Liga desde o berço para suprimir as reações de um filhote normal, então, se ele podia ver marcas de lágrimas em seu rosto, a coisa tinha sido ruim. Dick e Bruce até tinham ajudado a fazê-lo se sentir seguro para mostrar emoções, mas ainda era raro vê-lo cedendo aos instintos.

— Te acertaram um tiro ou alguma coisa assim? - Perguntou, mesmo que soubesse que dor física dificilmente o chatearia, certamente tinha sido Bruce, aquele idiota.

— Não, é só meu pulso, e nem está quebrado. - Damian respondeu, de má vontade.

— Hum, deixe eu decidir isso. - Jason disse, estendendo a mão.

Damian o olhou com raiva, mas sabia que de todos os filhos de seu pai, Todd era o pior para ele lidar. Grayson ele conseguia lidar, e se o irritasse, até podiam brigar. Drake sempre saltava para um confronto, aceitando suas provocações e partindo para os socos, mas Jason? O ômega da família sequer lhe dava a dignidade de tratá-lo como um oponente decente, sempre o olhava e tratava como uma criança birrenta, chegando ao cúmulo de segurá-lo pela gola das camisas e blusas, como se ele fosse um filhotinho malcriado. E o pior, era o costume de jogá-lo sobre o ombro como se não fosse mais que um peso leve, o que era fácil, já que Todd era um maldito gigante, por isso, se viu obrigado a ceder, e mostrar-lhe o pulso.

— Pirralho, isso está bem feio. - Jason disse, segurando delicamente sua mão para olhar seu pulso inchado.

Damian sabia que estava. Quando tirou a luva de seu uniforme viu que tinha a pele cheia de marcas roxas e de aspecto ruim.

— Isso são marcas de dedos. - Jason disse, com voz plana. - Dedos bem pequenos, torcendo seu braço.

— Foi um acidente, ele não fez de propósito. - O menino disse, rapidamente. Jason Todd era perigoso de várias maneiras, e tinha treinado com sua mãe, e em All Castle, isso mais seus instintos era uma combinação ruim.

Jason suspirou, irritado. Damian só tinha uma pessoa em sua vida que era forte o bastante para fazer algo assim e deixar marcas de dedinhos infantis.

— Superboy te machucou, mas isso não te fez chorar. - O pequeno alfa meio alien ia se ver com ele se tivesse feito algo mais sério. Se ia se comportar como um idiota, podia fazer isso bem longe de Damian.

— Eu não estava chorando! - Damian negou, firmemente.

Jason revirou os olhos, mas não disse que era uma mentira bem ruim. Damian ainda estava vestindo parte do uniforme de Robin, parecia cansado e seu cheiro estava indicando muito estresse.

— Vamos fazer assim, vou arrumar algo para gente comer. Por que não toma um banho e se livra dessas roupas? Assim posso trocar essa roupa de cama, e pode me usar para se acalmar o quanto quiser.

Damian ficou levemente corado, o que com sua pele marrom queria dizer que estava muito envergonhado.

— É só um imperativo biológico. Pai e Richard são alfas e o cheiro deles preocupados comigo é de enjoar, e eles ficam bravos e começam a rosnar e isso me deixa com uma sensação ruim no estômago e...

Jason se inclinou em direção ao menino, segurando-lhe o queixo.

— Não precisa me explicar nada, Damian. Sei como é ficar com vontade de me aninhar com outro ômega numa casa cheia de alfas prontos para uma briga. Tome um banho, vou enfaixar esse pulso, e podemos saciar nosso imperativo biológico até o cansaço.

Era uma piada interna dos Robins ômegas. A primeira vez que Jason foi até a mansão depois da chegada de Damian, Bruce estava brigando com o menino recém chegado da Liga dos Assasinos. Foi com divertimento que Jason, que tomava chá com Alfred, viu o pequeno menino com ar aristocrático se aproximar dele com as mãos na cintura, demandando que o ômega da família lhe proporcionasse conforto biológico, emitindo aromas calmantes enquanto o segurava. Ou seja, o pediu para segurá-lo e consolá-lo depois de uma briga com seu pai alfa. Os olhos brilhando de lágrimas do menino o impediram de rir, e o fato de Dick se roer de ciúme foi só um bônus.

— É um imperativo biológico entre ômegas, tem várias pesquisas sobre isso. - Damian disse, indo para o banheiro.

O menino sempre procurava racionalizar sua vontade de carinho e conforto e isso entristecia Jason, já que sabia como a Liga lidava com necessidade de afeto. Talia não teria escrupúlos em deixar seu filho pequeno num quarto pequeno e escuro até ele aprender que chorar e pedir colo não era adequado, e o avô de Damian faria pior. Dick tinha sido o primeiro a romper o condicionamento de Damian, abraçando-o e beijando-o até o cansaço, mostrando que era amado mesmo quando era um pirralho mimado e insuportável.

— Imperativo biológico ômega não explica porque gosta de abraçar e receber atenção de Dick. - Jason provocou, de bom humor.

Jason sorria ao se virar para a cama, se pondo a trocar os lençóis, ainda tendo tempo para gritar com o menino sobre meias sujas em sua cama, Alfred teria um ataque com isso, o mordomo detestava hábitos pouco sanitários. Trocando a roupa de cama, Jason refletiu que Damian tinha se enfiado ali buscando seu cheiro para se confortar, mas o menino tinha dado azar, seu cheiro não estava forte ali porque tinha estado fora por semanas, teriam que fazer um ninho decente. Alfred podia ser um mordomo, mas o homem invadia sua casa regularmente, e deixava sempre roupa limpa de Damian, Dick e Tim em seu armário, e Jason era muito esperto para reclamar sobre isso, pensando em como o beta era astuto e assustador, deixou uma camiseta antiga sua sobre a cama arrumada, um par de meias grossas e limpas, junto com um cueca pequena, tinha roupas de Damian ali, mas o menino ia apreciar usar algo com o cheiro do irmão ômega.

Voltou para a cozinha, e viu seus amigos ali. Biz guardando as compras e Artemis bebendo chá.

— Sinto muito pelo livro, Arty, mas ele não gosta de ficar perto de alfas que não conhecem, menos ainda uma alfa tão forte como você. - Ele explicou.

— Está tudo bem, deveria saber melhor do que tentar tocar num filhote estressado. - Disse. - Já cuidou dos machucados?

— Não, ele está no banho, enquanto arrumo algo para comer. - Jason disse, virando-se para Bizarro. - Biz, se importa de ir me comprar umas coisas?

— Para o passarinho? Claro. - Seu amigo concordou prontamente. Damian o tinha ganhado quando se sentou com bonequinhos para brincar com ele, e fazendo desenhos impressionantes do bonequinho favorito do grandalhão.

— Obrigado, te farei uma lista. - Jason disse, já escrevendo o que lhe faltava para cozinhar.

Artemis saiu com o clone, e Jason sorriu para ela. Sabia que ia ficar longe por um tempo para deixar Damian se mover sem a presença opressora de uma alfa com o nível dela.

X~x~X

Jason estava sentado em sua cama com um kit de primeiros socorros quando saiu do banheiro, já usando sua camiseta, que lhe passava dos joelhos ossudos, e claramente tinha tentado pentear o cabelo, que agora caía livre do gel que geralmente em sua testa Dick mataria por uma foto dele assim, mas ele não queria irritar o menino.

— Venha aqui, baixinho. Hora de enfaixar esse pulso.

Damian fez uma careta, mas se sentou na cama e deixou que Jason enfaixasse devidamente o local depois de passar um creme com cheiro de menta que Alfred sempre usava. Jason era muito hábil nisso, passando as faixas de forma que seu polegar ficou livre, mas parte da mão estava imobilizada com as tiras elásticas.

— Agora, falando sério. Só te torceu o braço? - Jason perguntou, Jon era mais novo que Damian, mas era um alfa meio alien com super força.

— Foi minha culpa, eu tentei tocá-lo quando sabia que estava chateado. Foi estúpido da minha parte. - Damian disse.

— Damian, se não estava atacando o pirralho, não é sua culpa. Não interessa se ele estava chateado, alfas não tem um passe livre para serem idiotas só porque sim, menos ainda se tem super força.

— Mas..

— Sem mas, sou seu irmão mais velho e estou te dizendo que não foi culpa sua.

Damian assentiu, e acabou falando:

— Jon estava muito triste e bravo porque uma menina que tentamos ajudar morreu. O irmão dela não estava desequilibrado e a matou, acho que foi minha culpa no final das contas, não consegui salvá-la.

Jason acaricou-lhe o cabelo.

— É impossível salvar todo mundo. - Disse, sabendo que era uma realidade cruel. - Quer cozinhar comigo ou prefere ficar aqui lendo?

— Vou ficar. - Não estava com vontade de interagir com o amigo de Jason.

— Te trago comida logo, logo.

X~x~X

Damian estava muito entretido com um dos muitos livros de Jason quando sentiu um cheiro familiar e delicioso, que o fez sentir saudades de sua casa no deserto. Com cuidado, colocou o livro na cama, Todd teria um ataque se estragasse. Saiu do quarto farejando, só ouvia seu irmão e Bizarro, então, não corria o risco de ouvir piadas sobre suas roupas, ou por qualquer coisa. O clone de Superman era mais doce que o próprio, jamais diria algo rude para Damian, deu-lhe um aceno quando entrou na cozinha, sentindo a boca salivar ao ver que ele comia um falafel com babaganoush.

— Todd, isso é comida de verdade. - Damian disse, chamando a atenção do mais velho, que tirava outro bolinho da gordura e o colocava para escorrer.

— Sim, tampinha, nem todos somos filhinhos de papai malcriados e inúteis. Pensou que eu te daria fast food como Dick?

A cara do menino era resposta suficiente. Jason o mandou sentar e colocou um prato vazio a sua frente e ao lado uma xícara de chá quentinho. Damian lutou para engolir a vontade de chorar, seu ódio por Drake tinha aumentado quando logo no começo de sua vida em Gotham o adolescente tinha feito piadas sobre seu costume de tomar chá junto com as refeições, isso tinha doído mais, porque até Grayson e seu pai tinham escondido a diversão, tinha parado de tomar seu chá para evitar mostrar o quanto a zombaria tinha acertado o alvo, e ver que Todd sabia da sua preferência e tinha preparado especialmente para ele o fez sentir de maneira engraçada. Todd ignorou sua comoção, para sua alegria, e serviu-lhe um falafel recheado com babaganoush. O sabor explodiu em sua boca quando mordeu o bolinho, era incrível voltar a sentir a combinação picante da páprica e o sabor pungente do azeite com limão.

— Quando tivermos mais tempo, te faço algo mais elaborado. - Jason disse, colocando algumas colheradas de tabule em seu prato.

— Isso está delicioso! - Damian disse, engolindo rápido. - Quer dizer, está adequado, Todd, obrigado pela nutrição.

Jason revirou os olhos, divertido, e se sentou para comer também. Fez uma nota mental para dizer a Alfred que o menino sentia falta dos temperos arábes e das comidas que cresceu comendo, já que Damian terminou devorando os bolinhos e comendo a salada com óbvio apetite. Uma criança acostumada com a riqueza de sabores fortes e picantes da culinária oriental, certamente achava a comida americana um horror. E o menino comia com as mãos, certamente como aprendeu a comer com a mãe e o avô, Alfred jamais permitiria isso na mansão, Bruce comia hamburguer com garfo e faca. Quando terminou, Damian levou o prato para a pia e lavou as mãos.

— Biz, pode vigiar, por favor? Se Superman ou Superboy aparecerem não tem permissão para entrar. - Jason disse.

— Bizarro vigia. - O clone disse, seriamente. - Pode dormir com o passarinho.

— Não sou passarinho. - Damian protestou, muito debilmente para seu normal.

O menino parecia muito cansado depois de comer. Sua missão em Metropolis terminou mal, tinha brigado com o amigo e chegou em casa para uma briga entre Bruce e Dick pela sua segurança. Fugiu para a casa de Jason e não tinha dormido nada, porque só tinha a amazona ali, e ela o deixava nervoso, já era de tarde e ainda não tinha descasado nada.

— Sim, Biz, não o chame de passarinho, baixinho é melhor. - Jason brincou, já de pé.

— Todd! - Damian protestou.

— É verdade, vem, para a cama. - Jason chamou, indo para seu quarto.

— Um dia vou ser mais alto que todos vocês. - Damian disse, emburrado.

— Por favor, se passei seu pai. - Jason disse, tirando as botas no quarto e a camiseta. - Vou tomar um banho, depois vamos dormir pr umas doze horas, isso não é negociável, você está cheirando como um filhote estressado e cansado.

Damian não ia negar o óbvio. O cheiro de crianças era notavelmente claro para ômegas, Todd sempre sabia quando ele estava chateado e precisando dormir, já tinha feito seu pai cancelar várias patrulhas para mandá-lo para a cama.

— Vou te perfurmar adequadamente quando sair do banho. - Jason disse, enfiando o menino embaixo das mantas na cama e esfregando sua bochecha contra a dele, depois o nariz em seu pescoço.

Damian soltou um som contente, que reverberou por suas cordas vocais e o fez se envergonhar, seu avô o acertaria um tapa se ouvisse isso, mas na casa de seu pai todos sorriam e o incentivavam a fazer isso.

— Já volto. - Jason disse, esfregando o nariz pela última vez junto ao do menino.

Damian assentiu, fechando os olhos e relaxando, já sentindo o cheiro do ômega principal da família sobre ele. No banheiro, Jason pegou o celular e mandou uma mensagem para Alfred, o beta devia estar preocupado com o sumiço do menino.

"Damian está aqui, vamos dormir bastante para acalmá-lo. Vou deixá-lo relaxar num ninho, precisa de cheiros confortáveis, não de alfas pronto para briga. Já está alimentado e cuidado, diga ao Bruce que não tente pegá-lo antes que eu esteja pronto para entregá-lo ou vou me irritar."

A resposta foi imediata.

"Obrigado por avisar, mestre Jason. Darei seu recado, e passarei logo para levar roupa limpa para nosso rapaz. Bom descanso."

Quando saiu do banho, o menino estava dormindo, enrolado nele mesmo como uma bolinha. O abraçou e puxou para se apoiar sobre seu peito, sentindo-o relaxar aos poucos, não demorou para que ele também dormisse.

Da sala, Bizarro sorriu ao ouvir aquele som que Vermelho e o Passarinho faziam. Artemis tinha rido e Jason se irritado quando perguntou porque os Ômegas ronronavam quando estavam felizes e satisfeitos, ele tinha insistido que não era como ronronar, mas Artemis disse que era como gatinhos felizes sim. Ele se endireitou no sofá, tinha que ficar de olho para que ninguém os fizesse parar de ronronar, ele gostava do som.