Ayreon: O Experimento Final escrita por Daisuke


Capítulo 5
Olhos do Tempo




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— Alphaniana...

— Alpha o quê? — questionou com estranheza um senhor franzino que encarava Ayreon deitado no chão em seu refúgio

— Q-quem és tu? — pergunta Ayreon retornando a pergunta enquanto se recompunha de seu desmaio.

— Sou Jonah, um velho andarilho. Por vezes paro por cá para descansar. E tú? — disse, dando a mão para que Ayreon levantasse

— Sou Ayreon, um pobre menestrel da cidade, estou apenas de passagem.

— Como podes ser um bardo e não te pores a cantar? — espantou-se o senhor.

— Deixei meu instrumento na praça por acidente — retrucou Ayreon, cabisbaixo.

— Reforço — disse Jonah, impaciente — Como podes ser um bardo e deixares seu instrumento para trás? A propósito, o que é Alphaniana?

— Também não é de meu conhecimento milorde, apenas algo que surgiu em minha frágil mente. Poderia me dizer onde fica a cidade?

— Não sou digno de tais nomenclaturas. Tome, este é o mapa, leve contigo e traga-me tua cantiga — rabujou o velho.

— Não posso, — afirmou Ayreon, abaixando a cabeça com tristeza. — não sou capaz de lê-lo.

— Como podes não saber ler um mapa com apenas imagens? — Johna parecia estar desconfiado de algo

— O fato é que sou cego, senhor — disse o menestrel, com pesar e um tom de lágrima em suas palavras. — Não enxergo com estes olhos. Meu mundo é escuro como a noite eterna.

O velho se calou, sem reação. Como podia um homem fraco e cego possuir algum conhecimento? Ele, com certeza, havia sido duro demais com seu visitante. Ayreon, por sua vez, não se abalou com o silêncio do homem e, em postura de respeito, ergueu a cabeça mais uma vez e, mesmo sem seu instrumento, pôs-se a cantarolar sua história:

— Não mentirei a ti, não sei o que dizer. Sinto uma névoa e estou a me perder. Não sei onde ou quando estou, vagando pelo real e fantástico me ponho. Não sei se é a eternidade ou apenas um sonho.

— Diga-me, o que vês? — questionou o andarilho, expressando bastante calma.

— Não posso dizer-te bem, parece que tenho os olhos do tempo. Vejo seres do passado. Meus antepassados e minhas missões. Olhos toda minha vida, mas tem algo mais que não é de minha posse. Algo que nem mesmo é de meu conhecimento.

— Certo, mas o que sentes?

— Não sei bem, só sei que não consigo libertar minha mente. Temo estar atingindo a insanidade.

Abruptamente ambos pararam de falar. Ayreon encarava o chão, enquanto Jonah encarava o jovem. Longos minutos se passaram e os dois continuavam imóveis.

Sons de folhas das árvores rompiam o silêncio e passarinhos solavam para a canção que Ayreon acabara de recitar. Ao fundo, então, se ouvia uma movimentação. Algo bem ao longe, que, aos poucos, foi se aproximando da gruta.

Surgiu então um grupo de garotos, com aproximadamente 13 anos, vestidos em roupas de linho.

— Vovô, veja o que encontrei pela cidadela! — afirmou um dos garotos.

— Deixe de tolice, quem achou fui eu! —  gritou o outro, nitidamente menor.

— Não se insultem, crianças. Todos os três, um por vez, contem-me o que encontraram.

— Estava andando pelo centro e encontrei isso daqui — disse o terceiro garoto, tirando as mãos escondidas de suas costas e, com elas, sacando uma Rabeca.

— Não podes pegar o instrumento dos outros assim! — brigou o velho.

— Está vendo o que eu lhe disse? — resmungou o primeiro, puxando a Rabeca para si.

Neste momento, uma de suas cordas soou, com um grito agonizante. Ayreon, até então imóvel, finalmente teve uma ação diferenciada. Havia reconhecido seu próprio instrumento pela única e esganiçada nota que havia emitido.

— Me dê! — gritou o jovem cego.

— Como assim? Este é teu instrumento? — questionou o idoso.

Ayreon apenas puxou em um movimento automático a Rabeca das mãos do garoto, deu as costas e tornou a falar:

— Ainda estou tentando entender por que vejo tais coisas. Seria algum outro mundo que grita por mim? Não consigo saber a causa de tanto conhecimento surgido do nada. Não me digas que sou um deus, pois sei que não sou. Temo que ninguém há de me dizer o motivo. Ajude-me meu grande mestre! — e encerrou voltando-se para o alto.

Os garotos começam a gritar tentando entender a situação, enquanto o andarilho tenta acalmá-los e segurar Ayreon. O menestrel, atordoado abaixa a cabeça e sai correndo, soltando apenas suas últimas palavras:

— Não consigo libertar minha mente!

—___________________________________________________________

Alguns minutos depois, Ayreon estava de volta ao vilarejo. Agora com seu instrumento em mãos, mas ainda não cantava. As pessoas passavam desentendidas pelo fato de o verem, pela primeira vez, sem emitir uma palavra sequer.

Em sua mente, um turbilhão de imagens percorria suas ideias, algo completamente irreconhecível, mas nenhuma palavra sequer surgia em seu pensamento. Os cidadãos se aglomeravam cada vez à frente do jovem.

Pessoas de várias idades, gêneros e classe encostavam em seu braço para lhe oferececr ajuda ou perguntar o que estava acontecendo. Mas nada mudava, continuava imóvel. A cidadela inteira parara para ver aquela cena. Tantos burburinhos sobre o estado do menestrel, que cada cochichada se tornava uma ópera barulhenta.

— O que ele tem? —  pergunta uma menina para sua mãe.

— É assim que ele trabalha? — questiona uma outra senhora.

— Eu sempre soube que ele era um fanfarrão! — exclamou um senhor cordo e barbudo

"É daí que surge a inspiração dele?", "Que bela música está criando agora?", "Está tudo bem?", eram algumas das perguntas que cercavam Ayreon. Como esperado, todas sem resposta.

A movimentação é tamanha, e cresce cada vez mais, parecia que a Grã-Bretanha inteira havia marcado encontro naquele local. Surge então algo atravessando as folhas. Em poucos segundos surgem gritos histéricos por toda parte. E uma flecha atinge a parede atrás de Ayreon, a milímetros de sua cabeça.

Cego e temporariamente insensível, Ayreon ainda não entende o porquê de tanto desespero. Até que sente que as mãos que tocavam seu corpo não eram mais as mesmas, agora eram mãos que o apertavam e o agarravam, jogando-o de um lado a outro enquanto permanecia sem reação.

Por um momento sua confusão mental parou para abrir espaço a outra sensação. Um ardor. Havia fogo em seus pés. Foi só o que Ayreon teve tempo de notar, e já havia outra flecha, agora fincando em sua testar, fazendo-o apagar.


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