A Queda de Angeline escrita por Catherine


Capítulo 1
Capítulo Único




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/75953/chapter/1

Senti o meu corpo tremer e um frio sinistro percorrer-me a coluna no momento em que Gabriel me tocou na cicatriz em forma de v que tinha nas costas. Apercebendo-se disso, retirou rapidamente a sua mão para o lado e eu baixei a camisola, virando-me para o olhar de frente. Não fui capaz de olhar directamente os seus olhos azuis, sentia-me vulnerável, incapaz, julgada, até mesmo envergonhada. Não seria capaz de suportar a ideia de o ver olhar-me com pena, pois eu tinha certeza de que era isso que ele sentia ao ver-me. Pena, e talvez até mesmo raiva. Para ele, tinha poucas dúvidas de que agora, eu não passava de um ser desprezível, com qual ele deveria ter o mínimo contacto possível.

Talvez fosse fácil para Gabriel pensar dessa forma, mas para mim, cortava-me o coração em pedaços do tamanho de grãos, só o pensamento de nunca mais o ver em toda a minha existência. Pensei que em sua cabeça ele perguntava se eu me teria arrependido, e eu desejei que ele me questionasse, para que eu pudesse gritar com todo o ar de meus pulmões que o meu mais profundo desejo era que nada disto tivesse na verdade acontecido, e que existisse alguma forma de eu reverter o passado.

Mas essa não era a verdade. Eu podia ainda sentir as mãos deles em mim enquanto me arrancavam o meu eu mais precioso sem hesitar uma única vez. Não importava mais para eles, tinha certeza. Não me olhavam mais como irmã, mas sim como inimiga. E o peso negro da consciência rondava o meu coração sem cessar, alimentando-se do meu ódio e raiva contidos.

Sentei-me na areia da praia, seguida de Gabriel. Olhei o mar, continuando a ser incapaz de o encarar. Questionei-me sobre o que passaria por sua mente naquele momento, mas quando me atrevi a dar uma espreitadela para si, foi como se espetasse mil facas sobre o peito. Gabriel chorava, inconscientemente, deixando gordas lágrimas caírem por sua face ligeiramente bronzeada. Senti-me a pior pessoa de sempre. O havia feito chorar, a ele, á pessoa que mais estimava. Tomei fôlego para ganhar alguma coragem, forcei o meu corpo a reagir e limpei suas lágrimas lentamente.

 

- Angeline – todo o meu ser tremeu ao ouvi-lo sussurrar o meu nome. Gabriel tinha a mais bela voz que eu alguma vez fora presenteada de ouvir, e de alguma maneira, ter o meu nome dito por ele, me fez sentir especial e cada vez mais arrependida.

 

- peço desculpa – não sei bem do que pedi desculpa. Se por o fazer chorar ou por tê-lo abandonado junto com eles. Fechei os olhos. Lembro-me perfeitamente do dia em que tudo aconteceu.

 

Havia apenas cedido á tentação durante segundos, mas Ele fora de tal maneira severo comigo que me enviara directamente a Uriel, Amitial e Remiel. Nesse dia, Gabriel estava com eles, e sua cara de horror ficou gravada para sempre na minha memória, enquanto eu urrava de dor e todo o meu corpo parecia pegar fogo. Durante três dias ele permaneceu ao meu lado, sem poder fazer nada para amenizar a minha agonia, apenas me encarando com pena, mágoa e compaixão. Mas a sensação de cair, foi monstruosa. E ainda hoje me lembro da dor e do fogo que nos consome quando nos arrancam as nossas asas com tanta brutalidade.

Encarei-o por segundos, ele não pertencia ali comigo, eu não fora suficiente boa para ele, e agora teria que arcar com as consequências, mesmo que este discordasse. Ele precisava ir embora, e eu sabia que se ficasse demasiado tempo comigo, Rafael viria para o pegar e levar para longe de mim. Ambos o sabíamos. Era impossível manter uma relação com um caído. Senti o meu coração cair a meus pés á medida que a separação eminente se aproximava. Levantei-me e estendi-lhe a mão para que se erguesse. Ficamos de tal maneira perto um do outro que eu poderia sentir a paz que emanava por todos os seus poros. Fechei os olhos, não tendo coragem suficiente para fazer algo mais do que permanecer quieta. Foi aí que senti a leve pressão de seus lábios contra os meus e abri os olhos surpresa, mas sem me mover. Ele tinha os olhos fechados e senti-o sorrir levemente no momento em que o meu corpo começou a reagir e lhe retribui no beijo, com uma tremenda paixão que não sentia em séculos. Deus, eu amava-o, e tinha cometido o pecado de o deixar com o sonho de me tornar humana. Um sonho idiota que me havia feito perder as minhas asas. Era impossível para mim ser humana, e agora estava condenada a vagar pela Terra com o ardente desejo em meu peito de voltar aos Céus e ficar para sempre ao lado de Gabriel. Fechei os olhos com força tentando desfrutar ao máximo dos poucos segundos que nos restava, e nesse momento houve uma explosão de luz no céu. Separamo-nos e encaramos Michael, que nos olhava com lástima, senti uma certa humidade no rosto, eu chorava, mas não me importava mais as lágrimas de perdia, sabia que estava na hora de me despedir para sempre. Dei um último e pesaroso beijo em Gabriel antes de o ver juntar-se a Michael e desaparecer em uma forte luz.

 

- amo-te Angeline, para sempre – deixei-me cair na areia a chorar e escondi o rosto com as mãos. Sentia-me envergonhada por ser Michael, meu irmão e temeroso guerreiro divino, a ver-me neste estado, pois sabia que ainda não me tinha perdoado. Senti-me horrível por saber que Gabriel me amava e eu o tinha desiludido de todas as maneiras possíveis ao cair. Sentia-me totalmente perdida. Senti um toque no ombro, mas não ergui a cabeça para ver quem seria. Apenas me encostei ao corpo que se sentava ao meu lado e chorei, chorei até as lágrimas secarem em meus olhos cinzentos. Ergui a cabeça e limpei o rosto com uma das mãos. Encarei duas orbes azuis-violeta que me olhavam com pena e talvez receio.

 

- vem comigo Angeline, não te deixarei sozinha – ele levantou-se e estendeu-me a mão que agarrei com algum medo. Olhei o céu enquanto ele se voltava para caminhar, despedi-me mentalmente de Gabriel, com a promessa de que o amaria para sempre e corri na direcção de Lúcifer, acompanhando-o na caminhada.

 

Eu tinha morrido naquele dia ao arrancarem-me as asas. Mas começava uma nova vida na Terra, como anjo caído. E continuaria a amar Gabriel, mesmo que o Céu e o Inferno não o permitissem. Eu amava-o, para sempre, e espero que consiga perdoar-me completamente um dia.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Bem, esta é a história anterior a "O pecado de Cassiel" e espero que tenham igualmente gostado
Beijos