Mãos Seguras escrita por Shalashaska


Capítulo 1
"Uma dança. Mas não a última."


Notas iniciais do capítulo

Escrito basicamente por encomenda para a Nath e para a Dana ♥



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O 107º Batalhão foi resgatado pelo Capitão América em uma das fronteiras com a Áustria. Não houve baixas significativas da tropa e todos aqueles feridos agora dispunham de atendimento médico na base americana. Existia pressa, muitos pacientes e muito a se fazer para conter a guerra e os planos de Schmidt, o Caveira Vermelha, mas o tempo para tratar os soldados não era considerado um tempo gasto.

Em meio ao clima chuvoso e o terreno de barro, a Agente Carter acompanhava Steve e seu amigo, James Barnes, às barracas médicas cor de oliva e com cruzes vermelhas. Dissera ela que existiam já enfermeiras e médicos nas proximidades para curar os feridos, embora não o suficiente para todos e com certeza não com todos os equipamentos necessários. Além disso, ela completou, aconteceram coisas mais estranhas do que um homem com a face desfigurada e rubra: veio ajuda do lado soviético.

— Ajuda? — Barnes perguntou, tentando não ficar ofendido por Agente Carter não lhe dar tanta atenção quanto estava acostumado. No fundo, estava feliz por ela lançar olhares recorrentes ao seu amigo, por mais que fosse desconfortável sentir-se invisível.

— Sim. — Ela respondeu e entraram na Ala Médica. — Encontramos duas mulheres saindo da fronteira. São do lado soviético, uma soldado e uma enfermeira. Haviam sido pegas pelas forças de Schmidt, mas conseguiram sair sozinhas. Ainda não quiseram contactar a base delas e por enquanto é muito arriscado voltar. Enquanto isso, estão nos prestando auxílio em estratégia, informação e por fim em cuidados com os feridos.

— Uma soldado? Interessante, huh. — Imaginou a figura quadrada e matrona que sempre mostravam ao falar dos russos, com pernas grossas e peles de urso.

— Eu tomaria cuidado, Sargento Barnes. Tatyana Kostryna foi uma sniper soviética. Contou 120 mortes pelas suas pequenas mãos. Não duvido que a soldado que temos aqui, Natalia Romanova, supere essa marca. Na verdade, até torço pra isso. Sem falar que elas conseguiram sair sozinhas e nao precisaram da ajuda do Capitão América aqui.

— Está ficando para trás, amigo. — Steve deu tapas amigáveis seu ombro.

— Elas falam inglês?

— Entendem perfeitamente o que falamos, mas não são de responder com muitas palavras. Espero que o russo de vocês esteja afiado.

— Eu não entendo a razão de estar aqui. Estou muito bem. Não preciso ser examinado por duas mulheres soviéticas.

— Você está ferido e não sabemos que tipo de experimentos fizeram com você, senhor Barnes. — O sotaque de Peggy foi mais carregado e seu tom era definitivo. — E será apenas uma. Romanova lida mais com primeiros socorros, emergências. Aprendeu no campo de batalha. Agora, Maximoff… Ela sabe muito mais.

Os três chegaram ao local, encontraram uma mulher ruiva polindo e limpando seu próprio rifle de forma despreocupada em uma das bancadas. Existiam algumas macas ali, homens deitados e dormindo. Peggy soltou um pequeno e respeitoso “olá”, a ruiva repetiu o gesto de forma breve. O primeiro fato que os dois soldados americanos notaram ao vê-la foi que a mulher era muito mais jovem que esperavam e seu olhar muito mais pesado do que a arma que ela tinha em mãos. Era incrível que seu corpo diminuto aguentasse o impacto do recuo da arma quanto atirava.

Steve Rogers e James Barnes a cumprimentaram com respeito e assombro.

— Romanova… Onde está senhorita Maximoff? Precisamos falar com ela. É sobre aquele soldado que eu havia dito.

Ela assentiu e desceu seu quadril da bancada. Vestia roupas emprestadas do lado americano, que afinal não a diferenciavam tanto na questão da cor, verde oliva. Ela se ausentou, indo até uma outra ala separada por uma cortina de lona impermeável. Demorou apenas alguns segundos e uma série de sussurros quebrados, palavras russas.

Natalia voltou, trazendo a enfermeira consigo.

James Barnes engoliu em seco. Não havia nada de parecido com a imagem estereotipada de mulheres soviéticas. A mulher era jovem também, apenas uma moça. Seu olhar foi cauteloso e intenso, indo de Peggy Carter até os dois, perscrutando quem seria o paciente. Como não encontrou nada grave, nenhum sangue, sua expressão torceu-se em dúvida e ela voltou sua atenção a agente inglesa.

— Senhorita Maximoff… Esse é soldado de quem falei. Agora que a situação aqui na Ala Médica está mais controlada, achei que… Poderia examiná-lo.

A jovem concordou com um breve aceno, indicando uma maca vaga em que James poderia se assentar. Ela colocou o avental branco por cima de seu vestido escuro, verificou se seu cabelo estava bem preso. Todos seus movimentos era muito calmos e delicados, tanto que ele teve a certeza de suas mãos magras e pálidas poderiam curar-lhe de quaisquer mazelas.

Quando James sentou-se e a enfermeira veio a seu encontro, ele sentiu a pergunta no ar se ela afinal poderia tocar em seu corpo, em seu rosto. Estranhou o silêncio daquela pergunta, mas soube apreciar tal gesto. Já tinha sido revirado por cientistas nazistas, era bom alguém perguntar se tinha autorização para tocá-lo. Ficou feliz por ter tomado um banho antes de vir, um banho pobre em meio a recursos escassos, mas ainda assim um banho. Ela não merecia mais um soldado ferido e fedido para tratar.

O único problema era que Steve o encarava com aquela expressão parva, ciente de que seu melhor amigo estava deveras impressionado com a enfermeira. Parecia que aquele menino mirrado dos fundos do Brooklyn segurava-se para não rir e Bucky desejava lhe dar um safanão na nuca.

— Você está em boas mãos. — Peggy suspirou. — Steve, se importa em me ajudar a catalogar algumas coisas nos nossos mapas? Tenho certeza que tem informações novas que serão úteis.

Barnes franziu a testa e comprimiu os lábios. Realmente começou a lhe dar nos nervos o fato que a inglesa não lhe dava atenção, chamava Steve muito pelo primeiro nome e seu amigo o infernizava dando o troco por algumas situações vividas no passado. Ou talvez fosse irritação por aquela dança recusada. Ao fazer tal expressão fechada, a enfermeira tirou suas mãos do rosto dele, preocupada.

— Dor? — Ela perguntou e sua voz o distraiu. Não soube responder de forma muito segura, somente negou com um gesto. Ela demorou alguns instantes para esboçar uma reação e depois encarou Carter e Rogers. Sorriu um pouco, como se entendesse.

— Vocês vão me deixar sozinho aqui?

Eles já passavam pela saída.

— Até mais, Bucky!

Silêncio, depois veio o som da chuva. Alguns homens resmungavam de dor nos outros leitos, coisa que fazia a enfermeira encará-los por um breve instante até decidir que estava tudo bem. Ela segurou mais uma vez seu queixo para cobrir um ferimento na maçã do rosto de James Barnes, ele soltou um murmúrio.

— Já está sarando. Não precisa gastar curativos com isso. Deixe para outros pacientes.

Não soube dizer se a barreira da linguagem limitava tanto sua comunicação, mas ela pareceu considerar suas palavras. Depois colocou o curativo mesmo assim.

— Um paciente é um paciente.

Bucky Barnes ficou encarando os olhos dela.

— Olhos verdes são um requisito necessário para ser russo?

Maximoff parou por momento. Não tinha entendido. Voltou-se à amiga que sabia melhor inglês, para saber se compreendera errado aquelas palavras. Natalia soltou um suspiro e engatilhou a arma que estivera limpando, respondendo em sua língua materna.

Ele está flertando. Mate-o com uma dose letal de morfina. Ou deixe o trabalho para mim.

Ela testou a mira apontando para James Barnes, que tinha certeza de que a ruiva dissera muito mais palavras do que a tradução direta de sua tentativa de ser charmoso.

Natalia. É meu paciente. Não o ameace.

Ele é americano, Wanda. — A sniper gostou de como o soldado estava perdido com a conversa em russo. — Vou deixá-los sozinhos, tenho mais equipamento para checar. Mas se ele for um cão contigo, será um cão morto e enterrado.

Ela saiu. Wanda, por sua vez, pediu para que ele tirasse a camisa. Agente Carter dissera que ele tinha sido torturado num laboratório muito suspeito e que era melhor verificar se existiam seqüelas.

A história que tinham contado para a agente inglesa que as encontrara parecia plausível e os talentos das duas eram úteis, portanto os americanos iriam aceitar tal conto de fadas. O acordo de não-agressão entre alemães e russos comecara a desmoronar, portanto não surpreendia que tivessem sido pegas pelo lado nazista, mas isso não era tudo. Natalia Romanova fugiu de uma organização eslava, o Salão Vermelho, e Wanda Maximoff escapou de um destino ainda pior. Uma foi criada para matar, a outra… A outra tinha acesso ao corpo, a cura, através de meios que jamais poderiam ser considerados naturais. Diziam que herdou do pai, porém este foi levado para um dos Campos na Polônia. Sua mãe era falecida. Seu irmão tinha partido para a guerra, para trazer o pai de volta. Ela foi levada a um dos laboratórios do inimigo. Conhecia as marcas de eletricidade, pois recebeu castigos em seu próprio corpo, até que conheceu Natalia e elas prometeram fugir do cativeiro e então vingar os mortos.

— Wanda? — Barnes esboçou o som na boca. — Esse é o seu primeiro nome?

Ela assentiu. Pediu para que ele ficasse de costas para ela, ainda sentado. Tateava sua pele com muito zelo, delineando os contornos dos hematomas com as pontas de seus dedos. Eram marcas de eletricidade, choque aplicado em pontos vulneráveis.

— Hã… Isso faz cócegas, senhorita.

A enfermeira sorriu sem graça, depois voltou-se frente para ele. Puxou um de seus braços para si, para ver se existiam furos de alguma substância injetada. Segurou seu cotovelo com uma das mãos e com a outra apalpou sua pele de forma metódica e gentil. James Buchanan Barnes, acostumado com um pouco da vida noturna dos Estados Unidos, estava muito mais encabulado do que imaginava que poderia ficar.

— Vocês, enfermeiras, devem assistir muita coisa pesada. — Tentou mudar de assunto, focar em outra do que a sensação de formigamento na pele e a palpitação em seu peito. Gostaria de falar sobre coisas mais leves com garotas bonitas, mas o assunto parecia inevitável. —  Por que se alistou?

Ela parou, encarando-o fundo. Não diria porque era judia, nem porque era romani, muito menos que era algo a mais que não conseguia nomear, pois não sabia quando essa informação poderia se virar contra ela. Estava totalmente em desvantagem em território estrangeiro. Então disse outro motivo, um também verdadeiro:

— Meu irmão. Há um ano ele… Ele foi para a fronteira. Não voltou. Sinto que não… Morreu, — A palavra foi difícil para sair de sua boca, mesmo em outra língua que não era sua. Em um gesto casual, ela brincou com a corrente em seu pescoço, cujo pingente ficava sempre oculto: uma estrela de Davi. Torceu para que ele não tivesse prestado atenção e que seu gesto descuidado não tivesse denunciado sua crença. — Mas não querem arriscar uma outra missão de busca. Eu vou encontrá-lo. Vou cuidar dele. E vou levá-lo para casa.

Ela não se lembrava de conversar tanto com alguém que não era Pietro ou no máximo Natalia e a inglesa Margareth Carter. Ele não se lembrava de sentir o peso do silêncio tanto quanto agora.

Wanda pediu que ele vestisse de novo a camisa. Estava claro que tentaram algo perigoso com ele, algo que não deu certo. Ou ao menos não até agora. Recomendou repouso, água e chá. Sempre recomendava chá aos seus pacientes, coisa que Natalia debochava em toda oportunidade. Também disse para voltar caso sentisse algo diferente.

Bucky Barnes concordou. Voltaria sim, se sentisse algo diferente… Mas ele não sentiu enjoos ou dor. Sentiu, e era desconfortável admitir, sua falta.

 

Steve Rogers odiava as desculpas terríveis que seu amigo arrumava para ir até a Ala Médica. Ralhara num primeiro instante com ele, pois existiam outros soldados precisando de atendimento… Até que percebeu que outros compatriotas não raramente arranjavam dores estúpidas para poder ver os belos olhos verdes da enfermeira Wanda Maximoff.

Ela os tratava bem. Trocava as bandagens nos ferimentos de Bucky toda vez que iam até lá, perguntava se se sentiam bem e se estavam comendo o suficiente, dentro do possível com a ração e alimento enlatado. Bucky sempre lhe dirigia palavras gentis, agradecimentos, piadas tolas, e outras tentativas inocentes de chamar sua atenção. Steve percebeu que ela conversava mais com eles do que com outros soldados, talvez por justamente o comportamento inócuo e adorável de seu amigo, que fazia perguntas sobre seu dia e sobre procedimentos médicos. Não estava lá apenas para até sorver, sedento, do rosto dela e de suas formas como faziam alguns rapazes que a achavam muito exótica por ser soviética. Estava lá para vê-la e saber de seu dia, sua história.

E aquilo definitivamente tinha chamado a atenção da enfermeira.

 

Em meio desse jogo de conversas e silêncios, de inglês e russo, as duas mulheres soviéticas ficaram mais confortáveis na base. Natalia ensinava alguns truques para uma mira perfeita, bebia vodka com alguns soldados e contava histórias de cicatrizes. Algumas eram verdadeiras. Sempre trocava uma ideia com Peggy Carter, tanto que Steve tinha a certeza de que seriam as duas a terminar a guerra.

Wanda, por sua vez, ouvia sempre um bom-dia por onde passava. Ela era quieta e doce, e o tratamento que recebia era muito similar.

Secretamente, as duas se preparavam para partir. O cotidiano ali era agradável, mas em algum lugar seu irmão sofria, talvez seu pai estivesse vivo, e Natalia iria honrar o dever com a sua pátria, Mãe Rússia. Elas guardavam mantimentos, roupas e comidas enlatadas, bem como subtraiam medicamentos da base para uma longa viagem que fariam sozinhas.

Wanda sabia que ele estava vivo, sentia dentro de seu peito. Se seu coração ainda batia, o de seu irmão gêmeo repetia o mesmo ritmo em algum outro lugar. Só esperava que não notasse os pulos e palpitações dentro de seu tórax quando ela via um sorriso folgado e ouvia gírias de um rapazote do Brooklyn.

Só iriam esperar o final do ano. Apesar de ser inverno, as duas conheciam bem o caminho e nem o frio, e nem nazistas poderiam para-las. Mas algumas coisas poderiam atrasa-las.

Algumas pessoas.

 

Bucky Barnes tentou impressioná-la com um ensopado nada impressionante. Não era raro que cozinhasse para o Batalhão, e embora se tratassem de homens famintos e feridos que comeriam qualquer coisa, ele se vangloriava de receber poucas ou nenhuma reclamação. Admitia, porém, que uma dama como Wanda Maximoff merecia iguarias finas.

Ela na verdade não saboreou muito o prato. Faltava algo, talvez paprikash. Mas não tinha coragem de apagar a expressão orgulhosa de Sargento Barnes ao fazer um ensopado. Ela sorriu, o que o fez sorrir mais ainda. Wanda saboreou a gentileza de seus atos. Mesmo na guerra e entre feridos, ele contava piadas parvas e dividia o pão.

 

Uma noite, Bucky Barnes bateu em sua tenda. Natalia soltou impropérios russos e voltou a cochilar, mas não era como se Wanda estivesse dormindo. Era uma noite de Hannuka, que ocorria na mesma data que o Natal naquele ano, e apesar de não ter velas para acender nem recursos para expressar sua religião, Wanda permanecia acordada entre orações e o pensamento que em algum lugar Pietro também orava por ela.

Quando atendeu Bucky, por quem chamava sempre de James, ficou muito preocupada. Era tarde, deveria ser importante, urgente, mesmo que o restante da base americana estivesse em uma simplória celebração de 25 de Dezembro e não houvesse combate, ao menos naquela noite. Ele adentrou o cômodo, pois estava frio lá fora, e lhe deu uma pequena caixa de papelão. Tentou não encarar muito sua camisola longa e branca, coberta por um casaco.

A enfermeira estranhou o ato, mas agradeceu. Quando abriu a embalagem, viu oito velas pequenas, finas.

— Eu sei que são velas de bolo de aniversário. — Explicou, sem bem saber se soviéticos tinham esse costume de velas em bolos ou não. — Foi aniversário de um dos rapazes e mandaram pra ele essas velas… E eu sei que hoje não é só Natal. Eu vi que usava um pingente de estrela. Eu não tinha como arrumar um menorah pra você, então…

Wanda abraçou-o num pulo, agarrando seu pescoço com os dois braços e soltando lágrimas silenciosas. Passaram alguns minutos assim, só o barulho do vento lá fora e sons esparsos da comemoração fraca de Natal dos soldados. Bucky Barnes achou bom que ela fosse enfermeira, pois poderia tratar dele ali mesmo depois que o abraço terminasse. Sua pressão tinha caído.

Ela sorriu, limpou as lágrimas. Disse obrigada uma centena de vezes.

— Bom… — Ele suspirou. — Eu daria esse outro presente pra você, mas a verdade é que quero aproveitá-lo também.

— O que é?

Bucky abriu a embalagem menor, revelando uma pequena barra de chocolate. Item raro e muito disputado naquele lugar, naquela guerra.

— Oh, James. Pode comer. — Ela riu. — Sei o quanto gosta de doces.

— Mas não teria graça comer sozinho. Vamos, sente, boneca. Vamos comemorar as duas coisas.

Eles acenderam as velas na bancada, de forma discreta e ainda de acordo com a tradição. Depois sentaram-se na maca mais próxima, na barraca da Ala Médica esta noite vazia. Deliciaram-se com o chocolate e com a presença um do outro. Bucky estava satisfeito consigo, pois um sorriso caía muito bem na face de Wanda Maximoff e aquela noite ela gargalhava com as histórias estúpidas de dois adolescentes no Brooklyn, principalmente sobre o primeiro e desastroso beijo de seu amigo Steve Rogers. Foi quando percebeu que se houvesse um visco ali, poderia beijá-la.

Depois viu que esse pensamento era uma mentira. Bucky poderia beijá-la com ou sem o visco. E foi o que ele fez. Esperava um empurrão, um tapa, que Natalia entrasse ali e estourasse seus miolos com uma bala. Mas Wanda o puxou com muita delicadeza para mais perto de si, pegando no colarinho de sua camisa com suas mãos gentis. Eles se entreolharam de maneira breve, houve silêncio. E depois um novo beijo.

Os lábios dele tremeram quando mais uma vez deram uma pausa para respirar. Era tarde e a mão dela estava sobre seu peito, Bucky podia sentir que ela segurava todos os seus sentimentos com a mão. Não teve medo, pois estava em mãos seguras.

Queria que aquele instante durasse a eternidade.

 

James Barnes e Steve Rogers estavam de partida para uma nova missão, uma que talvez não voltassem com o resto da equipe do Comando Selvagem. Iriam até os Alpes, longe, longe. Bucky deu um beijo na face de Wanda Maximoff, prometendo seu retorno em breve e mais uma barra de chocolate. Estavam mais uma vez sozinhos na Ala Médica.

Naquele ponto, Peggy sabia do romance leve dos dois e Steve Rogers também. O que ninguém imaginava é  que as duas mulheres iriam voltar para sua pátria e lutar por ela. Wanda tinha que encontrar o seu irmão e o dia seguinte era sua partida. Estava tudo planejado, as caronas acertadas. Era sua missão.

Não quis contar para ele, mas não quis quebrar seu coração. Esperava que ele voltasse dos Alpes, seguro e com vida. Esperava que a perdoasse. Que a esperasse.

Aquele dia ela aceitou todos os beijos do Soldado, riu de todas suas piadas tolas, atendeu em todas as vezes que a chamara de boneca. Ele pensava que seu olhar triste era causado por sua viagem, quando na verdade era pela dela própria. Ele tentou tirar sua tristeza com uma infinidade de beijos.

 

— Uma dança. — Ele pediu no entardecer. — Mas não a última.

Deram as mãos. Não havia música, mas Wanda repousou sua cabeça no ombro dele. O ritmo era tosco e lento, mal havia graciosidade naquilo. Foi a vez dela implorar que aquilo fosse infinito.

 

Capitão América e seu amigo James Buchanan Barnes partiram. Naquele mesmo dia, Natalia Romanova e Wanda Maximoff também.

 

Nos Alpes, o impensável aconteceu e James Barnes caiu do penhasco. O novo porte físico de Steve, seu carisma e força do ilustre Capitão América não foram o suficiente para salvar seu melhor amigo, aquele que estava lá mesmo quando ele não tinha nada, aquele que ainda estaria ali até o fim da linha.

Ele estava morto, o único do Comando Selvagem a morrer em serviço.

 

Quase já em casa, as duas também encontraram dificuldades. Já não tinham muita comida, embora racionassem. Mal dormiam, pois podiam ser pegas desprevenidas. Foi numa trilha pouco utilizada que se depararam com seu destino, um tanque alemão. Wanda deu sua mochila a Natalia, sua irmã de vida, e a empurrou ladeira abaixo, entre a neve e árvores. Se machucaria, é verdade. Talvez quebrasse algum osso. Talvez a odiasse pelo resto da vida, talvez não sobrasse tanta vida assim. Mas havia a possibilidade de sobreviver no inverno, mas não sob o domínio de nazistas. Natalia ainda respiraria o ar da mãe  Rússia, Wanda não.

Eles pararam para pegar a mulher no meio do nada. Reconheceram-na, a menina que era mais que uma humana, procurada pelos asseclas da HYDRA. Ela representava algo diferente, algo que poderia trazer a vitória ao lado germânico. Diziam que suas mãos magras curavam, que seus olhos podiam arrancar segredos. Tal fato era verdade, embora de uma forma muito menor do que os soldados exaltavam. O único problema era o colar judeu em seu pescoço, sangue sujo em suas veias. Iriam examiná-la de novo. Tirar sua essência e passar o avanço ao povo puro, ariano. Eles disseram com humor na voz:

— Os da laia dessa menina encontraram o fogo, a bala e o gás. Deixe a bruxa no gelo. Vai durar muito mais.

Wanda foi posta na criogenia, seu corpo muitas vezes seria ainda desperto para testar e testar e testar seus poderes, uma arma feita para curar aqueles que só pensavam e desejavam a morte. Já nos limites de sua consciência, Wanda sonhava com o toque gentil do Soldado americano e seu ensopado terrível. Esperava que ele a perdoasse, Natalia e Pietro também.

 

Mas James acordou no gelo, sendo arrastado. Havia uma camada grossa de neve, pinheiros cobertos pela mais alva cor. Não sentia seu braço esquerdo. Teve dificuldade para pensar, mas imaginou que era um resgate. Mal sabia ele que era HYDRA.

Voltaria para Wanda Maximoff, sua enfermeira. Ela cuidaria dele. Ralharia por ter sido tão descuidado, de ter se ferido tanto, e ele faria troça de sua preocupação. Ele ficaria bem. Fechou os olhos. Ficaria bem, pois estaria nas mãos de sua boneca, talvez comendo chocolate, e não existiam mãos mais delicadas e seguras e sabor mais doce que os beijos dela.

 

A guerra acabou em 1945, os experimentos não. Nem mesmo Steve Rogers, o Capitão América, tivera sorte. Se foi numa aeronave, tentando salvar o mundo. James Buchanan Barnes e Wanda Maximoff se encontrariam no futuro, em outra realidade, os dois reduzidos a frações do que um dia foram.

 

Buscariam até encontrar as mãos seguras que um dia entrelaçaram.


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Notas finais do capítulo

*Na minha cabeça, esse AU ainda dá margem a uma continuidade misturada dos quadrinhos com o MCU. Natalia Romanova aka Natasha Romanoff recebeu a versão soviética do soro do supersoldado, envelhecendo num ritmo extremamente lento. Em 2018 ainda estaria viva e encontraria o Capitão América, em 2012.
Eles ficariam muito surpresas quando se deparassem com o Soldado Invernal e a Feiticeira Escarlate, transformados em experimentos da HYDRA.

*Não sei dizer se na realidade duas mulheres soviéticas conseguiriam abrigo numa base americana, se alguém formado em História quiser me corrigir ou sugerir algo, fique à vontade, mesmo que se trate de AU.

*O capítulo foi revisado, mas existe a possibilidade deste arquivo ser sabotado pela HYDRA. Caso encontre algum erro, favor reporte à Shalashaska.

*Peace.



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