Eldarya escrita por Ju Assis


Capítulo 4
Capítulo 3 — Absinto.


Notas iniciais do capítulo

Olá faelianos! Eu sumi devido ao motivo: ranço da Beemoov.



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Kalina

— Kero??? — abri a porta da biblioteca e entrei, receosa.

— Ah! Você está ai. Me d-desculpe! Eu demorei mais do que pensava para encontrar essa belezura. — ele apontou para um grosso livro que estava em cima de uma mesa.

— Sem problemas. — tranquilizei-o.

— É... Você tem algum talento em particular? — perguntou ele.

— Bem... não acho que minhas habilidades mundanas sejam úteis nesse mundo. — arqueei as sobrancelhas.

— Uhm. É verdade. — Kero sorriu sem graça — Vamos começar, então...

Ele me fez algumas perguntas um tanto quanto... estranhas. Mas foi mais fácil do que pensava, e eu tentei responder tudo de acordo com as coisas que eu gostava no mundo humano. E no final do questionário, Kero mencionou sobre os Mascotes que os habitantes tinham e me prometeu me dar um como presente, mas que para isso eu teria que responder outro questionário – para encontrar o que melhor se enquadra com o meu perfil. Fiquei feliz com a ideia de ganhar um cachorrinho, até que ele entrou novamente na sala, com um... ovo.

Como não sabia se ria ou chorava, eu apenas perguntei onde estava meu bichinho. Ele pareceu não gostar da minha "piada" e então me explicou direito como eram os mascotes desse mundo. Aparentemente, você tinha que chocar um ovo primeiro, para depois ganhar o mascote. Isso significava comprar uma incubadora, o que não estava nos meus planos. Eu sequer tinha um centavo no bolso!

— É... Kero, vocês aceitam dólares aqui? — eu interrompi o faeliano, que me explicava onde eu deveria ir para conseguir uma incubadora. — De qualquer forma, eu estou sem condições para comprar essa tal de incubadora...

O rapaz arregalou os olhos e ajeitou as armações de seu óculos.

— Dólares? — ele perguntou, as sobrancelhas franzidas em confusão.

— Sim! — afirmei — É o dinheiro que as pessoas usam no meu mundo. 

— Ah é! Eu me esqueci disso, totalmente! — ele fez uma careta. Depois de uns segundos, ele pegou um papel e começou a rabiscar algo. — Aqui nós usamos os purreuros. Basicamente são moedas de ouro, prata e bronze. Você pode ganhá-las ao prestar serviços aos Purrekos, que são os donos do epicentro comercial de Eel. Também foram eles quem criaram o banco central. E pode deixar que eu vou te dar a incubadora de presente.

— Oh... não precisa, de verdade. — eu gesticulei, tentando fazer ele mudar de opinião.

— Aqui: vá até a loja dos Mascotes e entregue seu ovo para o Purreko junto com esse bilhete e eles cuidarão do processo para você. — Kero sorriu e me estendeu o papel, que eu aceitei com um aceno.

— Muito obrigada por tudo, Kero! E pela incubadora também. — agradeci enquanto saia da biblioteca com o ovo em mãos.

— Hahaha, não tem de quê! Até logo. Assim que eu encontrar o gabarito e somar os pontos, eu te procuro para dizer em qual Guarda está.

Eu sorri. Kero parecia muito distraído as vezes, deve ser por isso que anda perdendo os objetos por ai. Depois de ir até o "petshop-eldaryano" e ajudar o Purreko a colocar o ovo [que se tornaria meu futuro mascote] para eclodir, eu fui dar uma volta pelo QG enquanto esperava o resultado do teste. Como estava sem saber o que fazer, comecei a vagar pelo corredor, até que trombei com alguém... Ou alguém trombou em mim, não sei muito bem.

— BUUUUUUUU!

— Ai! — dei um pulo, assustada.

Ok, não que dar de cara com o rosto de Nevra seja algo para ter medo.

— Você de novo? Vou começar a cobrar por cada trombada que você der em mim. — cruzei os braços, e abri um sorriso de canto.

— Eu?!! Mas é você quem não presta atenção por onde anda. — ele retribuiu meu gesto. — E o que uma senhorita tão linda e charmosa está fazendo sozinha no corredor? Estava me procurando?

— Pff, claro que não! — franzi a testa. Eu estava acostumada com alguns homens da Terra me elogiando o tempo inteiro, mas isso me pegou de surpresa. — Uh... e-eu estou procurando o Kero. Ele provavelmente está com o resultado do meu teste.

— Hum, acho que vi ele no refúgio, posso te levar lá, se quiser. — Nevra disse e começou a caminhar do meu lado.

— Não, obrigada. Eu sei onde é. Posso ir sozinha. — respondi, mas ele continuou ao meu lado do mesmo jeito. Sério que ele vai dar em cima de mim tão descaradamente?

Quando chegarmos no início do corredor, na sala das portas, encontramos com Ezarel e o Valkyon.

— Então, já respondeu o questionário? — o Elfo perguntou.

— Sim. Por que está tão interessado? — ergui uma sobrancelha.

— Oras, nós estamos curiosos para saber quem ganhará uma escrava suplementar. — ele abriu um largo sorriso.

— Não ligue para o que ele está dizendo, ele está brincando. — Nevra piscou um olho.

— Eu tenho cara de quem estou brincando? — Ezarel fechou a cara.

— Não, não tem. — respondi, mordendo a língua. E eu tenho cara de quem quer ser uma escrava suplementar? Eu já estava perdendo a paciência com esse elfo metido!!

— Pff, não fale assim com ela, Ez. Espero que tenha entrado para minha Guarda. Será um prazer te ter. — Nevra sorriu alegremente e saiu assoviando.

— Ele é sempre assim? — ergui a sobrancelha. O platinado fez que sim com a cabeça. É, pelo visto o Valkyon não era de muita conversa.

— Hum... e você, o que acha? — virei-me em sua direção, ignorando o Ezarel, que também ia embora.

— O quê? — perguntou Valkyon, distraído.

— Quero dizer... as chances de eu entrar pra Obsidiana.

Como se fosse a primeira vez que me notasse, Valkyon olhou pra mim de cima para baixo, com um ar impassível. Ruborizei.

— Quem sabe... — ele assumiu um ar pensativo — você sabe lutar?

— Um pouco, sim. Eu fiz algumas aulas de artes marciais e defesa pessoal quando era criança.

— Já é um bom começo, mas se você quiser mesmo entrar na minha Guarda, vai precisar fazer bem mais que isso. Sinto muito, mas tenho que ir resolver algumas coisas agora.

~*~

Assim que me viu entrar na biblioteca, Kero fechou alguns mapas que estava analisando em sua mesa e caminhou até mim com uma expressão animada em seu rosto.

— Kalina, que boom que chegou! Eu já tenho o resultado do seu questionário. 

— E então, qual o resultado? — comprimi os lábios com excitação e entrelacei os dedos para conter a curiosidade.

— Hum... Só um instante! — Kero folheava as páginas de um bloco de notas que carregava consigo. — Bem, pelas minhas anotações.... Você está na Absinto. Parabéns!

— O quê?! — foi impossível esconder o tom de indignação na minha voz. — Isso aí deve estar errado. Alquimia e eu não nos damos bem. E trabalhar com Ezarel vai ser tipo fazer trabalho em grupo na Faculdade!

Kero pareceu não entender minha referência, mas deu de ombros.

— Não vai ser tão ruim, você vai ver...

— Ah, tá. — revirei os olhos.

— Hum, a Ykhar me pediu pra preencher alguns relatórios... Você deveria procurar os rapazes e pedir alguma missão, aproveite para dizer em qual Guarda está.

Entrei no QG emburrada. Eu não combinava nada com Alquimia, preferia muito mais ser útil nas explorações e missões de espionagem, como Kero havia mencionado quando falava da Guarda Sombra, nem que isso significasse ser assediada à todo instante pelo Nevra. O que não era má opção.

Ei, mente pervesa. Pare com isso! Não é hora de pensar em romance.

— Ei, você não poderia fazer alguma coisa útil ao invés de ficar zanzando por ai? — Ezarel gesticulou pra mim.

— Uh... — dei de ombros. — Mas eu estou fazendo algo útil. Kero me pediu para avisar aos rapazes em que Guarda eu fiquei.

— Parece interessante. Então a garotinha já sabe quem vai ser obrigado a suportá-la? — Ezarel desdenhou.

— Sei sim. — abri um largo sorriso. Ah, mas eu vou adorar irritar este cara. — Será justamente você. E ai, não vai dar as boas vindas para a mais nova integrante da sua Guarda?

— O quê?! — ele arregalou os olhos. — Na absinto? Você?! É impossível! Deve ter alguma coisa errada. Você tem certeza que respondeu as questões corretamente?

— Ah, mas eu fiz questão de responder tudo aleatoriamente. — provoquei. Não era verdade. A verdade era que eu não tinha entendido nem metade das perguntas!! Em seguida eu coloquei minha mão no seu ombro de Ezarel a fim de tranquilizá-lo e sorri cinicamente. — Mas não se preocupe... será só até vocês darem um jeito de me mandar para casa.

— Ei, não me toque! — Ezarel apertou meu punho com força.

Eu ergui as sobrancelhas, soltando-o imediatamente.

— Você tem algum problema, hein??! — massageei minha pele, que havia ficado dolorida pelo gesto brusco do chefe da Absinto.

Ele revirou os olhos, seu silêncio acabou fazendo eu perder a paciência e dar meia-volta para sair dali.

— De qualquer forma, é sempre bom ter uma escrava complementar! — o elfo disse em voz alta.

— Ah, vá se foder, Ezarel! — exclamei sem olhar pra trás.

Droga, não era aqui que eu queria ter vindo... — suspirei desanimadamente ao dar de cara com o corredor interminável das Guardas. Mas mesmo assim, não ia voltar para lá e ter que cruzar com Ezarel depois de ter feito a minha saída triunfal. Eu continuei andando devagar à fim de matar o tempo até que quase trombei com alguém. Santa arte em trombar nos corredores! Essa eu domino.

— Oh... olá, Kalina. — o rapaz, cujo o nome eu me lembrava ser Leiftan, me cumprimentou.

— Ei, Leiftan! Olá. — sorri, surpresa.

— Você está oficialmente em uma das guardas agora?

— Estou! Na Absinto. — eu respondi, ao mesmo tempo em que meu estômago soltou um barulho alto. — Caramba... desculpe. — segurei um riso.

— Você deve estar com fome, quer comer algo?

— Espere, eles não vão me acusar de ter persuadido pra roubar comida, ou vão? — fiz uma cara pensativa, esperando que ele não levasse a minha brincadeira tão à sério.

Ele riu, fazendo com que eu sorrisse novamente.

— Não, eles não vão. Venha! — gentilmente, Leiftan pegou minha mão e caminhou comigo pelo corredor. Estranhei esse pequeno gesto, mas me pareceu um ato digno de um cavalheiro, então não reclamei. Ele me levou até a despensa. — E então, está animada para trabalhar com Ezarel?

— Nem um pouco. — suspirei, vendo ele cortar algumas fatias do pão que estava em cima da mesa. — Hmmm... Leiftan? — chamei-o. — Agora que eu entrei na Guarda, você pode me dar algum conselho?

— Bem, você pode conversar com os rapazes para ver se eles podem lhe dar alguma missão. — Leiftan era ágil em seus movimentos e escolhia os itens que iria usar com maestria, como se fizesse isso sempre. Depois de organizar tudo que precisava, ele sorriu para mim. — Ei, não precisa ficar ai parada. Sente-se, Kalina!

Sorri timidamente, me sentando numa das cadeiras perto da mesa.

— Geralmente nós comemos na cantina, logo ali na frente. — ele apontou pro leste. — Mas ainda faltam algumas horas pro jantar, então não tem ninguém lá. Além do mais, posso fazer uma exceção para você. — deu uma piscadela.

— Obrigada.

— Quer dois sanduíches? — perguntou ele, erguendo o olhar. — Aposto que deve estar com muita fome. Eu irei pegar água também. Karuto está racionando o alimento ultimamente, mas você meio que merece isso.

Leiftan sorriu sem mostrar os dentes, tímido, como se pedisse desculpas pelo que aconteceu comigo desde que cheguei.

— Tá bom, pode ser. — Eu respondi, sem graça. Leiftan era bonito. Enquanto ele cortava algumas espécies de vegetais para montar nossos sanduíches, eu o observei melhor. Suas vestes deixavam o abdômen para fora, fazendo com que eu pudesse contemplar seu corpo musculoso um pouquinho. Ele parecia ser muito gentil e se sentou ao meu lado para comer.

O gosto do alimento deles era meio... diferente. Mas enfim, era melhor isso do que nada. Eu estava há tanto tempo sem comer e no meio de toda essa reviravolta eu nem havia tido tempo para perceber isso. Cada mordida fazia com que eu suspirasse com um pouquinho de prazer. Leiftan parecia se entreter quando eu intercalava a comilança com grandes goles d'água.

O faeliano terminou sua refeição primeiro do que eu e esperou educadamente que eu finalizasse o meu segundo sanduíche. Antes de dar a mordida final, pousei delicadamente os braços na mesa e encarei o alimento. Depois de algum tempo, ergui o olhar para Leifan.

— Eu... — suspirei. — Eu preciso voltar para casa, Leiftan!

— Kalina, eu entendo a sua dificuldade em aceitar... Mas as possibilidades disso acontecer são praticamente impossíveis. Para ser sincero, nós estamos passando por dificuldades e temos outras prioridades no momento.

— Eu sei, o Kero me contou. — observei.

— Você me entende agora? — Leiftan sustentou nosso olhar por um momento. — A Guarda Reluzente deve primeiro zelar pela segurança dos habitantes de Eldarya. Infelizmente sair agora daqui é muito complicado, exigiria um sacrifício enorme... E a Miiko tem outras prioridades no momento. Você é a menor delas, diga-se de passagem.

— Mas... — engoli a vontade de chorar. — Vocês não poderiam tentar...

Ele balançou a cabeça negativamente.

— Desculpe, mas está fora de questão. Principalmente agora que os níveis de maana estão instáveis. Nós não podemos arriscar, entende?

Permaneci calada.

— Mas tem que haver um jeito! — minha voz desafinou. — Não há pelo menos alguma forma de se comunicar, tipo... cartas de fogo? Eu preciso falar para minha família que estou bem ou...

— Você não é a primeira humana que entra no nosso mundo, e não será a última. — Leiftan colocou a mão no meu ombro. — Um dia eles pararão de te procurar e...

— Não... — minha respiração foi acelerando e senti um pânico enorme tomar conta de mim. Eu me levantei de forma brusca, sentindo meus sentidos oscilarem. — Eles não podem, eles não podem...

— Ei, desculpe, eu não quis te magoar. — Leiftan se levantou e chegou mais perto.

— Eu... — minha garganta trancou. Logo, minha visão estava embaçada por causa de lágrimas. Leiftan colocou as mãos em meu rosto e o acariciou suavemente.

— Ei Kalina, não chore. Ei, olha pra mim. — ele limpou minhas lágrimas. Encarei seus olhos claros por um momento. Um tom de verde mais lindo que eu já vi. — Você tem um novo lar agora, está bem? Está viva e tem um lugar pra morar e é isso que importa.

Leiftan sustentou o olhar e por um momento me perguntei se o brilho em sua íris significava preocupação. Provavelmente ele estava só tentando ser gentil. Eu suspirei fundo antes de o responder.

— Tem certeza? — sorri tristemente. — Eu não chamaria uma cela de ''lar.''

Ele riu suavemente.

— Foi apenas um mal entendido. Eu vou pedir para Miiko providenciar um lugar para você se alojar e descansar, está bem?

— Obrigada por tudo, Leiftan. — suspirei, me sentindo mais calma.

— Disponha. E agora termine sua refeição, por favor!

Depois de se certificar que eu estava de fato bem, Leiftan me deixou sozinha. Eu me sentei de novo na cadeira e fiquei encarando o centro da mesa por um interminável momento até que... bem: tudo ficou preto e eu só me dei conta da situação quando alguém começou a me cutucar e xingar.

— O quê? Ah... — olhei para o dono da voz. Era um homem com... pernas de cavalo ou algo do tipo. Eu quase engasguei, mas lembrei que estava num mundo mágico onde... tudo parecia ser possível.

— Você tá me ouvindo, garota?

— O quê? — esfreguei meus olhos. — Eu... eu... Me desculpa, eu só estou cansada.

— Pois bem, vá dormir no seu quarto!

Boa ideia!

— Uh... — comprimi os lábios. — Eu não tenho um quarto.

— Como assim, não tem um quarto???

— Eu acabei de chegar e...

— Ah, você é a humana?! — o homem arregalou os olhos. — Jamon!!! — ele berrou.

Ah não, ele de novo não... — me levantei rapidamente, só quando eu dei meia volta, o gigante já estava ali.

— Karuto chamar? — Jamon perguntou e mandou um olhar da perdição pra mim.

— Sim. Dê à essa moça um quarto, ela está atrapalhando o meu trabalho, aqui. 

Olhei para ele surpresa, mas antes de poder agradecer, a voz grave de Jamon fez os cabelinhos dos meus braços se arrepiarem.

— Miiko não dar ordem sobre quarto, Jamon não poder fazer nada. — o gigante deu de ombros.

— Não é problema meu. Vocês são uns incompetentes, até isso sobra pra mim!!! — Karuto saiu esbravejando. Era engraçado o jeito que ele andava por causa de suas pernas — DIGA À MIIKO QUE EU NÃO SOU PAGO PRA SER BABÁ DE NINGUÉM!!! 

Depois disso, escutei uns barulhos de panela batendo. 

— Poxa, qual é a dificuldade de ser cordial aqui? Vocês poderiam ter umas aulinhas com o Kero e o Leiftan, né gente? — sussurrei e encolhi os ombros.

— Kero e Leiftan não poder dar aulas. Eles ter muita coisa para fazer — afirmou Jamon. Sua convicção me fez abrir um pequeno sorriso. Ele com certeza não sabia reconhecer um comentário sarcástico ou irônico.  — Agora você vir comigo!

Olhei pra Jamon e meu coração acelerou com a hipótese de ser arrastada mais uma vez. Felizmente, o gigante apenas resmungou e fez um sinal para que eu o seguisse. Nós saímos pela dispensa e caminhamos até a sala das portas.

— Onde estamos indo? — perguntei.

— Humana não ter quarto, Jamon falar com Miiko.

— Sala do Cristal, presumo? — eu olhei curiosamente para o corredor das guardas.

Ele apenas fez um som de afirmação, começando a subir as escadas.

— Jamon... — suspirei de felicidade ao notar que o "segurança", da Miiko estava respeitando a velocidade dos meus passos. —  Obrigada por não me arrastar dessa vez.

— Jamon não ser mau. Apenas seguir ordens. — ele resmungou.

Antes que eu pudesse falar algo, nós chegamos até a Sala onde a Miiko deveria estar. De fato, ela estava reunida com os garotos da guarda. Eles pareciam se divertir. Miiko até virou sorrindo em nossa direção, até nos ver. Ou melhor: me ver.

— Você de novo? — a jovem revirou os olhos.

— Ela precisar de quarto. — pronunciou Jamon. — Descansar.

— Ah, sim... sim. Certo, eu tinha me esquecido disso. — a líder suspirou. E em seguida, com um estalar de dedos, um moito de chave apareceu em suas mãos. — Rapazes, vocês estão livres para ir. Jamon, vigie a sala para mim.

Miiko caminhou com segurança em minha direção e as palavras ditas com firmeza me fizeram admirá-la por um instante. Ela não vacilava nem por um segundo enquanto dava ordens e mantinha uma postura impecável ao se deslocar pelos ambientes, deveria mesmo ser uma boa líder para esse mundo.

Nós fomos andando em silêncio até o corredor das Guardas, a Miiko na frente e eu atrás. Deus sabe como eu gostaria parar de fitar as quatro caudas da jovem, mas era impossível. De certo modo, esse conceito de magia e novas raças ainda era tudo novo pra mim.

— Eu pedi para que Ykhar escolhesse um de nossos aposentos vazios pra você. — Miiko quebrou o gelo, fazendo com que eu me envergonhasse por estar encarando seu traseiro tão descaradamente. — Você pode decorar de acordo com seus gostos depois. — ela parou em frente à uma porta e destrancou-a.

Entrei no quarto. Ele estava estranhamente bem organizado e cheirava à lavanda. Além da cama, havia uma estante vazia, uma penteadeira e uma cômoda, todos pintados num tom creme. As cortinas brancas em harmonia com as paredes cor de pêssego transmitiam uma sensação de paz, fazendo a cama de casal com uma enorme colcha branca parecer muito convidativa.

Miiko caminhou lentamente para dentro.

— Dentro da gaveta da cômoda tem um par de roupas limpas e novas. Considere como um presente de boas vindas e... um pedido de desculpas pelo modo como de tratei mais cedo. Eu realmente estou um pouco nervosa ultimamente. Muita coisa vem acontecendo. — ela suspirou.

— O-obrigada. — eu sussurrei, quase em choque. 

— Posso te pedir mais uma coisa? — ela arregalou os olhos.

— Sim, claro. — eu fingi limpar a garganta para disfarçar a perplexidade. Desviei o olhar para a cômoda e percebi que havia um relógio em cima dela.

— Amanhã, quando acordar e depois que tomar café da manhã... — Miiko engoliu em seco. — Será que você poderia ir conversar com a gente?

— Ok, eu irei.

— Obrigada, Kalina. — a jovem sorriu agradecida.

— Você lembra meu nome? — arqueei as sobrancelhas.

— Claro. — ela sorriu — É dever de uma verdadeira líder conhecer todos e tudo que acontece ao seu redor. — ela suspirou e eu pude ver um lampejo de tristeza em seu olhar. — Bom, eu preciso ir. Tenha uma boa noite.

Ela saiu sem olhar pra trás.

— Boa noite... — dei de ombros.

Olhei para janela e vi que realmente um crepúsculo começara a tomar conta do céu. Me aproximei para observar melhor a paisagem. Afastei as cortinas e escorei meus braços no mármore, sonhadora. Avistei um campo verdejante, composto por uma vegetação encantadora: arbustos cheios de flores das mais diversas cores, samambaias, relva, abetos, pomares de cerejeiras cobertas de flores...

Uma leve brisa soprava e senti um perfume delicioso e doce inundar meu olfato. O céu era uma coisa linda de se ver, um crepúsculo bem inusitado se formava e a lua já era visível bem no alto... Ela era grande e emanava um brilho branco levemente azulado. Havia inúmeras estrelas no céu e não consegui identificar nenhuma constelação.

— Caramba, já é noite? — arqueei as sobrancelhas e cocei o queixo. — Como será que tudo isso funciona aqui? 

Para um mundo "mágico", o panorama Eldarya parecia bem normal — tirando os habitantes, claro. Mas ainda se parecia bem semelhante à Terra: o céu com estrelas, lua, sol, vegetação, construções, vilarejos.... E claro, isso me fez suspirar de saudades.

Antes que meus pensamentos se tornassem um  turbilhão, eu resolvi ir checar as roupas. Elas eram bonitas, até! Haviam cerca de quatro conjuntos e embaixo deles, encontrei um bilhete.

''Olá, Kalina! Eu sou a Yhkar. Você ainda não me conhece, mas provavelmente iremos nos ver em breve, hihi! Bem, eu espero que você cuide bem do seu quarto e tenha uma ótima noite de sono. Err... para tomar banho é só seguir até o final do corredor, os chuveiros ficam lá. Temos sanitários espalhados por todo Q.G.

Tomamos café da manhã todos os dias às sete e meia da manhã no refeitório. Não se preocupe porque eu já ajustei o relógio — e despertador —  pra você. Os almoços são meio-dia e os jantares são servidos às oito horas da noite. (Se você quiser eu posso fazer um quadro de horários mais tarde.)

A Miiko escolheu esse conjunto de roupas pra você, se ficar muito pequeno é só trocar com os Purrekos depois. Ah! Dentro do armário você vai encontrar dois pares de roupa de cama limpos.

Beijijnhos. ''

Sorri ternamente e depositei o papel-carta em cima da cômoda, ao lado do relógio. Notei que já era oito da noite, o que significava que o jantar estava sendo servido. Meu estômago parecia feliz com o que Leiftan havia preparado para mim, então eu me joguei na cama sem pensar duas vezes.

Era macia, extremamente macia. Mil vezes mais aconchegante que a minha cama na Terra. Mas não era melhor. Não sem o cheiro do chocolate quente que minha mãe preparava para todos antes de dormir. Até mesmo os ruídos de carros e motos passando pelas ruas faziam falta. Os latidos de Shrek ou os miados da gatinha Amy e ... Tantas outras coisas.


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Notas finais do capítulo

Beijos da tia Ju.
Fiquem bem!
04/05/2020



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