2014
Era inverno quando os Kim, agora uma família de três, se mudaram do apartamento para uma casa bem maior, onde teriam espaço o suficiente para que Jin tivesse seu ateliê, Namjoon tivesse seu estúdio e Yoongi tivesse um irmão.
Sim, um irmão.
Um ano tinha se passado desde o dia em que Yoongi decidiu aceitar a ajuda de seus hyungs, e agora ele era oficialmente um Kim. Não fora fácil mais de meio ano batalhando pela guarda do rapaz de agora catorze anos, porém valeu a pena. Valeu a pena quando Namjoon e Jin foram chamados de “Appa” pela primeira vez, valeu a pena quando eles decoraram o quarto do rapaz com seus músicos favoritos, valeu a pena pelo abraço apertado que receberam de Yoongi quando ele era finalmente um Kim. Tudo tinha valido a pena. E agora eles queriam aumentar a família novamente, por pedido do próprio Yoongi. Passaram por todo processo seletivo e todas as inspeções, agora só precisavam visitar o orfanato, lugar para onde iam quase em silêncio.
Quase, porque enquanto Kim Yoongi e Kim Namjoon estivessem juntos, existiria alguma música de hip-hop tocando e os dois rimando juntos, ou até batalhando, mesmo que Jin gritasse toda vez que escutava um palavrão, o que não fora poucas vezes, fazendo os dois outros apenas rirem.
—Appa, você tem que entender, hip-hop tem palavrão. – Yoongi disse entre risadas.
—Isso eu entendo, mas não quer dizer que aprovo – o mais velho fez um biquinho e cruzou os braços. – Não gosto do meu marido e do meu filho falando palavras feias. E é melhor que vocês não ensinem isso para o meu sol!
Isso fez os dois rirem mais ainda. Jin tinha pegado a mania de chamar o futuro membro da família Kim de sol, mesmo quando ainda não tinham sido liberados para a adoção, e ele tinha feito toda a decoração do quarto com esse tema. Era realmente um quarto iluminado.
—Estamos chegando – Namjoon avisou. Ele ia quieto por estar nervoso, lembrava de todo processo que passaram para que Yoongi fosse deles e isso o fazia tremer dos pés a cabeça, só de pensar que poderia passar por isso de novo.
O orfanato era uma casa gigante que um dia fora uma escola, pintada de amarelo e vermelho, um prédio vibrante diferente de todos os seus vizinhos, mas estranhamente quieto. O carro da família Kim achou uma vaga facilmente, e logo os três estavam entrando no prédio, os adultos com ombros tensos e o mais novo nervoso, porém distraído pela música que soava em seus fones de ouvido. A recepção era pequena e logo a família estava sendo guiada para a área onde todas as crianças estavam, o jardim nos fundos do local. Parte dele havia sido transformada em um grande playground onde as crianças menores corriam e gritavam já outro lado tinha pequenos bancos de madeira com almofadas, onde os maiores estavam, muitos com livros na mão, e pela primeira vez desde que fora adotado, Yoongi se sentiu perdido. Sabia que haveria muitas crianças, mas todas essas vozes falando ao mesmo tempo o deixavam tonto e com vontade de se esconder.
Namjoon e Jin sabiam reconhecer esses sinais, e por isso o mais novo dos dois colocou o braço sobre os ombros do filho e o guiou por entre as crianças, sendo seguido de perto pelo marido. Passavam por entre eles, mas a maioria os dava um sorriso educado e os ignorava logo em seguida, entretidos em um livro ou em uma brincadeira, até que Jin sentiu sua canela ser cutucada e se virou, deparando-se com um pequeno raio de sol.
~~*~~
Na volta, o carro estava silencioso, e isso era graças ao garotinho de seis anos que dormia apoiado em Yoongi. Tinha cabelos escuros e um rosto alongado, com o corpo encolhido contra o irmão mais velho, mesmo que o assento de segurança impedisse que estivesse completamente jogado contra Yoongi.
Quando o conheceram, o rapaz tinha uma flor nas mãos, que foi entregue a Jin com um sorriso. A conversa entre os três Kim e o garotinho durou longas duas horas, incluindo pausas para brincadeiras e para o lanche do rapaz. A conexão entre os quatro fora instantânea, e era óbvio para Jin que aquele era seu filho, assim como fora Yoongi.
E quando os papéis eram assinados, o menino dormiu no colo de Namjoon. Ele precisava de carinho para dormir direito, e carinho não foi o que faltou, já que Jin e Yoongi também estavam encantados com o rapaz.
Kim Hoseok.
Eles chegaram em casa rapidamente, e Namjoon foi o que pegou Hoseok no colo para manter o garoto no sono tranquilo. Jin se ocupou em fazer o jantar, enquanto Namjoon buscava seu computador, onde produzia grande parte das musicas. Sentou-se no chão da sala, em frente ao sofá onde Hoseok continuava a dormir, e Yoongi sentou-se ao lado do pai. O garotinho tinha apenas catorze anos, mas era um gênio da música.
Quando Jin (que tinha decidido fazer bulgogi para a janta) apareceu na sala, se acomodou do lado do marido e espiou a tela do computador.
—Quando você vai lançar sua mixtape, Joonie? – o mais velho perguntou, vendo o outro roubar o caderno de Yoongi para copiar algumas linhas. – Vocês dois tem tanta música que daria pra montar dois álbuns.
—É verdade, Namjoon-ssi. Você bem que poderia lançar uma mixtape agora e nem ia dar muito trabalho – Yoongi concordou.
—Vocês são exagerados! – Namjoon riu. – Eu sou produtor, não rapper.
—Não é rapper? Então como foi que eu te conheci, Rap Monster? – Jin disse provocando.
—Rap Monster? – o adolescente perguntou curioso, vendo Namjoon ficar corado até a raiz dos cabelos roxos.
—Seu pai e eu nos conhecemos numa batalha de rap, Yoon. E o nome artístico dele era Rap Monster. – o mais velho explicou para o garoto, que agora estava surpreso. Jin não parecia do tipo que frequentava batalhas.
—Por isso que seu nome como produtor é RM, pai?
—Não. RM é de real me, o meu eu verdadeiro. – Namjoon bagunçou o cabelo de Yoongi.
—Eu adoraria ver você batalhando, appa. Você deve ser ótimo! – o menino disse empolgado.
—Faz muito tempo, Yoon, eu estou enferrujado – o homem de cabelos roxos encerrou o assunto, sabendo que se continuasse, acabaria batalhando com Yoongi ali mesmo, na sala.
—Um rapper como você não enferruja Joonie, você era brilhante – Seokjin disse afinal, indo verificar o jantar que tinha deixado cozinhando. – Yoon, vai tomar seu banho antes de comer, aqui já vai ficar pronto.
O adolescente obedeceu, levando consigo para o andar de cima seu caderno de músicas, muitas delas que acabavam esquecidas naquelas folhas. Namjoon deixou de lado o computador e voltou-se para o garotinho adormecido no sofá. Há essa altura, Hoseok tinha se remexido e abraçava uma das almofadas junto ao seu corpo, ainda todo encolhido. O adulto sorriu doce e se pôs a tarefa de tentar acordar o garotinho.
—Hoseok-ah – ele chamou gentilmente, tentado a fazer cócegas no filho. Ao invés disso, fez um leve carinho nas bochechas do menino, e isso foi o suficiente. – É hora da janta.
A criança sentou-se no sofá, ainda agarrado a almofada. Manhoso, estendeu os braços para Namjoon, que o pegou no colo sem hesitação e o levou para a cozinha, onde Jin terminava de cozinhar o arroz para o bulgogi.
—Olha quem acordou – o mais velho disse sorridente, deixando de lado as panelas para poder cumprimentar Hoseok direito. – Você estava cansado, não é?
O menino assentiu e deitou a cabeça do ombro de Namjoon, bocejando um pouco. Os adultos trocaram um olhar, e Jin foi rápido em chamar a atenção do garotinho de volta para si.
—Hoseok-ah, quer conhecer a sua casa nova? – mais uma vez, o menino assentiu. – Namjoon vai te mostrar, e depois vocês vêm jantar conosco, okay?
Com isso, Namjoon colocou Hoseok no chão, segurando a mão dele enquanto mostrava a casa um tanto quanto grande para eles quatro. Quando tinham acabado o tour, Hoseok estava 100% desperto e animado. Eles voltaram para a cozinha, encontrando um Yoongi de pijama arrumando a mesa ao lado de Jin, que tinha em suas mãos trazia a janta, e isso fez Hoseok sorrir, principalmente quando Namjoon o apontou a mesa e disse para que ele escolhesse um lugar. O garotinho de seis anos era muito observador e viu a pequena rotina que aqueles três tinham, e como Jin e Namjoon se cumprimentaram com um selinho simples antes de se separaram para organizar a mesa, e como Yoongi automaticamente foi para perto de Namjoon quando eles sentaram, e como Jin sorriu feliz por ver Hoseok sentar-se ao seu lado.
Parecia uma família de verdade, sua família de verdade.
Os Kim não eram organizados na janta, e aquele dia não fora diferente. Yoongi e Namjoon elogiavam a comida de Jin enquanto se provocavam enquanto o próprio Jin tentava evitar que uma guerra de comida acontecesse de novo (acontecera uma vez e fora o suficiente para os três se arrependerem). E não seria uma janta se Namjoon não tivesse quebrado alguma coisa.
Quem viu foi Hoseok, e foi apenas uma lasquinha do prato que o adulto usava. Namjoon piscou para o garotinho, como se pedisse silêncio, já que Yoongi e Jin estavam distraídos falando sobre algum evento na escola. Mas a piscadinha não foi o suficiente, uma vez que Hoseok cutucou Jin, conseguindo a atenção do mais velho para si.
—Appa quebrou o prato – ele disse, sem perceber o que tinha acabado de dizer.
—Namjoon-ah! De novo? – Jin disse rindo. A felicidade de ter Hoseok chamando Namjoon de pai o impedia de brigar com o esposo. Eles não esperavam que fossem chamados assim tão cedo. – Obrigado por avisar Hobi.
Hoseok, Hobi, sorriu. Ele nunca tinha recebido um apelido que significasse tanto para ele. Era um apelido dado a ele por seu pai, o fazia se sentir parte daquela família.
Era um sentimento bom.

Três anos depois

—E o primeiro lugar vai para – a diretora da escola fez um pequeno suspense antes de anunciar – Kim Hoseok!
O garotinho levantou-se da multidão de alunos e subiu no palco, recebendo a medalha e um troféu da sua professora de dança. Ele se postou no meio do outros colegas, de frente para os pais e professores, com um sorriso enorme no rosto, procurando por sua família.
Não foi difícil encontrá-los. Jungkook gritava “esse é o meu hyung!” durante a salva de palmas que os vencedores recebiam, pulando em cima do banco, vigiado de perto por Namjoon, que segurava um Taehyung agitado com todo o barulho. Jin, ao seu lado, tinha Jimin nos braços e um sorriso no rosto, e ao lado de Jin estava Yoongi, também sorrindo e com uma câmera nas mãos tirando fotos do irmão mais novo.
Hoseok sentiu seu sorriso aumentar quando reconheceu o sentimento nos olhos de sua família: Orgulho. Ainda naquela manhã, antes de sua competição de dança, ele tinha prometido a eles que traria o maior prêmio, e ele conseguira. Levaria o troféu para casa, e colocaria ao lado dos troféus que seus pais tinham, perto do pequeno laço azul que Jungkook tinha ganhado no futebol. Ele se sentiu orgulhoso de si mesmo.
O sol parecia brilhar para ele mais uma vez.

“Querida, os sorrisos voltaram para os rostos. Querida, parece que fazem muitos anos desde que ele esteve aqui. Lá vem o sol, e eu digo, vai ficar tudo bem. Lá vem o sol”.
Here Comes the Sun – The Beatles