A Herdeira do Quarto Trono escrita por R31


Capítulo 13
Três Estátuas e Uma Lanterna


Notas iniciais do capítulo

Olá senhoras e senhores, damas e cavalheiros, como vão?



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“Tome cuidado. Quero estar com você de novo quando tudo isso terminar”

Prodigy - Trilogia Legend

 

De tudo o que Laura já havia imaginado sobre com seria beijar Nathan, nada chegou sequer perto da realidade. Ainda assim, quando ele segurou seu rosto entre as mãos e a beijou, ela foi totalmente surpreendida, surpresa, arregalou os olhos, antes de se deixar levar. Hesitante, ela ergueu os dedos e acariciou o rosto de Nathan e em seguida, entrelaçou-os nas mechas sedosas do cabelo dele, trazendo-o mais para si, aprofundando o beijo. Qualquer chance de reatarem convivência apenas como amigos que pudesse existir entre eles, ela acaba de ir pelo ralo. Este era um ato sem volta.

Nathan sorriu internamente, os lábios de Laura eram doces e deliciosamente molhados, ele se sentiu feliz por não ter sido rejeitado, teve de conter um ruído de satisfação. Já havia muito tempo que ele desejava Laura de volta a sua vida, mas já não mais como apenas sua amiga. Laura era sua dama, sempre foi, mas agora, ele queria que ele fosse sua de todas as formas.

—Me perdoa Laura - sussurrou ele perto dos lábios dela, antes de afastar um pouco e a olhar nos olhos -, eu não consigo ficar mais uma semana fingindo que não quero ficar perto de você, não quero mais fugir do passado, nem do futuro, quero encará-los junto de você...

—Eu... -Sussurrou ela, sabendo que este é um momento importante para ambos, mas seus pensamentos ficaram confusos, tudo o que ela queria era que ele se calasse e simplesmente continuasse a beijá-la. -... Eu acho que teremos muito tempo para conversar sobre isso mais tarde.

Com isso, Laura segura a camisa dele pelo colarinho e puxa o rosto dele para si, colando seus lábios novamente, despertando dentro de si um sentimento à muito tempo repreendido, Nathan desceu uma mão para a cintura dela, puxando-a para si ao se levantar. Alguns momentos depois, ambos estavam tão absortos um no outro que, quando o foco da luz acima de suas cabeças apagou do nada, com um estalo, ambos saltaram para longe do outro, assustados, achando que foram pegos em flagrante.

—Pela juba do Leão, o que foi isso? -Diz Laura, piscando para que seus olhos se adaptarem melhor à falta de luz.

—O que foi o quê? A falta de luz ou eu te beijando? -Diz Nathan, rindo de nervoso, agradecido pela falta de luz no local, pois assim Laura não poderia ver que o quão vermelho ele ficou, quando se deu conta do que estava prestes a tentar caso a luz não faltasse. Laura gaguejou nervosamente algo antes de parar por um segundo, respirar fundo e tentar pôr as ideias no lugar.

—Os dois, acho eu… -Comentou ela, se permitindo rir de seu próprio embaraço. Ela se virou para sua escrivaninha e tateou o tampo em busca da lanterna que havia ficado consigo após a batalha contra o dragão.

Com um sorriso bobo nos lábios, Nathan se aproximou da janela do quarto dela, por onde uma luz muito tênue da noite passava vinda da rua e olhou por ela.

—Bom, quanto ao beijo, não vejo a hora de repetir a dose, e quanto a luz, creio que foi um apagão que atingiu o quarteirão inteiro. -Tudo o que era visível aquela hora se devia ao fato de que a neve branquinha cobria praticamente todo o resto.

Quando ouviu isso, o rosto de Laura enrubesceu fortemente, um segundo antes de seus dedos esbarrarem no frio metálico conhecido da lanterna. Laura a apanhou e assim que a ligou, um feixe de luz claríssimo iluminou todo o quarto.

—Quem diria, para uma lanterna de quase quarenta anos, ela é potente… -Comentou Nathan, com um assobio.

—Pois é, incrível, não? -Diz ela, mirando a luz direto no rosto dele.

—Ei! -Diz Nathan, tentando evitar a luz e tirar a lanterna da mão de Laura, mas ela tirou o aparelho para longe do alcance dele, rindo. -Pare com isso, Laura. -Rindo, Nathan tentou novamente tirar a lanterna de Laura, ambos travaram uma pequena luta de brincadeira, rindo e disputando o objeto, a brincadeira deles mal durou um minuto quando, ao longe, ambos ouviram sons de alarmes de carros disparando por sobre o som de latidos e miados nas casas vizinhas, som que eles haviam ignorado até então.

Laura parou de rir aos poucos, quando pensou ter ouvido alguém gritar seu nome. Nathan ouviu o mesmo e, no mesmo momento ele se calou, a mesma pessoa que chamava Laura, também o chamava. E tal voz soava desesperada, vinda da rua.

Confusa, Laura olha de relance pela janela, olhando para a rua, para ambas as vias e, para sua surpresa, ela viu duas figuras correndo, subiam a rua na direção da casa dela.

—Laura! -A voz que a chamava ao longe soou de novo, desta vez, ela reconheceu o tom e a quem essa voz pertence.

—Victor? -Sussurrou ela, antes de disparar pelo quarto. Nathan, ao ouvir o nome de seu melhor amigo sair da boca de Laura, sentiu que algo errado estava acontecendo e não hesitou em correr atrás de Laura. Já que ele tinha a posse da lanterna agora, ele alcançou Laura antes da escada, tomou a dianteira e foi na frente, iluminando todo o caminho com o aparelho prateado. Num segundo, eles estavam na porta da frente, Laura com a mão na maçaneta para abrir a porta, quando, vindo da sala de estar, a voz de Maicon e Susana chegaram aos ouvidos de Laura e Nathan:

—Laura, o que está acontecendo aqui? -Perguntou Susana, que segurava uma vela improvisada, mas parando ali mesmo, sendo que Liam apareceu no momento seguinte, tentando chegar até Laura, mas Susana o impediu.

—Quem está gritando o nome de vocês? -Maicon diz, avançando até eles, quase se colocando entre Laura e a porta.

—São nossos amigos, da universidade, pai -ofegou Laura-, algo deve estar errado, muito errado…

Laura abre a porta rapidamente a tempo de ver Luana e Victor atravessarem o gramado da frente coberto de neve. Por causa da falta de luz, demorou para que Nathan, Laura e os pais da garota vissem o quão suados, sujos e exaustos os convidados inesperados da família Willians estavam até eles chegarem muito perto.

—Mas, o quê? -Murmurou Maicon, sem entender o que estava acontecendo.

Luana e Victor correram para dentro da casa da família de Laura como se suas vidas dependessem disso. Ao atingirem a soleira da porta da frente, eles se lançaram, literalmente, com tudo para dentro da casa. Maicon e Nathan tiveram de dar um pulo para trás para não serem atingidos.

—Fechem a porta! Rápido! Fechem a porta! -Luana exclamou, se sentando no chão e olhando suplicante para Laura -Por favor, Laura! Fecha essa porta!

Laura não hesitou em atender o pedido de sua amiga e, assim que a tranca foi usada para fechar a porta, Laura se ajoelhou na frente de Luana, segurando-a pelos ombros, numa tentativa de acalmá-la.

—Luana, se acalme! Se acalme e me diga o que está acontecendo!

—Eles estão vindo atrás de nós, por causa de vocês -diz Victor, com dificuldades, tentando recuperar o fôlego, ainda jogado de qualquer jeito no chão. -Um idiota está nos perseguindo à mais de uma hora, e é esse cara quem tem controlado tudo, os ataques, os animais, tudo! E tudo porque ele está atrás de vocês!

—Calma cara! Do que vocês estão falando? -Nathan diz, segundo os ombros e ajudando Victor a se levantar do chão. Enquanto isso, Laura ajuda a Luana a fazer o mesmo. -Quem está atrás de quem?

—Não dá tempo de explicar, eles vão nos alcançar antes- choramingou Luana, parecendo realmente abalada. Laura, sentindo um nó no estômago, abraçou Luana para reconfortá-la e no momento seguinte, a ruiva se desatou em chorar, complicando ainda mais a situação.

—Pela juba do Leão... -Murmurou Laura, assustada e ainda muito confusa com essa situação.

—Isso é sangue? -Perguntou Maicon quando Nathan iluminou os recém-chegados melhor e só então foi notado as marcas de arranhões e o sangue tanto no rosto e nas roupas de Luana e Victor. Ao ver isso, Laura e Nathan os ajudaram a andar até a sala de estar, Susana gritou para que uma das criadas trouxessem o kit médico ali e outra para que cuidasse e levasse Liam para o quarto dele.

—Eu sei que não temos lá muito tempo para explicar -diz Victor, se sentando num dos sofás, tentando pensar com coerência, mas a adrenalina e o medo pulsava mais forte em suas veias, passando a mão pelos cabelos loiros sujos de sangue e fuligem, empapados de suor-, mas, é sério! Todos os ataques que ocorreram hoje foram orquestrados por um homem, esse homem veio atrás de nós com a aparência de Mack, mas não era ele, não podia ser Mack, era alguém se passando por ele, alguém que tinha olhos amarelados!

Os olhos de Susana arregalaram e um nó se formou em sua garganta, de tensão e de surpresa, a última vez que ela ouvia falar de algo semelhante foi em seu tempo de rainha em Nárnia. Feiticeiros tinham o poder de se transformar, tomar a forma de outras pessoas, objetos inanimados e outros animais. Causadores de muitos problemas, estes tiveram de ser erradicados, tanto em Nárnia quanto nos países vizinhos. Susana também sabia que o aspecto amarelado nos olhos de um feiticeiro indicava o grau de poder e maldade em que a pessoa se encontra. Quanto mais instruído em feitiçaria proibida um homem está, mais forte e repugnante é tom amarelado. O que Susana não sabia era que tal poder oscila se um feiticeiro vem ao nosso mundo, e às vezes, tal poder pode vir a ser inexistente.

—E ele dizia coisas insanas- continuou o loiro-, dizia que estava atrás do rei e a rainha de Nárnia, disse que vocês- ele apontou para Laura e Nathan - são esses tais reis. Mas isso era loucura, afinal de contas. Quero dizer, desde quando Laura e Nathan são reis, eles mal se dão bem! E Nárnia? O que é isso? Um lugar real? Um jogo? Uma peça de teatro?

Nathan, Laura, Maicon e Susana trocaram um olhar significativo, Laura sentiu seu estômago revirar e Nathan franze o cenho.

—Isso é impossível, eu nunca estive em Nárnia... -diz Laura, baixinho, mas para si mesma. Um silêncio esquisito tomou conta do lugar, ninguém disse nada por um instante e tudo o que se ouvia eram latidos e miados furiosos, carros com o alarme disparados e num dado momento, um uivo diferente se elevou sobre todos os outros, algo semelhante ao uivo de um grande lobo, o que fez parecer que Luana iria desabar novamente.

—Então Nárnia é um lugar que realmente existe? -Fungou Luana.

—É complicado explicar, mas sim, existe. -Diz Nathan.

—Ah, céus, de novo não, por favor... -Suplicou Susana num murmúrio. No momento seguinte, Heather trás o kit de primeiros socorros e Maicon resolveu agir, tratando dos ferimentos em Luana e Victor, já que o homem tinha noções básicas de tratamento de feridas e cortes devido ao tempo que passou no exército estadunidense.

—Então, o sujeito não era tão insano assim. -Resmungou Victor, antes de arquejar. Maicon entregou à ele um pano limpo e embebedado com um líquido esterilizador para os ferimentos do rosto. Pressionando o pano contra o rosto, perto do olho, o rapaz sentiu uma forte ardência no local. - Ainda assim, não faz sentido. Tivemos de fugir, de qualquer jeito, pois demos de cara com uma legião de animais comandados por aquele cara, todos eram de uma aparência estranha, como se fossem feitos de um tipo estranho de fumaça, uma fumaça escura.

—Conseguimos escapar pelo metrô -contou Luana, ela arquejou quando o pai de Laura passou um outro pano também embebedado com o líquido esterilizante na bochecha dela- até conseguimos tomar um trem até aqui, mas acho que os pássaros do maluco conseguiram nos seguir, não sei como, mas conseguiram. Quando saímos numa estação próxima daqui, vários daqueles pássaros nos atacaram, tivemos de achar um jeito de revidar…

Maicon não disse nada, mas arqueando as sobrancelhas, ele pensou que isso explicava tantos ferimentos de garras de aves grandes nos dois.

—E quando conseguimos isso, algo ainda mais estranho aconteceu... -Murmurou Victor, entregando o pano esterilizador ensopado de sangue de volta para Maicon. -Alguns pássaros praticamente se jogaram contra postes de luz, nos que haviam transformadores, para ser mais específico, o que acabou com a energia no quarteirão todo...

—Só pode ter sido de propósito, quiseram nos deixar cegos e sem rumo. -Luana diz, sua voz tremeu de raiva. -Só não pensaram que nós conhecemos a área bem o suficiente para virar a situação ao nosso favor. Usamos os carros e outros elementos urbanos para confundi-los. Com a falta de luz e com os alarmes dos carros disparados, muitas pessoas saíram nas ruas. Agora me sinto horrível por usar essas pessoas para conseguir despistar os pássaros, mas se não tivéssemos o feito, não íamos conseguir chegar até aqui.

—Onde vocês conseguiram os despistar? -Perguntou Susana.

—À umas três quadras antes da casa de Nathan. -Respondeu Victor, fazendo uma careta.

Nathan fez um som de engasgo com a garganta.

—Perto da minha casa? -Diz ele, com a voz soando ansiosa.

—Sim, passamos lá primeiro, antes de me lembrar que vocês havia me contado que iria jantar aqui. -Respondeu Victor. -Mas como não havia ninguém em casa, corremos para cá...

—Espera, falando nos pais de Nathan, onde eles estão? -Perguntou Laura, estranhando o fato do casal da pesada não terem se intrometido ali ainda.

—Eles foram embora -revelou Heather, que estava ali, de prontidão para o caso de ser necessária -a poucos segundos antes de a senhorita Lupim e o senhor London serem trazidos para a sala de estar. Saíram pelas portas do fundos.

—Eles saíram assim, sem mais nem menos e sem me avisar? -Nathan diz, surpreso e quase sem acreditar. Não que seus pais fossem os mais normais de todos, mas seria legal que algum dia eles resolvessem agir como… bem, pais realmente.

—Me desculpe, senhor Crawford, não conseguimos os impedir e eles saíram sem falar nada, tinham uma feição furiosa no rosto. Simplesmente pegaram seus casacos e saíram pelos fundos. -Disse a criada, sentindo-se nervosa.

Nathan congelou no lugar, se perguntando para onde eles teriam ido e torceu para que nada de mal acontecesse à eles. Afinal, por mais desnaturados que fossem, eles ainda são seus pais.

—Ah, meu Deus, eu não sei mais o fazer com eles... -Resmungou o rapaz, uma faísca de raiva surgiu em seu peito.

—E se eles forem direto para sua casa? -Perguntou Laura em direção à Nathan. Ambos trocaram um olhar tenso, se dando conta de que os pais dele podem estar indo direto para uma grande encrenca.

—Droga... -Grunhiu Nathan, entregando a lanterna para Laura antes de alcançar o blazer com o qual ele veio num gancho para roupas de inverno, mas antes que ele colocasse a peça e se dirigir para fora da sala de estar, um pássaro pousou na beirada de fora da janela da sala. Dentro da sala, todos congelaram onde estavam, observando a estranha ave. Era um corvo enorme, negro como a fumaça mais densa que já se viu, olhos da ave eram de aspecto estranho, eram frenéticos e olhava para dentro da sala como se observasse rosto por rosto. Num segundo seguinte, o corvo gralha alto antes de voltar a alçar voo novamente, sumindo tão rápido quanto apareceu ali.

—Hã, acho que isso significa várias coisas -disse Maicon cortando o silêncio que se seguiu à aparição do corvo -, mas nenhuma delas é boa.

—É o mesmo tipo de corvo que eu vi hoje de manhã, na universidade, e o mesmo tipo de ave que nos atacou agora à pouco. -Diz Victor para Laura.

—Eles nos acharam -Luana sussurrou, apavorada.

Por um momento, o único som que cada um ouviu foi o retumbar de seus próprios corações. Todos se entreolharam, sem saber o que fazer.

—Nathan, não quero dizer que gosto da ideia de seus pais correrem perigo lá fora, mas realmente acho que você deve ficar aqui... -Diz Laura, preocupada, tentando evitar que sua voz denunciava o medo que ela sentiu. Se Nathan saísse por aquela porta e não voltasse mais, ela não conseguiria se perdoar.

—Porcaria, por que meus pais não podiam ser menos... Menos... Sei lá, menos inconvenientes, pelo menos uma vez na vida? -Nathan praticamente rosna, passando as mãos pelos cabelos com uma fúria que quase o sufocava e jogando o blazer numa das poltronas ali com violência.

—Calma Nathan, tenho certeza de que tudo há de terminar bem, e... -A voz de Susana era uma tentativa de parecer calma, mas tudo isso se foi num grito agudo de susto quando algo grande colidiu contra as vidraças da janela da sala e cacos de vidro voaram ambiente adentro. E não foi apenas ela, mas todos no local foram surpreendidos. Todos recuaram e se esquivam dos estilhaços, estilhaços do vidro, cortantes e frios, que causam ferimentos em quem acaba ficando em seus caminhos.

Assustada, Laura deu um pulo para trás, suas costas colidiram contra o peito de Nathan, a lanterna em sua mão mirou na criatura que havia acabado de entrar na sala de estar, a luz brilhou intensa, revelando que se tratava de um tigre feito da mesma matéria do corvo, quando a luz brilhou sobre o tigre, este rosnou de dor, estranhamente a luz da lanterna que antes era de Edmundo tinha efeito sobre as criaturas, já que a criatura começou a se desfazer em fumaça, e antes que se desfizesse totalmente, o tigre deu meia volta, acuado, e pulou a janela novamente, fugindo feito uma presa indefesa de algum predador.

Todos olharam para o objeto na mão de Laura, abismados.

—A lanterna! A lanterna é especial! -Exclamou Laura. Um brilho de esperança brilhou dentro da garota e o medo nela diminuiu consideravelmente. -Nathan, é por isso que Aslam deixou ela conosco!

—Vocês viram Aslam? -Susana diz, mas não obteve resposta.

—O que vamos fazer agora? -Diz Luana, dando voz ao questionamento que pairava sobre a mente de todos. Fugir e se esconder ou ficar e encarar a colisão iminente?

Maicon não iria conseguir terminar de tratar os ferimentos à tempo, então teve de se contentar com colocar cobrir os ferimentos mais graves com ataduras improvisadas.

—Logo, eles irão chegar e cercar a casa- disse Victor, assim que Maicon se afastou. O loiro se levantou e ajudou à Luana a fazer o mesmo -, mas se sairmos agora, teremos uma chance de escapar.

—Somos em muitos- diz Laura, tentando raciocinar um plano, pois, somando ela, Nathan, Liam, Victor e Luana, seus pais e as criadas, havia dez pessoas na casa-, assim que sairmos, teremos de se separar. -Como ela estava perto da janela, ela pode observar que uma nuvem de fumaça, mais escura e densa que a própria noite, estava se formando ao longe, na direção sul de Londres e agora estava se deslocando na direção deles. -E temos de ser rápidos.

—Como faremos isso? -Questiona Luana, e antes que alguém pensasse em alguma coisa, Laura já tinha meio plano arquitetado em mente.

—Tenho uma ideia -diz Laura, hesitando por um momento-, mas preciso da colaboração de todos.

Ninguém hesitou no momento de concordar em ouvir o plano. Um plano agora era melhor do que nada.

—Mãe, pai, vocês devem levar Liam, Luana, Victor e as garotas para longe, vocês podem sair pela porta dos fundos e correrem para a universidade. Está tendo aulas do noturno agora lá e, já que Victor é filho do reitor, conseguirão abrigo e ajuda facilmente. Já eu e Nathan, vamos ficar e aguardar nossos convidados na porta da frente e daremos um jeito de acabar com eles, ganhando tempo para vocês. Quando tudo acabar, vamos até a universidade e nos encontraremos com vocês lá.

Nathan assentiu com facilidade e concordando imediatamente com o plano. O mesmo não poderia ser dito dos demais.

—Você perdeu o juízo?! -Gritou Susana, horrorizada. -Eu nunca permitirei tal coisa! Você é minha filha, como espera que eu concorde com isso?!

—Podem esquecer! Eu não vou deixar vocês sozinhos! -Exclamou Maicon, furioso. -Acredita mesmo que eu os deixaria sozinhos?!

—Acham mesmo que essa luta é só de vocês?! -Victor exclamou, também furioso.

—Você disse para nos separar, não para deixar vocês sozinhos para se suicidarem! -Luana choramingou, quase em prantos. -E você ainda concorda com isso de bom grado, Nathan?! Eu não acredito nisso!

Luana lançou à Nathan um olhar acusatório, mas o rapaz não hesitou a dizer um “sim” com muita clareza.

Laura olhou para todos ao seu redor com um nó na garganta, olhou para a janela, ansiosa. Ela ouviu o som de sirenes de polícia ao longe, o que meio que a alertou para o fato que o tempo deles estava se esgotando.

—Vocês se esquecem que Aslam é por nós? -Diz Laura, já decidida. -Ele está cuidando de nós, eu sei disso, e a não ser que alguém tenha uma ideia melhor, devemos agir, agora. É a mim que eles querem, mas…

—Querem à mim também, princesa. Eles querem à nós. -Corrigiu Nathan, sorrindo num momento que devia ser de tensão. Insanidade ou não, isso fez Laura sorrir para o rapaz por um momento.

—Tá bom, nós. Mas eles não querem vocês.- Laura diz, olhando para seus pais e amigos. -E antes que vocês se esqueçam... -Neste exato momento, uma águia do tamanho da metade da janela entrou na sala pela vidraça quebrada, com as garras em posição de ataque, para cima de Laura. A garota girou o corpo e apontou a lanterna para a ave, no brilho máximo. Num segundo, a águia se desfaz em fumaça, tal como a garota esperava que acontecesse. Laura desligou a lanterna, girou-a na mão e soprou no foco, como cowboys do velho oeste fazem nos filmes, quando um tiroteio chega ao fim. Ela sorriu. -...que eu estou bem armada contra eles.

 

§

 

O plano de Laura tinha tudo, tudo mesmo para dar certo. Mas um detalhe acabou por atrapalhar tudo: o atraso na colocação do plano em prática. O medo de que algo desse errado os fez perder uma fração de tempo muito valiosa. Laura precisou acalmar seus pais até que eles concordassem e, quando o fizeram, já não havia tempo para reunirem todos e saírem pela porta dos fundos. Portanto, tiveram de improvisar um plano B.

Victor e Luana ficaram para ajudar Laura e Nathan. Maicon e Susana correram para o andar de cima. Heather e as demais criadas não tiveram escolhas se não seguir para o andar de cima também.

Maicon correu para o quarto que ele dividia com sua esposa, indo até o guarda-roupa, deixando sua própria lanterna na cômoda mais próxima, abrindo as portas duplas do armário num único movimento, o Willians tirou boa parte de suas roupas ali dentro e as jogou de qualquer forma no chão, dali, Maicon tirou de um fundo falso uma caixa de metal inoxidável.

Sem perder mais tempo,  ele abriu a caixa, tirando dali uma Colt 1911 calibre 45, de seu tempo de serviço no exército. Maicon estava se sentindo frustração, fúria e algo a mais que ele não soube identificar o que era. Quando servia à marinha, ele sabia exatamente onde estava se metendo e a quem iria encarar. Conhecia cada um dos procedimentos. Conhecia os porta-aviões, contratorpedeiros, destróieres, submarinos e ao transatlântico USS Marrimack, onde cumpriu suas últimas missões antes de sair definitivamente das tropas americanas, como a palma de sua mão, assim como conhecia cada centímetro quadrado de sua casa. Mas lutar contra o desconhecido estava o afetando mais do que deveria, não saber como derrotar o inimigo o incomodava como nada havia feito antes, e ele não sentiria paz até ajudar sua família a sair totalmente ilesa dessa situação.

Ao segurar a arma na mão, Maicon verificou se o pente estava carregado e, ao constatar que havia balas até os dentes, ele recarregou o cartucho e destravou a arma, mesmo que houvesse uma chance de armas de fogo serem inúteis nesse caso, ter algo letal nas mãos era muito melhor -e mais encorajador- do que nada. Pegando do chão sua velha jaqueta do exército, tirou da caixa de metal um cartucho avulso e carregado para caso precisasse recarregar a arma mais adiante, e o colocou seguramente no bolso da jaqueta, assim como tudo o que eles fosse precisar. O Willians vestiu a jaqueta e com a arma em punho, pegou a lanterna, voltou ao corredor, pronto para disparar em qualquer massa fumacenta que visse.

Susana, nesse meio tempo, entrou no quarto de Liam, onde seu filho estava, sob supervisão de Zara, que já tinha dificuldade de acalmar Liam. O que já estava começando à deixar Susana preocupada. Liam é agitado, como qualquer criança de quatro anos, mas não por tanto tempo. Até mesmo ele sabia que há coisas erradas acontecendo.

Susana entregou sua vela para a criada e tomou Liam em seus braços, explicando da maneira mais rápida que pode da situação:

—Laura e os amigos dela vão tentar atrair e as coisas que os estão perseguindo. Não posso explicar o que exatamente são aquelas coisas, mas acredite quando digo que é melhor nem descobrirmos o grau de risco que corremos. Laura vai tentar os afastar daqui, por enquanto, teremos de nos contentar com isso. -Disse Susana, para então se dar conta de que ela era a pessoa com a menor moral para pedir que alguém acreditasse em qualquer coisa. Ignorando a vozinha em sua mente que a acusava por todas as vezes que ela disse que seus irmãos estavam loucos, quando estavam o tempo todo certos e por todas as vezes que desdenhou da existência de Nárnia para Laura e Maicon, Susan mordeu o lábio inferior com força, bloqueando o som de fúria que ela queria soltar. Cerrando os olhos, ela se obrigou a pensar no “aqui e agora”, deixando toda e qualquer lamúria para depois.

Chegando ao corredor, com Zara em seu encalço e Liam se agitando em seus braços, Susan deu de cara com Maicon, que assim que viu sua mulher e filho, o ex-militar acenou para que elas viessem até ele rápido. Ao ver a arma de fogo na mão de seu marido, Susan acaba mordendo o lábio com mais força.

Susana odiava armas, sempre odiou, mesmo quando portava uma, mesmo em Nárnia, Susan preferia mil vezes ser a dama delicada a ser resgatada que ser a rainha guerreira que ia em socorro dos outros. E aqui, em nosso mundo a coisa não seria diferente. Mas em vista da atual situação, era melhor ela guardar sua opinião para si mesma.

Tudo acontecia tão rápido quanto um piscar de olhos.

Ao se reunirem, eles se dirigiram até o escritório de Maicon, estranhamente este foi o local que Laura mandou que eles fossem em seu plano B. Com esse novo plano, eles não tiveram tempo de argumentar contra. Ao atravessarem o corredor, dois sons altos chamam a atenção de todos ali: o rugido de uma fera voadora e o girar de hélices de um helicóptero, quase como se ambos estivessem pairando exatamente sobre o teto acima de suas cabeças. Sons foram ouvidos do lado de fora da casa, uma voz masculina gritava num megafone, vindo da rua, ordenavam que alguém parasse com os ataques com os animais e que as criaturas deveriam recuar e se entregar. Seja lá para quem isso foi dito, tal pessoa deve ter ignorado a ordem completamente, pois sons de tiros foram ouvidos logo em seguida.

—Mamãe, nós estamos num filme de guerra? -Perguntou Liam, inocentemente. O garoto ouvira sons semelhantes aos que ouvia agora vindo dos filmes que Maicon e Laura gostavam de ver na televisão, e que Susana, como atriz, também participou na produção de alguns deles. Susana apertou mais os braços em torno do pequeno, protetora, e sorriu, embaraçada.

—Sim, meu querido, todos nós estamos participando de um filme de guerra, não é legal? -Murmurou Susana. Ela odiava mentir para o garoto, mas o que mais poderia fazer? Ela entrou no escritório e logo seus olhos buscaram um local seguro para se esconder com o menino nos braços. O garoto deu um grito de alegria ao ouvir sobre estarem de fato participando de um filme.

—Shhh, Liam! -Disse Maicon, alto, tentando ser ouvido por sobre os sons ensurdecedores que vinham da rua e entrando na onda de Susana.- Se não atuarmos direito, não iremos participar do filme em sua edição final... Têm de ficar em silêncio e fazer o que a mamãe e o papai mandar, tudo bem?

—Tudo bem... -Diz Liam. Um segundo depois todos se assustam com um som de explosão que veio da rua, como se um carro tivesse explodido.

—Susan, Liam, escondam-se debaixo da mesa; Zara, Heather, ali, atrás da estante; Helena, no baú, está vazio. E eu vou ficar ao lado da janela, atrás das cortinas, de prontidão... Agora vão! -Diz Maicon, fechando a porta e a trancando assim que todos entraram ali. O som da tranca sendo usada soou alto no local, como se eles tivessem se trancado num cofre, não num escritório. Maicon arregalou os olhos quando viu uma luz dourada brilhar sob a porta e por dentro da tranca. Confuso, ele olhou ao seu redor e viu que a luz dourada brilhava na lareira e na janela. E ele não foi o único à ver isso.

Liam se soltou de Susana, saíndo de baixo da mesa e correu para a janela, quase matando seus pais do coração.

—Liam! Saía de perto da janela! - Gritaram Susana e Maicon, quase que ao mesmo tempo, o garoto os ignorou e olhou para o que se passava na rua, arregalando os olhos para o que viu. Antes que o braço de Susana passasse pela cintura do garoto, o puxando para longe dos vidros, Liam se deu conta que, esse isso era mesmo só um filme, porque não havia câmaras em lugar algum e as pessoas na rua estavam lutando de verdade com criaturas sombrias de verdade?

 

§

 

—Isso tudo é loucura... -Disse Victor, sentindo cada célula de seu corpo se retesando de tensão, sua boca estava seca e suor escorria por seu rosto ainda. Laura concordou com a cabeça, mas não sabia mais o que fazer. Seu plano A já evaporou diante de seus olhos. O plano B tinha que funcionar, primeiro, que ela não tinha tempo de elaborar mais nenhum plano D, E e muito menos um F, segundo porque o plano C era lutar até morrer.

—Eu sei, mas tem que funcionar. -Respondeu Laura, vasculhando os utensílios da cozinha com pressa. Fazia poucos segundos que os pais dela haviam subido para o segundo andar. A jovem sentia que a vida de sua família e das criadas dos Willians dependiam dela. -Droga... Aqui não tem nada útil…

Ela fechou as gavetas dos armários e da pia com força e correu de volta à sala, com Victor logo atrás de si. Lá, eles se juntam à Nathan e Luana.

—Encontraram algo útil? -Perguntou Luana, já mais calma, mesmo que estivesse claro que ainda estivesse apavorada com a situação, ela lutava para se manter firme.

—Não -responde Laura, frustrada-, argh, eu queria ter herdado as espadas que meu tio Pedro tinha casa dele! Elas sim seriam úteis agora… e a garagem só pode ser acessada pelo lado de fora...

—Mas aquelas coisas? -Perguntou Victor, apontando para a lareira da sala. -Pode ser que eu esteja ficando maluco, mas o mais próximo de espadas que eu estou vendo, são aquelas três... Hã... Coisas sobre a lareira.

Os quatro amigos olharam aquelas coisas, as estátuas de Susan que Laura tanto odiou desde que as vira pela primeira vez. Quando Laura às viu novamente naquele momento, viu que elas, por mais horríveis que possam parecer, tinham um certo aspecto intimidador, afiado, letalmente ameaçador até. E antes que qualquer um fizesse alguma objeção sobre as três coisas retorcidas, um som de um helicóptero soou num ponto acima da casa de Laura, bem como o som de uma fera grande e voadora.

Luana, Victor, Nathan e Laura trocam um olhar e todos sabiam: o tempo havia se esgotado. Era hora de lutar.

Nathan apanhou as três estátuas de sobre a lareira e entregou uma para Luana e outra para Victor. A terceira permaneceu com ele.

—Que Aslam nos proteja. -Diz Laura, caminhando em direção à porta da frente. Nathan ficou ao seu lado, por um momento, o rapaz segurou a mão de Laura, tentando transmitir tudo o que ele não podia dizer à ela. Laura sorriu, retribuindo o gesto.

Sem dizer nada, vindo logo atrás vinham Luana e Victor. Que trocam um olhar tão cheio de significados. Isso bastou para eles renovar a esperança.

—Nathan? Laura? -Falou Victor, de repente.

—O que foi? -Tanto Laura quanto Nathan olharam para trás.

—Não nos deixem morrer e não deixaremos vocês vocês morrerem. -Diz o loiro, decidido.

Laura sorriu, grata pelo apoio.

—Idem, cara. -Respondeu Nathan, sério.

Quatro jovens estudantes munidos de três estátuas e uma lanterna, caminhando ao encontro de seu misterioso adversário.

Laura não sabia se devia rir ou se devia chorar, mas qualquer que fosse sua decisão, ela estava enterrada sob um forte desejo de fazer somente aquilo que tinha de ser feito. Custe o que custar.


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