Sol de Uma Tarde de Inverno escrita por Swimmer


Capítulo 2
2- Copos com Guarda-chuvas




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Eu tinha treze anos quando me mudei para a Califórnia. Nunca fui bem na escola e nunca tirei uma nota A, mas pelo menos conseguia passar de ano, o que era suficiente para minha mãe não implicar. Gastar meu tempo estando em três clubes diferentes e sendo a chefe das líderes de torcida ajudou.

Fui transferida para a Saint Mary Academy em janeiro, no meio do ano escolar, então o time das líderes de torcida já estava completo. Eu me senti meio perdida, estava no time da minha antiga escola desde que aprendera a me mexer de um jeito normal.

E aí conheci Lauren e Kat numa aula de sociologia. Não me lembro do tema da discussão, mas Mark Reeves começou a dizer que garotas que se arrumam demais só querem atenção. Eu disse que talvez elas só se arrumassem para si mesmas e algumas pessoas começaram a rir. Kat interrompeu as risadas e disse que concordava comigo.

Nós duas discutimos com Mark pelo resto da aula e desde então nunca nos separamos. Minha mãe diz que é uma história fofa e poderosa. Eu sei, as duas palavras não fazem muito sentido juntas, mas descrevem nossa amizade muito bem. Kat conhece Lauren desde sempre e não foi nenhum sacrifício ficar amiga dela também, ela é um doce.

Tudo certo pra irmos aí?”- Lauren 09:20.

Tudo sim… Não esquece o biquíni” - Thereza 09:20.

Depois de responder Lauren joguei o celular na cama e abri o guarda-roupa. Meus biquínis tinham que estar ali em algum lugar. Apesar de ser inverno, era a Califórnia, estava quente o suficiente para que minhas amigas viessem para uma mini festa na piscina para matar a saudade.

Meu quarto parecia normal agora, havia uma pilha de roupas na cadeira da escrivaninha e outra em cima do tapete rosa. Encontrei os biquínis e formei uma nova pilha de roupa em cima da cama.

Coloquei minha carteira e as chaves numa bolsa e saí do quarto.

—Ben? - gritei.

Esperei uma resposta mas não obtive nada. Quando chegamos ontem, eu o ajudei a levar umas caixas para o quarto, que antes era o ateliê da minha mãe. Os quadros dela são famosos na região, foi assim que ela pagou a casa e minha escola. Enfim, movemos o ateliê para o térreo e Ben ficou com o quarto, onde ele não estava agora que eu precisava dele.

Encontrei Ben na cozinha, estava sentado na mesa, comendo. O café-da-manhã dele era sobras de bolo de casamento e uma garrafa de dois litros de refrigerante. Enquanto eu descia as escadas presenciei a horrível cena de Ben levando a garrafa até a boca e bebendo. Eca.

—Que nojo - falei. - O que você tá fazendo?

Ben soltou a garrafa e olhou para mim.

—Comendo?

—Você sabia que tem copos no armário? Se você usar um as outras pessoas podem beber refrigerante sem ter que beber sua baba junto - parei na frente dele.

Ao invés de dizer alguma coisa ele me encarou. E arrotou, foi o arroto mais longo dos últimos tempos. Toda e qualquer vontade que eu tenha sentido de beijar Ben quando o vi pela primeira vez desapareceu.

—Quer alguma coisa ou só veio encher meu saco?

—Preciso do seu carro emprestado, minha amigas estão vindo pra cá e preciso comprar alguma coisa pra gente comer - olhei para a garrafa pela metade em cima da mesa - e beber.

Consegui as chaves. Dirigi até o supermercado mais próximo e coloquei várias coisas no carrinho. Salgadinhos, chocolate, comida congelada para o jantar e refrigerante, elas não podiam reclamar. Estava colocando as sacolas no carro, senti o celular vibrando e tirei do bolso.

Olha o que você tá perdendo”- Lauren 10:06.

Junto com a mensagem ela tinha mandado uma foto, era Ben prestes a pular da piscina, a foto devia ter sido tirada da porta da cozinha. As pessoas só diziam que Lauren era a mais quieta de nós três porque eu e Kat compartilhamos uma necessidade de opinar em quase tudo, o que não fazia de Lauren nenhuma santa.

A antiga vontade de beijar Ben voltou, mas aí lembrei dele arrotando na mesa de jantar. Além do mais, éramos meio que irmãos agora, fazer isso seria nojento.

Respondi e entrei no carro.

Só diz isso porque ele não arrotou na sua cara” - Thereza 10:07.

 

Minha amigas estavam paradas na porta da cozinha feito duas garotas de doze anos, olhando pra piscina.

—Faz tempo que vocês estão aí? - perguntei.

—Uns vinte minutos - Kat respondeu. Ela estava usando um vestido de crochê por cima do biquíni azul, que ficava lindo nela. Kat tem a pele negra e o cabelo cacheado, que hoje estava preso para cima. Eu tinha um vestido parecido, a mãe dela fez pra mim.

—Ele abriu a porta pra gente - Lauren disse sem nem olhar pra mim, estava ocupada demais debruçada na porta. Lauren tem a pele clara e olhos e cabelos castanhos, semana passada resolveu cortá-los, um pouco acima do ombro.

Revirei os olhos e coloquei as sacolas no balcão.

—Estou indo colocar meu biquini. Você pode vir junto, Lauren - eu disse, ela ainda estava de jeans. - Ou se troca no banheiro daqui de baixo, tanto faz.

—Aham.

Por algum milagre do universo, Lauren tinha colocado o biquini quando voltei.

As duas me seguiram para fora e deixamos as toalhas nas cadeiras. Ben fez uma pausa na sua exibição de habilidade em natação para que entrássemos na água. Kat foi primeiro, Lauren foi logo depois, eu ia pular em seguida mas lembrei que não tinha passado protetor solar. A única coisa pior que ficar com a pele oleosa é ficar com a pele queimada.

Me sentei e fiquei olhando para a piscina. Kat e Lauren começaram a jogar água uma na outra, logo já tinham feito Ben participar da brincadeira. Terminei de passar o protetor e pulei na piscina.

—A Thereza definitivamente ganhou - Kat disse, tentando enxugar do rosto a água que eu tinha espirrado nela com meu pulo. - Você não sabe brincar - ela jogou água em mim.

—Eu nem tava brincando - joguei água nela também.

A brincadeira não durou muito, levar água na cara fica chato bem rápido.

—Ei, adivinha quem mandou mensagem pra Lau! - Kat gritou e se sentou na borda da piscina.

Olhei dela para Lauren e abri a boca, surpresa, porque sabia exatamente quem era.

—Carter Collins falou com você? - gritei para Lauren.

—Sim! - ela exclamou animada e mergulhou. - Incrível, né?

Mês passado Lauren decidiu que gostava de Carter, um garoto da aula de história dela, e não parava de falar nele. Eles se sentaram juntos umas cinco vezes e, segundo ela, ele parecia super a fim.

—O que ele disse? - perguntei.

—Várias coisas… E perguntou qual é minha comida preferida, o que, espero eu, só pode significar que ele vai me chamar pra sair - Lauren se sentou ao lado de Kat e a abraçou.

—Você tá pensando na mesma coisa que eu, Thereza? - Kat sorriu pra mim.

—Claro - nadei para trás, como se abrisse espaço para as imagens da minha cabeça. - Imagino a Lau com um vestido branco. E a gente segurando buquês de tulipas.

—E os nossos vestidos vão ser vermelhos. Ah, e os filhos deles vão ser a cara do Carter - Kat completou.

Lauren revirou os olhos e deu um tapa no braço de Kat.

—Como vai o Owen, Thereza? - ela me deu um sorriso sarcástico e se levantou. - Não vão me deixar de mau-humor hoje - Lauren saiu dançando até a cozinha.

Ainda isso? Fiquei com Owen em uma festa, um tempo atrás. De vez em quando ele me manda uma mensagem me chamando pra sair. Normalmente invento uma desculpa mas não estou interessada e Lauren sabe disso.

—Sua mãe deveria saber sobre esse tal de Owen? - Ben perguntou.

—O que a Lauren foi fazer lá dentro? - perguntei para Kat, ignorando Ben.

Kat deu de ombros.

Lauren voltou com dois copos na mão, entregou um para mim e o outro para Kat e perguntou se Ben ia querer. Lauren tinha achado a caixa que trouxemos da festa ontem e colocado guarda-chuvas rosa nos copos.

Assim que tomei o primeiro gole percebi que não devia ter dito a Lauren onde minha mãe esconde as bebidas. Resolvi só esperar que Ben não percebesse.

 

Era quase oito da noite quando Ben e eu fomos levar as meninas pra casa. Ben não precisava ir, claro, porque as amigas eram minhas, mas ele não quis me deixar dirigir, só concordou em levá-las porque Lauren pediu. Deixamos ela em casa e dei as direções até a casa de Kat.

—Vem dizer oi pra minha mãe - Kat pediu antes de abrir a porta.

Pela cara de Ben, ele não queria esperar.

—Volto em dois minutos - falei e saí do carro.

Kat e eu corremos pelo gramado até a varanda e ela apertou a campainha pois tinha esquecido a chave.

—Não sei como você aguenta viver com aquele deus grego do outro lado do corredor - ela sussurrou.

—Vivi com ele por um dia, Kat - eu ri - antes disso só alguns fins de semana aqui e ali… Acho que ele não vai muito com a minha cara.

—Você tá brincando?! - ela controlou o tom para não chamar atenção. - Ele ficou te encarando o tempo todo na piscina.

—O que?

Antes que eu pudesse descobrir se ela estava me zoando ou não, o irmão mais novo de Kat abriu a porta, viu que éramos nós e saiu.

—Mãe - Kat gritou. - Trouxe a Thereza pra te ver.

 

Sempre fui péssima em disfarçar. Durante a viagem de volta meu olhos ficavam voltando para o rosto de Ben, tentando descobrir o que ele estava pensando. No meu quarto eu não precisaria me preocupar com isso, saí do carro assim que ele o estacionou. Abri a porta da frente e acendi as luzes da sala. Senti uma mão segurando meu braço e me virei.

—Você disse pra sua mãe que iria se comportar. Misturar álcool com refrigerante e depois querer dirigir não é se comportar.

Ele estava tão perto que eu conseguia sentir um cheiro leve da vodka que Lauren colocara nas bebidas. Péssimo argumento, sério. Quanta hipocrisia... Empurrei a mão dele devagar para longe do meu outro braço e me aproximei ainda mais dele.

—Você não é meu irmão de verdade, Ben. Pare de agir como se tivesse que tomar conta de mim - falei. Dei as costas e continuei meu caminho até meu quarto.


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Notas finais do capítulo

Obrigada por ler :))



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