Alguém no Espelho escrita por Bacon


Capítulo 1
Único


Notas iniciais do capítulo

honestamente eu estou no meio de uma crise e só queria escrever alguma coisa
eu amo o ahriat mas ele me odeia e eu aceito isso
eu queria desabafar mas não sei como nem com quem então aqui está meu coping mechanism, jogado para a internet numa tentativa conforto de não estar sozinha ao mesmo tempo que tenho a esperança de ninguém ler e eu não ter que me justificar
não que nada disso faça sentido
idk
enjoy
perdoa toda a negatividade, devo excluir essa desgraça daqui a uns dias quando a vergonha bater forte demais

~~~~

pois muito que bem, alguns meses depois cá estou eu decidindo não apagar isso porque reli e achei que ficou um conto bem legal
optei por deixar também essa Notinha Vergonhosa de Tempos Obscuros pq sei lá
ela é bem crua e fez parte da experiência, né
enfim
boa leitura!! ♥



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Ahriat encarava com ódio a pessoa no espelho.

Sua bochecha estava inchada e vermelha, enegrecida não por causa de maquiagem alguma. O lábio cortado lhe dava nojo. Os cabelos negros caíam sobre seu rosto e ondulavam até acariciar os ombros. Mas falhavam em esconder seus olhos, vermelhos e úmidos. Ele todo lhe dava nojo.

Os dedos seguravam a porcelana da pia com força, e a sensação de unhas quebradas pinicava sua pele. As sardas que cobriam toda ela pareciam sujeira. Na ponta dos pés, nos dedos, nos ombros, nas orelhas, no nariz e na testa. Eos dizia que eram um lembrete. Que cada ponto na pele era um sinal de seus pecados. Que, para qualquer outro, poderiam ser como estrelas. Mas Ahriat não merecia estrelas, e por isso Eos não o beijava mais.

Ele encarava a pessoa no espelho e esfregava o dedo onde ficava o nariz no reflexo. Escondia o vidro com a gordura, com a sujeira, para que uma escondesse a outra. Como se suor e sebo fossem melhor que sua própria pele. Mas não eram. Ahriat não queria ser a pessoa no espelho.

E se sentiu ingrato. Ingrato porque aquele era o corpo que a Deusa havia lhe dado. O corpo que Ela esculpira pedacinho por pedacinho e que havia lhe proporcionado tudo o que ele tinha até hoje. O Alto Sacerdote Omega, o mais belo de toda Edom. O Omega perfeito, com seus olhos perfeitos, seus lábios perfeitos, seus quadris perfeitos. Com suas pernas perfeitas e suas coxas perfeitas. Com a boca perfeita e a língua perfeita. O corpo perfeito e o calor perfeito.

Às vezes ele pensava que a Deusa o havia feito para o amor. Que ele era feito de amor. Mas quando Ahriat fazia amor com Eos, Eos não fazia amor com ele.

Eos lhe havia ensinado que ele não era perfeito. Que seu corpo não era de ouro, por mais que ele se enfeitasse com ele. Que seus olhos não eram joias, por mais que Ahriat olhasse para elas. Eos havia lhe ensinado que Ahriat era aquilo – o melhor Omega para o melhor Alpha. O mais belo para o mais belo. Eos, sim, era perfeito, com seus cabelos de prata e olhos de noite. Ele era perfeito com seu sorriso brilhante e corpo impecável. Ele era Alpha. E Ahriat – oh, Ahriat, ele dizia. Ahriat poderia ser o mais belo de todos, mas mesmo assim não passaria de Omega. Deveria sofrer como Omega. E implorar pela misericórdia de seu Alpha, que viria a acompanhá-lo durante os dias de dor.

Eram seis dias de dor. Ele estava no quarto dia de dor. Eos o acompanhava todas as vezes, ficava ao seu lado todos os dias. Usava seu corpo todas as noites. Porque ajudava. Sempre ajudava. Eos beijava seus lábios e tocava seu corpo, e Ahriat suspirava com o alívio que isso trazia. Ahriat odiava os dias de dor, mas sonhava com eles. Pois era quando Eos era o mais gentil e ele sentia que Eos o amava. Eos dizia que o amava. E era o suficiente para que ele se entregasse sem dizer uma palavra.

Mas ontem ele disse palavra. Ontem ele disse que preferia orar. Que a dor não estava tão ruim, e ele gostaria de agradecer a Deusa. Eos não gostou disso e puxou-o para si. Mas Ahriat insistiu. Ahriat disse não. Eos não gostou.

Era a Deusa quem deveria puni-lo pela desobediência, Eos dizia. Mas a Deusa não tinha tempo para lidar com Omegas sujos e insignificantes. Com Omegas infiéis que se recusavam a seguir seus mandamentos, que desrespeitavam seus Alphas. Então Eos puniu-o de seu próprio jeito, como fazia todas as vezes. E no final disse que não iria nem fodê-lo, pois Ahriat não merecia.

Ahriat encarava a pessoa no espelho e não queria aceitar que era ele. Mas era, e seu rosto machucado mostrava quão podre ele era por dentro. Porque ele queria que de seus cortes nascessem flores. Que em suas lágrimas morassem peixes e em seus soluços voassem pássaros. Mas de seus cortes saía sujeira, suas lágrimas eram ácido e seus soluços eram secos. Sua pele era marcada por unhas e inchaços, e Eos o fazia para que Ahriat soubesse. Soubesse que era lindo por fora. Mas que não poderia esconder o que era por dentro. Não dele. Nem de si mesmo.

Ahriat odiava. O odiava. Se odiava. Olhava para a tesoura nas mãos e se perguntava por que não acabava logo com aquilo. De certa forma, acabaria. Ergueu a tesoura ao lado do rosto. Pegou os próprios cabelos. E cortou.

Cada fio que caía no chão era uma lágrima que se seguia. Ele tinha vergonha do que fazia e se encarava com ódio no espelho. Os olhos inchados e a boca torcida eram seu rosto mais horrível. Que escândalo seria, o Alto Sacerdote Omega destruindo os próprios cabelos. Que escândalo seria, o Sacerdote Omega sabotando-se a si mesmo. Que escândalo seria, o Omega que se negou ao Alpha.

Que escândalo seria, a pessoa que se queria deixar.

Ele cortou a mecha, e viu com ela ir embora seus momentos mais lindos. De quando rezara pela primeira vez, de quando as águas sagradas inundaram sua alma em frente a todos no Templo. Cortou a mecha, e viu com ela cair aos prantos, puxado pelos cabelos e forçado ao chão. Cortou a mecha, e viu com ela o pôr do sol daquele dia, com seu amor beijando o rosto e o vento beijando os cabelos. Cortou a mecha e forçou para longe o desejo de fugir quando ele forçava abertas sua boca e suas pernas. Cortou a última mecha e não viu nada. Não sentiu nada. Não forçou nada. Apenas deixou que descesse o ralo e apodrecesse no esgoto.

Ahriat encarou a pessoa no espelho e sentiu como se ela não fosse nova. Como se não fosse ele, mas apenas mais uma farsa. Pois seu rosto destruído e a pele manchada ainda mostravam quem ele era. Ainda o lembravam do que ele era.

Ahriat se sentiu feio, sujo e imperfeito. Jogou as tesouras para longe como se o queimassem. Tocou a própria cabeça sob os cabelos e sentiu os fios tortos e incompletos terminarem sob seus dedos. Observou enquanto sua mente se ajustava finalmente ao que estava fazendo. Enquanto se dava conta do erro que estava cometendo.

Suas mãos tremiam e Ahriat chorava. Ele chorava, desesperado, enquanto via como seu rosto, feio e disforme, era reflexo do corpo, nojento e imperfeito. Como, sem seus cabelos, ele havia jogado fora a beleza que lhe sobrara, e ficara apenas com a alma torta e pecaminosa. Como antes, deixou-se cair ao chão e chorar com a humilhação que, dessa vez, ele mesmo cometera. Porque, em seu ato de loucura, ele mesmo se destruíra.

Ficou assim até as lágrimas secarem, abraçando-se com os braços ardendo enquanto as unhas se cravavam no sangue. A dor de seu flagelo aumentava pelo segundo, e ele a desejava, como punição por sua ruína. Ahriat não iria rezar à Deusa. Ele não era digno de falar com as estrelas.

Quando ele finalmente ergueu a cabeça, não havia céu sobre a luz artificial. Não havia flores sobre os azulejos manchados. Não havia nada que o trouxesse de volta.

Só havia Eos, que o encarava da porta.


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