Darkpath escrita por Lyra Roth, João Pedro


Capítulo 8
♤07 - Pareidolia♤


Notas iniciais do capítulo

Mais um capítulo do Matt ^-^
(Que, por algum milagre, teve coragem de se levantar da cama depois de ver um zumbi no banheiro e um tio sem cara)



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/751777/chapter/8

⌘ Matthew D. Coleman 

Milla decidiu investigar o cara de terno comigo. Alguma coisa era estranha nela, não do jeito ruim... estranho do tipo "bom demais para ser verdade."

Milla era uma pessoa bastante calma. Tudo bem que ela não tinha visto as coisas que eu vi, mas tenho certeza que a maioria das pessoas trocariam de dormitório caso entrassem e dessem de cara com um colega de quarto aterrorizado no quarto 66. 

Eu consegui chegar na aula pontualmente naquela manhã nublada e deprimente. O clima estava tão ruim que deve ter atingido a classe. Metade dos meus colegas estavam dormindo, metade da outra metade fingindo que não estavam e a outra metade da metade que restou, no facebook. Graças a Deus, a vibe ruim atingiu Mr. Gajeel também e ele não implicou tanto comigo hoje (porém, continuou perguntando aquelas coisas da Milla. Deu vontade de socá-lo).

A Srta. Dodds, que finalmente falou de desenvolvimento de jogos, também não estava lá muito animada. Quando deu o horário, perguntei sobre o desenho que ela fizera na noite anterior e invadiu meus "sonhos". Ela explicou que, na verdade, eram dois olhos, um desenhado na vertical e um na horizontal, não um "X" oval. Disse que vira em um livro numaa biblioteca uma vez, estampado bem na capa. Foi nesse ponto da conversa que ela apareceu. 

— Olha se não é o "Zombie Boy". - Disse Nathalie, sorrindo. Ela ainda usava o tapa olho e ainda parecia ter meio metro. 

— Vocês já se conhecem? - Srta. Dodds sorriu, jovialmente como de costume. 

Conhecer era uma palavra muito forte... Eu só havia encontrado-a em um estacionamento esperando alguém ser assassinado, mas não achei que a Srta. Dodds ia gostar de saber disso. 

— Oi Srta... - Fiquei tentando lembrar o sobrenome dela, mas nem me lembro dela já tê-lo dito. 

— Nathalie. - Ela completou. - Eu estava esperando você. 

Gelei. Essa frase nunca soara muito agradável, mas vindo de alguém como ela... Não me surpreenderia se tivesse uma arma escondida nos bolsos do casaco laranja. 

— Acho que estou atrapalhando. - Srta. Dodds soltou uns risinhos, o que me deixou constrangido. Não que ela tenha se importado. 

— Não é... - Tentei explicar, mas a menina segurou meu braço e começou a me puxar pela porta. 

— Até depois, Srta. Dodds! - Nathalie disse, acenando pelas costas. 

E então, estávamos no refeitório, esperando por Milla. Na verdade, havia muito pouca gente àquele dia, Srta. Dodds deve ter dispensado a classe mais cedo porque estavam "animados" demais pra prestar atenção...

— Por que estava me esperando? - Perguntei, desviando o olhar do rosto dela. 

— Porque certa pessoa estava ocupada demais para me ligar. - Ela revirou os olhos enquanto eu pedia desculpas. Havia perdido o papelzinho em algum momento entre Yasmin e o "Cara de Terno".

— Estava em dúvidas se devia te chamar ou não, - Ela continuou - mas agora você está aqui. Tenho que te mostrar uma coisa. 

Nathalie abriu um laptop cor de rosa, que bizarramente fez com que ela se parecesse com uma menina normal. Tinha um adesivo de girafinha na parte inferior, mas não pude analisá-lo porque ela o virou na minha direção e sentou-se na cadeira ao meu lado. 

— Eu estive procurando sobre sua enfermeira zumbi. Fiquei imaginando: "Por que uma enfermeira se tornaria zumbi?", aí deduzi que pra ser um zumbi... - Ela fez uma pausa dramática. - Tem que morrer primeiro!

Não aguentei e comecei a rir. Queria aprender a contar piadas com o rosto sério daquela forma. 

— Concentre-se, Matt! - Ela claramente estava tentando segurar o riso. - É um caso de morte ou vida! 

— Tudo bem. - Eu disse, tentando parar de rir. 

— Voltando, para ser uma enfermeira zumbi, antes a pessoa tem que ser...

— Uma enfermeira. - Completei. 

— Uma enfermeira ruiva. - Ela acrescentou, enquanto teclava. - Sabe quantas enfermeiras são assassinadas por ano?

Minha ânsia aumentava conforme as matérias sobre assassinatos em diversos jornais passavam diante dos meus olhos. Geralmente as fotos nos jornais eram censuradas, mas Nathalie possuía todas em alta definição! 

— Que horror. - Desviei o olhar. - Por que você tem isso? Como...

— Eu queria acrescentar "baseado em fatos reais" na descrição do meu primeiro jogo. - Ela deu de ombros. - A Srta. Dodds me ajudou a conseguir as fotos, definitivamente a melhor Hacker que já conheci.

Ela tinha uma hacker. E fontes. Provavelmente um animador profissional enquanto eu tinha apenas um roteiro mal acabado e assombrações para deixar-me com medo de digitar de noite.

— Interessante. - Afirmei, sem ideia do que dizer. - Isso não é ilegal?

Por sorte, Nathalie estava empolgada demais para se importar. Ela segurou meu rosto com aquelas mãozinhas pequeninas e o obrigou a encarar a tela. 

— Enfermeiras ruivas são bastante raras. Exceto em filmes pornô. 

Eu estava começando a ficar com medo daonde aquela conversa estava chegando. 

— Por que você sabe disso? - Perguntei. 

— Foco, Matt. - Ela estava corando, que fofo. - Não encontrei nenhuma enfermeira ruiva assassinada, mas encontrei ela. 

 

"Caso Ann - 21/04/2008. Desaparecida."

 

— Meu Deus! - Exclamei. A mulher da foto era... 

— Gostosa, né? - Nathalie me cutucou. Meu espanto impediu qualquer reação minha. - Pela sua cara, encontramos nossa zumbi.

Milla chegou em algum momento da explicação. Srta. Ann era uma pessoa exemplar e uma ótima enfermeira, além de ser linda e responsável, mas parecia que não era assim tão boa. Segundo os detetives, ela tinha um caso com um médico que, bem... Era doido. Ele queria ressuscitar os mortos e promovia experimentos no porão de sua casa, mesmo lugar em que vários cadáveres desmembrados foram encontrados, incluindo o seu. Nesse dia, Ann desapareceu, mas deixou evidências em todo o lugar antes disso e nunca mais foi vista por ninguém, exceto por mim.

— Isso é loucura. - Milla disse. - Essa é a vida real, não um filme de terror. 

Eu já não estava tão certo disso. 

— Bem, o caso é de verdade. - Nathalie fechou o lap top. - E se trata de um louco querendo ressuscitar os mortos, seu amigo sonha com um zumbi que, por coincidência, é igualzinha a essa moça.

— Matt? - Milla perguntou. - Você está daquele jeito de novo.

Daquele jeito. Do jeito de quem acabou de ver um demônio usando terno. Do jeito Matthew Coleman com medo de morrer.

— Se importa se eu tirar uma foto? - Nathalie não esperou resposta e tirou, com Flash e tudo. - Você acabou de se tornar meu protagonista. 

— Nathalie! -Milla exclamou. 

— Desculpa, mas essa expressão é impagável! - Ela sorria. - Vou recompensá-lo depois. 

Ela se levantou. 

— Tchau Matt. Tchau Camilla, te vejo na classe amanhã. 

Elas estavam na mesma classe? Curso de... Bem... eu não sabia do que, mas era bem estranho pensar que Milla e Nat—Nathalie tinham um gosto em comum sendo tão diferentes. 

— O curso de vocês é sobre assassinatos ou algo do tipo? - Perguntei. 

Milla começou a rir. Acompanhei o riso, mas era uma pergunta séria. 

— É Design. - Explicou, ainda risonha. - Não lembro dela na sala, acho que faltou nos primeiros dias. 

De maneira involuntária, lembrei das palavras de Mr. Gajeel sobre Nathalie. Ele não soou como se ela fosse uma pessoa de boa fama e, nas duas vezes em que nos encontramos, ela estava sozinha. Não fazia sentido nenhum, ele disse que todos a conheciam. Alem disso, ela não quis dizer seu sobrenome, isso me intrigava. Eu ia perguntar para Milla agora que sei que estudam juntas, mas parece que ela sabe tanto quanto eu. 

— O que você acha dela? - Perguntei. 

—Ah... - Milla pareceu pensar um pouco. - Ela parece ser uma boa pessoa.

Tapei um dos olhos com uma das mãos. 

— Mesmo com isso do...

— Não deveria julgar as pessoas pelas roupas que usam. - Milla disse. - Não é muito legal. 

Sorri, um sorriso que vinha com lembranças não tão boas assim. 

— Acho que eu entendo um pouco. - Antes que ela pudesse perguntar qualquer coisa, levantei-me. - Vamos começar nossa pesquisa hoje?

— Claro, mas hoje começo no Fliperama, certo?

Tentei imaginá-la usando o uniforme enquanto carregava bandejas. 

— Certo. - Sorri. - Você vai se dar muito bem lá. 

Se ela tratasse meus clientes da mesma forma que tratava seus amigos, não duvidava que iriam frequentar só para falar com ela. 

Era bem fácil ser amigo de Milla na verdade. Enquanto percorríamos o pavilhão rumo à biblooteca, encontramos alguns de seus amigos com nomes impronunciáveis. Aquele "Daniel-ílo" também era brasileiro, eu tinha certeza. 

Fiquei surpreso por Milla conseguir fazer amigos tão rápido, sempre fora uma tarefa difícil para mim. 

Depois de alguns minutos caminhando sob os finos e ineficazes (além de muito estranhos,) raios do sol da matina, chegamos na biblioteca. 

Juro que era maior do que minha antiga casa e minha antiga casa era bem grande. Fileiras e fileiras de estantes se estendiam na nossa frente como paredes de um delicioso labirinto, recheado de aventuras e conhecimento. Eu não ia me admirar se encontrasse o Necronomicon original  no meio daqueles livros. 

A parte mais interessante ao meu ver, eram as escadas em caracol que não chegavam a lugar nenhum, mas ajudava a pegar livros que ficavam lá no alto. 

— Bem... Vamos começar. - Milla suspirou. 

Senti preguiça só de olhar. 

Livros e mais livros depois, achamos muita gente de terno, mas infelizmente todos tinham rosto. 

Pegamos uma pilha de jornais antigos e colocamos sobre uma mesinha discreta sob a janela na parede esquerda, que ficava entre duas estantes e parecia ser a mais isolada. 

Tirando algumas cruzadinhas, não encontramos muita coisa interessante. Havia alguns anúncios e umas crônicas de clara ficção.  

Exceto por uma no penúltimo jornal. Essa contava uma história sobre um menino que começou a ter visões com sua irmã morta e se tornou um assassino por... Sei lá porque, aparentemente não era para fazer sentido já que era um texto muito ruim. O que chamou nossa atenção foi o "baseado em fatos reais" no final. 

Uma busca rápida na internet nos levou à um Serial Killer de valentões que os destroçava com machados de mão. Ele era chamado de Toby, em homenagem à um menino morto que ficaria muito feliz se esses projetos de Mr. Gajeel morressem. 

— Milla... - Murmurei, apontando para as árvores na cena do crime censurada de uma das matérias. 

Ele estava lá... bem no fundo entre as folhagens, eu o vi! Milla tentou. Eu vi que a tentou, mas não o viu. 

— Matt, são apenas árvores. - ela disse. 

Desviei o olhar pela janela. Estava aberta e uma brisa fria gelou meus ossos. Não conseguia parar de imaginar a coisa entrando ali e agarrando-me com aqueles malditos tentáculos que mais pareciam uma ninhada de cobras!

— O que estão fazendo agora?

Eu quase tive um infarto. 

— "Ataquioariu" — Milla disse algo que soou como isso, devia ser uma expressão em português, ela deixava escapar algumas às vezes.

— Vocês deviam ter visto a cara de vocês. - Nathalie soltou leves risinhos. - Desculpe-me pelo susto, não foi intenção. 

— Foi o adeus mais rápido que já vi. - Milla sorriu. 

— Não achei que fosse encontrá-los por aqui. - Ela colocou uma pilha de livros na mesa, mas pareceu com o som de um martelo arremessado na janela.

— Matt? - Camilla exclamou.

— Meu Deus, você está apavorado. - Nathalie notou. - Dê-me sua mão. 

Ela estendeu a própria. Não me movi. 

— O que vai fazer? - Milla perguntou, aprentando estar curiosa. - Massagem funciona para esse tipo de coisa?

— É uma técnica que aprendi com... - Seu sorriso morreu. - Bem..  Com alguém não tão importante. Deve ajudá-lo a relaxar.

— Talvez eu devesse aprendê-la. - Milla sorriu. - Ele fica assim às vezes.

— Isso n-não é ver-verdade. - Gaguejei, ainda fitando a janela. 

— Matt... - Milla levantou uma sobrancelha, ainda sorrindo, o que me fez corar. Claro que era verdade, desde quando a Milla se enganava sobre alguma coisa?

Suspirei e deixei que Nathalie segurasse minha mão. Ela começou a fazer movimentos circulares e apertar alguns músculos repetitivamente. Não surtiu efeito nenhum no começo, mas depois consegui parar de prestar atenção na janela aberta e comecei a prestar atenção nos movimentos. Era como uma música silenciosa.

— Está melhor? - Milla perguntou, depois de algum tempo em silêncio. 

— Acho que sim. - Afirmei. 

— Então... O que os senhores estavam procurando dessa vez? - Ela olhou para a tela do notebook de Milla antes que pudéssemos abaixar a tela.

— Toby? - Ela riu baixinho, ainda movendo os dedos pela minha mão. - Eu amo ele, já viram quando ele destruiu a Stella di Firenze? Ele começou pelos olhos e...

— Por que você ama um serial killer? - Milla perguntou, afastando-se um pouco dela.  - Ele mata pessoas, não é algo muito legal.

— Você nunca quis matar alguém? - Ela perguntou. Milla respondeu "Não" imediatamente, mas a pergunta ficou na minha cabeça. 

A unha do dedo indicador de Nathalie percorreu o meu dedo, deixando uma sensação levemente formigante que só cessava quando ela fazia de novo. Era gostoso. 

— Eu meio que me identifico com ele. - Ela olhou para mim, deixando a sensação de que ela me entendia por trás daquele tapa-olho estranho. - Eu adoraria matar aquelas garotas idiotas da minha antiga escola, adoraria matar certas pessoas daqui! - Ela começou a apertar minha mão mais forte. Chegava a doer um pouco. - Pessoas que fazem o que querem com você só porque podem! 

Ela levou a outra mão ao seio esquerdo e respirou fundo. Estava se descontrolando e poderia chorar a qualquer momento. Não devia ter sido tão legal usar tapa-olho no ensino médio. 

Milla batia o pé sucessiva vezes enquanto segurava a mão de Nathalie, da mesma forma que ela fazia com a minha. 

— Eu sinto muito. - Murmurou. 

Nathalie se recompôs com um suspiro. 

— Está tudo bem. - Ela esboçou um sorriso, olhando para a mesa. - Obrigada, Camilla. 

Depois de algum tempo em silêncio, ela perguntou: "Por que você estava daquele jeito?". 

— Eu... - Eu não sabia como explicar. Aquela coisa enorme de terno parecia estar perto, mas agora, quando olhava para a janela, não sentia nada além de um friozinho matinal. 

— Matt jura que viu um monstro na foto. - Milla mostrou a tela para Nathalie. 

Ela pareceu concentrada durante alguns momentos. 

— Realmente... - Ela disse baixinho. Aproximei-me da tela. 

— Você também viu? - perguntei, retomando a bizarra sensação. 

— Claro! - Ela apontou para algo bem diferente do que eu vira outrora. - Com essa roupa ela só pode ser um monstro! Olha isso, parece que saiu de um cemitério. 

Ela se referia à mãe da vítima, que não trocara de roupa para ver o filho morto e chorava histericamente enquanto policiais a seguravam. 

— Foi uma brincadeira. - Ela revirou os olhos. - São só árvores, olha!

Dessa vez ela apontou para o lugar certo. E definitivamente não havia nada demais ali, apenas árvores.

— Desculpe-me... eu... - Olhei para Milla, sabendo que me entenderia. 

— Está tudo bem, esse tipo de coisa acontece. - ela tocou minha outra mão. - Eu já li algo sobre isso, "Pareidolia" se não me engano. Faz com que seu cérebro enxergue coisas que parecem ser e não o que são de verdade. 

Guardei a palavra junto com o sonho que tive quando cheguei, era interessante. A coisa realmente se parecia com uma árvore, então eu devia ter confundido. 

Nathalie finalmente soltou minha mão. 

— Isso eu nunca tinha visto. - Ela disse, enquanto dava zoom na página. - Quero dizer, claro que já tinha visto, mas nunca em uma cena do Toby.

No galho da árvore mais próxima à mãe da vítima, havia uma marca peculiar e quase apagada, na verdade era bem difícil ver, mas enfim conseguimos. 

Era a marca do meu sonho: O maldito "x" oval, ou olhos... Não sei, mas seja o que for, estava lá. 

Um arrepio percorreu minha espinha. O rosto de Milla não apresentava nenhuma expressão e o de Nathalie estava intrigado. O meu deveria estar mais branco do que o leite que misturamos com chá de madrugada. 

— Toby está aqui? - perguntei baixinho. - Isso está aqui, então Toby está aqui, certo?

Nenhuma delas respondeu.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Toby está lá? ㄱㄱ
O que vocês acham?
Me conta ㄱㄱ
Tchauㄱㄱ
Melhores olhinhos ㄱㄱ



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Darkpath" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.