Os Gregos Tinham Razão escrita por Miojo-san


Capítulo 1
Memories Soaked in Blood




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  Os gregos tinham razão. Como assim? Ora, para os gregos, a história do mundo não é uma linha reta, como é para os cristãos. Ela é composta de círculos que se cruzam e se repetem infinitamente, fazendo com que certos acontecimentos acabem se repetindo com pequenas diferenças. O que quero dizer com isso? Muito simples: vocês humanos nunca aprendem. Sendo sincero, pessoalmente preferiria estar dormindo ou lendo alguma coisa interessante em vez de dissertar neste pedaço de papel, mas minha mestra deseja que eu escreva minhas memórias e pensamentos. Não sei realmente o que aquela mulher pretende fazer com isso, mas devo obedecê-la mesmo assim, afinal, ela é minha senhora.

 

  Com o desejo de ilustrar este pensamento dos gregos, eu, Alucard, compartilharei com vocês, possíveis leitores, um momento curioso de minha vida, que ocorreu a mais ou menos cinqüenta anos atrás em Berlim, nos derradeiros momentos da ditadura do Fuhrer, aliás, para ser mais preciso, é um acontecimento que se deu nos últimos minutos de vida do austríaco em questão. Bom, eu estava lá, quando os soviéticos entraram em Berlim destruindo tudo para se vingar do sofrimento que Hitler causara. A capital germânica ardia em chamas, o barulho de tiros e bombas formava uma linda orquestra espontânea com o choro dos humanos, civis ou militares, que morriam como moscas no meio daquele adorável inferno.

 

  Eu caminhava em meio às casas ardentes e cadáveres, meu casaco vermelho coberto de fuligem e sangue. Julgo desnecessário dizer que matava todo e qualquer soldado que cruzasse meu caminho, minha mira era precisa, e minhas armas, mortíferas. Sim, é fato que os revólveres de cinco décadas atrás não eram tão bons como os atuais, mas faziam seu trabalho, da mesma maneira que 500 anos antes, arcos e flechas cumpriam seu dever magistralmente. De todo modo, todos aqueles que cruzavam meu caminho tombavam. Os humanos, com um ou dois tiros, e os monstrengos de segunda classe da SS, com uns cinco disparos.

 

  Estava me divertindo, sim, apesar de naquele momento não existir nenhum oponente à altura em Berlim, o massacre que promovia naquela cidade, capital do Terceiro Reich, era....embriagador. Estava inebriado com os derradeiros gritos de meus oponentes, me encontrava em um êxtase total. No entanto, fui arrancado de meu divertimento por uma voz que viera de uma pessoa atrás de mim, me virei e observei a silhueta do humano que fora capaz de me deixar de joelhos. Hellsing, o primeiro deles. Estava sorridente, com seu terno impecável e bengala, seu amado Reino Unido estava vencendo a guerra afinal. Ele sabia que os soviéticos e os americanos iriam roubar a coroa da Inglaterra, mas não ligava para isso no momento, a sensação de esmagar a Alemanha nazista era boa demais para ele.

 

  “Tenho um pedido para você.”- disse ele, sorrindo enquanto acendia mais um charuto.

 

  “O que desejar, meu lorde.”- respondi com um leve sarcasmo, enquanto fazia uma reverência.

 

  Nosso diálogo foi brevemente interrompido por um ghoul que surgira atrás de meu mestre, mas aquilo foi resolvido rapidamente. Um disparo de meu revólver, uns fios de cabelos a menos na cabeça de meu chefe e tínhamos um ghoul a menos no mundo. Meu chefe olhou para o cadáver que se desfazia em cinzas no chão. Era um dos poucos monstros da SS que restaram, no final das contas, os investimentos do Reich em criaturas sobrenaturais não fora suficiente para decidir os rumos da guerra.

 

  “Sua pontaria é boa, mas vai ser punido pelos fios de cabelos que você arrancou de minha cabeça, nosferatu.”- Hellsing me repreendera com cinismo.

 

  “Eu quero que você mate Hitler antes dos soviéticos.”- explicou.

 

  Eu olhei surpreso para ele, matar Hitler seria divertido, mas chamativo. Isso não combinava com o estilo discreto do homem. Arqueei uma sobrancelha e sorri de modo debochado, exibindo minhas longas, e belas, presas. Arrumei meu chapéu e recarreguei minhas armas enquanto aguardava mais instruções. Aquele plano era simples demais para os padrões de Hellsing, tinha que ter mais detalhes.

 

  “Outra coisa, faça parecer que ele se matou, entendeu? Não queremos chamar atenção, ainda.”- completou antes de soltar a fumaça do charuto.

 

  “Entendido, meu lorde...”- respondi enquanto fazia uma breve reverência para logo em seguida retomar minha caminhada, deixando meu chefe para trás.

 

  O pedido fazia sentido agora. Meu mestre não queria o reconhecimento por ter se livrado de Hitler, queria simplesmente se livrar do ditador. Talvez fosse desejo de vingança, talvez fosse simplesmente egocentrismo por parte dele, mas não me importava, eu deveria apenas realizar o pedido de meu amo. A caminhada até o esconderijo de Hitler era monótona, o fuhrer não tinha mais criaturas poderosas a seu serviço, portanto era uma presa extremamente fácil. No caminho matei mais alguns soldados e uns dois vampiros de nível baixo que outrora foram oficiais nazistas, eram poucos guardas, deduzi então que a maioria dos soldados alemães deveria estar em combate com os soviéticos. Lembro que fiquei muito despontado neste momento, quando os inimigos são fracos, a diversão se dá pela quantidade deles.

 

  Cheguei à entrada do esconderijo do chefe alemão, um bloco de concreto que dava acesso ao subterrâneo, após uns vinte ou trinta minutos andando. Arrombei a porta com um pontapé e entrei. A escadaria era mal-iluminada, e os degraus estavam sujos de sangue e fuligem. É claro que não me importei com estes detalhes, afinal, sequer usei os degraus para descer. Levitei, era mais prático e menos barulhento. Encontrava-me então no primeiro subsolo, e graças aos meus dons das trevas, sabia que teria mais uns cinco andares para desbravar.

 

  “Oh, então é assim, Adolf?”- disse em voz baixa enquanto apontava uma arma para o chão.

 

  Naquele momento, invoquei meus poderes sombrios, envolvi o revólver que apontava para o chão em trevas e chamas e por fim, disparei. O tiro abriu um buraco até o último subsolo, onde Hitler estava escondido. Por um acaso acabei dilacerando a secretária do miserável, mas ela iria morrer de qualquer jeito. Ouvi o último grito de agonia da mulher misturado aos berros de medo do ditador, e pulei, chegando até ele em poucos segundos. Aterrissei em cima da mesa que ele usava para organizar a papelada, e esta se partiu ao meio com meu peso.

 

  “Monstrengo da Inglaterra...”- balbuciou ele enquanto me fitava com um misto de pavor e desdém.

 

  “Heh, faz tempo que não te vejo Adolf.”- respondi, encarando o homem.

 

  Pobre miserável, não valia o ar que respirava, pensei. Pelo menos Lúcifer iria se divertir torturando-o. Olhei ao redor, vi remédios, uma corda, um punhal e um revólver, pelo visto ele iria se suicidar de qualquer maneira. Sorri com sadismo e apontei meus dois revólveres para o focinho dele. O outrora poderoso fuhrer da Alemanha agora estava encolhido na parede, temendo pela própria vida. Aliás, é engraçado ver como as pessoas se mostram covardes ao se depararem com a derrota completa.  Mais uma vez então envolvi meus revólveres em chamas e trevas e gargalhei como não fazia há muito tempo.

 

  “Vim te poupar trabalho,então, morra como um porco!”- sentenciei antes de descarregar minhas armas no corpo do miserável.

 

  Ele ficou irreconhecível, mas faltava ainda disfarçar o serviço. Isso foi fácil, queimei até os ossos do cadáver e depois fiz o mesmo com o que restara da secretária. Meu trabalho estava completo, saí do local na forma de uma nuvem de morcegos e voltei para meu lorde desejoso de dar-lhe as notícias. No outro dia, os jornais diziam: “Hitler comete suicídio e Berlim é tomada”. Ah, como eram ingênuos os jornalistas da época, muito mais fáceis de ludibriar do que os enxeridos do século XXI.

 

  Agora você deve me perguntar: o que diabos essa história tem haver com o pensamento dos gregos? Permita-me então explicar, ocorre que, mais de 50 após a derrota do Nazismo, vocês humanos se dividem mais uma vez em mocinhos e bandidos, em vencedores e perdedores. Era assim em 1945, é assim hoje, foi assim na minha juventude e será assim mesmo depois que eu me for. Vocês não aprendem. Levam uma vida mesquinha na qual pensam que sofrem e batalham, mas não tem idéia do que é uma batalha de verdade, sequer têm noção do que é o verdadeiro sofrimento. Mas que posso fazer por vocês? Sou apenas um príncipe das trevas, não cabe a mim julgar a vida vulgar que vocês levam. Apenas assisto suas falhas e “dores”, e quando necessário, limpo a sujeira de vocês. Acho que no fundo é esta a minha função, e a dos Hellsing também, nós limpamos as porcarias que vocês fazem. Por vocês nunca aprenderem é que os gregos tinham razão, os mesmos erros são sempre cometidos, o mundo muda, mas vocês não.


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