Altéia escrita por morisawa


Capítulo 1
Único


Notas iniciais do capítulo

Como eu amo essas duas! Meu primeiro casal e yuri e até hoje o meu favorito. Acabei ficando sem tempo para escrever esses últimos dias, mas encontrei um espaço e decidi publicar aqui.

Boa leitura.



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Madoka acelerou o passo, deu uma meia-volta bonita, apertou forte a espada pequena acinzentada e a fincou no boneco de pano logo à frente, sem parecer ter remorso algum, e voltou à pose normal graciosamente. Era como se ela tivesse nascido para isso; talvez, juntando a sua beleza, delicadeza e determinação, era como se estivesse no palco e fosse à bailarina principal, dando tudo de si e mostrando seu melhor ao público. Sem defeitos, apenas e simplesmente perfeita em todas as bordas. Mesmo que Homura soubesse que Madoka não era um anjo, não conseguia enxergar os defeitos que a mesma enxergava em si mesma. O pequeno suor que caía de seu rosto avermelhado resultante do cansaço que tinha, mas que tampouco demonstrava, estava dando lugar à sua delicada face um sorriso animado.

— Acho que eu estou melhorando nisso, sabe? - exclamou feliz, sorrindo de olhos fechados e mostrando as covinhas quase inexistentes, mas que ainda estavam ali. - Você é uma ótima professora também, Homura, eu nunca conseguiria sem você.

Homura a entregou um pano branco, e Madoka secou o suor. Seu corpo definido, os braços que estavam criando músculos e o tanquinho, agora tão bem feito, resultado dos treinos incessantes, tiravam-na da habitual aparência “feminina” que tinha, mas ainda assim, continuava tão linda como sempre. Com uma blusa curta e apertada, esportiva e branca, e uma bermuda tão igual quanto, dava para se perceber o quanto ela tinha mudado – para melhor, na opinião de Homura. Mesmo assim, não pode deixar de sentir a dor tão habitual no peito, que a machucava e sufocava, dando lugar a uma ânsia horrível. Reprimiu-a com dificuldade, tentando não deixar tão aparente seu enjoo repentino.

 – Isso tudo veio porque você se esforçou. Eu só dou um empurrãozinho, sabe. – respondeu acuada, com as mãos juntas de modo tímido. Na verdade, seu corpo inteiro estava tenso, mas era tão normal isso acontecer ao lado de Madoka, que nem dava mais tanta importância.

Madoka riu baixo e discordou com a cabeça. Tomou um gole da garrafinha d’água que sempre trazia. Não era tão tarde, e aqueles treinos eram rotineiros das duas: uma forma que encontraram de ajudar Madoka a proteger a si mesma, depois de tantos noticiários sobre os assaltos e sequestros recorrentes no Japão inteiro.

Os treinos sempre ocorriam às tardes quentes, às vezes frias, mas nunca chuvosas, no quintal dos fundos da casa de Homura. Estava limpo, bem cortado e cheiroso, como era o costume dela, sempre deixar as coisas no melhor estado, bem feito e simples, mas ao mesmo tempo extravagante, como ela mesma; olhos violetas brilhantes, cabelos longos e escuros, que a davam uma aparência mais velha e madura, mesmo que sua personalidade seja contrária, tímida, reservada e ligeiramente desajeitada, mas sempre ao extremo da fofura. Madoka admirava muito a amiga e como Homura lhe ajudou muito nesse pouco tempo em questão á autodefesa, e nos desabafos, que mesmo raros, ainda eram muito, muito bons e reconfortantes. Bom, não sabia como agradecer, mas se esforçava muito para dá-la orgulho – queria mostrar como era uma boa aluna, afinal.

— Quer comer alguma coisa? – indagou Homura desconfortável com o silêncio, e com medo da ânsia voltar.

— Ah, não, estou bem assim. Obrigada por tudo que você está fazendo.

Homura sentiu seu rosto esquentar e estremeceu. – Tudo bem, somos amigas, e amigas servem para isso.

Madoka e observou. Ombros tensos, olhos semicerrados e infelizmente, sem óculos – que a deixavam melhor, na opinião de Madoka, mas que Homura odiava e vivia dizendo como lhe deixavam estranha. Era bonita, ligeiramente maior que Madoka, magra e com tantos músculos quanto ela, mas que não apareciam pelo seu costume de usar roupas largas e eventualmente, com mangas longas, como estava usando agora, pretas. Além de ser uma boa amiga, claro, e uma ótima companhia para dias chuvosos.

— Bom, já está ficando tarde – anunciou Madoka calma, ainda se secando –, nos vemos amanhã, na escola? Tenho que terminar a tarefa de Química, mas prometo voltar aqui no sábado seguinte.

Homura sentiu um aperto no peito, novamente, e junto da ânsia. Tossiu algumas vezes, e quase, por pouco, vomitou. Percebeu que Madoka a olhava preocupada, e com vergonha, rapidamente limpou as mãos na camiseta preta que usava, sem deixar a amiga ver o sangue que escorria entre seus dedos longos e ossudos. Queria passar mais tempo com ela, mas como sempre, era covarde demais para dizer e tinha medo de algo assim acontecer, novamente, na frente de Madoka. Não era aquela garota séria de tão pouco tempo atrás, sem emoção, sabia que aquilo machucava a amiga. Mas ao mesmo tempo, não sabia quem ela era. Murmurou um “tudo bem” baixo, e limpou o suor da testa, consequente do calor e a ansiedade que sentia.

— Quer que eu te leve até em casa? – acrescentou se virando para a saída do jardim dos fundos, onde treinavam. Deu as costas ainda tímida, com medo de que se houvesse outro enjoo repentino, ela não conseguiria esconder o sangue. Madoka a seguiu enquanto segurava as coisas do treinamento, e seus materiais; pano, garrafa d’água, a pequena e afiada adaga, peças de roupas e as chaves da bicicleta.

— Não, obrigada Homura. Vou sozinha hoje. Te ligo quando chegar em casa, podemos conversar um pouco enquanto fazemos a tarefa.

Homura acenou com a cabeça em concordância. Com o coração palpitando rapidamente, passaram pela sala brilhante e tecnológica, em direção á saída da frente, ou entrada. Madoka botou o casaco verde-saturado enquanto caminhava, escondendo o top branco de baixo, com preguiça de por novamente sua blusa azulada. Depois de passarem pela sala e a cozinha, chegaram à porta da frente. Madoka saiu primeiro e Homura a seguiu, com face indiferente e as mãos suadas.

 Como era cedo, o sol ainda estava bem destacado contra o céu azul e limpo de nuvens, o brilho amarelado dele mesmo refletia no metal amarronzado da bicicleta de Madoka, que tinha uma cesta pequena e bonitinha na frente. Homura olhou silenciosamente a amiga terminar de por as coisas na cestinha branca pendurada em frente, e com os lábios crispados, viu-a ir embora. “Até amanhã, na aula de Artes” a ouviu murmurar, encantada, como sempre, mas não respondeu.

Por dentro, sua alma gritava de dor; como se estivesse presa num inferno que em vez de ser tão ardente, era gelado e parecia matar devagar, recheado de flores bonitas, buquês e pétalas de Altéia, fazendo a vítima nem perceber e guardar falsas esperanças, para depois saborear sua decepção e tristeza. Mas tampouco Madoka, que nunca iria perceber como a cobiçava nas aulas de educação física e muito menos nos treinos, abraços e a ajuda nas tarefas, conseguiria a tirar daquela situação. Não iria perceber que queria partir a outro ponto, sair daquele ônibus ruim e cheio, para ir encontrar um mais aconchegante e rápido.

Com um vazio dentro de si, Homura apertou o passo e entrou cabisbaixa dentro de casa. Como morava sozinha, não tinha muito que fazer; sem nenhum animal de estimação, era como viver dentro de um silêncio desconfortante em que algo a impedia de sair. Novamente a ânsia a atacou, agora mais forte e angustiante, que a fez cair de joelhos no piso branco e bem limpo. Dessa vez ela não a reprimiu, e sentiu sua garganta rasgar devagar, enquanto vomitava um buque de pétalas brancas, roseadas no meio e delicadas, recheadas de espinhos, mas agora manchadas com seu sangue avermelhado e imundo. 


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