Luisa Parkinson: A Companheira Fantástica escrita por Gizelle PG


Capítulo 89
A mulher que não existia


Notas iniciais do capítulo

Helloo!!

"A turma está amarada a mercê de uma antiga inimiga do Doutor que não mais deveria existir. Qual será a causa disso?"



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O Doutor parecia perplexo. Quase inconsolável.

—Não pode ser a verdadeira Rani. Isso é impossível... –ele chacoalhou a cabeça. –Poxa vida... Eu sou um doutor! Talvez deva me auto-receitar umas pílulas contra alucinações...

A mulher sorriu, pretensiosa.

—Ah... Como você se engana, seu tolinho—ela provocou. –Sou eu mesma, Doutor. Eu voltei. Agora em melhor forma do que nunca! E estou com a corda toda...—então parou de chofre. –Você ainda continua usando esse nome medíocre: “Doutor”? Santo Pai de Gallifrey... Que falta de criatividade!

O Doutor cerrou os dentes.

—O meu nome é uma promessa. Um juramento que fiz a mim mesmo há muito tempo... Antes de ser exilado. Ao por do sol da ordem e do caos... E novamente, ás vésperas da última grande Guerra do Tempo.

—Tudo muito poético -ela bocejou. -, mas voltemos aos negócios...

—Espera! –Luisa interferiu. –O Doutor falou da Guerra do Tempo. Será que eu fui à única que prestou atenção?

—Do que você está falando? –Rani franziu a testa.

Na ironia disso tudo—a TARDIS completou. Até então, ninguém havia notado que ela estava acordada ouvindo tudo. Melissa, por outro lado, continuava dormindo, como se nada estivesse acontecendo. –Durante esse tempo todo, o Doutor esteve sozinho. Desde que seu planeta se foi, ele e eu vagamos juntos, tentando encontrar um novo propósito para continuar vivendo e seguindo em frente. Até então, não existia quaisquer sinal de sobreviventes de Gallifrey, além dele mesmo, de mim e do Mestre. Mas agora, com a Rani entre nós, as possibilidades tornam-se muito mais excitantes... –ela sorriu, então fez uma pausa, afligindo-se. -Ou então, talvez isso seja realmente muito, mais muito preocupante mesmo.

Calma lá! Segure as pontas “sucata do tempo”—ofendeu-a, Rani. –Como assim “desde que seu planeta se foi”? Gallifrey não saiu do lugar. Nem sequer mudou de estação ainda neste ano. Neste caso, o que vocês pretendem conseguir com essa atuaçãozinha barata?

A TARDIS fez uma tentativa de dar de ombros.

—Queremos dizer a verdade, ora –intensificou. –Que Gallifrey se perdeu para sempre. Que levou o mesmo fim que os Daleks. Que não sobrou nada ou mais ninguém. Que ambos perderam a guerra.

Rani franziu tanto o cenho que Luisa imaginou que suas sobrancelhas fossem despencar.

Mas que Guerra do Tempo?

A última grande guerra. –o Doutor esclareceu, meio confuso por ela não se lembrar. –Simplesmente, a mais impactante de todo o universo. Ao todo, centenas de planetas com espécies menores pereceram por causa dos efeitos colaterais que ela gerou em todo o cosmos; O equilíbrio nunca mais foi o mesmo... Oh, Rani! Rani. Por favor... Todo mundo ouviu falar dela. Como logo você, uma Senhora do Tempo legítima, pode não se lembrar?

Lembrar?—ela parecia intrigadíssima. –Você só pode estar mesmo ficando louco! Como quer que eu me lembre de um fato que jamais aconteceu?

Jamais?—foi à vez dele fazer uma careta, e fitá-la como se ela fosse a coisa mais absurda de toda a criação. –Eu não estou te entendendo. Sei que você desapareceu por um tempo... E pra dizer a verdade, não me lembro de vê-la lutando na linha de frente, quando Arcádia caiu. Mas, de uma coisa eu sei: Todos os Senhores do Tempo foram convocados para retornar até em casa e defender Gallifrey. Todos. E, apesar de não tê-la visto lutando, com meus próprios olhos, eu acreditava que você, assim como o Mestre e todos os outros, estariam lá, respondendo ao chamado, assim como eu fiz.

Rani riu, incrédula.

—Você perdeu a sanidade? NÃO EXISTE ESSA COISA DE “ÚLTIMA GRANDE GUERRA DO TEMPO”! –ela insistiu, gritando em seu ouvido. –Se quer saber, eu vi Gallifrey recentemente. Eu estava lá semana passada... Nada do que você diz é verdade. Só pode estar mesmo blefando... Eu sempre lhe disse que viajar com seres humanos fazia mal ao cérebro.

—Ei! –protestou Luisa, em seu nome e no de Melissa. –“Os seres humanos aqui tem ouvidos, tá!?”

—Eu não vou admitir que fale assim com elas –o Doutor tomou as dores, irritado. –E não me olhe como se eu fosse um lunático assumido. Rani! Presta atenção! Você tem que me escutar... Tudo o que eu disse sobre Gallifrey... É tudo verdade. Sério! Passei séculos em luto por causa disso... –ele desabafou. -Olha, eu não sei o que aconteceu para você esquecer de um fato tão importante para todos nós, mas eu lhe peço que tente ser razoável. Nós três somos os últimos da nossa espécie... Se continuarmos a criar desavenças logo agora que deveríamos nos unir, estaremos perdidos! –o Doutor insistiu.

Rani fez um bico enorme.

—Hum-hum. Sei. Então quer dizer que dentro desse seu “mundinho de ilusões”, todos morreram e você sobreviveu. Então, agora me responda só uma coisa: Por que logo VOCÊ entre tantos de nós? Por que logo você seria privilegiado?

O Doutor encarou-a com pesar.

—Eu não tive escolha. Sobrevivi como uma forma de penitencia. Um castigo prolongado. No dia em que Gallifrey sucumbisse, eu viveria para continuar a ver o universo envelhecer. Não digo que foi uma troca perfeita. Queria ter podido salvá-los... Mas não consegui. Na verdade, foi a decisão errada que tomei, que pôs tudo a perder. –ele fez uma pausa, tentando conter a enxurrada de sentimentos confusos que o atingiram. –Claro que não sujei as mãos usando esse rosto. Foram pelo menos umas cinco regenerações à diante. Mas isso não faz diferença. De um jeito ou de outro, foi o Doutor que destruiu Gallifrey e Skaro. E eu sou o maldito Doutor.

Do outro lado das amarras, Luisa estava com os olhos lacrimejando. Rani porém, não se convencera tão facilmente. Ainda tinha certas duvidas de que aquilo fosse verdade, e resolveu tirar tudo a limpo de uma vez por todas, mostrando quem é que manda. Por isso aproximou-se dele, mais imponente do que nunca, sentindo-se a tal, e segurou seu queixo com força, forçando-o a olhar para ela.

—O seu problema, Doutor, é que você não sabe perder. Finalmente reconheceu que está em perfeita desvantagem, e por isso começou a ficar inventando historinhas comoventes, esperando que eu caia nessa sua lábia afiada: Você me subestima. –ela ponderou. -Eu, por outro lado, aprendi muito com os erros que cometi no passado... Tanto que hoje em dia, estou sendo muito mais cuidadosa.

Ele esquivou o rosto da mão dela, enojado.

—Sim. Pode até ter melhorado suas táticas, mas sempre haverá uma coisa da qual você se esquece de alterar. A coisa mais importante, se quer saber: você ainda continua trabalhando para o lado errado.

Rani sorriu, otimista.

—Noticia de primeira mão para você, Doutor: Eu não trabalho mais pra ninguém. Já faz meio século que renunciei ao meu antigo cargo em Gallifrey. Finalmente, estou por conta própria. E mais criativa do que nunca para poder executar meus experimentos.

Foi nesse momento que o Doutor arregalou os olhos.

—Então é isso! Ah! Já entendi a de vocês!

Naquele momento, o comunicador de Rani tocou e ela se afastou para atendê-lo. Percebendo que a barra estava limpa, Luisa voltou-se rapidamente para o amigo:

Isso o quê? Diga Doutor!—insistiu ela, curiosa. –O que você descobriu?

Nesse meio tempo, o Doutor se propôs a esclarecer as coisas do modo mais breve possível.

—Entenda uma coisa: Esse presente atual onde estamos vivendo é uma linha cruzada. Essa Rani que voz fala, é antiga para mim; Quase como um fantasma de um tempo perdido. De uma Gallifrey extinta, que não existe mais... Diante das circunstancias, imagino que o mesmo se aplique ao Mestre também –sugeriu. -O fato é que quando viemos parar nesse shopping, eu não fazia idéia que mais alguma intervenção de Senhores do Tempo estaria acontecendo exatamente aqui e agora, ganhando repercussão extra com a nossa presença, mas também, cultivando a existência de duas pessoas que já não deviam mais existir. –ele fez uma pausa, brincando com os lábios. –Só que isso é mero detalhe perto do tamanho real do problema... A verdade é que esse shopping; o Mestre e Rani; a profecia; nós quatro presos aqui... Tudo faz parte de um jogo. Durante todo esse tempo, estávamos brincando de gato e rato e nem tínhamos conhecimento disso.

Luisa franziu o cenho. Ficara intrigada sobre uma determinada parte do discurso dele.

—Estou enlouquecendo ou você disse “que eles não deviam existir”?

—É quase como um eco atrasado –exemplificou a TARDIS. –Escute isso: “Em uma bela véspera de Natal, dois ambiciosos Senhores do Tempo, de um passado remoto para nós, pegaram suas TARDIS e manipuladores de vórtices e viajaram até um Shopping futurista nos limites do tempo e espaço, muito antes da Última Grande Guerra do Tempo ter sido anunciada ou da queda de Gallifrey, e começaram a trabalhar juntos em uma parceria que prometia ficar para a história. Mas, era obvio que cedo ou tarde o Doutor iria intervir em seus planos, que por coincidência, tratavam-se justamente de tirá-lo de vez da jogada. Então, muito sigilosamente, seus dois inimigos bolaram uma armadilha para atraí-lo e rendê-lo, sem se preocupar com a possibilidade de capturarem um Doutor com muitas regenerações à frente. É claro que isso complicaria um pouco as coisas, mas eles teriam que dar um jeito de desregenerá-lo de qualquer forma. Contudo, primeiro precisariam que nós mordêssemos a isca, o que para seu deleite, nós definitivamente fizemos quando aterrissamos no lugar errado e na hora menos conveniente possível; Que pra começo de conversa, resultou no eventual choque de linhas de tempo; O que sem querer, acabou completando o ciclo planejado pelo Mestre e Rani, desde o princípio”.—e inclinou a cabeça meramente na direção de Luisa. -Você compreende agora? 

O Doutor ergueu a sobrancelha para a TARDIS.

—Espertinha você, hein?

—Como eu disse: sou psíquica. -ela deu de ombros, sorrindo simplista pra ele. -Só em uma piscada de olhos, fui capaz de desvendar todo o arsenal de informações sigilosas que Rani armazenava em seu cérebro... De repente, sabemos tudo sobre seu plano... –ela foi se empolgando à medida que a ficha foi caindo. –Puxa... Estamos em vantagem sob eles! Não é um máximo!?

—É claro que é! Eu sempre soube que você era promissora... Por isso te escolhi. –o Doutor flertou com ela, fazendo-a corar.

—Por isso EU te escolhi. –ela sorriu, mas percebeu o olhar de Luisa, perdido sob os dois, então tratou de recompor-se rapidamente, voltando-se para a menina com um ar mais profissional possível: –Entendeu tudo querida?

Luisa foi pega de surpresa.  

—Hã? Ah sim..! –ela umedeceu os lábios. –Então... Esses tais de “Mestre” e “Rani” são dois inimigos jurados do Doutor, de outra época, mas que curiosamente, cismaram de viajar também para esse shopping. E nós, que somos de uma versão do universo após a queda de Gallifrey, acabamos de adentrar em suas linhas de tempo antigas. E, acima de tudo, essa nossa “participação inesperada” na verdade era tudo o que eles precisavam para conseguir êxito em seu plano mirabolante e perverso...—Luisa resumiu, por fim, engolindo em seco. –Nossa. De repente meu estômago deu uma cambalhota com tudo isso...

Às suas costas, o Doutor balançou a cabeça.

—Controle-se. Não é hora de sentir nostalgia—ironizou, brincalhão. –Precisamos ser otimistas! Quem sabe o que nos espera? Talvez eles só queiram nos convidar para tomar um chá com biscoitos... –sorriu ele, esperançoso.

—É. Igual fizeram os Hipnóts—retorquiu Luisa, devolvendo o tom de ironia. O Sorriso do Doutor desapareceu formalmente.  

Só para melhorar as coisas, Rani retornou ao corredor, guardando seu comunicador rústico e pôs as mãos na cintura.

—Desculpe minha ausência. Onde paramos?

O Doutor piscou por um momento, intrigado.

—Sinceramente... Você é mesmo a Rani? A cientista que fazia experimentos inconseqüentes usando moradores de planetas indefesos como cobaia?

Sou a própria—ela disse, fazendo uma reverencia. –E você é o Doutor. O homem que vive intervindo em meus planos. Mas não agora, meu caro... Hoje, é você quem está com a corda no pescoço. É a sua vez de sentir como é estar completamente impotente.

Bem...—ele inclinou a cabeça, relevando o comentário. –Eu diria “temporariamente fora de serviço”, mas vamos fazer do seu jeito por enquanto. –ele arregalou os olhos por uma fração de segundos. -Falando em “temporariamente fora de serviço”... Como é que vai o Mestre?

Rani sorriu torto.

—Vai muito bem, obrigada. Disse para eu agilizar as coisas. Estamos ficando sem tempo.

—Ah! Agora estamos atrasados para alguma coisa... Engraçado você dizer isso, porque do jeito que você estava se gabando agora pouco, eu podia jurar que ainda tínhamos o dia todo pela frente. –ele ironizou, sorrindo de falsete.

Rani deu uma gargalhada maligna que fez até Melissa acordar, assustada.

O quê? Quem foi que roubou meu pão!? Eu vou acabar com a raça do desgraçado!—gritou Melissa, despertando de um possível pesadelo, e caindo de pára-quedas na confusa realidade. Então deparou-se com a perversa Rani, e com todos os seus amigos amarrados. –Ué... Vocês começaram a festa sem mim?

—Ah, Doutor... Você sempre fez as piores escolhas... –debochou Rani. –É isso que viaja com você ultimamente? –e apontou para Melissa e Luisa.

Ainda meio grogue por causa do sono, Melissa não percebeu o tom ofensivo que Rani usou ao se referir a elas duas. Ao invés de se irritar e começar a bater boca, como normalmente faria, apenas franziu o cenho, fazendo cara de pura estranheza, e voltou-se para o Doutor e Luisa, murmurando:

Qual é a dessa tia locona? —tentou ser discreta, mas sua voz saiu alta e clara.

Eu não sou tia de ninguém, sua inútil!—rebateu Rani. –Eu sou a fabulosa RANI. A genial. A incomparável. A única e indispensável. Quem me tem como aliada, jamais se arrepende.

—Ou será que isso é porque ninguém sobreviveu pra contradizê-la –sugeriu a TARDIS, fazendo todos quase estourarem de vontade de dar risada. A Senhora do Tempo não gostou da brincadeira, e deixou sua raiva transparecer nos punhos fechados, e na olhada mortal, que jogou sobre ela. Em afronta, a TARDIS permanecia irritantemente íntegra: com seu ar de inocente, olhar azul tênue, e um sorriso dissimulado, no rosto. 

Rani abaixou-se próximo dela, no chão, e falou:

—Você, navesinha estúpida, tente aproveitar ao máximo sua estadia nesse corpo, porque, eu mesma lhe garanto: Não. Vai. Durar. Muito.—provocou-a, falando próximo ao seu ouvido. Desta vez a TARDIS ficou séria, e Rani finalmente ficou satisfeita. –E então, Doutor. Sua companheira aqui perguntou sobre uma festa... Bom, não vamos decepcioná-la, não é? –a mulher sorriu terrivelmente.

O quarteto se entreolhou, receoso.

—Calma. Não precisam se preocupar... –Rani garantiu. –Na verdade, em nome da minha sinceridade, eu lhe garanto que não irei machucar nenhuma das suas amiginhas—disse ao Doutor, enquanto apertava o rosto de Luisa. –Isso se você for um bom menino, e se entregar de forma simples e sem resistência.

—E vocês oficializaram a parceria agora? –sondou o Doutor.

Rani ajeitou o cabelo.

—Acredite, o Mestre não quer nada além de ter uma conversa franca com você.

Hã! Mais é claro—o Doutor deu uma de incrédulo. –Assim como não estava tentando explodir minha TARDIS quando seqüestrou-a para transformá-la em uma máquina de paradoxo. É... Essa é boa! Tem mais alguma piadinha ultrapassada nessa sua lábia de vilã fracassada?

Rani ficou inflamada e fitou-o com ódio mortal.

—Quer saber, eu acabaria com você agora mesmo se não tivesse um trato a cumprir! Sinta-se sortudo por isso!

—Eu deveria? –ele trincou o maxilar. -Estou amarrado desconfortavelmente e sendo ameaçado à luz do dia por uma maluca displicente que ainda se sente orgulhosa por fazer as coisas macabras que faz. Como ainda consegue dormir de noite? Como ainda pode se enxergar como “uma boa Senhora do Tempo”?

Ela cruzou os braços, cheia de si.

—Chama-se “ser fria”. –anunciou. -Já ouviu falar em cirurgia, não é Doutor? Os cirurgiões têm que ter estomago frio para não desmaiarem perante à operação de um paciente. E eu, sou assim com meus experimentos. Se os ouço gritar, espernear, lutar pela vida, penso em uma das trinta e oito sinfonias clássicas de Gallifrey. Os ignoro. Daqui a alguns instantes, o incômodo vai embora completamente.

O Doutor fez uma careta.

—Isso é absolutamente doentio. Você é doente, RANI! –ele rugiu, fazendo o corpo de Luisa sacolejar junto do seu.

Rani olhou-o com o mais puro ódio e deu-lhes as costas por um momento. Pouco depois, voltou trazendo uma seringa com uma divisão bi-lateral no centro do tubo de armazenamento removível, constando em ambas as duas extremidades separadas, a mesma quantidade de um líquido vermelho, praticamente idêntico.

Desta vez, já estando armada, Rani veio caminhando na direção do Doutor com um sorriso perigoso no rosto.

—Vejamos: uma dessas é um sonífero barato. A outra é um estancador de processo regenerativo. –anunciou, sorrindo torto. Atrás dela, a TARDIS arregalou os olhos, pensando nas possibilidades. Percebendo a agitação da mulher ex-máquina-do-tempo, que já compreendera o que aquilo significava, Rani prosseguiu: -Eu deixo você escolher, Doutor—propôs, esperando uma reação da parte dele, mas o Senhor do Tempo permaneceu imóvel, contemplando-a cínico. –Daqui a pouco, eu irei aplicar uma das duas em você. Se escolher a extremidade com líquido certo, então pode seguir seu caminho que eu nem irei me importar. Juro que mentirei para o Mestre, dizendo que eu e você jamais nos encontramos nesse shopping. –prometeu, fingidamente, dando uma piscadela ousada para uma câmera de segurança. Em algum lugar daquele imenso shopping, o Mestre estaria assistindo tudo aquilo de camarote, e Rani queria se certificar de que seria bem recompensada quando tudo aquilo acabasse... Portanto, diverti-lo com idéias inusitadas, meio que fazia parte do pacote.  –Mas... Se escolher o recipiente errado, então estará em minhas mãos. Eu o esperarei perder a consciência, e o levarei para o Mestre, contra sua vontade. –e sorriu largo. –Como é? O que me diz?

Melissa, Luisa e a TARDIS voltaram-se para ele, com dificuldade, com seus olhares implorando para ele negar.

—Doutor, não faça isso! –Luisa suplicou. –Não vale a pena...

—E eu tenho escolha? –sondou o Doutor, fitando a cientista. –Ou terei de escolher de qualquer forma, mesmo não querendo?

Rani mordeu o lábio e saiu caminhando.

Você é tão esperto...—cantarolou provocativamente.

Ele se entreolhou rapidamente com a TARDIS. Ela sempre correspondia seus pensamentos.

Não erre” –ela instruiu-o psiquicamente, apenas intensificando um aceno de cabeça para ele, sem proferir som algum.  

Ele assentiu, bravamente. Era a melhor chance que tivera até então. Se escolhesse certo, seus problemas poderiam chegar ao fim antes mesmo do que esperava...

—Doutor, não escolha nenhum dos dois! –alertou Melissa. –Os líquidos dentro deles são perfeitamente iguais, como pode ter certeza de que ela não colocou sonífero nos dois?

Rani revirou os olhos.

Ah, por favor... Sou uma cientista, não uma psicopata!—resmungou.

Cientista maluca e psicopata insana não são duas coisas tão diferentes –insistiu Melissa. –Ambas iriam para num hospício, se dependesse de mim. –disse, sombria.

Rani contemplou-a com cara de zombaria.

Ah, pobre garota humana... Só está amarrada à meia hora e já começou a perder a sanidade. Que companheira mais tosca você arrumou desta vez, Doutor. Eu juro que preferia aquela bonitona de cabelo curtinho. –e abaixou-se novamente para falar com o Doutor olho no olho. –E então? –perguntou novamente, levando a seringa na altura de seus olhos. –Vai escolher ou não vai?

Às costas dela, Melissa começou a sentir a raiva tomar conta de si e, antes que qualquer um deles pudesse pensar em dizer alguma coisa, ela induziu a TARDIS a impulsionarem-se as duas contra a mulher, pegando-a desprevenida, agachada de uma forma francamente desfavorável, o que colaborou para fazê-la cair e bater a cabeça no chão. O baque a deixou inconsciente, o que colaborou para eles ganharem algum tempo e começarem a tentar se desamarrar.

—Mas que... –o Doutor gaguejou, olhando desconcertado para Rani. Então, inesperadamente, voltou-se para Melissa e abriu um imenso sorriso de orelha a orelha. –Boa pontaria!

Agradecida pelo elogio—Melissa fez um aceno de cabeça. –Agora vamos picar a mula antes que ela acorde, meu povo!

E puseram-se a cortar as cordas (graças a um estilete que Luisa portava em sua bolsinha) e depois, saíram correndo rapidinho dali.

—Ah! Esperem! Eu esqueci uma coisa! –a TARDIS brecou os pés de súbito e deu meia volta, deixando todos momentaneamente com caras de bobos. –Não podíamos ir embora sem isso... –voltou veloz, trazendo consigo a seringa, ainda intacta para usos futuros. –Agora sim. Vamos embora! –e pegou na mão do Doutor, puxando-o junto das duas garotas.

Correram em zigue zague durante um bom tempo por entre os corredores e andares, mas então, em uma esquina aleatória que viraram, Luisa ficou para trás, tentando recuperar o fôlego. Ela não se incomodou em gritar para que esperassem-na, pois sabia que a qualquer momento eles sentiriam sua falta e voltariam para buscá-la. Ofegante, ela encostou-se na parede mais próxima, procurando recompor-se. Porém, pegou-se contemplando a câmera de segurança por um instante, e uma idéia avassaladora lhe ocorreu.

—Meu Deus... Isso tudo é inútil—gemeu. –O Doutor tinha razão. Estamos mesmo brincando de gato e rato.

—Ali está ela! -dito e feito. Logo em seguida, seus três amigos refizeram o trajeto, correndo ao seu encontro. –Luisa... Por que ficou para trás? –perguntou Melissa.

Ele pode nos ver—Luisa disse, sem tirar os olhos da câmera. –Eu não sei como conseguiu acesso livre a todo o sistema de vigilância, mas conseguiu. –exasperou-se. –Você me entende, Méli? Independente de onde nos escondermos... O Mestre saberá onde nos achar.

—Bom, então talvez devamos fazer alguma coisa bem inteligente... –propôs o Doutor, afogado em seu cachecol colorido. -... Tipo cortar a energia—e sucessivamente, desconectou uma seqüência de fios de uma caixa de força próxima, deixando o shopping todo no breu.

—Ah! Fantástico! –Luisa aplaudiu. –Como é que não pensamos nisso antes?

A TARDIS apertou as mãos contra o peito, empolgada.

—É! Agora o mestre não pode mais nos ver... 

É. E nem nós a ele.—Melissa cortou o barato de todos. –Como vamos fazer? Não enxergo um palmo a minha frente!

—Bobagem. Todo mundo sabe que você nunca enxergou nada à frente do seu nariz, mesmo quando estava claro como o dia –comentou o Doutor, inocentemente, ganhando um tapa forte no braço, como recompensa. –Ai! Tá vendo! Melissa só reclama, mas quando se compromete a localizar meu braço no escuro, ela consegue perfeitamente o que quer!

Foi em meio aos seus manifestos, que alguma coisa roçou os pés de todos e agarrou-os, virando-os pendurados de cabeça para baixo. 

AAAH! SOCORRO!—gritaram com todo o fôlego que ainda tinham, até que uma coisa molenga e flexível tapou suas bocas, impedindo que continuassem.

A luz de uma lanterninha vagabunda acendeu contra seus rostos, cegando-os no escuro eminente, mas ajudando a revelar a criatura que os rendia: era um polvo gigante, cheio de sacolas e tranqueiras enroscadas em seus tentáculos desocupados.

—Façam silêncio! –bronqueou-os. –Será que não se pode mais assaltar um shopping na paz de Netuno?

O grupo se entreolhou. Luisa afastou o tentáculo gosmento de perto de sua boca.

—Deixe-nos em paz! Não está vendo que só estamos de passagem?

—Vocês não chamaram a polícia, ou chamaram? –o polvo perguntou, começando a suar. -Sabe como é que é. Não posso ser preso de novo... Depois da segunda vez, eles te mandam para o Abismo do Retorno, da qual ninguém jamais voltou.

Melissa revirou os olhos e mordeu o tentáculo que pressionava sua boca, mantendo-a fechada.

—AI! Sua pestinha! –praguejou o polvo, dando um safanão no Doutor.

EI! E essa injustiça rolando solta?!—o Doutor reclamou, massageando o nariz. –Foi ela que te mordeu, colega. Não eu!

—Desculpe meu camarada. Acaba-se fazendo confusão quando não se enxerga um palmo à frente do nariz.

A TARDIS cruzou os braços, de cabeça para baixo.

—Ora, seu infeliz! E porque não arranja logo um óculos?

—Boa pergunta. Na verdade esse é o principal motivo de eu estar aproveitando esse blecaute para fazer um pequeno arrastão matinal no Estrela Guia. –e mostrou-lhes as sacolas. –Eu acabei de assaltar as Óticas Orgilla. Eles tem as melhores lentes, mas infelizmente para um durango como eu, os piores preços.

—E você não poderia encontrar um lugar compatível com a quantidade de dinheiro que você possui? –sugeriu Luisa, com cara de obviedade.

—Dã! –Melissa incentivou.

—Bem, sim. Mas acho difícil encontrar algum lugar que possa me fornecer um óculos de graça. Sabe, não se tem muitas oportunidades quando se é um sem-teto no cosmos –ele disse, pensativo. –Bom, de qualquer forma... O papo está muito bom, mas eu preciso me mandar!

E já ia soltá-los, se não tivesse cismado com o cachecol, imensamente grande, colorido e tricotado, do Doutor.

—Ah! Isso até que ficaria bem em mim... Faz muito frio no Triangulo das Calças—ele comentou, puxando uma das pontas do cachecol.

Náá... Não se atreva!—reagiu o Doutor, segurando o cachecol contra o pescoço. –Ele não está disponível para ladrões. Por que não vai assaltar uma loja de cachecóis?

—Não me parece boa idéia. Roubar dá muito trabalho, e eu estou com uma preguiça que só vendo... –articulou, repuxando o bigode mal feito. -Por outro lado, o seu me parece do tamanho e espessura perfeitos. Muito diferente dos Cachecóis da Mamãe Espinhuda. Ela usa pelagem de ouriço do mar ao invés de linha... Pinica de dar raiva!

Nem me fale, amigo—Melissa repuxou o tecido de seu macacão, que já recomeçava a incomodá-la.

—Bom, então estamos decididos! Vou ficar com esse mesmo –e soltou todas as garotas de qualquer jeito no chão, concentrando-se apenas no Doutor, envolto por seus tentáculos. –Passe pra cá esse cachecol, que eu o deixo ir embora tranqüilamente, depois de levarem uma surra.

O Doutor fez cara feia.

—Isso não é legal, amigo! Não gosto de violência. Nada feito.

A criatura quase soltou fumaça pelas orelhas.

—Passe esse negócio pra cá, sua criatura alfabetizada e sociável! —grunhiu o polvo, perdendo a paciência e começando a chacoalhá-lo com força, na tentativa de desenrolar o cachecol.

—NÃO! DEIXE-O EM PAZ! –Luisa desesperou-se, junto às outras duas. Mas o polvo não parava. Forçou tanto a barra e nada do cachecol se desprender do seu dono. Na verdade, era tão comprido que parecia se enrolar cada vez mais, à medida que era puxado de qualquer jeito.

—Meninas! Uma ajudinha aqui seria muito boa... –o Doutor disse com um sorriso forçado no rosto, tentando manter o controle enquanto sentia o tecido apertar sua garganta. No chão, as meninas esforçavam-se para tentar escalar os tentáculos do polvo, mas a criatura exageradamente grande, atirava-as longe.

—Passe pra cá! –o polvo intensificou o aperto, já irritado. –Me dê logo isso!

—Meninas... Por favor! –gemeu o Senhor do Tempo, agora demonstrando um pouco mais de urgência na voz: Estava sendo enforcado pelo próprio cachecol!

Mais uma vez, Luisa foi atirada no chão. Caiu perto da TARDIS, mas logo se recompôs e, impulsivamente, já ia tornar a tentar escalá-lo de novo, quando a TARDIS segurou-a pelo braço.

—Não vá. Deixe o Doutor cuidar disso sozinho.

—Como!? Ele mal consegue se mexer! –protestou Luisa.

A TARDIS mordeu o lábio, olhando fixamente para algo acima da cabeça de Luisa. Preocupada com o significado daquilo, virou-se devagar para contemplá-los, e deparou-se com novas luzes douradas explodindo da face e mãos do Doutor. Novamente começara o ciclo de desregeneração. O terceiro rosto estava a caminho.

Assustado, o polvo ladrão libertou o Senhor do Tempo e fugiu, deixando-o ficar com o cachecol. Durante a fuga, deixou cair sua lanterna, e também derrubou de uma de suas sacolas, por descuido, uma capa preta com revestimento vermelho, que aterrissou sob o Doutor, de bruços no chão.

—Não... Não... Não... –as três correram até ele, com o coração na mão, mas pararam perto do corpo coberto pela capa, sem coragem de descobri-lo. Não sabiam se ele tivera tempo suficiente para se regenerar antes de despencar contra o chão. Tinham medo de que ele não tivesse resistido.

—Ele mudou de novo? Alguém viu? –Melissa fez a pergunta que não queria calar. As outras duas se entreolharam, ansiosas, depois voltaram-se para Melissa, roendo as unhas. Melissa apanhou a lanterna que estava caída no chão e suspirou: –Tudo bem. Eu vou checar... –e ergueu o tecido, o bastante para que conseguissem ver seu rosto. Ele estava mais velho agora. Tinha os cabelos brancos como flocos de neve, penteados num tipo de topete, só que bem maior que o habitual; o nariz era mais adunco, suas sobrancelhas eram completamente grisalhas, e as marcas faciais estavam mais destacadas do que nunca. Ele definitivamente envelhecera, mas Luisa sabia que ainda era o mesmo homem por dentro, independente da idade, ou do rosto que vestia. Ao menos isso ela já tinha aprendido ao passar muito tempo com ele. Uma das coisas que também aprendera era que, não importava o quanto à situação era delicada... Qualquer sinal que induzia esperança já era motivo para se dar um sorriso imenso e comemorar deveras. Por isso ela não se incomodou em expressar um enorme sorriso quando viu de relance, a testa do Doutor se franzir de leve.

—Ufa... Ele está bem –Luisa respirou fundo, caindo de joelhos ao lado dele, e pousando a mão sob suas costas, enquanto ele se recompunha aos poucos.

—Béssie! Onde está Béssie? –a 3ª encarnação do Doutor disse de repente, observando a extensão do corredor vazio. –Cadê aquele calhambeque maluco...? Como esperam que eu combata os Zygons sem um veículo seguro para escapadas não programadas? –então, finalmente percebendo que tinha companhia, olhou para Luisa ao seu lado, abriu um imenso sorriso e disse: -Olá Jô Grant! Faz tempo que não a vejo... Ei, você engordou dois quilos e meio desde a nossa ultima aventura juntos!

Luisa bufou com ar de riso, olhando para a TARDIS e Melissa.

—Quer que eu dê um cascudo nele por você? –Melissa se ofereceu.

—Não precisa. Eu ajudo o vovô a se levantar... –Luisa brincou, ajudando-o. O Doutor fitou-a intrigado.

—Você trouxe seu avô junto com você?

—Acho que ela estava falando de você—Melissa explicou com ar provocativo. –Bem vindo à terceira idade, “garotão alienígena”!

Terceira idade? Hã! Besteira... –ele empinou o nariz, cheio de si. –Eu corri ontem mesmo na São Silvestre. Não digo que sou o mais habilidoso dos jovens, mas pelo menos não sou um adolescente sedentário, como certos seres humanos.

—Espero que esteja se referindo a essa tal de Jô, porque, caso não tenha percebido ainda, ela é a única que não está aqui para se defender... –Melissa disse, ameaçando lhe dar uma palmada.

Cacilda! Eu tenho 510 anos e você me trata como se eu fosse um calouro da Academia dos Senhores do Tempo—ele resmungou, depois percebeu as vestes de Melissa e perguntou: -Por que diabos está vestindo isso? Parece uma prostituta de Vênus!

Como é que é!?—Melissa ficou boquiaberta e começou a avançar na direção dele. A TARDIS e Luisa correram para segurá-la. –Deixe eu dar um cascudo nesse sem noção! Só um vai...!?

Não Méli –Luisa colocou-a em seu lugar, obrigando-a a prestar atenção em suas palavras. –Escute. Nós precisamos protegê-lo a todo custo. Eu sei que ele pode estar pedindo por uns tapas de vez em quando, mas não cabe a nós ficarmos julgando-o. Lembra-se? Ele acabou de se desregenerar. Está confuso e assustado e precisa do nosso apoio pro que der e vier.

Melissa encolheu os ombros.

—Mas ele me tira do sério! E a vontade de dar um corretivo nele é quase incontrolável... Não sei se posso repelir isso para sempre.

—Não estou pedindo pra repelir. Apenas tente ser um pouco mais compreensiva, tá bom? –sugeriu Luisa, a favor da idéia.

—É. –a TARDIS apoiou. –Dê um tempo ao Doutor... Depois que tudo voltar ao normal, vocês poderão acertar suas diferenças de uma forma não violenta, eu espero.

—Ah... Tipo com palavras? –arriscou Melissa.

—É! Isso aí! –saltitou a mulher, animada. –E quem sabe, o Doutor mesmo vá ser um cavalheiro e lhe pedir desculpas primeiro... –sugeriu a TARDIS sorridente, voltando-se para um Doutor... Invisível.

Por alguns instantes, olhou toda a extensão do corredor, aturdida. Não havia sinal de Senhor do Tempo algum ali. Diante da atual revelação, Luisa arregalou os olhos, exasperada.

Deus do céu! Cadê ele? 

Ele estava aqui agorinha mesmo! —gemeu a TARDIS, incrédula, torcendo parte da blusa, nervosa. –Aonde terá ido? Será que ficou entediado? Ele costuma se isolar e procurar o que fazer quando se sente excluído de uma conversa...

—Bem, o que deu nele eu não sei, mas acho que posso supor para onde ele foi –anunciou Melissa, tomando a frente do grupo. Ela deu alguns passos e se agachou, apanhando alguma coisa e depois retornando para junto das outras duas. –Isso diz alguma coisa a vocês? –e mostrou-lhes o cachecol, que estivera jogado no chão. –Ele estava estendido bem ali na frente, o que sugere que o Senhor do Tempo tomou aquele caminho.

—Como também poderia tê-lo despejado ali de propósito, para depois tomar o caminho inverso –disse a TARDIS com os olhos bastante arregalados. As outras duas fitaram-na, impacientes. –O quê? O Doutor é indeciso. Temos que desconfiar de todas as possibilidades...

—Você não poderia só ler a mente dele e pular essa parte chata em que ficamos andando que nem barata tonta até encontrá-lo? –sugeriu Melissa.

—Eu já tentei. Mas ele está bloqueando os pensamentos... Costumava fazer isso quando era mais jovem. Tinha medo que eu tomasse conhecimento de algumas de suas falhas, ambições, medos e lembranças muito pessoais. Com o tempo, ele foi se soltando... Mas demorou até pegar total confiança em mim.

—Então voltamos à estaca zero. –resumiu Luisa, frustrada, para depois emergir com um sorriso encorajador. –Que tal se fizermos assim: Quem vota pelo caminho do cachecol? -Melissa e Luisa ergueram as mãos. –Quem vota pelo caminho oposto? –só a TARDIS levantou a mão. Luisa e Melissa sorriram. –Tudo bem então! Vamos pelo caminho do cachecol...

Percorreram um curto percurso, até que chegaram a um corredor sem saída. Ou melhor, que levava diretamente a uma loja única, sozinha, sem comércios vizinhos ou movimento próximo. Chamava-se “Orvalho da Tecelagem”, mas em geral, não parecia muito convidativa.

—Legal –bufou Melissa. –Não encontramos ele. Ótimo! Que tal voltarmos...

—Espera –Luisa segurou-a no lugar, de modo que a TARDIS também parou para ouvir o que ela tinha a dizer. –Sou eu ou esse lugar não tem algo de familiar?

As outras duas espremeram os olhos, intrigadas. A loja tinha aparência de abandonada. A pintura estava descascada e havia tecidos de cortinas esfiapadas esvoaçando por uma vidraça quebrada. Aquilo mais parecia um cenário de filme de terror, do que uma loja voltada para clientes de bom gosto. Inclinadas por pressentimentos de que aquilo não geraria coisas boas, Melissa e a TARDIS tentaram convencer Luisa de que não valeria a pena ir até lá, mas a garota parecia olhar diferente para o estabelecimento, quase como se estivesse emocionada em vê-lo. E, mesmo com a relutância da outras duas, ela insistiu em ir até lá. 

—Vamos meninas! Talvez quem trabalhe lá saiba algo sobre o paradeiro do Doutor. Quem sabe eles não o viram passar?

Melissa e a TARDIS se entreolharam, indecisas.

—Não sei não, Luisa. Isso está parecendo muito esquisito pra nós...

Luisa deu de ombros, decidida. 

—Tudo bem. Você não querem vir comigo... Azar de vocês, porque eu vou sozinha! –e saiu marchando, na direção da loja macabra.

Melissa entreolhou-se com a TARDIS e engoliu em seco.

—Ai... Nós não podemos deixá-la ir sozinha. –gemeu Melissa. –Vamos ter que ir também.

C-como? Lá dentro?—a TARDIS gaguejou. –N-não obrigada. Eu estou muito bem ficando por aqui mesmo... Ai! Não! Não! Não! Pára! NÃO!—Melissa empurrou-a a força, até a porta da loja. –Nããããõ! Me deixa!

—Prontinho. –sorriu Melissa, largando dela. A TARDIS olhou ao redor e gelou a perceber que já estavam dentro da loja.

—Ah... Não... –a TARDIS gemeu.

—Tudo bem. Você pode me xingar depois, se quiser. Mas agora vamos seguir em frente. Não quero perder Luisa de vista... –argumentou Melissa, puxando a TARDIS pelo braço.

—Ah... De novo não. –reclamou a TARDIS, vencida, cedendo aos puxões da adolescente. Mas isso foi só no início, pois depois a TARDIS foi tomando coragem e começou a caminhar sozinha. Passaram algum tempo em silêncio, só observando os enfeites da loja: nas paredes, havia espelhos quebrados, chifres e dentes de criaturas selvagens, um Dodô empalhado, além de coisas que elas nem sabiam compreender direito, como um relógio no formato de um coração gigantesco, que ao invés de fazer tic tac, batia naturalmente como se estivesse bombeando sangue para um corpo invisível; A única coisa mais evidente do que a decoração horrorosa, era o cheiro nauseante do incenso.

—Sabe da última? Você tinha razão—Melissa admitiu. –Esse lugar é bizarro. Devíamos ter esperado lá fora...

Ah... Se arrependimento matasse—a TARDIS suspirou. –Vamos em frente. Estamos quase chegando ao balcão...

Caminharam mais alguns passos, intrigadas com uma figura estirada adiante, no chão. Só depois de se encontrarem a uma distancia relativamente próxima, que Melissa arregalou os olhos.

—LUISA! –correu na direção da amiga, desmaiada próxima ao balcão. Tentou urgentemente reanimá-la.

—Hã...? –ela recobrou os sentidos e focalizou as duas amigas, meio zonza. –O que foi? Por que estão... me olhando assim? Eu fiz alguma besteira?

As outras duas suspiraram, aliviadas por ela estar bem.

—Graças a Deus você está viva –sorriu Melissa.

—Não estou entendendo... –Luisa franziu o cenho. -Nós achamos o Doutor?

—Não. Ele não está aqui. –assegurou a TARDIS. –Venha. Vamos embora. -e ajudaram-na a ficar em pé. Mas quando voltaram-se para a saída, ficaram perplexas ao verem coisas pontudas começarem a surgir das extremidades da porta, encaminhando-se para se encontrarem.

—O... O que é aquilo? –gemeu Melissa.

—Acho que são dentes... –a TARDIS adivinhou, quase paralisada de perplexidade. –Dentes saídos de todas as direções, ao redor de uma enorme... boca.

Uma boca? Mas não pode ser...—Luisa apertou os olhos: por mais estranho que pareça, tudo que conseguia enxergar ao seu redor era uma atraente e delicada lojinha de decorações, tão familiar quanto as do planeta Terra, que costumava freqüentar com sua mãe, quando era criança. Isso tudo era muito estranho... Estava certa de que se tratava de um local tranqüilo e seguro. Por que então suas amigas estariam com expressões tão aterrorizadas? Mesmo assim, não começaria a contestar sua percepção das coisas. Ela sabia o que estava vendo. E o que estava vendo, era real. Ela tinha certeza disso.

—Por que estão tão assustadas? Não há nada para se temer aqui...

—A pergunta talvez seja, porque você não está.—disse uma voz conhecida.

—Doutor? –Luisa sorriu, procurando-o. Logo ele entrou em seu campo de visão, parando bem na sua frente e começou a examiná-la. Curiosamente, ela o via como se fosse um fantasma; sua imagem tremeluzia e oscilava freqüentemente, mas ela podia senti-lo tocá-la. Checar seus pulsos e batimentos. Correndo contra o tempo por conta de alguma coisa que ela desfavoravelmente desconhecia...

—Luisa. Tem que me escutar: Você precisa ignorar seus sentidos! Precisa ignorá-los completamente. Renegue suas sensações. Imagine que tudo o que está vendo, ouvindo, sentindo não passe de hologramas... Escute! Isso é importante... Precisamos dar o fora daqui! O temo está acabando... Por isso eu lhe peço que se concentre, e renegue sua percepção das coisas agora mesmo! –ele instruiu.

—Mas por quê? Por quê? –ela indagou, contrariada.

O Doutor respirou fundo.

Porque não é real. Nada aqui é real.  

Aquilo foi como um balde de água fria. Era quase como se tudo aquilo fosse uma charada e o Doutor houvesse acabado de lhe soprar a única forma de resolvê-la corretamente. “Só conseguiria cair na real, e contemplar a verdadeira situação que os envolvia, quando começasse a desconfiar de seus sentidos, e passasse a renegar sua própria interpretação da coisa toda”. Muito poética, a resposta veio de encontro a ela como uma brisa. Mas é claro que falar era mais fácil do que fazer. Duvidar de si mesma era, com certeza, a parte mais difícil de tudo aquilo. Por fim, fechou os olhos com o seguinte pensamento em mente: “Isso que vejo não é real. Quero ver a verdadeira face que se esconde atrás de um véu de mentiras”. Repetiu isso algumas vezes para si mesma, então, balançou a cabeça por um momento, contestando completamente a versão que seus olhos lhe mostravam. Quando tornou a abri-los, desta vez, assustou-se com o resultado.

O papel de parede estava rasgado, o chão estava imundo e empoeirado, havia tecidos corroídos, espelhos quebrados e um enorme coração, que pulsava, cada vez com mais fervor. E, logo adiante, uma porta com coisinhas afiadas saindo dos batentes, como dentes selando a abertura de uma bocarra horrenda.

Apesar de o desenrolar de tudo aquilo parecer estar ocorrendo em câmera lenta, aconteceu mais ou menos dentro de uma pequena fração de segundos. Da qual o Doutor esperou passar, pacientemente, e logo depois, ao perceber que Luisa já se via fora do “delírio”, segurou em sua mão, e puxou as garotas para fora daquele lugar horripilante, antes que a passagem finalmente se fechasse.

Novamente tudo pareceu correr em câmera lenta. Progressivamente, Luisa ouviu a TARDIS gritar:

NÃO VAI DAR TEMPO! ELA ESTÁ QUASE SE FECHANDO!

E sucessivamente, o Doutor respondeu:

—CONTINUEM! NÃO DESISTAM! ESTAMOS QUASE LÁ... –e olhou de súbito para trás, fazendo uma careta espantada ao contemplar o chão, as paredes e tudo mais, ganharem relevo e transformarem-se em algo parecido com as entranhas de uma criatura gigantesca. –Puxa vida... Pelas barbas de Merlin, isso é incrível!

Está se fechando! —o grito desesperado de Melissa despertou-o do congelamento momentâneo e o fez retomar a correria, junto delas.

—CORRAM! –gritou agitando os braços para elas apertarem o passo. Tudo ia desfazendo-se atrás deles. A única saída era enfrentar a bocarra da criatura, logo à frente. Mesmo amedrontados, nenhum deles freou os pés em cima da hora, e graças aos céus todos conseguiram atravessar a saída, surgindo do outro lado, de volta ao corredor do Estrela Guia. Até mesmo o Doutor, que foi o último a sair, e que sucessivamente, tirou uma fina da fileira de dentes afiados como lâminas, não perdeu muito mais do que alguns poucos fios de cabelos laterais, e uma tira de sua capa, que pegou de raspão. –AH! Minha capa adorada! Vou ensinar você a nunca mais danificar as vestes das pessoas... Tome isto! E isto!—como se não bastasse ter escapado com vida, ainda ameaçou dar alguns golpes de Aikido Venuziano (uma das habilidades do 3º rosto do Doutor) no bicho macabro, dono da bocarra assustadoramente gigantesca, só para dispersar sua adrenaliana. Entediada com as investidas do Senhor do Tempo, a criatura deu um rugido de gelar a espinha e o Doutor correu para longe dela, feito diabo fugindo da cruz. –Até maaais!

Por fim, lá estava a equipe TARDIS: todos ofegantes, cansados, suando frio. Mas ao menos, ainda estavam vivos. E isso fazia toda a diferença.

Exaustos, viraram-se para contemplar a fachada da loja resmungar: Era na verdade, uma grande besta disfarçada de estabelecimento, esperando que algum pobre coitado adentrasse nela, iludido, e acabasse virando um lanche-expresso.

—Tá todo mundo bem? –perguntou o Doutor, deitado no chão, fitando as amigas de cabeça para baixo.

—Estamos. –a TARDIS respondeu por todas. –Relativamente abaladas, devo acrescentar. 75% de chances de não dormirmos a noite... Mas em geral, afora os traumas psíquicos e o manifesto pânico eminente... Acho que vamos sobreviver.

O Doutor grisalho sorriu, mostrando os polegares para elas.

—Excelente!

—Sério... Eles deviam fechar esse lugar e impedir os consumidores de freqüentarem um comércio desses. Se eu fosse fiscal, juro que multaria essa coisa e a proibiria de continuar enganando gente inocente!

Ofendida, a besta, que já retomara novamente o formato de loja comercial, ergueu o capacho de entrada, feito uma língua comprida e mostrou-a para Melissa, dando ar de pouco caso.

Ah é assim?!—Melissa indignou-se. –Vai continuar tirando uma com a nossa cara? Olha, que eu juro que vou fazer uma reclamação aos organizadores desse lugar... Não vá reclamar depois!

A criatura bufou, contrariada, mas parou de se meter com eles. Após o período de susto se dissipar, o Doutor foi ver como Luisa estava.

—Diz de novo porque eu vi aquelas coisas quando ninguém mais viu –pediu ela, enquanto ele a examinava novamente.

—Isso é uma Besta Oclahona. Elas são famosas por se camuflar e persuadir suas presas a entrarem dentro de si, atraídas por uma visão de algo agradável. É parecido com a casa de doces de João e Maria. Só que tem um porém: ela atrai só um determinado biotipo. Algumas pessoas são mais suscetíveis do que outras para que as sementes “psíquico-delirante” façam efeito e as atraiam, como à uma armadilha perfeitamente executada. Em geral, a grande maioria irá vê-lo como realmente é: uma coisa horrível e nada convidativa. Você, obviamente, tem a genética certa para o delírio agir.

—E isso significa que sou o quê?

—Como assim?

—Você disse que só uma minoria consegue enxergá-la de uma forma delirante... Isso faz de mim o quê? Uma azarada?

O Doutor parou para refletir por um instante. Luisa não sabia se ele tinha aquela resposta. Na verdade, não fazia idéia se aquele silêncio significava que estava procurando as palavras certas para usar, ou que não tinha resposta, ou que não queria dar a resposta, ou que tinha a resposta, mas estava tentando tornar aquilo um pouco menos impactante para ela. O fato é que os silêncios do Doutor raramente eram sinônimos de coisas boas... E Luisa não gostou muito da prolongação dele.

—Vou tentar de novo –Luisa recomeçou, vendo que daquele mato não saía cachorro. –Você disse que existem pessoas propensas ao delírio, mas que a maioria não é. Não devia ser o contrário? Porque, desta forma, a Besta Oclahona passaria muito mais fome, esperando que um iludido apareça... Especialmente se as probabilidades forem tipo: três em um milhão.

Essa pergunta o Doutor respondeu.

—A Besta Oclahona não precisa se alimentar sempre. O coração de um delirante íntegro é consumido por séculos e a mantém viva por muito tempo. –o Doutor parou por um instante, como se estivesse decidindo se devesse continuar ou não, mas acabou levando em consideração a curiosidade de Luisa, e terminou dizendo tudo o que sabia: -São poderosos, sabe? Os mais sucessíveis ao delírio... Ninguém sabe o tamanho do poder que eles carregam consigo. Às vezes, nem eles mesmos...

Luisa ficou pensando naquilo. Não fazia nenhum sentido, ainda por cima com o Doutor fazendo todo aquele ministério para lhe contar... Poder de quê? Em que sentido? No que se referia? Luisa estava cheia de perguntas. Queria muito revelar todas elas ao Doutor, mas Melissa e a TARDIS se aproximaram, e rapidamente o assunto se perdeu.

—E vocês duas? –ele sondou. –Nenhuma seqüela, certo?

—Ai! –gemeu Melissa, massageando o braço.

—O que foi Melissa? –o Doutor se prontificou, preocupado.

—Minha mão tá coçando demais... –ela disse, teatralmente.

—Puxa vida... Quer que eu dê uma olhada? –o Doutor se ofereceu.

Naquele exato momento, Melissa mudou de investida.

—Precisa não –se desfez. –Deixe que eu mesma conserto! –e deu-lhe um tapão no braço.

AI!—foi à vez do Doutor gemer, só que de verdade. –QUE DIABOS MELISSA! ESTÁ LATEJANDO!

É pra latejar. –ela sorriu, satisfeita. –Minha mão só se acalma depois que eu resolvo todas as coisas pendentes...

O Doutor fez um bico.

—Qual é!? Ainda está brava por causa do que eu falei mais cedo...? Eu só estava brincando com você!

Melissa inflou as bochechas, inflamada.

—Ah, é? Foi só uma brincadeirinha, né? Pois eu NÃO ACHEI GRAÇA NENHUMA! Eu dei risada por acaso? Eu não dei risada! Sua mãe nunca te ensinou que a brincadeira só está valendo quando todo mundo se diverte?

O Doutor empinou o nariz, convencido.

—Eu puxei o senso de humor da minha mãe. –disse, pomposo. –E não me venha com sermões, porque a senhorita também vive tirando barato da minha cara, sem que eu esteja me divertindo! Hã... Quer dizer que quando se trata de mim, a zoeira é liberada, mas quando se trata de você, temos sempre que dar um nó na língua?

Melissa trincou os dentes.

—Ah! Tomara que você morda a sua língua! –praguejou. 

Idem. –ele disse, mostrando a língua pra ela.

Ah! Mais vou te mostrar uma coisa...—e tentou novamente acertá-lo, mas Luisa e a TARDIS seguraram-na no momento certo.

—Calma Méli... Não vale a pena brigar. Pense bem no que eu te disse mais cedo. Nós devemos proteger o Doutor. Se ficarmos todos juntos, vai acabar tudo bem. Não podemos é criar desavenças numa hora dessas... –lembrou Luisa.

Melissa considerou o argumento da amiga.

—Tudo bem. Mas esteja avisado que eu só não continuo lavando a roupa suja por respeito à Luisa—disse, ameaçando o Doutor com seu dedo indicador.

—Sem problemas. Depois eu te empresto a minha máquina de lavar. –o Doutor disse, brincalhão. –Olha que ela lava que é uma beleza... Só não vá dar mancada e colocar roupas vermelhas com brancas. A última vez que fiz isso, tive que usar pijama cor de rosa por uma semana.

As garotas não se agüentaram e caíram na gargalhada. Inclusive Melissa, que relaxou e retomou seu equilíbrio interno.

—Opa. Espera aí... –Luisa chamou a atenção de todos. -Já que estávamos falando de hoje mais cedo... Diz uma coisa, Doutor: quando você sumiu, sinceramente, o que você foi fazer?  

—Ué? Fui procurar a Bessie! –ele disse, como se fosse óbvio. As garotas seguraram o riso.

E encontrou? —a TARDIS fez o favor de prosseguir.

—Não. Eu tinha certeza que havia estacionado na frente do caminhão de sorvete... Mas quando eu cheguei no andar principal do shopping, encontrei mais de vinte barraquinhas de sorvete e desisti de procurar.

—E aí você nos encontrou –Luisa completou, ainda com ar de riso. –Então você não veio por aqui, certo? Ou passou por aqui antes de nós? Sinceramente, Doutor... Por qual caminho você veio?

—Bem... Eu derrubei o meu cachecol num dos caminhos e sai pelo lado oposto do corredor. É uma antiga tática para confundir o inimigo.

Melissa sorriu torto.

—É. E para confundir as companheiras também.

A TARDIS olhou com uma cara de “espertinha” para Luisa e Melissa.

Eu avisei!—ela riu, vitoriosa. –Quando se trata do Doutor, sempre pense no mais importável. Pois é. Ele faz isso.

Todos se entreolharam por um instante e recomeçaram a rir uns dos outros.


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Notas finais do capítulo

E aí? Curtiram a dona Rani "maniaca dos experimentos"? Cuidado com ela, hein Doc! Essa mulher é o perigo encarnado!! kkkk


Até quintaa meu povo!!



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