Luisa Parkinson: A Companheira Fantástica escrita por Gizelle PG


Capítulo 41
Presente de Grego


Notas iniciais do capítulo

Hello! You Fool I Love You!

:D

"Os Sontarans vibram por uma batalha, e não é nada fácil convencê-los a desistir. Eles tem seu exército particular de Clones, porém, o Doutor também arranjou importantes aliados... Seu plano, contudo, envolve uma abordagem diferente da que os Sontarans esperam. Resta saber se irá funcionar."



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—Isso aí é o nosso transporte?

—Minha nave é uma TARDIS tipo 40. A melhor de todo o universo! Não se preocupe: Chegaremos na Índia ainda á tempo de ajudá-los...

—E vamos até a Índia combater o inimigo dentro de uma... Caixa?

O Doutor amarrou a cara para o centurião Victórion, ao seu lado.

—O que esperava: uma limusine de luxo? Não é um “carro esporte”, mas ter uma TARDIS tem suas vantagens...

O rapaz preparava sua nave para a partida. Precisaria aumentar muito mais sua potência na decolagem, já que voltaria para a Índia com uma carga um pouco mais pesada... Talvez uns dez mil centuriões seriam o bastante. Sim, o Doutor conseguira convencê-los. Usou todas as abordagens possíveis, destacou todos os pontos importantes, colocou todas as provas em evidencia e tagarelou muito. Acabou se surpreendendo com o bom resultado que aquilo tudo gerou. Não esperava que o plano não desse certo, mas acreditara que ficaria uma hora e meia apenas para conseguir convencê-los de que ele não era mais um médium doido do hiper-espaço... No fim das contas, acabou subestimando-os. Teve sua audiência com a rainha Nefertiti e com os demais presentes. Depois de serem convencidos de que tudo fora apenas um mal entendido, acabaram entrando em um acordo. O centurião Victórion fora encarregado de acompanhar o Doutor até sua nave, para colocarem os últimos detalhes do plano em evidencia.

O problema em destaque era o tamanho da nave, que não suportaria o peso de tantos soldados Gregipciomanos. Ou, ao menos era isso que Victórion pensava...

—Pelo elmo de Hades! –guinchou ele espantado, quando o Doutor abriu a porta da caixa, convidando-o a entrar e conferir, ele mesmo, o tamanho da nave. –Mais isso é impossível! É... –ele voltou-se para o Doutor de um modo brusco, seus olhos brilhavam como duas safiras. –É a Pandorica! A Caixa de Pandora... Sempre soubemos que ela não estava perdida para sempre nos desertos espartanos!

—Bem, não é exatamente uma coisa mística. A TARDIS é na verdade uma nave de deslocação pelo tempo e espaço, também é uma maquina do tempo formidável... –ele disse, passando o braço ao redor do pescoço do centurião, ainda em choque. -Ah! Está vendo aquele telefone atrás da porta?

—Estou! Estou sim! –o homem se prontificou, encantado.

—Ele não funciona. –disse o Doutor animado, dando-lhe as costas, deixando o centurião confuso consigo mesmo, e dirigiu-se as portas, fechando-as. –Muito bem... Agora vamos ao que interessa!

—Sim. Acho que devemos mesmo decidir qual será a abordagem que iniciará nosso ataque.

O Doutor juntou-se novamente ao homem, que o fitou cheio de expectativas.

—Você por acaso não tem um cavalo, tem?

—Ora, e para que precisaria de um? –o homem riu. –Você tem dez mil homens!

—Conhece a história do cavalo de tróia, Victórion? –indagou o Doutor, encostando-se no painel de controles, cruzando os pés e as mãos.

O homem assentiu.

—Precisamente. Os gregos e os troianos estavam em guerra pelas terras. Então um dia os gregos resolveram traçar um plano infalível: construíram uma estrutura em formato de cavalo e esconderam-se dentro dela, para surpreender os troianos. Mais tarde, outros gregos levaram-na até os troianos, alegando que o cavalo era um presente de paz deles para seu povo. Os troianos ficaram muito contentes com a iniciativa dos gregos e deram uma festa. No meio da noite, os gregos dentro do cavalo atacaram tróia enquanto esta ainda dormia. Os troianos não tiveram chance.

—Exato. O famoso “presente de grego”. –completou o Doutor. –Diga-me Victórion, você conseguiria nos imaginar executando uma estratégia como a dos gregos perante aos troianos?

—Acho que sim. Colocando acima de tudo o fato de termos essa sua nave... Enorme por dentro!

—Sim! –o Doutor aproximou-se dele novamente, os braços ainda cruzados. –O que você me diria se utilizássemos a mesma idéia, mas sob outras circunstâncias. Digo, não teríamos precisamente um cavalo de madeira onde os guerreiros pudessem se esconder embaixo e esperar até à hora certa para atacar... Mas nós temos algo melhor que isso, em muitos critérios: Temos a minha nave. –ele saltitou empolgado. –Veja: Pequena por fora, mas grande por dentro! Um esconderijo perfeito para um batalhão de soldados, sem o problema da falta de espaço, e além do mais, minha nave passaria muito mais despercebida no meio das terras do inimigo, do que um cavalo de madeira!

—Até que faz sentido. –o homem admitiu averiguando as circunstâncias. –Poderíamos mesmo nos esconder aqui dentro, aguardando ordens... Me parece um bom plano.

—Sim, sim, é claro! Mas não se esqueça da parte principal: Não estou contratando vocês para acabarem com a raça do povo Sontaran. Só quero assustá-los. Deixá-los crentes de que a batalha foi perdida... Quem sabe assim eles vão embora daqui e desistem de uma vez por todas dessa idéia absurda “de se espalhar por todo o universo e conquistá-lo para si”.

—Então nós faremos apenas uma encenação?

—Basicamente... Sim. É isso. Não quero mais mortes ocorrendo de modo banal. Nem do nosso lado, nem do deles...

—Mas Doutor... E se eles se recusarem á partir?

O Doutor fitou o homem por cima do ombro, uma expressão determinada no rosto.

—Então eles terão que me enfrentar.

 

*   *   *

—Você disse que sabia o que estava fazendo! –grunhiu Luisa para a melhor amiga. –Méli... Eles vão nos pegar! Não faça isso!

Ela arrancou a arma Sontaran da mão de Melissa.

—Qual é Lu? É nossa única chance... Como acha que vamos nos defender desses brutamontes se não estivermos preparadas?

—Pra começo de conversa, não precisaríamos ficar “preparadas” se estivéssemos apenas de sentinela, como o Doutor pediu...

—E desde quando eu faço o que aquele alien metido á besta diz?

—É por isso que sempre acabamos encrencadas... –admitiu Luisa.

—Não –a amiga estendeu-lhe uma arma de três bocas. –É por isso que sempre estamos um passo á frente dele. Você não percebe? Nós poderíamos ser descobertas a qualquer momento, encolhidas ao lado daquele muro... Mas agora, ao menos teremos uma chance!

—Chance de quê? De suplicar para que eles não nos matem? Caso tenha se esquecido, não sabemos ao menos empunhar uma arma na mão!

—Tá aí a magia do cinema: você olha com uma cara de psicopata para o inimigo e sai correndo na direção dele, deixando-o apavorado demais com sua reação, para poder fazer qualquer coisa...

—Certo. Mas isso tratando-se de humanos. Como podemos ter certeza de que funcionará igualmente para os Sontarans?

—A resposta para a sua pergunta só chegará ao nosso conhecimento na prática...

Luisa engoliu em seco.

—Espero que minha pergunta não precise ser respondida, então.

—Meninas! Tchalô! Vamos! –Nyha estava dando cobertura.

—A barra está limpa? –perguntou Melissa.

—Ainda á pouco havia três deles pelas redondezas. Agora se foram. Precisamos voltar imediatamente...

—Vamos logo! –apreçou-as Nik. –Já estamos andando á horas e eu estou começando a ficar com fome...

—Primeiro nós lutamos Nik, depois nós comenos. –alertou sua dona.

—Nyha está certo Méli! –concordou Luisa. -Nem deveríamos estar aqui, para começo de conversa...

—Tudo bem! Vamos embora...

Nahin! Nahin! Não é seguro! –Nyha se precipitou para junto delas, mas foi detido antes.

Um Sontaran o segurava pela gola da camisa e levantava-o do chão.

—Ponha-o no chão, seu armário ambulante de terceira categoria! —gritou Melissa, apontando-lhe a arma. O Sontaran sorriu, como se aquilo o divertisse.

Não! Eu vou entregá-los para o comandante. Ele sabe bem o que fazer com bisbilhoteiros... Ah!

De repente, sem mais nem menos, ele cambaleou para frente e perdeu totalmente o equilíbrio, caindo de bruços. Soltou o menino antes da queda, de modo que este conseguiu escapar ileso.

Nyha correu para junto das meninas e lá ficaram, olhando paralisados para uma sombra que vinha se aproximando por trás do Sontaran caído ao chão. Conforme foi se aproximando, a sombra foi se tornando menor, até adquirir a forma de um humano de estatura média: Quase não couberam em si quando descobriram se tratar de Chanty. A menina sorriu amplamente para eles e caminhou em sua direção.

Por Deus, Chanty!

—Pensamos que não fosse voltar... 

—Pois pensaram errado! –ela sorriu. –Aqui na Índia temos um ditado: Mexeu com um de nós, mexeu com todos nós. Isso porque somos muito ligados á família. Se alguém levantar a mão para um, todos os outros se doem em nome dele, o que torna o enfrentamento muito mais complicado...

—Vou me lembrar disso quando me meter em encrenca, lá em casa... –brincou Melissa. –Vamos fundar um clube de veteranos quando voltarmos. Assim, quando um precisar de ajuda, é só gritar um código ou uma senha para que qualquer um dos outros membros se manifeste para ajudá-lo... Isso me livraria de uns bons cascudos, de vez enquanto.

Luisa riu do novo plano da amiga.

—Boa idéia, mais primeiro precisamos ir em frente com o plano do Doutor e ganhar essa batalha...

—Então vamos! –todos cruzaram o caminho, esquivando-se do Sontaran caído no chão. Porém, quando Nyha foi passar por último, Chanty se deteve em sua frente, impedindo sua passagem.

—O que foi? –ele experimentou perguntar.

—Nada –a menina sorriu, então estendeu-lhe a mão. –Eu só queria me desculpar. E pedir para que aperte minha mão em sinal de amizade. Espero que esse ato nos aproxime cada vez mais, daqui para frente.

O menino sorriu, um sorriso que mal cabia e seu rosto. Ele não podia acreditar no que estava ouvindo...

—Você falou comigo? –ele se surpreendeu.

Ela riu, mas manteve a mão no mesmo lugar, firme na decisão que tomava.

—Eu percebi que o que o Doutor dizia era verdade. Felizmente, ainda bem á tempo!

—É! –ele sorriu, hesitando num primeiro momento, mas depois apertou sua mão e ela retribuiu o aperto, muito forte.

—Agora somos amigos –ela afirmou. –Você e eu.

—Amigos? –ele sorriu, piscando os olhos uma centena de vezes para ter certeza de que aquela cena era mesmo real.

Atchá! Claro! –ela fitou-o. –Dou minha palavra! Não serei mais á favor das castas... Daqui pra frente, vamos fazer o possível para combater essa regra estúpida juntos, Tiki he?

Tiki he! Okay! —ele animou-se. Então, assim do nada, Chanty fitou algo nele com extrema atenção, deixando os olhos demorarem-se na marca de nascença em seu pescoço.

—Você tem a marca da lua invertida... –ela arregalou os olhos, reconhecendo o símbolo.

Tiki. Tenho. –ele fitou-a, intrigado. –Isso é importante?

Ela mudou de expressão rapidamente, disfarçando.

Nahin, não. –sorriu. –Não se pegue com isso. Dja Dja! Vá logo! –ela insistiu. –Precisa voltar ao seu posto com as outras...

 -E quanto á você?

 -Não devo me demorar por aqui. Saí de casa enquanto meu baldi dormia. Ele não deve demorar a acordar agora...

—Mas você tem que ficar Chanty! Por favor! Você não disse que iria lutar do meu lado? Então! Essa é a chance...

Chanty pareceu parar para pensar. Seus olhos se tornaram opacos e, por um só minuto, Nyha pensou que ela estivesse desconsiderando a promessa que fez, mas fora só impressão.

—Está bem! Tchalô! Tchalô! Vamos! Teremos muito o que fazer então...

E os dois passaram correndo de mãos dadas, para junto das meninas e de Nik, que esperavam-nos se acertarem perto dali.

 Pouco tempo depois, já com o quinteto posicionado novamente na vigia, o plano se seguiu. Luisa sentiu uma brisa gélida ás suas costas e sorriu: sabia exatamente o que aquilo significava.

—A TARDIS! Vejam! É a TARDIS! –Luisa chamou os outros. –Ele conseguiu!

O amigo saiu da caixa, assim que ela se materializou por completo.

—Oi... –ele sorriu tímido.

—Oi! –ela se atirou em seus braços, fazendo-o expandir as marcas de riso. –Deu tudo certo lá? Fizeram alguma coisa à você? Você está suando frio... –ela beijou sua testa, preocupada.

—Estou bem. –ele olhou a paisagem por cima da cabeça dela. –Acho que estou um pouco nervoso. Só isso...

—Bem, então vamos acabar logo com isso! –a voz de Chanty irrompeu por entre eles e o Doutor espichou a cabeça até conseguir encontrá-la.

—Chanty! -comemorou. –Eu sabia que não iria nos decepcionar... –ele a abraçou. –É isso que eu chamo de equipe surpreendente!

—Então... “Hospício Man” Qual o próximo passo? –indagou Melissa, fazendo-lhe um breve aceno de cabeça.

—Já temos todas as cartas na manga: temos vigilantes, temos informantes que estão integrados na facção, temos um exercito inteiro para contra-atacar, a nave mais poderosa do universo e, por ultimo, temos a mim e ás minhas fantásticas habilidades de dedução...

Exibicionistas são permitidos só de terças e quintas, no Museu de arte Natural. –brincou Melissa. –Onde você deveria estar empalhado á uma hora dessas, vovô Matusalém!

—Engraçadinha. –o Doutor revirou os olhos, cruzando também os braços, mas não se pegou muito ás brincadeiras irônicas de Melissa. –Precisamos começar chamando a atenção dos Sontarans de alguma forma... Essa foi a única parte do plano que ainda não pensei.

—E o que acha que faríamos, dançar o Mantra?—cutucou-o Melissa novamente. –Não podemos simplesmente improvisar qualquer coisa?

Luisa ficou muito quieta, seu cérebro pareceu ter feito as conexões certas quando Melissa proferiu a ultima frase... Era aquilo. Tinha que ser...

—É isso mesmo... –ela tocou o braço do amigo de leve. –Precisamos surpreendê-los, não é? Eles são aliens... Devem estar acostumados mesmo com um ataque bem organizado, vindo da retaguarda... Precisamos de algo novo...

—Posso estar errada, mas acho que entendi que Luisa está pensando em chegarmos dançando na hora da batalha...? –arriscou Chanty.

—Como? Isso é inadmissível! –o Doutor repreendeu-as. –É loucura! É inapropriado! Improvável! Impossível e... Uh!

Sacou?—Melissa instigou-o.

—Saquei... –ele sorriu amplo. –É tão fora do comum que pode dar certo!

—Bom plano! –comemorou Nyha.

—O melhor de todos! –concordou Nik.

—Tudo bem pessoal, é agora ou nunca... –o Doutor se inclinou, fazendo todos imitarem-no em uma roda. –É hora do presente de grego, e como já induz o próprio nome: Ele tem que ser lendário!

 

*   *   *

Dentro do campo de batalha, estavam centenas de soldados Sontarans, sem os capacetes, com suas caras de batatas zangadas, sempre ligadas no movimento ao redor. Fizeram seu ultimo disparo sonoro contra o planeta Júpiter, indignados por esses não terem tomado nenhuma providencia de guerra até agora... A tensão se intensificou quando tudo continuou do mesmo jeito que estava e nenhuma nave de guerra foi avistada cruzando os céus, rumo ao planeta indiano.

Foi em meio ao alvoroço provocado pelo silêncio de nenhum alvoroço, que o Doutor e seus amigos se puseram a agir. Primeiro soltaram a música indiana *Sajna V Sajna por um auto-falante tamanho família, que Nyha arrumou, carregando até lá com a ajuda de uma porção de Oods. Ele e Nik ligaram o aparelho. Em seguida, entraram Chanty, Luisa e Melissa na dança, com seus Sares coloridos. As duas últimas copiando os passos que a primeira fazia. Ás costas delas, a TARDIS era empurrada pelo Doutor e Victórion, trazida ao meio de campo. Enquanto os soldados Sontarans se inquietavam, ameaçando-as com armas e tudo o mais, eis que elas foram abrindo caminho para os dois rapazes que vinham caminhando lentamente logo atrás (desde o lugar para onde rebocaram a TARDIS, até a direção dos rivais). Por um momento tudo ficou quieto.

Que significa esse circo todo?—exigiu saber um dos Sontarans.

—Absolutamente nada. –o Doutor sorriu sem mostrar os dentes. –Só vim conversar.

Não temos nada para conversar!

—Ah, não temos? Bom, engraçado você dizer isso... –ele entrelaçou os braços atrás do corpo e deu mais alguns passos á frente. –Porque esse planeta já é habitado e, de acordo com a lei 574 do código penal da Proclamação das sombras, vocês estão invadindo território privado...

Ah! Um expert no assunto! —zombou o Sontaran para os companheiros. –E o que tem a nos oferecer? Aulas de julgamento?

—Não, vou deixar que os Jooduns cuidem dessa parte.

O sorriso zombeteiro do Sontaran que falava, desapareceu. A situação pareceu alcançar proporções ainda mais preocupantes. 

O que vocês querem?—exigiu saber.

—Só o óbvio. Que vocês partam e nunca mais voltem a por os pés neste planeta. Em nenhum outro que já seja habitado, para ser exato. Se quer criar uma civilização na paz de Deus, encontre seu próprio planeta...

Nosso planeta se foi. Queimou com as altas proporções da Guerra do Tempo. —ele falou e o Doutor sentiu-se bombardeado por suas palavras: Então a Guerra do Tempo também havia acontecido naquela realidade?

Como se tivesse lido sua mente, o Sontaran prosseguiu:

A Guerra do Tempo devastou mundos, realidades inteiras, galáxias e universos longínquos... Muitos não sobreviveram a ela... Nós não tivemos escolha!

—Sempre há a possibilidade de se fazer uma escolha! –o Doutor rebateu, e o Sontaran não gostou nada disso. –E se pensa que vou ficar sentado vendo você colocar essa civilização a baixo por puro capricho, então está muito enganado...

O Sontaran enrijeceu, dando um passo à frente na direção do Doutor. Luisa apertou o braço da amiga, ao longe, quando ele o fez.

E o que você vai fazer sobre isso? Nos expulsar? Humano insignificante!

—Está errado de novo –o Doutor acrescentou. –Eu não sou humano. Sou como vocês. Digo, não exatamente. Meu planeta já não existe mais e eu fui sim, acolhido pelo planeta dos humanos...

O Sontaran viu a oportunidade de virar o jogo, exatamente como o Doutor previra.

Então você nos entende... Sabe o quanto precisamos deste lugar!

—É. Eu sei, mas não é da mesma forma que eu preciso deste lugar. –ele interveio. –Quando estive sem casa, os humanos me acolheram... Já vocês querem re-popular o planeta inteiro com clones seus, extinguindo uma raça inteira, apenas para recriar outra... Isso é errado e eu não aprovo.

O Sontaran inflou as narinas, irritado.

Então morrerá por sua não aprovação!

Todos os soldados deram um passo à diante, formando as tropas, todas atrás do porta-voz. O Doutor nem piscou.

—Tá achando que vai me impressionar com isso tudo? Hã! Por favor... Me poupe!

Eu tenho soldados com quem contar, e o que você tem?

—Tenho fé! Esperança; Determinação; Criatividade; Um joanete no pé esquerdo, quem sabe? –ele tagarelou. –Eu falei de mais? É... Eu faço isso. Sabe, comandante sei lá das quantas, eu tenho amigos maravilhosos... –ele disse e toda a sua equipe se entreolhou, orgulhosa. -Mas tem uma coisa que só eu tenho, e que é o melhor de tudo...

E o que é?

A minha boca grande—ele estalou os dedos e as portas da TARDIS se abriram á suas costas, revelando centenas de soldados Gregipciomanos, marchando também em sua direção, parando atrás de seu representante. –E enquanto eu falo, falo, e falo... Alguém sempre está agindo por trás, á meu pedido, ajudando a impedir gente como vocês de fazerem coisas terríveis, como a que estão prestes a fazer –ele falou, com um brilho feroz nos olhos. –Por isso, em hipótese alguma... Se você ama sua vida... Nunca, mais nunca... Me Subestime!

Quando ele disse a ultima palavra, o batalhão de centuriões equipados com lanças, elmos e escudos tomou a dianteira, de modo que ficaram uma tropa de frente para a outra, encarando-se. O comandante da frota Sontar, porém, não se intimidou.

Quantos são? Acha que poderão nos destruir com alguns poucos humanos?

—Não pretendo destruí-los. Pelo contrário... Amedrontá-los e expulsá-los daqui á força me parece uma opção mais agradável...

E como pretende fazer isso? Com seus truques baratos? 

O Doutor fitou-os intensamente.

—Foram vocês que pediram... –ele ergueu uma das sobrancelhas. –AGORA!

No mesmo instante, uma seqüência de coisas aconteceram. Primeiro, pedregulhos do tamanho de casas foram empurrados ladeira abaixo pelos Dalits –que eram seus associados –depois raios foram disparados de todas as direções pelos retro-refletores da lua da Índia (Luisa, Melissa e Chanty cuidaram disso –o Doutor deixou com elas o aparelho sônico, só precisaram mirá-lo para cima), então a música no alto-falante recomeçou tão alta que quase ensurdeceu-os... Os Ood começaram a cantar uma canção, para reforçar o poder da que já estava sendo repercutida, enquanto os centuriões bateram suas lanças no chão, destemidamente. O Doutor inflou o peito e, com toda a força do mundo, gritou:

Vem me encarar agora! Porque se vier, vai ter que encarar todos nós!

Infelizmente, os Sontarans mal puderam ouvir o que ele dissera, a música já fazia seus tímpanos doerem, ensurdecendo-os. No instante seguinte, os soldados Gregipciomanos caminharam indiferentes pos entre os Sontarans que sofriam com a amplificação do som e cutucavam, na maior moleza, seus orifícios logo atrás dos pescoços, imobilizando sua tropa inteira. Em menos de meia hora, tudo estava acabado.

Não acredito que fomos derrotados por uma simples alteração sônica! Esse truque é um dos mais inferiores...—queixava-se o líder dos Sontarans, de bruços no chão.

O quê? Eu não te ouço... —o Doutor gesticulou, levando a mão ao ouvido. –Ah, é! Agora eu posso ouvi-lo... –então retirou de dentro de suas orelhas, dois tampões de ouvido. Quase que em sincronia, muitos dos seus amigos fizeram o mesmo, como se esse fosse o sinal de que já seria “seguro” se livrarem dos tampões.

Isso foi jogo sujo!

—Os únicos com a cara cheia de lama aqui são vocês... –brincou o Doutor, passando por vários soldados, ignorando suas posições decadentes. Luisa vinha correndo em sua direção e ele só tinha olhos para ela. Para ela e para todo o resto da equipe que também veio correndo ao seu encontro, sorrindo e comemorando, rumo ao maior abraço grupal do século.

Sem dúvida, eles fizeram história.

 

*   *   *

Começaram uma busca pelas terras, á procura de todos os tais Dalits revolucionários, agora muito mais amedrontados que antes, voltaram-se rapidinho para o “lado bom da força”, ignorando de vez o plano dos Sontarans. Em meio á procura, encontraram em uma das naves-prisões Sontarans, uma cela onde estavam a princesa Mayara (a dona da tal festa de casamento do início da história), e seu noivo, Niraj. No meio de sua libertação, eles agradeceram a bravura dos nossos heróis e sua lealdade perante á uma causa que nem lhes dizia respeito. Sentiram-se ambos em dívida com os guerreiros Gregipciomanos, por eles terem lhes ajudado no final, mas esses acertaram tudo com um bom e velho aperto de mão, e uma promessa de parceria. Pouco após os entendimentos entre os representantes dos dois planetas, os guerreiros Gregipciomanos decidiram que queriam cortar logo o mal pela raiz: desejavam mais do que tudo explodir as naves Sontarans, mas, o Doutor teve uma idéia ainda melhor: colocou todos os soldados Sontarans á bordo de suas naves de guerra e estipulou um curso, determinado com a ajuda de sua TARDIS, para que as naves deles saíssem fora do sistema solar, e acabassem quase do outro lado do universo, longe demais para lhe causarem problemas novamente. Assim, quando os Sontarans finalmente recuperassem os movimentos do corpo, já seria tarde para retomar o plano de onde pararam, e também, para refazer a rota ao contrário, retornando ao planeta indiano, de modo que teriam de conviver com aquela derrota para o resto de suas vidas, sem chance alguma de um “segundo round”.

Com o tempo, isto é, com os Sontarans estando longe, os dois planetas iniciando um laço duradouro de amizade e tudo entrando novamente nos eixos, a paz foi finalmente restaurada. Os Dalits voltaram em fila indiana para a Índia, arrependidos da posição que tomaram na história; os Oods voltaram á seus postos, como humildes servos dos humanos (como eles queriam que fosse); Chanty voltou para o palácio, junto de Mayara e Niraj, contando ao Marajá, (seu pai e pai de Mayara) sob o insuspeito rapto da irmã e do cunhado (que ainda á pouco haviam sido descobertos mortos em seus quartos, por um servo, que alegou ter pego os dois no flagra, confessando em alto e bom som que estavam planejando dar um golpe no Marajá, assassinando-o pela manhã seguinte, tomando logo de uma vez sua posição de tremendo poder e importância perante ao povo, regendo todo o país, de modo a controlar o planeta com mais facilidade do que pretendiam anteriormente, com apenas o plano base Sontaran. Explicação? Ah sim... O verdadeiro casal (que estavam com Chanty agora) havia sido capturado já há algum tempo, mas até agora ninguém notara seu desaparecimento graças á dois clones (que atualmente estavam mortos) projetados propriamente por seus mestres Sontarans –ambos exatamente iguais aos dois seres humanos, tomando seu lugar durante sua ausência. Ambos estavam sob o comando do inimigo, infiltrados no ambiente do palácio somente para recolher informações preciosas que seus líderes poderiam vir a usar futuramente contra os indianos, em batalha –mais ou menos a mesma abordagem que o Doutor executara ao persuadir os Dalits á se infiltrarem nas terras não conquistadas, para descobrir mais detalhes sob o plano inimigo. A diferença, é que com os Sontarans a coisa acabou saindo um pouco fora do controle; Houve pouca cautela dos dois em manter o plano em segredo, o que acabou resultando em sua morte precoce. Apesar do inconveniente, Chanty contou ao Marajá também sobre todas as coisas incríveis que ela, e os “hóspedes indesejados” de seu pai, haviam feito para ajudar o povo indiano, e como, de uma hora para a outra, a suposta rixa entre os dois planetas, indiano e Gregipciomano, fora extinta. Os guerreiros Gregipciomanos também foram ao palácio e foram homenageados, receberam agradecimentos e tudo mais, e agora preparavam-se para voltar para o seu planeta muito em breve, deveras contentes pelo seu ótimo desempenho em batalha (mesmo que não tenham encostado em um fio de cabelo do inimigo).

O Doutor, Luisa, Melissa, Nik e Nyha também tiveram seu reconhecimento. Todos foram tratados como heróis, desde então, pelos indianos, que quiseram dar uma festa em seu nome e em nome de todos os soldados Gregipciomanos. Estes, que já estavam de partida, hesitaram ao ouvirem a palavra “festa” soar no ar e, como brigar e comer, típico “pão e circo”, eram suas atividades preferidas, acabaram abrindo uma exceção e ficando um pouco mais por lá.

 

*   *   *

A festa de agradecimentos estava de arromba. Ela fora realizada na manhã seguinte, junto ao casamento dos verdadeiros Mayara e Niraj, que foi estipulado oficialmente junto da comemoração, cuja a cidade inteira fora convidada. Os casamentos indianos costumavam ser cheios de luxo, danças, muitos convidados e, principalmente, duravam muitos dias (o que acabou deixando o Doutor meio enlouquecido), mas que de início, até que foi bom.

—E aqui estamos de novo –Luisa sorria. Ela estava novamente toda arrumada com seu Sare pink, tinha os pés descalços e a pele salpicada de desenhos, pingentes e jóias. Observava toda a movimentação da festa bem ao lado do Doutor. O Senhor do Tempo por sua vez também não ficou para trás. Estava trajando roupas tão limpas e distintas que mal era capaz de reconhecer seu próprio reflexo no espelho. Ele sorriu descontraído para ela, em retorno:

—Espero que Melissa não esteja misturando drinques desconhecidos de novo...

—Espero que não sejamos obrigados a dançar em público. –Luisa riu, cobrindo o rosto com a ponta do véu.

—Depois de tudo o que fizemos, acho que não nos sairíamos tão mal assim...

Luisa fitou-o amigavelmente.

—Tem razão. Isso não é nada comparado ao que tivemos que fazer no “campo de batalha”.

—Á propósito, você dançou muito bem lá...

—Pensei que não tinha prestado atenção em nós. Imaginei que estivesse se concentrando no que devia falar á seguir aos Sontarans –declarou ela.

—Eu não precisava pensar muito: Ou eles abortariam seu plano ou iriam em frente com ele. Caso eles dessem a entender que a segunda opção se sobressaía, então eu teria que agir. Era simples.

—Ah, claro! Fácil como apontar um lápis... –brincou ela. –Se isso é considerado fácil para você, então o que consideraria difícil?

O Doutor pensou um pouco.

—Esconder algo de você.

Ela amplificou o sorriso, toda contente.

—Graças á Deus por isso. Fico feliz que não pretenda mais esconder coisas de mim... Sobre tudo quando elas parecem ser cruciais para minha vida...

E eu tenho escolha? —ele retorquiu enfático, fazendo-a rir com seu tom irônico, ao nível profissional. –Você é insistente! É dura na queda! É teimosa e cabeça dura... O que acha que eu posso fazer? Minhas habilidades de ocultar coisas não são páreo para a senhorita... Tem idéia de como é difícil conseguir persuadi-la? Mais uma dessas minhas tentativas fracassadas, e eu juro que me aposento de vez! 

—Cala essa boca! –ela riu, cutucando-lhe as costelas de leve, com o cotovelo. –Estamos bem agora. E você não mais terá que mentir... –ela ficou séria de repente. -Quero que saiba que não precisa guardar segredos de mim. Eu estou aqui para o que der e vier. Sou sua amiga, e você pode confiar em mim do mesmo jeito que confio em você... E isso não é pouco, se quer saber. –ela intensificou, porém ele apenas olhou-a por cima e ela teve a impressão de que o amigo não a estava ouvindo.

—É. –o Doutor sorriu de leve, pouco satisfatório perto do que ela esperava. Sua boca era apenas uma linha fina, com uma das laterais de seus lábios curvados para cima. Algo não completamente feliz. Quase como se seus lábios formassem uma ponte entre dois sentimentos diferentes, sendo a metade curvada para cima: satisfação; e o que restara: um quê de preocupação, tornando a mudança de expressão não exatamente necessária, já que as duas cabiam em uma só reação.

Nossa. Eu nunca vi você assim... Que bicho te mordeu? –ela encostou seu ombro de leve no dele, impulsionando-o para frente em um movimento involuntário.

—Assim como? –ele pareceu indiferente á cara que fazia.

Eu sei lá... Meio misterioso, meio inquieto, meio agitado... Eu diria até ansioso.

—E isso não é normal, eu presumo?

—Não é não. –ela fitou-o demoradamente, verificando um olho de cada vez. –Você não é assim normalmente. Na maior parte do tempo é falante e empolgado... Você contagia as pessoas com sua alegria. O quê que há com você?

—Eu não sei. Sinto um arrepio estranho na nuca e alguma coisa estranha se manifestar na boca do estômago... É como um mau pressentimento, e eu não gosto nada disso.  –ele mordeu o lábio.

Luisa ergueu o braço e entrelaçou-o em volta de seu pescoço, de modo que ele descansou a cabeça na sua.

—Está pensando em quê, especificamente?

Ele fitou-a por um momento.

—Não sei como levá-la para casa. Digo, posso te levar para casa quando você quiser, mas antes preciso nos tirar daqui, desta versão da realidade... –ele suspirou cansado. –Ficamos tão ocupados em terra firme, nos preocupado em ajudar os outros, que até nos esquecemos de que também estamos com problemas...

Luisa fitou-o bondosamente.

—Esquece isso, tá? Vai ficar tudo bem... Eu sei que vai! No final, tudo sempre acaba bem...  

—Espero que esteja certa.

—Eu estou, com certeza! –ela sorriu, encorajando-o. –Eu confio no nosso potencial! Sei que daremos um jeito nisso. Pode demorar, mas... Bem, de qualquer jeito, a gente sempre acha uma saída. Sempre há uma saída...

Milagrosamente, ele pareceu se sentir um pouco melhor com aquele conforto, embora não fosse muito.

—Tem razão. Ei... Que tal nós nos juntarmos aos outros na dança cerimonial que está ocorrendo nas ruas? –ele ergueu a cabeça de volta, afastando-se dela para poder contemplá-la melhor. –Estivemos apenas caminhando o trajeto todo...

—Tudo bem, mas eu prometo que será uma experiência doída e catastrófica de novo...

—Catastrófica eu até compreendo... Só não entendo porque seria doída.

Ela tomou sua frente, puxando-lhe pelo braço, com ar de riso.

—Se eu pisar no seu pé, depois vê se não reclama... –ela brincou e ele riu abertamente.

—Luisa Parkinson... Só você para me fazer esquecer dos problemas!

—“Esquecer dos problemas” é meu nome do meio! –ela riu.

—Pensei que fosse “Guimarães”. –brincou ele.

É, isso também. –ela riu ainda mais, junto da multidão sorridente e alegre, que dançava pelas ruas rumo ao palácio do Marajá, onde ocorreria o casamento e depois o restante da festa de agradecimentos e confraternizações pelo bem estar do planeta.

Dançaram durante muito tempo a música *Azeem O Shaan Shahensh, pelas ruas, até chegarem ao palácio, onde a linda cerimônia de casamento ocorrera. Casamentos são mesmo incríveis, são capazes de fazer as pessoas mais duronas chorarem feito crianças... Melissa foi uma delas:

Você está chorando?—o Doutor abordou-lhe incrédulo. –Não! A Melissa Rivera está chorando? A mesma Melissa que vive quebrando regras e me chamando de tudo quanto é nome? Eu não acredito... Me belisque que eu devo estar sonhando... AI!—o Doutor massageou o braço com urgência.

—Foi você quem pediu “menino alien” –ela retrucou. -E não, não estou chorando... Caiu champanhe nos meus olhos!

Ah, sim. Claro! Por que foi que não pensei nisso antes...? Sempre chove champanhe nessa época do ano... Eu devia ter me tocado! É tão óbvio, não é?—disse o Doutor sarcástico.

Em meio á confusão de corpos indianos e Gregipciomanos, tudo pareceu entrar em sintonia com o universo. De repente, todos estavam mais leves, muito mais animados. O Doutor entrou tanto no clima da festa que nem se importou com as pisadas que Luisa deu em seu pé, sem querer, ao quase tropeçar na barra do Sare diversas vezes.

Longe dali, Melissa também se divertia. Estava dançando com um indiano de sua altura, e tomando muitos drinques com ele, brindando sempre á união dos planetas e ao casamento da Mayara e Niraj. Bem, isso era no começo, quando ela ainda estava sóbria. Algum tempo depois, ela já começava a não falar coisa com coisa: chegou a fazer um brinde em nome do Troféu Imprensa e outro ao Papa, gritando bem alto: “Viva o Papa pop!”.

Enquanto o Doutor e Luisa riam, trocando palavras entre si –dizendo que Melissa devia ter algum parentesco com os antigos Gauleses do desenho de Asterix e Obelix, que viviam se embebedando e comendo á valer –era executado um show de danças, só com as garotas indianas dançando profissionalmente a música *Main Vari Vari, no centro do salão, deixando todos impressionados com seu talento; a menina Chanty, irmã mais nova da princesa Mayara, se aproximava do casal de noivos indianos, que de acordo com os costumes, sempre deviam passar grande parte da festa sentados, tirando fotos com os convidados. Chanty cochichou algo no ouvido da irmã e, por algum motivo a princesa Mayara tornou-se inquieta e não parava de olhar para o menino Nyha de forma curiosa e intrigada, com seus olhos muito grandes e bem delineados. Ela cochichou algo no ouvido do marido e ele pediu que Nyha se aproximasse dos tronos dos noivos.

—Meu bom rapaz... –Niraj sorriu para o menino, tocando em seu ombro. Nyha surpreendeu-se com a reação do novo Marajá.

—Senhor... –o menino fez uma reverencia, com as mãos juntas. –Queria falar comigo?

—Sim. Minha esposa, na verdade, parece ter algo a lhe dizer...

Atchá! Marido, como foi que adivinhou? –a mulher fitou-o surpresa.

—Dá para ver em seu rosto... –ele sorriu largo para ela, que retribuiu o ato. –Vocês dois se conhecem?

Nahin. Não senhor –Nyha se apreçou. –Eu apenas ajudei a salvá-la.

Dakho, Marido! Veja –e apontou para o pescoço do menino, onde havia uma marca, parecida com uma lua de cabeça para baixo. Na mesma hora, Niraj emudeceu e deixou os lábios se entreabrirem, colocando depois as duas mãos sobre eles.

Are Baba, Mayara... –eles se entreolharam, ambos pasmos. Nyha franziu o cenho.

—Foi alguma coisa que eu disse? –arriscou.

Nahin. Fique sossegado. –assegurou Niraj com seu olhar bondoso e sorriso amigável. Parecia mais do que feliz agora... Parecia meio, emocionado!—Você não fez nada... –sua voz se tornara embargada.

Ao longe, o Doutor e Luisa pararam para observar o que acontecia lá, dessa vez, sem interferir.

Então porque estão assim...? –o menino pareceu alarmado. O que teria feito para que ambos estivessem com os olhos repletos de lágrimas? Coisa boa não devia ser. –É seu casamento! Não deviam chorar hoje...

—É um choro de alegria –afirmou Niraj, acariciando o rosto da esposa que concordou e se encolheu toda com o mínimo toque que lhe causara um arrepio bom. Dava para ver que estavam verdadeiramente apaixonados. Mas, como os indianos nunca se beijavam ou se tocavam em público, acariciar o rosto da esposa foi tudo que o homem pode fazer. –Minha magnífica esposa acabou de fazer uma descoberta fantástica...

Então ele se ergueu da cadeira e fitou o menino do alto, baixando a cabeça ao fazê-lo para que seus olhos pudessem se encontrar. Nyha estremeceu com a reação inesperada. Por um momento achou que estava encrencado, pois os noivos não deviam se levantar tão cedo do acento... E ele fizera isso acontecer.

—Senhor... –Nyha olhou-o apreensivo. –Q-qual é a descoberta? –disse, não tendo muita certeza de que queria mesmo ouvir a resposta.

—Estamos assim por sua causa. –falou Niraj. –Muito felizes!

Nyha piscou desconfiado. Mayara também se ergueu, imitando o marido, e tomou a palavra.

—Você tem uma lua invertida no pescoço.

—Sim senhora. Eu a tenho desde que nasci. -Nyha assentiu. Mayara ameaçou chorar. –Por que isso choca vocês?

Os dois se deram as mãos, os sorrisos largos.

—Mostre a ele -Niraj olhou para a esposa e induziu-a a baixar um pouco o Sare, mostrando parte do pescoço... Onde havia também uma lua invertida. Nyha ficou sem fala. Niraj continuou: -Essa marca de nascimento está na família de minha esposa há gerações, ela me disse... E você a tem no mesmo lugar. –os dois se entreolharam, então Niraj agachou-se e abraçou o menino. –Meu filho...

Nyha pareceu não crer, logo de inicio, mas quando as coisas começaram a se clarear em sua cabeça, tudo passou a fazer sentido...

—Baldi! –ele abraçou o pai, com força, a mãe uniu-se a eles, no abraço que se tornou triplo.

 Os três ficaram um tempo sem conseguir falar nada, então a princesa contou a ele que, há alguns anos atrás, ainda sendo muito nova, tivera um filho com o mesmo homem que agora se tornara seu esposo, mas o bebê fora tirado dela á força logo que nasceu, para que a família não ficasse mal falada... Então era verdade! Nyha era filho legítimo de Mayara e Niraj. Os dois ficaram muito felizes de terem reencontrado seu filho e Nyha, muito surpreso com tudo aquilo. O garoto ainda se perguntou como poderia ser filho dos dois, se ele era um Dalit, e eles eram ambos de castas nobres. Então todos chegaram à conclusão que, como ele foi abandonado, viveu no meio das crianças de rua (os Dalits) e acabou crescendo acreditando fazer parte daquele grupo que sempre ouvia dizer que era amaldiçoado, acabando vivendo excluído de tudo e todos. No exato momento em que chegaram a essa conclusão, a princesa chamou a atenção de todos e, junto do marido, anunciaram terem encontrado seu filho legítimo para todos na festa, que aplaudiram animados.

—Escutem todos: Nyha é nosso filho! O meu filho perdido... Ele está de volta! –sorria Mayara, encantada, com os braços em volta do pescoço do menino.

—Ele foi um verdadeiro herói hoje, e merece uma recompensa por isso –completou Niraj, orgulhoso. -Em homenagem á sua coragem e bravura em enfrentar as leis do país para uma causa maior, em nome de todos nós que habitamos a crosta deste simples planeta na perdição do cosmos, nossa primeira iniciativa como seus regentes, será abolir as benditas castas, deixando o povo indiano finalmente livre!

O salão explodiu em vivas, ao ouvir a fantástica novidade. O que, claro, não impediu que o antigo Marajá ficasse alvoroçado com a notícia. Indignado, ele tentou mudar a decisão dos dois, sobre tudo, colocando em evidencia seu próprio jeito de ver as coisas, mas o casal foi muito perspicaz em sua decisão, de modo que não haveria volta em sua palavra.

—Desculpe baldi, mas agora eu sou a regente. E, como sou a primeira mulher á substituir o pai como Marajá, acho que devo começar com o pé direito... –ela sorriu e indicou o menino com as mãos. –Esse, baldi, é seu neto. Tchalô! Vamos... Repare na marca de nascença embaixo do pescoço! Ele é meu filho e uma mãe sabe reconhecer seu próprio filho...

—Ele é seu filho? Eu tenho um neto...? –o homem pareceu confuso ao fitar o menino. –Mas por que eu nunca soube da existência dele?

—Por muito tempo ele esteve perdido. Se o senhor me permite explicar –começou Niraj. –A Mamadi de Mayara quis manter tudo em segredo: assim que o parto de minha esposa terminou, a senhora sua mãe livrou-se da criança, para não deixar rastros desastrosos na história de sua família...

Ranira fez isso? –o homem pareceu chocado. –Mas ela nunca disse nada... Ela nunca aparentou... Como conseguiu ser tão fria á esse ponto? Ela não sabia que quando uma criança é trazida ao mundo é porque os deuses á querem em terra firme? Ela não podia ter dado seu filho embora... Baguan Kelie! Isso não é nada auspicioso! Poderíamos ter sido amaldiçoados por culpa dela... Are Baba!

—Tenha calma sogro, ela teve fortes razões para fazê-lo... –assegurou-lhe Niraj. –Se há um culpado na história, este alguém sou eu. Foi eu quem comprometeu sua filha muito antes do casamento...

—Oh! Shiva, shiva, shiva...o homem arfou, desgostoso, agitando as mãos para o alto. –Como é que conseguiu esconder a gravidez de seu baldi, minha filha?

—Foi na época em que você esteve fora, papa. –defendeu-se Mayara. –Lembra quando o senhor foi na Convenção Cerimonial Interplanetária dos Planetas Unidos?

—Sim! Sim, claro! Como poderia esquecer? Fiquei doze meses longe de casa...

—É preciso apenas nove meses para se ter um filho –contou a mulher, encolhendo-se de leve, com medo da reação do pai. O Marido a abraçou em apoio maior e o filho segurou forte suas mãos frouxas que ainda contornavam seu pescoço. O marajá aposentado se endireitou, suspirando, então voltou-se somente para o menino e fincou os olhos na mancha de nascença.

—É igual á de sua falecida mamadi—ele comentou para Mayara. –O pequeno sem dúvida tem os olhos dela...

O Menino fitou o avô, sorridente.

O senhor é meu nana?—disse Nyha, cheio de esperanças. (nana significava avô materno).

—Sim. Eu sou. –o homem sorriu mais do que jamais sorrira na vida. Seus olhos brilharam ao reconhecer o neto e os dois se abraçaram demoradamente. Pouco depois, Chanty também uniu-se á eles, alegre pelo reconhecimento de seu sobrinho, oficialmente como membro da família.

—Aquela hora que nos encontramos no campo de batalha Sontaran e você reconheceu minha marca de nascença... –começou Nyha, abraçado á tia mirim. –Você já sabia de tudo isso?

—Eu soube que devia ser um parente nosso desde o momento em que vi a lua invertida em seu pescoço. Mas, antes de tomar qualquer decisão precipitada, eu precisava procurar meu baldi, para informá-lo... –ela alegou. –Que bom que correu tudo bem, Nyha!

—Isso é mais do que bom... É perfeito! –sorriu o garoto. –Até ontem eu não tinha nada. Nem família, nem ninguém. O Doutor foi a primeira pessoa que realmente interagiu comigo de forma civilizada...

—Graças aos deuses! Temos que agradecer muito á esse Doutor... Por causa dele, nossa família está finalmente reunida! –afirmou Mayara, pedindo um abraço coletivo, com todos os membros de sua família.

Todos no salão gigante aplaudiram o ato. Os Dalits festejaram muito ao serem convidados a participarem da celebração, dentro do palácio, após a declaração do fim de castas. No fim das contas, as pessoas nem mais ligavam para aquela maldita história de “maldição”. Logo se acostumaram com a nova idéia de igualdade social, que funcionara quase como se todos já aguardassem a criação daquela lei há muito tempo... Nyha ficou super feliz com os novos pais, a tia e o avô que ganhara inesperadamente e, ainda mais contente com o sinal positivo que o Doutor e Luisa lhe lançaram á longa distância, com o dedo polegar, animados com o desfecho de sua história. Só então que Nyha se tocou que o Doutor definitivamente soubera o que estava dizendo á ele: Toda aquela história sobre ser um Dalit, uma poeira cósmica e coisa e tal só se intensificara porque ele acreditara na maldição, tornando-a cada vez mais real com a força da própria mente. Graças aos deuses, agora ele conseguia enxergar tudo tão claramente quanto podia. O Próprio Marajá acabou reconhecendo-o como seu neto e os dois ficaram numa boa, conversando a noite toda, sobre o tempo que não tiveram juntos. A família marajá estava finalmente reunida! Todos comemoravam as boas novas e o salão quase chacoalhou de tanto que dançaram aquela noite... Tudo parecia estar entrando nos eixos. Pelo visto aquela seria uma festa longa e inesquecível, com desfechos marcantes e boas risadas. Até os Ood caíram na farra, brincando de “Até Onde Você Vai”, abaixando o mais que podiam para conseguirem passar por debaixo de uma corda esticada por dois romanos, uma centena de vezes até chegarem a se arrastar no chão para conseguir fazê-lo.

Não tão longe dali, Chanty também dançava acompanhada por um romano de sua estatura, Nik e o macaco traiçoeiro do Marajá, que até que estava se portando bem demais para o seu costume, também os acompanhavam, na lateral do salão. Durante algum tempo, as pistas de dança ficaram vazias: todo mundo estava concentrado em comer ou em conversar com pessoas diferentes, que nunca haviam trocando assunto antes por causa da diferença de castas, mas então o carismático casal indiano tomou o centro da pista, ao fim de sua seção de fotos, e fizeram sua primeira dança, convidando á todos para acompanhá-los ao som da badalada *Kajra Re. Todo mundo foi chegando no centro da roda para ficar perto dos noivos. O Doutor, Luisa, Melissa e Chanty, além de Nik, se encontraram em meio aquela bagunça de corpos sacolejando pra lá e pra cá, aproveitando a oportunidade para dançarem todos juntos, em roda. As Hijdras fizeram uma surpresa á todos, chegando na festa sem avisar e abençoando os noivos e todos mais que lhe ofereciam rubras. Muito rapidamente, elas passaram por Luisa e o Doutor depositou algumas moedas nas mãos do terceiro sexo, (sabe se lá de onde ele tirou aquelas moedas... Normalmente ele anda duro!). A Hijdra á sua frente lhe sorriu muito e abençoou-os, então, bruscamente lançou-lhes uma verdadeira cara de susto:

Are Baba! Vocês não podem ir embora antes de visitar o templo...

—Qual deles? –perguntou Luisa.

—É. Eu sei... A oferta é irrecusável e sem por cento irresistível... –falou o Doutor. –Talvez nós possamos dar uma passadinha lá mais tarde, o que acha Luisa? Seria um ótimo programa de despedida, não acha?

Programa?—guinchou uma segunda Hijdra horrorizada. –Não estamos falando de uma visita qualquer no templo... Nós sentimos suas vibrações! Vocês precisam ir ao templo o mais rápido possível... Isso será de grande importância para seu destino... Vai mudar suas vidas para sempre!

—Como assim “Para nosso destino”?—o Doutor ficou desconfiado. Ele desconfiava de tudo que metia seu destino no meio, ou sua gravata-borboleta. –Qual templo? Digam!

O templo grego. –falou uma outra Hijdra, mais atrás, de modo místico. –Vão encontrar todas as respostas que procuram por lá... E ainda mais. Muito mais coisas do que esperam, lhes aguardam...

—É hora da grande revelação! –animou-se uma outra, esfregando as mãos e dando pulinhos animados.

O Doutor e Luisa se entreolharam.

—Elas são bem simpáticas, não acha? –Luisa sorriu forçado na direção das Hijdras, confiando a informação ao amigo, sem tirar os olhos delas.

—E muito suspeitas também... –concluiu o rapaz, de canto de lábios, quase inaudível. –Simpáticas e suspeitas demais para o meu gosto: uma péssima combinação!

Doutor—Luisa encarou-o, intrigada. –Não encare as coisas dessa forma... É óbvio que elas tão exagerando. Sabe? Pra nos fazer querer ir até lá. É um truque pra chamar atenção dos turistas. Certeza! Afinal, o que pode haver de errado nisso? É só um simples e inofensivo passeio...

O rapaz ponderou:

—É. “O passeio que mudará nossas vidas para sempre”. Não tenho certeza se gosto muito disso.


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Notas finais do capítulo

YESSSS!!!

AINDA NÃO ACABOU MINHA GENTE!

Uh! *-*

Bom, a parte principal em que a Índia seria registrada termina aqui, mas não podemos nos esquecer que a equipe TARDIS ainda precisa arrumar uma forma de conseguir voltar para seu respectivo universo.
Se eles vão conseguir ou não a gente confere semana que vem.

Mas por enquanto, vamos às considerações gerais do Capítulo de hoje:

Pois é: sentiu o climão de novela? kkkkkkk Foi intencional mesmo... É que na verdade meu primeiro contato com a Índia se deu através da novela Caminho das Índias, exibida em 2009 pela Globo. Eu devo acrescentar logo em seguida que todos os personagens indianos aqui presentes foram criados exclusivamente por mim -mas ainda assim não pude deixar de fazer algumas referências à novela, como por exemplo os nomes da princesa Mayara e do príncipe Niraj (alusão ao principal casal indiano da trama da novela, Maya e Raj).

Se há alguma coincidência nos nomes do menino Nyha e de Niraj serem meio parecidos? YEAH! CLARO QUE SIM! Eles são pai e filho!

Sim, eu sei que vocês ficaram aí nas cadeiras querendo esganar o antigo Marajá até o último segundo não é? kkkkkkk Mas fiquem tranquilos: ele não vai causar mais problemas agora... Ainda mais porque no mesmo dia que acreditou ter perdido "supostamente" a filha e o genro -mortos por traição - teve a inigualável surpresa ao revê-los ainda com vida, e depois que Chanty explicou tudo ao pai, ficou ainda mais claro assimilar a confusão que os clones dos Sontarans haviam causado. No fim, o que era para ser um dia triste de muito pesar, se tornou um recomeço para todos, em muitos sentidos.

Yeah... Não seria maravilhoso se abolissem as castas na Índia? Ou o preconceito no mundo? Ai ai... Que sonho feliz.

Enfim!!! kkkkkkk

Espero não ter bugado muito vocês com as explicações finais da família do Marajá... kkkkkkk É que é muita informação mesmo, eu admito! Mas fazer o que? A família deles está no poder a gerações! Futrico é o que não falta! kkkkkkk

Espero que tenham curtido o desenrolar dessa bagaça linda!

E até o próximo capítulo!!!




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