Luisa Parkinson: A Companheira Fantástica escrita por Gizelle PG


Capítulo 100
A Piscina na Biblioteca


Notas iniciais do capítulo

Hey galera!! Estou de volta!! :D

Tudo bem com vocês? Eu vou muito bem, assistindo Friends e bancando a louca por aí kkkk ;) ^-^
Bom, eu prometi voltar, e aqui estou eu, meio enferrujada sorry kkk, mas feliz por estar trazendo mais um capítulo para vocês. Espero que gostem da continuação das aventuras da Equipe TARDIS.

Boa leitura! :)



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Pentear os cabelos poderia ser uma tarefa desafiadora. Muitos pentes e presilhas já foram perdidos pela humanidade em toda a superfície capilar já explorada, na tentativa de tentar conter a rebeldia de seus belos e teimosos cachos e fios esticados. Contudo, a primeira vista, a figura ajeitadinha de Luisa poderia ser facilmente taxada como “não sofredora” do tal problema cabeludo... Tudo porque seus cabelos eram inteiramente lisos. Porém, enganavam-se os que pensavam que isso era cem por cento garantia de fios obedientes e perfeitos. Luisa que os diga! Havia dias que se deitava para dormir com o penteado invejavelmente impecável, e, quando tornava a acordar no dia seguinte, parecia ter acabado de voltar de um encontro particular com a terrível Medusa.

O que a maioria das pessoas não imaginavam, era que seus cabelos embaraçavam muito facilmente, de modo que a “praticidade” que deveria acompanhar as palavras “cabelo liso” eram só para inglês ver. Ou neste caso, só para Senhor do Tempo ver.

Pois, enquanto Luisa ocupava-se em desembaraçar seus cabelos no fim daquele dia desgastante, o Doutor observava-a, sentado num degrau que levava ao painel circular central da TARDIS. Ele tinha os cotovelos apoiados nos joelhos e a cabeça apoiada nas mãos, cuja os dedos contornavam abertamente ambas as laterais de seu rosto.

—Como você consegue? –indagou, depois de um longo tempo em silêncio.

—O quê?

—Ter tanta paciência... –ele arregalou os olhos, fazendo uma careta insana. -Venho tentando descobrir o “segredo da paciência” minha vida inteira, mas fracassei miseravelmente. –e encarou-a esperançoso. –Como você consegue?

—Ter paciência? –Luisa largou a mexa que estava penteando só para dar-lhe atenção, com ar de riso. –Eu sei lá... Acho que não existe uma “regra geral” ou uma “dica” para isso. Eu só sou paciente e pronto!

No plano de fundo, Melissa atravessou a sala de controles com um esmalte em punho, prestando atenção na conversa deles.

—Mas... Isso é tão complicado—o Doutor prosseguiu, balançou a cabeça, descente. –Como é que você consegue realizar essa proeza?

Ora, ela é mulher!—Melissa exclamou, concluindo o assunto. O Doutor inclinou a cabeça, analisando o novo argumento por um instante.

—Faz sentido –admitiu, apesar de ainda não estar devidamente satisfeito com a resposta. Pensativo, observou a si mesmo. –Infelizmente, sobre isso eu não posso fazer nada...

E nem nós, meu bem. Ao menos que você esteja querendo um tratamento intensivo de pele, unhas pintadas e um novo penteado –anunciou Melissa, agitando o esmalte para ele ver. –Hoje é noite de embelezamento das garotas! —lançou-lhe uma alfinetada em forma de piscadela.

O rapaz empertigou-se.

Puxa, olha a hora! Tenho que trocar os fios da válvula reguladora da TARDIS... –e foi retirando-se, com a intenção de deixá-las em paz, antes que alguma coisa sobrasse pra ele. Porém, Luisa acabou intervindo em sua saída.

—Ué? Pensei que você fosse ir dormir.

O Doutor encarou-a como se ela fosse louca.

Dormir?E para quê isso?

—Dã... Gênio! Por que todo mundo tem que dormir de vez em quando! –explicou Melissa em tom obvio.

O Doutor fez cara de confusão.

—E o que isso tem a ver comigo?

As meninas se entreolharam.

—Você nunca fica cansado? Tipo: NUNCA?

O Senhor do Tempo cruzou os braços.

—Acho que já tivemos essa conversa...

—E eu acho que você nunca nos deu uma resposta satisfatória –Melissa replicou, cheia de insistência. –Qual é, mané!? Você acabou de passar pelas quarenta e oito horas mais desgastantes da sua vida... Ou pelo menos, até onde sabemos. Você nunca tinha se “desregenerado” antes, tinha?

Não, mas isso não significa que estou cansado. Pelo contrário: Na verdade estou cheio de energia... Pronto para outra! —ele disse, entusiasmado.

Melissa olhou para a amiga com cara de tédio.

—Luisa, querida... Quer fazer a gentileza de aconselhar esse idiota teimoso de que ele precisa se recuperar do processo regenerativo, antes que eu mesma tenha que fazer isso?—pediu Melissa, educadamente, forçando um sorriso, e com a voz assustadoramente gentil e calma, como jamais esteve antes.

Certo—Luisa assentiu, achando cômico o ar “bondoso” da melhor amiga. Seguidamente, deixou a escova e poltrona para trás e caminhou na direção do rapaz, lançando-lhe um olhar abismado durante a trajetória. –Vamos Doutor... Melhor você obedecer.

O quê? Ham... “Obedecer”!? –ele fez uma careta indignada, voltando-se para Melissa. –Você não pode dizer o que eu devo ou não fazer! No meu bolo já tem centenas de velinhas de aniversário provando que eu posso ficar acordado até mais tarde se eu quiser... –então crispou o nariz, inconformado. –E não devo explicações a você. Essa nave é minha!

Melissa manteve a cabeça baixa, com a atenção no esmalte das unhas, mas com toda aquela teimosia dele, acabou por apenas erguer os olhos, em sinal de reprovação.

Isso soou tão infantil quanto você não devia ser—Melissa interveio, desarmando-o. –Pare já de criancice e trate de ir tirar uma soneca. Agora. –mandou, firme. O Doutor abriu a boca para retrucar, mas acabou calando-se. Emburrado, olhou para Luisa, depois deu meia volta e saiu resmungando por além dos corredores internos da TARDIS.

Luisa olhou impressionada para a amiga.

—Como você fez isso?

Melissa sorriu, sabichona.

—Acho que minha prática em lidar com crianças melhorou muito depois do último Natal... –brincou, irônica. Luisa riu do comentário, e saiu correndo para alcançar o amigo.

Teve que apertar o passo para conseguir alcançá-lo.

—Ei! Espera! Espera! –correu acenando com as mãos erguidas, ao descer o corredor até o ponto onde ele estava. Derrapou bem ao seu lado, recuperando o fôlego. –Puxa vida... Você anda rápido!

—E qual o problema nisso? Vai dizer agora que eu devia também mudar o modo como caminho? –resmungou, azedo.

—Eu não disse isso –Luisa negou, rindo do jeito dele. O Doutor olhou para ela, consternado.

—Não estou cansado, se quer mesmo saber—ele parou no meio do corredor, bloqueando a passagem. –É sério! Não preciso ir dormir... Senhores do Tempo não tem a mesma necessidade de uma boa noite de sono que os humanos tem. Eu agüento muito mais tempo acordado do que vocês...

—Não duvido disso –Luisa concordou. –Só que Senhores do Tempo não passam diariamente por crises desregenerativas. E, creio eu, isso já sai um pouco da sua normalidade biológica, acertei?

O Doutor bufou, chateado.

—Esse é o dia mais insuportável da minha vida...

—Que é isso! São só algumas horas de sono... –ela tentou animá-lo, passando a mão em suas costas.

—Hã! Algumas intermináveis horas de sono, você quer dizer... –reclamou. –Diga-me: O que eu vou fazer quando estiver tentando dormir e o sono não vier?

—Hum... –Luisa pensou um pouso a respeito. –Por que não tenta contar carneirinhos?

Ele imediatamente arregalou os olhos.

Ficou Louca? Sou alérgico a lã!—brandiu. –Nem posso pensar no assunto que já começo a me coçar todo, olha só!—e para ilustrar, realmente começou a se coçar.

—Tá bem! Péssima idéia... –ela catalogou, franzindo o cenho para ele. –Hum... E porque não “conta os segundos”? Creio que isso ia logo motivá-lo. Ou desmotivá—lo, no caso. Acho que esse é o objetivo, afinal.

RÁ! Que engraçadinha você! Muito bem: Faça piadinhas ridículas...“O Doutor iria adorar isso, NÃO É MESMO?”—ironizou, amargo. -Porque, afinal de contas, onde eu estava com a cabeça? “É obvio que ele ficaria entretido em contar os segundos; Ele é um Senhor do Tempo! NÃO SERIA UMA ÓTIMA IDÉIA!?”—debochou ele, movimentando as mãos exageradamente e imitando a voz da garota de modo escachado.

Luisa escancarou os lábios e levou as mãos aos quadris.

—Agora você é que está sendo ridículo! –ela afirmou, enquanto ele continuava fitando-a com implicância.

Eu? Foi você que começou com essa coisa de “dormir”! –acusou. -Se nunca tivesse levado esse assunto para discussão, EU NUNCA SERIA OBRIGADO A IR DORMIR ÁS SETE E MEIA DA NOITE! —gritou, espalhafatoso, falando bem perto do rosto dela.

Luisa limpou embaixo do olho, provavelmente secando uma gotícula de cuspe, e depois checou o próprio relógio de pulso, enquanto o rapaz lhe dava as costas e saia marchando corredor à frente de cara fechada.

—São cinco e meia da manhã. -informou ela.

—E EU COM ISSO!? –desdenhou com irrelevância, dando meia volta e tornando a caminhar na direção dela, raivoso. –VÁ DORMIR SE QUISER, PORQUE EU NÃO PRECISO!!!

Luisa fez cara de brava. A teimosia dele já estava começando a esgotar sua paciência.

—Bom, será que seu mau-humor incomum não estaria diretamente associado à falta de sono?—propôs ela, em tom irônico.

—É claro que não! Só um tolo pensaria uma coisa dessas! –ele abriu a primeira porta que viu pela frente no corredor e adentrou no espaço interno, só para ter o prazer de bater a porta na cara de Luisa.

Irritada, a garota marchou até a porta, girou a maçaneta e entrou também no ambiente. Curiosamente, era uma sala vazia, com apenas uma cadeira com rodinhas no centro, onde o Doutor se apoiava espirituosamente.

Ah, e a falta de sono por acaso não tem nada a ver com isso, não é? –ela levantou a voz, batendo a porta atrás de si.

O Doutor trincou o maxilar.

—NÃO TEM NÃO! –ralhou ele.

—AH, É? VOCÊ ACHA?—satirizou ela.

NÃO, EU TENHO ABSOLUTA CERTEZA!—confirmou ele, cheio de marra.

—E VOCÊ POR ACASO É O DONO DA VERDADE AGORA!?

—TALVEZ EU SEJA! –ele berrou, com os dentes cerrados, enfiando o dedo na cara dela com um ódio sem igual. –Luisa Parkinson, tenha certeza de uma coisa: Quando eu digo que não estou com sono, é porque definitivamente não estou...—antes de acabar a frase, os olhos dele giraram nas órbitas e ele caiu para trás, desmontando na cadeira às suas costas, já fora de si e roncando; mergulhado em um sono muito profundo. Luisa mordeu o lábio por um momento, repassando toda aquela última cena na cabeça, então, diante da atual virada de jogo, adiantou-se até as costas da cadeira, revirando os olhos: -O que você ia dizer mesmo?—satirizou, falando perto de seu ouvido de propósito; Ele nem se moveu, o que comprovava que ele tinha apagado mesmo. Rindo da própria situação e das maluquices do amigo, ela saiu empurrando a cadeira de rodinhas corredor afora, a procura de algum lugar bom o bastante para deixar o rapaz repousando.

Virou e girou muitas vezes pelos corredores, sem localizar nenhum lugar relativamente aconchegante. A verdade era que tudo ao seu redor na TARDIS parecia irritantemente igual; cada porta, cada corredor, cada extensão de parede, teto e chão. Não havia diferença, a não ser que você passasse abrindo todas as portas que fosse encontrando pelo caminho, o que era um trabalho deveras exaustivo. Desesperada, ela chegou a cogitar acordar o Doutor e perguntar se ele por acaso não tinha um quarto na TARDIS e, se a resposta fosse sim, onde diabos o aposento ficava...

Quando já estava prestes a desistir, eis que teve uma inspiração: inexplicavelmente, uma das portas pareceu ficar mais em destaque aos seus olhos, do que as demais. Intrigada, e ao mesmo tempo maravilhada com o efeito “relevo” que aquilo causava, ela começou a se aproximar da porta escolhida, empurrando a cadeira do amigo inconsciente, na frente do corpo.

Ela parou. Ia girar a maçaneta quando uma idéia francamente inquietante lhe ocorreu: teria sido a TARDIS (que agora, de fato, estava comprovado que tinha mesmo alma) a guiá-la até aquele determinado aposento? Sorrindo com a suposição, olhou significativamente para as paredes do corredor –de repente, tudo parecia tão convidativo...

—Foi você, TARDIS? –Luisa perguntou, baixinho. Dessa vez, as luzes não piscaram nem nada, mas Luisa imaginou que, de qualquer forma, a TARDIS estivera tentando facilitar as coisas para ela, e se comunicar também. Contentando-se com essa versão dos fatos, Luisa girou a maçaneta, e acabou por ter a maior de todas as surpresas, ao cruzar a entrada.

—UAU... Nossa! –o aposento era um quarto; e o quarto era tridimensional, com a temática oficial de Gallifrey, o planeta natal do Doutor. Luisa rapidamente reconheceu aquelas colinas e montanhas rochosas... As árvores que queimavam ao por do Sol; e a gigantesca redoma circular, envolvendo a majestosa cidade de Arcádia, dando ao lugar a encantadora impressão de ser sempre intocável pelo tempo e pelo espaço. Sim, aquele era o quarto do Doutor.

Sem palavras, Luisa observou cada detalhe, de vez em quando levando a mão aos lábios, de vez em quando, dando uma espiadinha para checar se o Doutor continuava dormindo na cadeira. Depois de praticamente perder a noção do tempo diversas vezes, admirando o designe e a magia presente no lugar e tudo o mais, Luisa voltou à atenção exclusivamente para o amigo, movendo sua cadeira por entre o aposento até o encontro de uma cama rústica, circular e laranja, bem no centro, (com símbolos e desenhos talhados a mão nas laterais cuja ela não entendeu o significado), onde ela o depositou com cuidado e ajeitou as cobertas sob ele.

Por fim, ficou a observá-lo um pouco, sentada ao lado do leito da cama. Ele parecia tão bem agora. Tão mais “encaixado” lá, quase como se sua presença completasse o ambiente. Foi então que se pegou perguntando há quanto tempo ele não vinha visitar aquele lugar? Será que costumava evitá-lo? Porque Luisa nunca o ouviu mencionar, sequer, que ele tinha um quarto. Será que aquele era mais um de seus segredos? Por que ele tinha tantos afinal? Por que sempre vivia agindo como se não pudesse dividir seus sentimentos e lembranças com mais ninguém? Será que tinha medo de se abrir? Será que aquilo tinha o mesmo impacto e também fornecia perigo igual ao do seu nome? Será que havia algum peso maior, que ele não gostaria de dividir com mais ninguém? Bom, Luisa sabia que ele passou maus bocados durante a tal “Ultima Grande Guerra do Tempo”, e que, desde então, ele vivia se culpando por ter feito algo definitivamente errado, e também, sob como seu erro gerou um fim trágico ao seu amado povo. A menina não sabia direito como ele executara aquilo, mais tinha certeza de que, se ele escolhera não comentar, então era porque devia ter sido algo muito sério, catastrófico, e terrivelmente doloroso para ele.

Uma idéia então lhe ocorreu: Ficou preocupada com a hipótese dele acordar mais tarde e ficar irritado ao se deparar com o aposento; ou, na melhor das sugestões, talvez ele ficasse feliz por tê-lo encontrado; Vai saber se ele não tinha desistido de localizar o aposento há tempos? Afinal, a TARDIS às vezes aprecia um labirinto... Talvez ele também tivesse problemas para diferenciar os corredores e as portas.

De qualquer forma, já estava ficando tarde e Luisa precisava voltar à sala de controles para ficar com Melissa. Decidindo que o amigo definitivamente estava seguro ali, ela então se despediu em silêncio e foi andando nas pontas dos pés até a porta.

Ao fechar a maçaneta e dar de cara novamente com o extenso corredor do lado de fora, eis que veio a descobrir que estava com problemas.

—Ai não... Por onde foi que eu vim mesmo? –gemeu, analisando todos os caminho que o corredor levava. –Droga! Pra que lado fica a sala de controles?

Pensou muito no que devia fazer. Várias vezes sentiu o impulso de sair correndo e vasculhar os corredores na marra, até encontrar alguma coisa; outras vezes cogitou sentar e esperar por ajuda (Melissa viria procurá-la cedo ou tarde), ou esperar até que o Doutor acordasse. Mas isso poderia levar horas, e seu nível de paciência não estava dos melhores naquele dia.

Pôs a cachola para funcionar: o que faria? Precisava tomar alguma iniciativa, nem que fosse tosca.

—Certo! –chiou, farta daquela indecisão boba. -Eu vou explorar. –e começou a caminhar, parando de chofre logo em seguida. –Espera! Preciso de uma garantia. Se eu sair andando por aí a torto e a direito, posso me perder ainda mais e talvez nunca volte a encontrar o Doutor ou seu quarto de novo. Preciso dar um jeito de usar a porta do quarto dele como ponto de referência: se não encontrar o caminho de volta à sala de controles, pelo menos poderei retornar ao ponto de partida e repensar um novo plano. –e começou a pensar. –Ah! Já sei! Vou marcar o caminho com alguma coisa para poder me localizar. Mas o que poderia ser? –e teve a brilhante idéia de revirar a bolsinha rosa. Quem sabe ela poderia portar algo realmente útil? Empolgada, ela praticamente vibrou quando puxou para fora um rolo inteiro de barbante, muito comprido. –YES! Agora sim!

Prática, ela amarrou uma das pontas na maçaneta da porta do quarto do Doutor e, foi desenrolando-o gradativamente, conforme adiantava-se pelos corredores escolhidos a olho.

—Quem diria! Parece que aquela aula de mitologia, da 5ª série, sobre “Perceu e o Minotauro” veio mesmo bem a calhar...

Passou bastante tempo desde que começara com aquela busca e não descobrira nada até então. Chegou a abrir algumas portas para ver se estava chegando perto da sala de controles, mas como nenhuma delas revelava o interior da cozinha ou da Sala de TV, a garota foi ficando desmotivada. Cada vez mais salas escuras com tranqueiras acumuladas iam surgindo; de vez em quando, uma sauna, oficina ou pista de boliche apareciam para constar presença. A garota podia imaginar que aquele lugar fosse parecido com um labirinto, mas também nem tanto!

Luisa tinha a constante impressão de estar sempre andando em círculos, mas ela nunca se deparava com a outra ponta do barbante esticado, mostrando que já havia percorrido aquela direção; o que era facilmente interpretado como uma prova de que nunca havia passado por ali antes. Os corredores eram como o labirinto do conto mitológico, e Luisa, como sua prisioneira.

De tanto que vagou, começou a ter divagações estranhas. Em uma delas, chegou a imaginar se, de fato, não haveria uma criatura horripilante tomando conta do labirinto de corredores da TARDIS. Talvez não um Minotauro para ser exato, mas vindo do Doutor, Luisa podia esperar qualquer coisa... Até mesmo que ele não soubesse da existência da besta em sua nave. O que, julgando pela falta de atenção do rapaz, era bem possível. Sim. Porque, se ela ficasse bem quietinha enquanto caminhasse, poderia jurar conseguir distinguir alguns ruídos esquisitos e medonhos, ecoando pelas extensões dos corredores, que poderiam muito bem pertencer a um monstro selvagem e feioso.

Bem, talvez estivesse exagerando... Era ainda mais provável que tudo aquilo fosse fruto de sua imaginação fértil e assustada. Ou talvez não. Afinal, contanto que ela não desse de cara com a aberração em pessoa, estaria tudo bem.

Sendo assim, seguiu com seu trajeto, até que foi surpreendida por quem menos esperava: o barbante chegara ao fim. Insistente, ainda puxou-o algumas vezes, na intenção de tentar esticá-lo um pouco mais, mas como ele era um barbante “e não um elástico”, acabou desistindo. Fitando ambas as extremidades do mesmo corredor (lado com barbante e lado sem) a garota acabou por morder o lábio, indecisa: deveria prosseguir? Deveria retornar? Não contava com mais essa agora, com que esquentar a cabeça...

—Espera aí... –intrigada, ela largou o barbante no chão e, só por um momento, resolveu distribuir mais alguns passos na direção ainda não explorada, com os olhos semi-cerrados. Sabe se lá por qual motivo, a extensão do corredor estava mal iluminada, ao passo que ao se adiantar rumo a ela, a imagem foi ganhando novo foco e a garota ficou pasma ao contemplá-la mais de perto. –Puxa... Que engraçado. Esse corredor termina sem saída... –então aproximou-se mais e mais do fundo, até dar de cara com uma única porta, bem de frente para ela. –Estranho... É a segunda porta que consegue minha atenção exclusiva hoje. –e, cautelosamente, encostou o ouvido na madeira, tentando escutar algo do outro lado. -O que será que tem aí?

Naquele instante, acabou recuando de susto. Os motores da TARDIS fizeram um barulho inesperado, que ecoou por todas as suas entranhas, de modo a pegá-la de surpresa, e fazendo com que a garota se sobressaltasse. Luisa esperou um instante até que julgasse ser seguro tornar a respirar fundo, então olhou em geral para a TARDIS, ao seu redor.

—Não faça isso de novo... Você quase me matou de susto! –reclamou Luisa, sorrindo logo depois. Tornou a olhar para a porta, desta vez com significância, então encarou o corredor de novo, com a mesma sensação. –TARDIS...? Foi você que me trouxe até aqui?

Não houve resposta. De nenhum tipo. O ruído não tornou a acontecer e Luisa ficou na mesma. Porém, sua curiosidade não permitiria deixá-la desistir.

—Eu devo entrar aí? O que tem atrás dessa porta?

A garota quase congelou no momento seguinte, pois a maçaneta girou sozinha e a porta destrancou sem mais nem menos. Poderia ter saído correndo, em pânico, mas pensou melhor e achou que aquele poderia ser um sinal direto da caixa azul para ela. Sem pensar muito nisso, foi logo agarrando a maçaneta e tratou de lançar mais um olhar maroto à estrutura da máquina do tempo, antes de adentrar de vez no novo espaço.

A porta rangeu ao ser empurrada. Era muito antiga, de uma madeira escura e pesada. De início, não deu para ver nada do lado de dentro. Luisa ficou em silêncio, procurando algum tipo de interruptor. Tateou a parede em vão, sem encontrar nada que estivesse ao alcance de um clique. Acabou por dar um passo à frente assim mesmo e, curiosamente, várias luzes se acenderam no teto, uma depois de outra, a partir de sensores que detectaram a presença de alguém no ambiente.

Uau!—ela embasbacou-se ao deparar-se com uma enorme... Não, enorme é pouco: uma GIGANTESCA biblioteca de vários andares e níveis acima da parte térrea, onde a menina se encontrava. –Caramba... Isto é... INCRÍVEL!

A garota caminhando encantada, sem saber para que lado olhar primeiro. Era simplesmente lindo o designe daquele lugar: havia estantes muito altas, à direita e à sua esquerda, repletas de centenas de livros, frascos e objetos esquisitos em geral, que Luisa nem podia imaginar para que serviam; À sua frente, (completamente diferente do piso encerado das laterais) uma passarela de tacos erguia-se entre as fileiras de estantes, guiando a menina pelos arquivos cuidadosamente armazenados, até a parte central, onde os tacos de madeira se perdiam em um circulo gigantesco, bem no centro da parte térrea da biblioteca. Luisa olhou para cima e deparou-se com um lindo lustre de cristal, iluminando aquela área toda. Olhou para os lados e achou graça no formato compacto das estantes que rondavam o circulo central; comicamente, as estantes laterais pareciam preferir esmagar-se contra a parede, do que se arriscar “pisar” no circulo de tacos. Ao ultrapassar o belo piso circular, as estantes prosseguiam de modo crescente, até adquirirem sua largura habitual e continuarem a aparecerem em mais alguns metros adiante. Ao continuar seguindo em frente, a menina olhou para cima, maravilhada, fitando uma passarela que unia duas extremidades que compunham um pedaço do andar de cima. Mais pra adiante, no segundo andar, havia algo parecido com uma sacada, repleta de grades de pedra, onde a pessoa poderia se apoiar tranqüilamente e olhar para os andares de baixo... E talvez, meditar.

Depois de observar a estética geral do lugar, e de perder a conta com tantas estantes e andares diferentes, ela se concentrou em tentar focar a atenção nos objetos das prateleiras dispersas nas proximidades. Nelas, havia baús, cofres, arcas, e até mesmo geringonças protegidas por redomas de vidro e acrílico. As fileiras eram catalogadas de várias maneiras diferentes. Algumas que Luisa leu no índice foram: o básico “ordem alfabética”, “simétrica de Skaro”, por “escala de periculosidade”, por “danos causados por diabretes atrevidos”, “presentes ganhos por celebridades históricas”, “colecionáveis tridimensionais”; “lembranças líquidas”; “Enciclopédias Gallifreyanas”; “títulos abarrotados” (que de fato pertencia a uma prateleira toda bagunçada); e “coisas esquisitas que vale a pena entulhar num sótão, só porque é legal”; entre outras centenas de títulos.

Tinha tanta coisa para olhar, que a garota ficava até zonza. Foi então que, num dos corredores entre as estantes, Luisa avistou um altar com um único livro fechado em cima, com a capa iluminada por uma luz de leitura, logo ao lado. Avançou por aquela cessão, observando o volume grosso, posto em destaque. Inclinou-se e leu o título: Era justamente sobre a Guerra do Tempo. Arregalou os olhos meramente. Tinha tantas coisas que gostaria de perguntar ao Doutor sobre aquela época, mas não tinha coragem de interrogá-lo. Será que aquela era sua chance de descobrir tudo o que ele vinha querendo manter em segredo?

Correu o dedo pela capa vermelha e levemente deteriorada. Deveria fuçar o livro? O Doutor ficaria bravo com ela por conta disso? Estava decidindo o que seria melhor fazer, quando percebeu um reflexo estranho no teto e franzindo a testa. Sua atenção foi tomada de imediato por ele; Não só por ser um reflexo pálido e ofuscante no meio de uma biblioteca escura, mas também por ele tremeluzir no teto. O efeito era parecido com o de uma luz refletida na água corrente, ou pelo menos, com alguma superfície molhada sendo chacoalhada. Luisa engoliu em seco: teria mais alguém ali com ela? Talvez um “guardião dos arquivos proibidos”? Aquela biblioteca era proibida? Porque o Doutor nunca mencionara nada sobre ela?

Antes mesmo que pudesse tomar qualquer atitude sensata, foi atraída pelo mistério em tudo aquilo. Deixou o livro pra trás, desviando das estantes seguintes, sempre seguindo o reflexo cintilante e tremeluzente no teto. Foi parar no extremo fundo da biblioteca. Faltava ultrapassar só mais duas estantes agora. Estava a caminho quando inesperadamente parou, observando alguma coisa numa prateleira exatamente na altura de seus olhos. Piscou algumas vezes, com dificuldade para ver. Por mais que a biblioteca contasse com um lustre gigante e muitas outras lâmpadas dispersas pelo ambiente, a potência da iluminação ainda era demasiado fraca para se enxergar qualquer coisa à distancia. Movida pela curiosidade, ela avançou pelo corredorsinho entre as prateleiras, com a mão estendida. Tocou uma superfície de madeira do tamanho de um caixote, só que muito mais reforçado. Era um berço —sim, um pequeno berço de madeira. Dentro, na parte superior, havia uma espécie de móbile pendurado, com enfeites de estrelas, planetas e luas, de madeira rústica, na cor dourada. Na lateral, mais uma remeça de símbolos esquisitos pintados, tão indecifráveis quanto os da cama do Doutor. Era muito antigo, mas ainda sim, tinha um ar extremamente familiar. Não entendeu exatamente o porque, mas Luisa acabou por sorrir, ao entrar em contato com o berço. Será que ele pertencera ao Doutor?

Distraidamente, foi apoiar a mão livre na prateleira, e sentiu seu dedo mindinho roçar em alguma coisa. Olhou para o lado e percebeu que havia um monte de outras coisas interessantes espalhadas ao seu redor. Mais uma vez, impulsionada pela curiosidade, ela deixou o adorável berço para trás e passou a dar uma olhadinha no restante dos objetos. Havia ferramentas, pecinhas engraçadas, muitos cabos, até mesmo algumas alavancas quebradas, dentro de um porta-tranqueiras.

Puxa, o Doutor deve ter ficado uma arara nesse dia...” –pensou ela. “Imagine, só: quebrar as alavancas da TARDIS? Não queria estar na pele de quem fez isso...”

Mais também havia coisas comuns, como um bule de chá, um rádio walk talk e uma colher dourada, posta dentro de um estojo de acrílico. Luisa ficou imaginando por qual motivo uma colher mereceria tanta proteção. Mas acabou deixando aquilo passar; Ainda havia muitas outras coisas para se bisbilho... Digo, observar. Sucessivamente, entrou no corredor seguinte e observou as novas prateleiras, sem tocar em nada. Desta vez, deparou-se com chaves de fenda sônicas antigas, interruptores quebrados, uma ampulheta dourada com pedrinhas azuis dentro –pareciam ser safiras; livros, livros e mais livros; um baú cheio de grampos que assemelhavam-se com insetos, um aspirador de pó enferrujado, meia dúzia de botões e um guidão estragado. Nada de anormal, para os parâmetros dele.

Achando tudo aquilo muito interessante, Luisa olhou através da prateleira: Nem se dera conta, mas aquela era a ultima estante do andar térreo da biblioteca, o que automaticamente significava que depois dela, só haveria parede, e algumas caixas empilhadas, talvez (o tipo de coisa que deixariam nos fundos de uma biblioteca). Contudo, tornou a olhar espontaneamente para cima: e lá estava mais uma vez o tal reflexo, ainda tremeluzente. Notou que ele estava vindo de trás daquela mesma estante e, a partir disso, resolveu dar a volta nela, conferindo de uma vez por todas, o que estaria causando aquilo.

Chegou do outro lado esperando encontrar qualquer coisa, menos uma PISCINA.

—O quê? –franziu o cenho. Aquilo não podia ser real... O que uma piscina estaria fazendo dentro de uma biblioteca? –Nossa, isso é tão... -Luisa esfregou os olhos. Pensou que estivesse delirando. –Estranho.

Sem entender exatamente o porque, teve a súbita reação de se agachar para observar sua imagem refletida no espelho d’água. Sentiu-se atraída pela água de uma forma inexplicável, o que era bizarro, porque, em geral, Luisa nunca se sentia muito a vontade perto de piscinas. Era uma inversão de sentimentos: normalmente, ela procuraria ficar o mais longe possível das bordas, mas hoje, seus olhos estavam vidrados na água, ao mesmo tempo que suas mãos estendia-se para tocar a superfície... Era mesmo estranho o poder que aquilo tinha sobre ela.

—NOSSA! QUE MANEIRO: UMA PISCINA NA BIBLIOTECA! –gritou, exageradamente, a voz de Melissa. Luisa levou um susto tão grande que quase caiu dentro da água.

—Méli! –gemeu, indignada. –Você quase me matou de susto sua louca! Nunca mais chegue de fininho quando eu estiver próxima de uma piscina. Por Deus! Eu quase caí...

—Calma amiga –Melissa ajudou-a a se levantar. –Relaxa que eu peço desculpas. Não precisa ficar nervosa...

Luisa esfregou a cabeça, como se sentisse que alguma coisa não estava muito bem lá dentro.

—Não é isso –ela pressionou forte as pálpebras, para depois abri-las. –É que eu acabei de sentir minha vista embaralhar... Por um instante, me senti mal.

—Não se grila –Melissa disse, colocando as costas da mão contra a testa da amiga. –Você está fresca. Não deve ter sido nada grave.

—Assim espero –Luisa suspirou, tornando a fitar Melissa, agora com mais atenção. –Ei, como você chegou aqui?

Ela deu de ombros.

—Sei lá. Eu só segui um barbante engraçado que encontrei no corredor.

—Ah –Luisa deu risada. –Então você o achou? Fui eu que deixei o barbante.

—É sério?

—É. Eu meio que me perdi e acabei tendo que marcar o caminho, para não me perder ainda mais.

—E o Doutor? Ele está com você?

—Não. Deixe-o dormindo em seu quarto. Foi depois disso que me perdi.

—Ué, Ele tem um quarto?

—Foi exatamente o que eu me perguntei quando vi aquele lugar –admitiu Luisa. –É estranho. Creio que só tenha conseguido encontrar aquele aposento por intermédio da TARDIS... Assim, como a essa biblioteca. Não sei exatamente o porquê, mas tenho impressão de que ela está querendo me dizer alguma coisa...

—Ah, disso você pode desconfiar! Em qualquer outra época, eu poderia até te chamar de louca por estar “ouvindo e falando com caixas azuis”, mas depois de tudo o que passamos no Estrela Guia e, ainda por cima, de termos conhecido a TARDIS em sua forma humana; Atualmente, não duvido mais de nada.

Luisa franziu o cenho por um momento. Estivera prestando atenção no que amiga dissera, mas seus olhos se perderam na prateleira mais alta da estante mais próxima, às costas de Melissa.

—Mais o que é aquilo? –indagou Luisa, semi-cerrando os olhos, e apontando para além dos ombros de Melissa. –Me diz que não é o que eu estou pensando...

A loira virou o pescoço, crispando o nariz de imediato.

Eca, que nojo! É uma mão boiando em um líquido nojento dentro de um pote de acrílico... —Melissa fez uma careta repugnante. –Argh! Que mau gosto! O Doutor tem cada idéia pra decoração, que eu vou te contar...

Porém, não houve mais tempo para conversar, pois a TARDIS (que estava sendo guiada pelo piloto automático) adentrou em campo aberto no espaço. Aquilo, em teoria, deveria simbolizar que a viagem seria calma e tranqüila, pelo menos pelos próximos cem anos luz. Porém, como diria o próprio Doutor: “campos abertos são piores do que estar envolto por uma centena de meteoritos: dos meteoritos você ainda tem uma grande chance de escapar, mas das imprevisibilidades que lhe esperam ao adentrar em um campo aberto no espaço (ou seja: o vácuo total, sem qualquer sinal de vida ou matéria, por perto), é praticamente impossível sair ileso”. Isso porque, na prática, o Doutor sabia que campos abertos no espaço, “são como um prato cheio” para outras criaturas mal-intencionadas localizarem sua nave sem problema algum, afinal, não há meteoritos ou nebulosas para ajudá-los a se camuflar.

Assim –na versão deles (pulando toda essa explicação)– numa fração de segundos, a TARDIS foi atingida por uma energia desconhecida, que a fez rodopiar feito um pião pelo vácuo escuro e silencioso do espaço sideral. Por isso mesmo, a conversa de Luisa e Melissa foi interrompida. A nave deu uma guinada tão forte, que seus rodopios fizeram as garotas perderem o equilíbrio. Melissa agarrou-se na lateral da primeira estante, aparentemente fixa, que conseguiu alcançar, enquanto Luisa não teve a mesma sorte: ainda estava de costas para a piscina antes da TARDIS perder a direção, e quando o baque ocorreu, a garota escorregou para trás e caiu com tudo na água.

Naquele segundo, o Doutor abriu os olhos em seu quarto. Saltou da cama de uma vez só e saiu correndo para fora do aposento, sem nem ao menos notá-lo. Ao chegar do lado de fora, tropeçou no barbante de Luisa e praguejou deveras por causa disso. Só então, arregalou os olhos ao fitar o barbante e começou a seguí-lo, transtornado.

De volta à biblioteca, a situação não estava melhor. Bem, ao menos o Doutor estava à caminho.

Ah, não vai dar!—gemia Luisa, batendo as mãos na água, assustada, após quase afogar-se diversas vezes. –Eu não consigo nadar! SOCORRO!

—LUISA!!! –desesperada, Melissa largou a estante e saiu correndo em auxilio da amiga. –Vem rápido! Eu seguro a sua mão! Me dá a sua mão!

—Não posso! Não consigo me aproximar da borda! E se parar de me debater, eu afundo! –disse ela, chorosa.

—Ora, vamos lá! Faça um esforço! Eu aposto que essa piscina não deve ser tão funda assim... –insistiu Melissa, desdobrando-se para tentar alcançá-la.

Mesmo atônita, Luisa esticou os pés, tentando ver se conseguia tocar o fundo da piscina. Não conseguiu.

—Não posso arriscar! Meus pés não tocam o fundo... –arfou, exasperada. -E se eu afundar? MÉLI!!! EU NÃO QUERO MORRER! Estou apavorada... Muito apavorada! Não sei se vou conseguir sair dessa...

Não diga palavras negativas agora! Só vai piorar as coisas!—guinchou Melissa, começando a suar. Não podia se esticar mais. Se o fizesse, provavelmente acabaria caindo na piscina também.

Como se as estantes tivessem ouvido o comentário de Melissa sobre “palavras negativas”, alguns objetos começaram a cair das prateleiras, e quando elas deram por si: estavam sendo bombardeadas de todas as direções, pelas mais diversas coisas –alguns chegavam até mesmo a despencar dentro da piscina; enquanto outros vinham como bombas, caindo do céu.

—Aaaaah! Méli! –Luisa olhou para cima e se afligiu ao ver o tal pote com a mão dentro começar a balançar na prateleira. –Aquele negócio vai cair a qualquer momento! Saia daí!!!

E eu vou pra onde? Não tem onde se esconder! –retorquiu a outra, espontânea.

—Garotas? Vocês estão aqui? -o Doutor chegou no ambiente. O pote então perdeu o equilíbrio e despencou lá de cima. Luisa e Melissa gritaram. O rapaz correu e conseguiu segurá-lo no ar, antes que ele se espatifasse no chão. Ao tê-lo nos braços, deu um beijo no acrílico e enfiou o pote dentro de um baú pesado, que não seria capaz de se voltar contra eles depois. Então, dirigiu-se para a piscina com pressa, primeiro tirando Melissa de perto da beirada, e depois, partindo para o mais difícil: tirar Luisa da água. Mesmo com tantas coisas ocorrendo ao mesmo tempo, ele foi capaz de bolar um plano: amarrou uma corrente nos suspensórios; passou a corrente ao redor do pé da estante mais próxima e ainda deu o que restou da ponta para Melissa segurar, em caso de aquilo não bastar. Então, deitou-se de bruços, próximo á borda e estendeu as mãos, agarrando rapidamente os braços de Luisa, que se debatiam freneticamente. Ela estivera tão assustada que nem notara a presença do amigo no local.

—DOUTOR! –gritou ela, a plenos pulmões.

—Que confusão, hein?! –ele brincou, meio tenso. –Vamos... Eu te peguei! Não precisa ficar tremendo desse jeito...

Luisa continuou chorando e tremendo demais.

—Não consigo deixar de tremer –soluçou. –Não gosto de piscinas... Definitivamente as odeio!

—Não se exalte. Ficar de mal com a piscina não vai ajudar agora...

—Não estou de mal com a sua piscina. O negócio é pessoal! Tenho trauma de piscinas em geral... –anunciou Luisa, deixando-o pasmo.

—É sério? –ele ergueu as sobrancelhas, ficando por um momento, intrigado. Mas então, um novo problema surgiu: a estante, até então fixa, onde ele havia amarrado a corrente, começou a balançar. E Melissa deu um grito, horrorizada.

—DOUTOR, RÁPIDO! A ESTANTE VAI CAIR!!!

—Vem Luisa! Fica comigo! A gente vai conseguir... –então ele foi puxando-a para mais perto, até que finalmente conseguiu envolvê-la em seus braços e, com precisão, puxou-a para fora d’água.

Contudo, a força que usou para deslocá-la de um terreno baixo, para o piso normal, mexeu ainda mais com a estrutura da estante que, pouco depois, desabou com tudo na direção deles.

Num movimento rápido, o Doutor pegou Luisa nos braços e jogou-se com ela para fora do caminho, salvando-se de serem massacrados. A estante fez um barulho terrível ao atingir o chão e Melissa gritou, abaixando-se, amedrontada. Porém, abriu os olhos nos segundos seguintes e vislumbrou o Doutor e Luisa, vivos, do outro lado da estante. Tremula de susto, ela acenou para o Doutor, que retribuiu o gesto, sinalizando para ela se aproximar. Tomando cuidado para não tropeçar em nenhum dos milhares de objetos espalhados, ela deu a volta ao redor da estante, estatelada contra o piso, até vir de encontro com os dois amigos, encolhidos, e ser acolhida pelo abraço consolável do Doutor.

Com a cabeça em seu ombro, e o corpo envolto por seu braço direito, Melissa ergueu o olhar para o rapaz e perguntou:

—O que está fazendo isso?

—Eu não sei –ele respondeu. O olhar visivelmente preocupado. –Queria muito saber.

Luisa estremeceu do seu outro lado.

—Não gosto disso... –gemeu, afundando o rosto do lado esquerdo do pescoço do rapaz. –É apavorante!

—Fique calma. Vocês duas. Eu irei protegê-las... Não importa o que aconteça. –e firmou ainda mais os braços, ao redor das duas.

Por toda a biblioteca, e também, muito provavelmente, pelo resto da TARDIS, coisas continuavam desabando de todos os lados. A nave estava descontrolada. Continuava girando e dando guinadas enlouquecidamente pelo espaço. A situação ficava cada vez mais caótica, quando uma luz inesperada surgiu no ar, exatamente em cima da piscina, e uma criatura, muito parecia com uma múmia surgiu, flutuando.

Era o Oráculo de Delfos. Sua velha amiga traiçoeira da Realidade Suspensa no Tempo e Espaço, do Planeta dos Gregipciomanos.

Diante da surpresa do trio, a múmia ergueu a cabeça velha e poeirenta.

Finalmente, viemos a nos encontrar. Figurinhas difíceis, vocês são de achar... Mesmo para um Oráculo, como eu, não foi nada fácil de lhes localizar!

Melissa trocou olhares confusos com o Doutor.

—Não sabe ler pensamentos, profecias e todas essas coisas? –sondou.

Precisamente. –afirmou o Oráculo, com um mero aceno de cabeça.

—Então como é que pode não saber onde nos encontrar?

Vejo que andaram ocupados—desconversou ela, fazendo Melissa revirar os olhos. –Estiveram realizando as profecias uma a uma... Mas ainda lhe falta muito pela frente...

—Espero que sim –Luisa falou, pela primeira vez desde o incidente com a piscina. –Acho que o fim das profecias significaria também o nosso fim e, aparentemente, não me sinto muito animada quanto a isso...

O Oráculo inclinou-se para ela.

Você tem a visão. –anunciou.

—Hã... Obrigada. –Luisa imaginou que aquilo fosse um elogio à sua rápida dedução e grande percepção das coisas, mas o Oráculo ainda tinha mais cartas na manga.

Você tem a visão. Você enxerga além do que os outros jamais conseguirão... –nessa parte, Luisa começou a ficar meio insegura. –Oh, sim! Muitas batalhas ainda terá de enfrentar...

—Espera aí: vai nos dar outra profecia? Mais nós nem terminamos de cumprir a última!—protestou Melissa.

O Oráculo parou por um instante. Pareceu ficar meio aborrecida com a interrupção antecipada. Luisa, por outro lado, aproveitou a oportunidade para respirar fundo.

—Pois bem: já que você gosta tanto de falar, porque não refresca nossa memória? –propôs o Doutor. –Já que está aqui, fale tudo de novo! Queremos saber até onde já fomos na profecia original...

—É. Já que alguém não deixou a gente anotar o “passo a passo” da última vez... –resmungou Melissa.

O Oráculo se concentrou, ignorando seu comentário. Antes mesmo que ela pudesse começar a falar, Luisa apanhou disfarçadamente seu celular e colocou para gravar, no modo “microfone”. Desta vez, certificaria-se de que eles não perderiam uma só palavra do que o futuro ainda lhes aguardava.

Os ladrilhos amarelos no planeta dos sonhos... –relembrou o Oráculo, com a voz novamente mais carregada que antes. –O universo se agita ao norte... Uma aliança causará desequilíbrio ao cosmos, mas só beneficiará aos que tiverem sorte. Muito em breve, o universo estará em perigo... Para seus habitantes não mais haverá abrigo. Os sentidos serão despertos e grandes revelações serão feitas... Apesar de ainda estiverem apenas á espreita. Os grandes doze se manifestarão... E o mar imponente reconhecerá seu descendente com precisão. Os guerreiros da floresta branca serão convocados... Juntamente aos Humanóides Para-normais que serão recrutados... A criança do Vórtice será amaldiçoada e terá seu destino traçado por um feiticeiro... O fim do universo causará devastação á alguns, enquanto trará a perdição á um velho guerreiro... A alma da TARDISES será drenada, mas desvirtuada será apenas a pobre menina arruivada... Essa é a Era do Tormento... A fauna vem á bordo do Expresso que desafia o tempo... A gêmea dará seu ultimo suspiro de existência... A rivalidade às vezes cria desavença. Cinco almas cantantes virão ao destemido grupo se juntar... Enquanto tantas outras apenas irão lhes ensinar... Um homem bom lutará pela segurança de sua agregada... E não descansará enquanto não encontrar a esposa raptada. O pesadelo da criança só está começando... O reencontro tão desejado já está se aproximando... As portas deverão permanecer sempre fechadas, mas uma alma mortal terá o descuido de escancará-las... As crianças do tempo terão seus caminhos entrelaçados... Muitas vidas dependerão da determinação de poucos rastreados... A garota prometida não deve confiar na palha... O fim se aproxima.

Desta vez o trio apenas se entreolhou. Luisa guardou o celular no bolso e tirou um bloquinho da Bolsa Que Tudo Tem, começando a rabiscar algumas anotações de cabeça.

—Bem, vejamos: Eu reconheci as partes que falam sobre “o fim do universo causar perdição a um velho guerreiro”. É você, não é, Doutor? Nós acabamos de vir do Shopping no fim do Universo... E também, “A alma da TARDISES será drenada... e... Alguma coisa sobre uma menina arruivada”. É de Sofia que o Oráculo se referia, certo? À sua TARDIS, Sofia e ao Estrela Guia.

—Na mosca! –o Doutor deu um soquinho no ar. –Oh... Isso foi muito bom! Inteligentíssimo Luisa Parkinson! Brilhante! –ele sorriu para ela. -Agora, vejamos: Eu ouvi alguma coisa sobre “tormento” e também sobre “fauna a bordo de um expresso”. –ele deu de ombros. –Não sei. Para o meu entendimento, isso faz alusão direta à nossa pequena estadia na Prisão do Tormento e à nossa viagem à bordo do Expresso Oriente com plantas carnívoras assassinas.

—É! Pode crer! –concordou Melissa, entusiasmada. –Também tem aquelas partes que falam sobre “a gêmea”, “rivalidade” e “esposa raptada”. Pelo que me lembro, a única gêmea que conhecemos, foi a não mais existente irmã da Terra, “Theia”; Houve rivalidade entre você e a Luisa naquela passagem com os Hipnóts, certo? E a “esposa raptada” não seria a mulher de John Smith?

O rapaz piscou para ela, pasmo.

—Puxa, Melissa! Não sabia que você era tão observadora... –disse o Doutor, impressionado. Melissa sorriu torto.

Pelo jeito não sou a única aqui que avalia mal as pessoas... –disse ela, dando-lhe uma cutucadinha boba, que o fez rir.

Luisa continuava rabiscando coisas em seu bloquinho: porém, mais nada parecia fazer sentido até então.

—Bem... É só isso por enquanto. –ela concluiu, pondo o lápis atrás da orelha. –Nada mais a acrescentar.

Sim, há uma ultima coisa a relatar... —ponderou o Oráculo, olhando bem fundo nos olhos de Luisa, de modo crítico e penetrante. –E é exatamente com você que eu devo falar.

Luisa estremeceu de leve. Guardou o bloquinho dentro da bolsa rosa.

—O que é? –perguntou, tentando não transparecer o receio que lhe percorria o corpo, dos pés à cabeça.

O Oráculo estreitou os olhos.

Você tem o dom da visão. Não é simplesmente sábia ou esperta na ocasião. Você enxerga além do que todo mundo vê... Mas quase nada eles podem supor sobre você. Não é uma troca muito justa, na real. Mas o dom de Visualizadora não poderá renegar, no final. Seu medo de água logo terá explicação... Você nem imagina o que está por trás dessa confusão. Um homem distante. Tão longe ele está... Mas ela ainda é capaz de sentir, à noite, um beijo na testa lhe dar. Um menino e uma menina... Ambos cresceram separados, contudo, seu destino estará entrelaçado... Eu vejo algo divino, eu vejo a escuridão, eu vejo o desespero do seu pobre coração! Eu enxergo além da imagem, de um tridente anunciar, quando a Filha das Águas, finalmente despertar...

—Ai... -Luisa gemeu de repente, dobrando o estômago. Sentiu uma pontada muito forte se manifestar. O Doutor segurou-a pelos ombros, preocupado.

O que você fez!?—gritou para o Oráculo. –O que há com ela? Reverta isso! REVERTA AGORA!

Não será possível—a múmia negou, séria. –Ninguém pode interferir nas questões das profecias; Nenhum de vocês deve atrapalhar o curso do universo... A garota deve passar por isso. Eu vi. É assim que tem que ser. O Processo de Reconhecimento Começou! Luisa Parkinson nunca mais será a mesma!

O Doutor trincou o maxilar, tirando a chave sônica do bolso e apontando-a para a piscina, embaixo da imagem flutuante do Oráculo.

Vá pro inferno!—praguejou ele, fazendo a água subir e atingir a imagem da múmia, desmaterializando-a de dentro da TARDIS. Claro que o Oráculo fora mais ágil e conseguira escapar ileso antes de ficar todo ensopado, mas o Doutor deu-se por satisfeito só de conseguir tirá-lo de dentro de sua nave. –Hum! Sujeitinha inconveniente! Como se não bastasse entrar na minha TARDIS sem ser convidada e causar toda essa bagunça...

Doutor! —Melissa cutucou-o ainda em tempo de apanhar Luisa no ar. –Meu Deus, ela desmaiou! E agora?—gemeu Melissa, preocupada. –Ai... Como poderemos ajudar? Nem sabemos o que o Oráculo quis dizer com todas aquelas coisas...

O Doutor perdeu-se em pensamentos por um minuto. Não era engenhoso tentar adivinhar o significado da profecia particular de Luisa. Ao invés disso, concentrou-se no problema atual, pensando em qual seria o melhor lugar para levá-la agora, naquelas condições, com a intenção de ajudá-la a se recuperar. Quando voltou à realidade, já estava com uma boa idéia em mente. Com destreza, ele ajeitou-a em seu colo e começou a caminhar pelos destroços da biblioteca, até a saída do salão.

Doutor! O que vai fazer?—Melissa insistiu, seguindo-o, atônita.

—Acho que já sei para onde devemos levá-la. –anunciou, misterioso.


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Notas finais do capítulo

E a velha e caótica confusão está de volta... Bom, sempre se está sujeito a passar apuros viajando pelo tempo e espaço, e depois de uma ótima noite de Natal, já era de se esperar que as coisas não continuassem calmas por muito mais tempo.

Nas palavras de Joey Tribbiani (Friends), diretamente para o Oráculo de Delfos: "Va Fa Napoli!" kkkkk

Iiiih, agora a múmia velha levantou a lebre... Que segredos será que a Lulu esconde? Algum palpite?

Ah é, me empolguei tanto que quase esqueci de dizer: a biblioteca descrita é a mesma que o 11th mencionava para a Amy, que por coincidência também é a mesma biblioteca que Clara Oswald visitará só de passagem na série 7 (futuramente, após a temporada da Luisa, no caso) no episódio "Viagem ao Centro da TARDIS".

Bom, o próximo capitulo será postado logo mais! Fiquem atentos!!

Beijos pra todos vocês!! ;)



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