Sangue, Suor, Lágrimas e Estilhaços escrita por Blue Blur


Capítulo 28
Ser Humano


Notas iniciais do capítulo

O que faz um ser humano ser considerado um... ser humano?



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— Quantas foram nossas baixas?

Aquela foi a primeira coisa a ser dita depois da derrota terrível que os humanos sofreram na batalha do Jardim de Infância Beta. Já fazia cerca de 2 horas que o exército de Amennekht, Sebek e Rose havia fugido, e desde então só havia silêncio. A pergunta que quebrou o silêncio foi feita por Sebek, cujo tom de voz era sério e aparentemente calmo, mas ninguém precisava ser íntimo do rei de Ahkvata para saber que ele não estava conseguindo digerir aquilo.

(Um soldado de Ahkvata): Perdemos 2000 homens, dos quais metade foram mortos apenas por aquela gem que emergiu do nada. Ela também estilhaçou 80 Crystal Gems sozinha. Além disso, perdemos Menob, um dos principais guerreiros do Esquadrão Platina.

Novamente silêncio, por aproximadamente 60 segundos, então Sebek voltou a falar com calma. Ironicamente, ele conseguia ser mais intimidador falando com calma do que quando vociferava ordens.

(Sebek): Como isso aconteceu? Como o Esquadrão Platina, a elite de Ahkvata, foi derrotado tão facilmente?

(Tyris): Não tínhamos um líder para nos instruir acerca da nossa formação de batalha.

Mais 60 segundos de silêncio, talvez um pouco mais, até que Sebek resmungou algo consigo mesmo.

(Sebek): Maldito seja, Thanos. Quando você voltar, vai responder por isso.

O exército derrotado continuou sua procissão a fim de voltar ao teletransportador que os levaria de volta a Ahkvata em total silêncio. Nesse meio tempo, ninguém disse mais nada, pois o clima era de luto total.

Enquanto isso, no Jardim de Infância Beta, a situação era totalmente diferente: todas as gems estavam pulando e gritando de alegria. O clima era de festa: Esmeralda, Celestita e a gem recém-formada estavam sendo carregadas como se fossem celebridades. As guerreiras que pouco antes acreditavam que seriam derrotadas ou até estilhaçadas, agora festejavam como se não houvesse amanhã. Infelizmente, a festa acabou sendo interrompida abruptamente. Uma nave familiar pousou logo na entrada do Jardim Beta. Uma Hessonita bastante enfurecida entrou de forma enérgica no lugar, batendo os pés para enfatizar sua raiva, e gritando por um único nome:

(Hessonita): ONDE ESTÁ A CORNALINA LARANJA??? EU EXIJO QUE ELA COMPAREÇA NA MINHA PRESENÇA AGORA!!!

Cornalina se apresentou diante de Hessonita fazendo a típica continência de Homeworld: cruzando as mãos diante do peito, desenhando um losango (https://vignette.wikia.nocookie.net/aliens/images/b/b2/Homeworld_Gem_Salute.png/revision/latest?cb=20170305120709).

(Cornalina): Comandante Hessonita? O que houve?

(Hessonita, furiosa): Como assim, “o que houve”? Sua maldita traidora desbotada! Eu devia ter desconfiado disso no momento em que você levantou a voz contra mim para defender esse bando de trastes!

(Cornalina): Mas do que você está falando? Por que eu sou traidora?

Hessonita estava a ponto de explodir. Deu uma bofetada no rosto da comandante da Divisão Sigma, mas o que ela queria mesmo era sacar seu sabre e atravessar a pedra de Cornalina ali mesmo.

(Hessonita): Não me faça perguntas idiotas se preza pela sua pedra! Você estava este tempo inteiro com uma fusão no seu destacamento! Eu vi as filmagens da batalha!

(Cornalina): Espera um pouco aí, você estava filmando a gente, enquanto lutávamos contra os rebeldes? QUER DIZER QUE VOCÊ PODIA TER NOS AJUDADO ESSE TEMPO TODO, MAS PREFERIU FICAR APENAS ASSISTINDO ENQUANTO...?

A revolta dela foi interrompida por outra bofetada. Cornalina não apenas havia desafiado a autoridade de Hessonita, como também tinha uma fusão em suas fileiras. Pior: uma fusão que derrotara um dos guerreiros mais fortes da humanidade. Hessonita não podia aguentar aquilo. Ela tinha que humilhar aquela oficial rebelde diante do maior número possível de gems para que ficasse bem claro o que acontecia com quem ficava no caminho da grande Comandante Hessonita, a almirante mais prestigiada da Diamante Amarelo.

Cornalina se recusou a mostrar qualquer sinal de fraqueza. Cada bofetada era horrivelmente humilhante e parecia ofendê-la com todos os xingamentos possíveis, mas ela se recusava a deixar aquilo desestabilizá-la. Hessonita sabia que elas precisavam de ajuda, sabia que os rebeldes estavam atacando, mas se recusou a mandar qualquer tipo de ajuda para ela. Uma comandante dessa não merecia qualquer demonstração de respeito, nem mesmo de sua própria pérola.

Hessonita desviou sua atenção de Cornalina e deu uma nova ordem para as gems sob seu comando

(Hessonita): Tragam a celestita e a esmeralda da Divisão Sigma até a minha presença.

Um grupo de citrinas agarrou Celestita e Esmeralda, imobilizaram as duas e as colocaram num lugar onde todos podiam vê-las. As duas gems que antes formavam a Turmalina Paraíba agora estavam de joelhos, imobilizadas com um aparato que parecia ser uma algema de energia, que prendia seus braços e pernas.

(Hessonita): Muito bem. Agora eu ordeno que estilhacem essas duas traidoras, e que isso sirva de lição para todas vocês!

(Cornalina): Não, você não pode fazer isso!

Num impulso de raiva e indignação, Cornalina voou em cima de Hessonita, agarrando-a pela capa e até pelo cabelo. Se tinha algo que Hessonita odiava mais do que alguém contestar sua autoridade, era que alguém a tocasse sem autorização. Com movimentos rápidos e sem aviso prévio, Hessonita deu um murro no nariz de Cornalina. Depois deu um chute tão forte no peito dela que a fez bater as costas numa parede. Antes que Cornalina desse um passo para se afastar da parede, Hessonita sacou seu sabre e apontou para o rosto da oficial insurgente.

(Hessonita): Você não vai dar nem um passo! Se você não é capaz de instigar respeito e obediência às suas gems, então eu mesma farei isso, e você vai ficar aí paradinha, assistindo tudo! Se tentar interferir de alguma forma...

Hessonita terminou a frase abaixando a lâmina e apontando-a para a pedra de Cornalina, em seu umbigo. Cornalina sentiu um desconforto horrível quando sentiu a ponta da espada de Hessonita arranhando sua pedra.

Esmeralda estava extremamente assustada com tudo aquilo. Ela não queria ser estilhaçada! Não daquele jeito, não depois dela e Celestita terem se fundido de um jeito tão maravilhoso! Celestita percebeu o terror instalado no rosto de sua companheira, e tentou acalmar a pequena gem verde a todo custo. Até tentou assumir a culpa por inteiro.

(Celestita): Escutem, a culpa foi minha! Eu que agarrei ela, eu que forcei tudo! Podem me estilhaçar, mas não machuquem a...

(Hessonita): Calem a boca dessa imbecil!

Uma das citrinas sob comando de Hessonita deu um murro em Celestita para silenciá-la.

(Hessonita): Agora contemplem, todas vocês! Isso é o que acontece com quem banca a insubordinada no meu turno! As leis de Homeworld são claras: nenhuma casta pode se macular executando uma fusão com um membro de uma casta inferior, tampouco ter a ousadia de fazer este ato com um membro de uma casta superior. O ato de fundir-se é uma técnica que só deve ser executada em situações bastante específicas, seguindo regras bastante claras: apenas entre gems iguais.

Hessonita era bastante intimidadora, apenas o olhar dela era o bastante para fazer aquele enorme contingente de gems ficar em silêncio, como se tivesse medo de perder uma única palavra do discurso dela. Não só isso, como também era extremamente habilidosa: ela conseguia proferir aquele discurso intimidador e, ao mesmo tempo, apontar uma espada e ameaçar uma oficial insubordinada. Como Hessonita tinha que praticamente virar as costas para Cornalina, a fim de falar com seu público, ela usava a ponta de sua espada para cutucar ou arranhar de leve a pedra de Cornalina a cada 5 a 7 segundos, como um lembrete para mostrar o que aconteceria caso a capitã da Divisão Sigma mostrasse algum sinal de resistência.

(Hessonita): Esta celestita e esta esmeralda burlaram esta lei. Imitaram os hábitos das rebeldes, que usam fusões proibidas para se insurgirem contra a Grande Autoridade Diamante. Todas vocês são testemunhas disso, por isso elas devem ser punidas. Esta é a lei de Homeworld e deve ser aplicada, desde ao menor dos Cascalhos até à maior das Diamantes!

— Não somos testemunhas de nada!

Uma voz ecoou no meio da multidão de gems. Todas as gems olharam para quem havia dito aquilo: Larimar, que ainda carregava consigo a pedra de Ônix e as próteses dela. As gems se afastaram um pouco para que ela ficasse bem visível. Hessonita parou de apontar a espada para Cornalina e foi andando em direção à gem azul-clara, com uma cara de quem havia acabado de sujar os sapatos novos.

(Hessonita): O que foi que você disse?

(Larimar): N-Nós... n-não p-podemos ser testemunhas de nada!

(Hessonita, sacando a espada): É mesmo? Poderia me dizer por quê?

Larimar começou a tremer, sem conseguir achar palavras para justificar sua postura impulsiva. Antes que Hessonita usasse a ponta de sua espada para fustigar a joia na coxa da pequena Larimar, outra voz surgiu do grupo.

(Jade): Porque nenhuma de nós estava no lugar onde Celestita e Esmeralda supostamente se fundiram! Só o que vimos foram os humanos carregando o corpo do gigante, e logo depois ouvimos que Celestita e Esmeralda o derrotaram trabalhando juntas! Você apenas está deduzindo que elas se fundiram, mas ninguém aqui viu nada! Não pode estilhaçar duas heroínas que venceram um guerreiro-platina!

— Jade está certa, eu só vi as duas vindo, normalmente, contando que haviam derrotado o gigante.

— Ninguém aqui viu nenhuma fusão turmalina.

— Mesmo que elas tivessem se fundido, é óbvio que esta esmeralda é uma gem defeituosa. Ela teria enfraquecido a fusão e o gigante teria vencido facilmente.

— Com todo o respeito Comandante, mas de onde a senhora tirou uma ideia dessas?

Aquilo pegou Celestita de surpresa: era óbvio que Jade estava mentindo. Jade, Larimar e mais outras gems da Divisão Sigma haviam visto a fusão. Além do mais, Jade tinha rancores de Celestita desde o incidente envolvendo as duas (ver capítulo 15). Por que ela mentiria para proteger uma gem que odiava?

Hessonita também não engoliu nada daquilo. Ela tinha as gravações em sua nave, podia provar que a fusão existia e que Celestita e Esmeralda deveriam ser estilhaçadas! Nada a impedia de apresentar o caso à Diamante Amarelo!

(Hessonita): É mentira! Vocês todas estão mentindo! Eu gravei toda a batalha, eu filmei a fusão, eu filmei inclusive vocês vendo a fusão surgir! Se continuarem com essa mentira, vou levar o caso à Diamante Amarelo em pessoa, e aí todas vocês terão o mesmo destino dessas duas!

(Cornalina): Se levar o caso à Diamante Amarelo acabará mostrando uma prova contra você mesma: enquanto todas nós lutávamos para defender o Jardim de Infância do ataque das Crystal Gems, você privou nossas forças de receber reforços, o que quase nos causou uma derrota terrível! Quer mesmo que a Diamante Amarelo saiba que sua falta de proatividade quase custou um Jardim de Infância?

(Hessonita): M-Mas era você que estava no comando! Era sua tarefa mobilizar as tropas!

(Cornalina): É dever de toda oficial, inferior ou superior, mobilizar suas tropas para participar de batalhas contra as Crystal Gems! Privar deliberadamente soldados em batalha de receberem reforços é um ato que pode ser facilmente interpretado como traição!

(Hessonita): Mas eu... não, quero dizer...

(Cornalina): Agora me diga, Hessonita: O que você vai fazer com as duas gems que derrotaram o gigante do Esquadrão Platina?

Hessonita ficou em silêncio por alguns instantes e, sem conseguir pensar numa forma de sair da cilada que se metera, não teve outra escolha:

(Hessonita): Soltem essas duas imediatamente!

As duas gems que iriam ser executadas foram prontamente libertadas e se juntaram às outras companheiras de Esquadrão. Hessonita chamou suas soldadas de volta e resolveu ir embora, tentando não perder a pose.

(Hessonita, cochichando para Cornalina): Isso ainda não acabou... ouviu bem?

(Cornalina): Se realmente preza pelo andamento da causa de Homeworld e pelo seu status, é melhor que tenha acabado.

Todo mundo ficou em silêncio até ter certeza de que Hessonita realmente havia ido embora. Uma vez que tiveram a certeza absoluta, todas começaram a comemorar num volume ensurdecedor, demonstrando toda a alegria que tinham por terem passado juntas por tudo aquilo!

Mas as que estavam mais felizes eram, sem dúvidas, as gems da Divisão Sigma. Nem quando o Esquadrão Platina bateu em retirada elas se sentiram tão aliviadas do que ao ver que Hessonita não ia mais causar problemas (pelo menos por hora). As amigas de pelotão foram se reunir com Cornalina a fim de cumprimenta-la pela coragem que teve ao confrontar a superior arrogante.

(Bixbita, sorrindo): Cornalina, sua louca! Como é que você teve coragem de falar todas aquelas coisas para a Hessonita?

(Jet): Se ela não falasse, quem acabaria falando seria eu, e eu com certeza seria estilhaçada... valeu por correr esse risco por mim, Alina.

(Cornalina): Quem é “Alina”?

(Jet): É um apelido, sua boba!

(Cornalina, sorrindo): Ei Jade, já sabe como é que você deve me chamar agora, né?

Jade teve que disfarçar seu rosto que ficou subitamente corado, principalmente para que Celestita não visse, já que a gigante azul também tinha algo a dizer para Jade.

(Celestita): Jade... obrigada por ter inventado aquela mentira. Sabe, depois do que você fez ali eu só queria dizer... Desculpa. Me desculpe pelo que ocorreu no treinamento de guarda-costas. Eu poderia ter feito você ser estilhaçada naquela ocasião, e mesmo assim você voltou a se arriscar por mim. Obrigada...

(Jade, desconversando): Tá, que seja. Eu só não queria ver a Esmeralda triste, então não me entenda mal.

(Celestita): Obrigada do mesmo jeito.

Celestita sentiu a mão delicada de Esmeralda segurando sua mão, enquanto a pequena gem esverdeada estava com um olhar como se parabenizasse Celestita por ter tomado coragem para pedir desculpas pelo que ocorrera tempos atrás. Celestita não resistiu à vontade de colocar a pequena Esmeralda em seu colo e enchê-la de beijinhos. Mas obviamente ela tomou cuidado para ambas não se fundirem novamente.

Mais afastada do grupo, estava uma outra gem que havia emergido do Jardim Beta, uma citrina que, por ter saído defeituosa, era bem mais magra que uma citrina normal, ao contrário das citrinas normais, que costumavam ter um físico mais musculoso, já que serviam de soldados para as oficiais da Diamante Amarelo (https://images-wixmp-ed30a86b8c4ca887773594c2.wixmp.com/intermediary/f/4efd84e5-d08f-4320-8022-3edac1ade101/dao6i7u-866ed511-074d-4a8e-8da7-45053b113231.png/v1/fill/w_623,h_1282,strp/citrine_s_new_clothes__doodle__by_pikokko_dao6i7u-pre.png). Aquela citrina havia sido uma das participantes da batalha que ocorrera anteriormente e por pouco ela não havia sido estilhaçada. Na verdade, o único motivo dela ainda estar viva foi justamente a gem misteriosa que havia emergido nos 45 do segundo tempo e salvado não só ela, mas todas as outras, e ela queria agradecê-la por isso. Um monte de gems haviam ficado intimidadas ao ver a ferocidade daquela terráquea recém-emergida, mas aquela citrina ainda assim queria falar com ela.

A guerreira em questão estava em cima de uma das paredes do Jardim de Infância, observando concentrada, como se estivesse fazendo um trabalho de sentinela. Mesmo de costas, ela era bem intimidadora: tinha braços grossos, parecendo pilastras de ouro, com uma pintura avermelhada por cima, como se tivesse pintado com o sangue dos inimigos que atacaram o jardim de infância, tudo isso completado com os vultuosos cabelos brancos, parecendo uma enorme juba de leão. A postura daquela gem contrastava totalmente com a aparência magra e delicada de citrina, o que a deixou meio constrangida.

(Citrina, constrangida): Errr... oi? Com licença?

A gigante se virou, com uma expressão totalmente diferente da que havia mostrado no campo de batalha. Ela tinha uma feição bonita, até atraente (https://i.pinimg.com/564x/58/be/4f/58be4fc5c87f7e10be5f904030c207f9.jpg?b=t), quando não estava cerrando o cenho, urrando e jogando crystal gems para todo lado enquanto pintava as paredes com o sangue dos humanos. A pedra dela ficava localizada no lugar onde era seu nariz.

— Oi.... Vem cá, eu te conheço...?

(Citrina): Bom... não... é meio que por isso que eu queria falar com você. Sabe, quando você emergiu mais cedo, eles estavam quase me estilhaçando.

(Guerreira): Quem, as rebeldes?

(Citrina): Bom, sim, mas mais aqueles seres... terráqueos... como é mesmo o nome deles? Quando eu lembrar eu te conto. Olha, eu só queria agradecer pelo que você fez lá atrás, entende?

A guerreira deu um sorriso, visivelmente lisonjeada pelo comportamento da quartzo menor (https://images-wixmp-ed30a86b8c4ca887773594c2.wixmp.com/intermediary/f/801b64f7-b0bd-4f6a-ab95-ca8e2ba79431/da1ngmo-dd80f3c4-a5a9-4c6d-8338-6cbb75b7ab7a.jpg/v1/fill/w_751,h_1063,q_70,strp/jasper_by_roguekelsey_da1ngmo-pre.jpg).

— Ora, não seja por isso! É o meu trabalho! Nosso trabalho! A rebelião não vai se estilhaçar sozinha, né?

(Citrina, rindo): É... eu acho que não.... A propósito, como é seu nome? É que está todo mundo te chamando de “a Nova Campeã da Diamante Rosa que Botou os Platinas Para Correr”, mas eu acho esse nome muito longo. Não tem um mais curtinho? Se rolar apelido, posso te chamar de “A Campeã”.

A quartzo gigante começou a rir mais ainda e deu um tapa amigável na costa da Citrina, um tapa que quase a desconjuntou todinha.

— É, eu gosto de “A Campeã”, mas acho que outras oficiais iriam ficar com inveja, então pode me chamar só de Jasper mesmo.

(Citrina): Bom, “Jasper”, você pode me chamar de Citrina então.

(Jasper): Sabe Citrina, você é a primeira gem que me agradece por fazer o meu trabalho direito... na verdade você é meio que a primeira gem que fala comigo hoje.

(Citrina): Bom, sabe o que é? É que tá todo mundo lá embaixo comemorando porque não foi estilhaçada enquanto você está aqui em cima, sem falar que a primeira coisa que você fez ao sair do seu buraco foi sair matando meio mundo. Isso e também o fato de que eu queria ser sua primeira amiga...

Jasper deu outro sorriso bonito. Era difícil de acreditar que, pouco tempo atrás, aquela gem enorme estava trucidando rebeldes.

(Jasper, sorrindo): Bom, parabéns. Você conseguiu. Agora vamos, quero que você me apresente o resto do pessoal. Ah, também quero conhecer minha comandante.

As duas então desceram da parede do Jardim de Infância e foram se juntar às outras gems, que não só comemoravam a vitória contra os rebeldes, mas agora faziam uma calorosa recepção à sua nova campeã: Jasper.

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Num período entre as 15-16hs daquele mesmo dia, Sebek e sua coluna de guerreiros voltaram para Ahkvata. Quando os portões (enfim colocados no lugar) se abriram, havia um monte de gente reunida, como de costume, para ver seus campeões entrando. Qual não foi a surpresa de todo aquele povo ao ver seu rei e todos os seus guerreiros adentrando com a derrota estampada em suas faces. Um pouco mais atrás, na coluna, quatro cavalos puxavam uma carroça improvisada, onde transportavam o corpo sem vida de Menob. A esposa de Menob ficou em choque com a cena e começou a chorar muito alto, e não tem nada pior do que ver uma mulher grávida, carregando um bebê de mais ou menos 2 anos, chorando a morte do marido, carregado em uma carroça improvisada.

— MENOB? MENOB? O QUE ACONTECEU COM MEU MARIDO? O QUE ACONTECEU COM ELE?

— Menob, o gigante anaquim? Ele está morto?

— Impossível! Ele era o guarda-costas do rei! Era um dos soldados do Esquadrão Platina!

Os múrmurios do povo de Ahkvata começaram a ficar cada vez mais altos, até que eles começaram a demonstrar publicamente sua inquietação!

— O que está acontecendo? Como fomos derrotados?

— Majestade, o Esquadrão Platina não estava na batalha?

— Isso tem algo a ver com o Thanos?

Amennekht, Merit, Rose e as outras gems começaram a ficar desconfortáveis diante daquele povo. Sebek foi ignorando todos enquanto se dirigia até a praça central, o mesmo lugar que ele usou para executar as gems que ele recapturou após a fuga de Thanos. Chegando lá, Sebek fez um gesto para que todos silenciassem.

(Sebek): Cidadãos de Ahkvata, infelizmente trago más notícias para todos vocês! Os inimigos que enfrentamos no Jardim de Infância ofereceram uma resistência muito maior do que a que havíamos previsto! Por circunstâncias alheias à nossa vontade, o Esquadrão Platina acabou se separando, e isto aconteceu!

Muitos começaram a gritar em prantos, desconcertados com o que havia acontecido! Embora a expressão geral fosse de luto e pranto, alguns indivíduos isolados começaram a usar aquilo para extravasar uma fúria racista acumulada por muito tempo.

— ISSO TUDO É CULPA DESSAS ASSASSINAS!!!

— FORAM MONSTROS COMO VOCÊS QUE MATARAM MENOB!!!

— VAMOS APEDREJAR ESSAS MALDITAS!!!

Soldados de Amennekht começaram a fazer um cordão de isolamento ao redor das Crystal Gems para protege-las dos baderneiros que queriam usá-las como bode expiatório!

(Amennekht): Parem com isso, controlem-se! As Crystal Gems são nossas aliadas! Elas nos ajudaram na batalha! Não foram elas que mataram Menob, foram as gems de Homeworld!

— EU DISCORDO!!!

Todos voltaram sua atenção para perto do palanque onde Sebek estava. Logo abaixo estava Tyris Flare, juntamente com o Esquadrão Platina. Os vikings pareciam estar estranhando a postura dela, mas o resto agia como se quisesse que ela botasse a boca no trombone.

(Tyris) Eu vi o momento em que Menob morreu! Ele estava lutando sozinho contra uma gem de quatro braços e com cabelos brancos. Se eu não me engano, ela também tinha mais de uma pedra no corpo!

(Pérola): Impossível! Só uma fusão de gems diferentes teria uma aparência desse jeito, e o exército de Homeworld proíbe qualquer tipo de fusão desse tipo.

Devido ao espanto pelo que acontecera, Pérola acabou falando sem pensar, e isso acabou condenando todas as Crystal Gems.

(Sebek): Está me dizendo que quem matou Menob foi uma de vocês?

(Pérola): N-Não! Nós lutamos pela humanidade, nunca faríamos isso!

(Sebek): Então quem mandou matar Menob?

(Pérola): E-Eu não sei!

(Axel): Se vocês têm alguma honra, tragam essa fusão desgraçada até nós!

(Gilius): Traidores merecem ser cozinhados na própria gordura!

(Amennekht): Parem com essa barbaridade! Isso não vai nos levar a lugar nenhum! Temos que permanecer unidos! Talvez o inimigo tenha feito isso de propósito apenas para nos jogar uns contra os outros!

Os vikings começaram a ficar extremamente desconfortáveis com tudo aquilo e tentaram apartar a briga antes que a coisa ficasse mais séria.

(Olaf): Espere um pouco, majestade! Amennekht têm um ponto! Nosso líder, Thanos, já levantou, nos treinamentos, a hipótese de que um dia as gems de Homeworld poderiam usar artifícios para...

(Tyris): Não venha com essa de “nosso líder”, Olaf! Um líder de verdade não vira as costas para seus seguidores! Thanos nos abandonou, e por causa disso Menob morreu!

(Garnet): Escutem, a culpa não é de ninguém aqui! Isto é uma guerra! Pessoas morrem, gems morrem! Isso é o resultado da tirania de Homeworld! É contra isso que devemos lutar, não uns contra os outros!

(Sebek): Não venha querer nos dizer contra quem devemos ou não lutar, sua máquina imunda de guerra!

Garnet cerrou os punhos com raiva, se segurando para não acionar suas manoplas na frente de todo mundo!

(Amennekht): Chega Sebek! Uma coisa é você estar furioso com o que aconteceu no campo de batalha! Outra, totalmente inaceitável, é você usar minhas amigas e aliadas como bode expiatório! Controle-se e haja como um rei de verdade: Admita a derrota e se prepare para a próxima batalha!

(Sebek): “Suas” amigas? “Suas” aliadas? Essas coisas são monstros, é por causa delas que estamos mergulhados nessa guerra sem fim!

(Amennekht, furioso): Elas são minha família! Elas cuidaram de mim quando eu não tinha mais ninguém! Rose foi como uma mãe para mim! Não vou aceitar que você destrate minha família na minha presença!

(Sebek): Eu sou sua família, Amennekht! Eu sou a única coisa que te restou de família! Nosso pai e nossa mãe estão mortos por culpa de abominações como essa coisa, que você chama de mãe! O que nossa mãe diria se visse você maculando a memória dela, chamando de “mãe” uma das criaturas responsáveis pela morte dela? O que nosso pai diria se visse você sujando a linhagem real de nossa família fornicando com uma dessas meretrizes demoníacas?

Furioso com o que havia acabado de ouvir, Amennekht sacou sua espada e apontou para Sebek, enquanto o Esquadrão Platina formava um cordão de isolamento para proteger seu rei.

(Amennekht): Retire o que você acabou de dizer, Sebek!

(Merit): Parem com isso, isso é loucura!

(Erik): Majestade, por favor, isso está ficando fora de controle!

(Sebek, ignorando Erik): E quanto a você, Merit? Concorda com o que seu marido diz? Vai ficar do lado dele e da raça que está querendo exterminar nosso povo da face da Terra?

(Merit): Sebek, por favor! Você não está raciocinando direito! As Crystal Gems são nossas aliadas, você não pode...

(Sebek): QUIETA, SUA TRAIDORA!!!

Todo o povo reunido ao lado de Sebek estava começando a ficar exaltado com toda aquela cena, e Sebek aproveitou para usar tudo aquilo ao nosso favor!

(Sebek): Menob era o último sobrevivente de Hebrom! O último gigante! O último filho de Anaque! Graças às gems que Amennekht tanto ama, os gigantes anaquins foram varridos da face da Terra! Qual será o próximo povo? Os midianitas? Os hunos? Os helenos? Os vikings? Os astecas? Os tupinambás? Os apaches? Quantos mais ainda terão que morrer para que você veja quem é o verdadeiro inimigo?

(Rose, chorando): Eu não sou sua inimiga...

(Merit): Não precisa ser assim, Sebek...

(Sebek): Mas é assim! Você vai ter que se decidir agora, Merit! De que lado você vai ficar? Do lado daqueles que vão lutar pelo futuro da Humanidade, ou do lado daqueles que viraram as costas para seu próprio povo e agora se acovardam, buscando a paz com o inimigo?

(Baleog, cochichando para os outros vikings): Pelos deuses, o Sebek vai exilar a própria irmã...

Relutantemente, Merit se colocou ao lado de Amennekht, que mantinha uma expressão rígida contra o irmão caçula.

(Merit): Eu me casei com Amennekht, eu sou a esposa do Hórus vivo na Terra e rainha do Egito! Você acusa meu marido de virar as costas para o próprio povo ao mesmo tempo que me pede para escolher entre meu país e meu irmão! Eu não vou virar as costas para meu reino, Sebek, com ou sem gems morando nele! Se você vai escolher me renegar por querer servir meus súditos, a escolha é sua!

(Sebek): Já que você quer ser rainha entre as renegadas que nos atacaram à traição, você será uma renegada também! Nem você nem Amennekht são mais bem-vindos aqui! Agora vão embora de nossa terra!

(Baleog, cochichando): Odin nos ajude... isso vai ser um desastre!

Os soldados de Sebek e os cidadãos de Ahkvata agora batiam lanças e cajados contra o chão de forma ameaçadora. Estava claro que Amennekht não era mais bem-vindo em Ahkvata. Silenciosamente, ignorando as lágrimas de Merit e Rose, Amennekht conduziu as Crystal Gems e seus soldados em direção aos portões de Sidim.

Música de base: https://www.youtube.com/watch?v=F1c5PHAP4-g

(Axel): Invasão!

Chacina!

Nosso sangue manchando sua mão cristalina!

Invasão!

(Tyris): Covardes!

(Axel): Chacina!

(Tyris): Traidoras!

(Gilius): Subjugando a humanidade com força destruidora!

À medida que Amennekht foi avançando, toda a cidade começou a acompanhar o canto de desprezo de Axel, Tyris e Gilius. Alguns começaram a jogar pedras e até facas, obrigando os soldados de Amennekht a cobrirem o grupo com seus escudos!

(Soldado romano): Fora de nossa cidade!

(Axel): Invasão!

(Tyris): Covardes!

(Axel): Chacina!

(Tyris): Traidoras!

(Guerreiro Zulu): Traidor da humanidade!

(Guerreiro Chinês): Nosso sangue manchando sua mão cristalina!

(Amazona): Vai embora, opressor!

(Chefe Tupinambá): Parem de nos matar!

(Guerreiro Bárbaro): Invasão!

(Guerreira edomita): Covardes!

(Oficial turco): Chacina!

(Mulher persa): Traidoras!

(Egípcio de Ahkvata): Hórus nos abandonou!

(Guerreiro Janízaro): Subjugando a humanidade com força destruidora!

(Guarda de Ahkvata): Vai embora, opressor!

 

Diante de Amennekht, os portões de Ahkvata se abriram de uma forma sombria, como se até o próprio portão estivesse os expulsando dali! Até o sol parecia estar ainda mais inclemente do que de costume, potencializando ainda mais o coro enfurecido da população.

(Povo de Ahkvata, em conjunto): Perdeu seu lar

Cresceu em dor

Mas se uniu ao opressor!

Preferiu as Crystal Gems

E ao seu próprio povo ele renegou!

Ele não é um ser humano

Ele jamais foi um ser humano

Que humano renega o próprio povo

E se alia a um povo tirano?

É, Amennekht havia deixado de ser humano. O motivo? Ele não quis condenar as Crystal Gems injustamente! Não quis entrega-las à turba enfurecida de Ahkvata, que agora destilava ódio contra elas pelo simples fato delas terem uma pedra encravada na pele. Quando todos passaram, Amennekht olhou para trás: assim como Merit, a maioria das gems estavam chorando: Topázio Imperial, Pérola, Rose, mesmo a Garnet não conseguiu disfarçar o filete molhado escorrendo por baixo da viseira.

Mas Amennekht se recusou a mostrar qualquer sinal de fraqueza! Não iria chorar! Ele só voltou a olhar para trás para ver se conseguia um último contato visual com seu irmão, para que ele visse, estampado no rosto do Faraó, a frase: “Um dia você vai se arrepender disso! ”

(Povo de Ahkvata): O povo de cristal nos escravizou

Agora irão pagar!

E todo aquele que trair nossa causa

Para mostrar empatia ao opressor

Também vai pagar!

 

Ele não é um ser humano

Sebek ainda estava na muralha, observando enquanto Amennekht ia embora, levando consigo as detestáveis criaturas de cristal que oprimiam a humanidade, mas que ele insistia em chamar de família! Do lado do rei de Ahkvata, estava o Esquadrão Platina. Axel, Tyris e Gilius mostravam, em suas expressões faciais, total aprovação à conduta do rei. O Samurai se mostrava inexpressivo, enquanto que os vikings estampavam preocupação em suas feições.

(Erik): Ele acabou de exilar o próprio irmão.

(Baleog): Pior do que isso... ele acabou de quebrar relações diplomáticas com o Faraó do Egito.

(Olaf): Que Odin nos proteja...

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Jardim de Infância Beta – Algumas horas depois...

A noite havia caído, e o calor do deserto havia dado lugar ao frio congelante, não que isso importasse muito para gems. Num canto mais afastado do Jardim Beta, Jade estava treinando seus movimentos de luta e defesa pessoal. Além dos clássicos chutes e socos, ela também treinava as posturas e bases, bem como alguns movimentos de saque de armas. Como toda gem, Jade tinha poder de criar uma arma a partir de sua joia. A arma dela era um machado, mas ela preferia lutar corpo a corpo, deixando para sacar o machado apenas em que pudesse dar um golpe certeiro e definitivo, ou quando o oponente se mostrava forte demais para ela enfrentar no corpo a corpo.

Os punhos dela rasgavam o ar, com rapidez vertiginosa e uma força que deixaria qualquer rosto que ela atingisse bastante deformado. Parte dessa força era motivada pela raiva: Jade ainda estava remoendo a raiva pelos maus-tratos a que Hessonita submeteu sua Cornalina diante de todas as gems do Jardim Beta. Jade sentia vontade de chegar naquela almirante de nariz empinado e abaixá-lo na base dos murros. Mas ela sabia que seria suicídio. Uma situação sem saída que a irritava profundamente: Jade odiava ficar parada enquanto a Cornalina Laranja, a gem que ela tinha dever de proteger como guarda-costas, era esbofeteada como se fosse uma pérola defeituosa renegada pela própria dona. Porém, se ela tentasse intervir, seria estilhaçada imediatamente, acusada de alta traição por atentar contra a integridade de uma oficial superior, aí não haveria mais como ela proteger Cornalina. Se Jade tivesse sangue, ele estaria fervendo, mas como não era o caso, a gem verde resolveu descontar a raiva socando e chutando um pedregulho solto. Os golpes eram tão fortes que, em pouco tempo, a pedra começou a criar marcas nos pontos de impacto.

De repente, Jade parou de atacar e desfez sua postura de luta.

(Jade): Cornalina, eu posso sentir você me observando. Por favor, eu já disse o quanto me incomoda você fazer isso durante os treinos.

Cornalina saiu das sombras e chegou perto de Jade, com um leve sorrisinho no rosto.

(Cornalina): Desculpe, não sabia que você estava treinando. Só vim porque você parecia aborrecida, e você costuma se afastar para descontar sua raiva batendo nas coisas quando está aborrecida.

Jade não respondeu, apenas desviou o olhar, o que fez Cornalina desfazer o sorriso.

(Cornalina): Você está chateada por conta do incidente mais cedo, não é?

Jade apenas fechou os olhos, sem vontade de fazer contato visual com Cornalina.

(Cornalina): Jade, está tudo bem. Nada aquilo foi culpa sua. Você tinha razão, a Hessonita é uma idiota.

(Jade): Eu sei, mas... eu sou sua guarda-costas. Eu fui treinada para lutar contra inimigos duas a três vezes mais fortes do que eu. Mas eu não consigo te proteger de uma... uma... UMA IMBECIL QUE SE ACHA ALGUMA COISA PORQUE TEM UM LOSANGO AMARELO NA ROUPA!!!

Cornalina fez uma cara de espantada, tamanha foi a sinceridade nas palavras de Jade. A gem verde sentiu como se estivesse parecendo ainda mais idiota.

(Jade): *suspiro* Eu sei, nunca fui boa com as palavras. Por isso prefiro ficar calada e deixar os punhos falarem por mim.

Cornalina estendeu a mão e começou a acariciar o rosto de Jade.

(Cornalina): Bem, hoje mais cedo você deu um verdadeiro show com as palavras. Foi muita coragem da sua parte mentir daquele jeito para proteger nossas amigas.

(Jade): A C-Celestita não é m-minha amig-ga!

(Cornalina): Mais incrível ainda. Você arriscou sua pedra por uma gem que você sequer gosta. Por que não deixou a Hessonita simplesmente estilhaça-la?

(Jade): Não parecia certo... estilhaçamento é um fim horrível para qualquer gem. Celestita pode ter sido uma babaca comigo no passado, mas ela não merecia aquilo.

(Cornalina): E o que mais?

(Jade): A Esmeralda... ela ia ficar muito triste. A Esmeralda é uma gem maravilhosa, tão leal à nossa causa. Leal para com a gente. Eu não gostaria de ver uma gem tão adorável quanto ela de coração partido. Vê-la naquela situação foi demais para mim.

(Cornalina): Você sentiu algo ao vê-la daquele jeito. Foi isso que a motivou a agir daquele jeito.

(Jade): Eu não podia ficar parada sem fazer nada.

(Cornalina): Não, você não entendeu.

Cornalina segurou carinhosamente as mãos de Jade, causando uma sensação desconfortável na gem verde, que novamente voltou a desviar o olhar.

(Cornalina): Jade, olhe para mim.

(Jade): ...

(Cornalina): Por favor.

Relutantemente, Jade voltou a olhar para Cornalina. A gem verde tentava a todo custo manter uma expressão facial que ocultasse as sensações que corriam por dentro dela.

(Cornalina): Eu gosto muito de você. Não apenas como guarda-costas, mas como amiga. Só que me incomoda o fato de que você parece não... quero dizer...

(Jade): Eu pareço o quê?

(Cornalina): Meio... distante...

Não era a ideia que eu queria passar.

(Jade): Você queria que eu fosse mais como?

(Cornalina): Queria que você passasse mais emoção. Aquela vez que você me consolou após o incidente com a Hessonita... essa vez agora, que você interviu para ajudar a Celestita e a Esmeralda.

Eu não posso fazer isso. Não fui feita para isso.

(Jade): Cornalina, eu sou sua guarda-costas. Minha missão é proteger você. Me desculpe por não ter a sensibilidade que você tem. Eu realmente gosto dessa sua característica, mas eu não sou assim.

Não é por falta de vontade, acredite. Eu simplesmente, não posso.

(Jade): É para isso que gems importantes têm suas pérolas. Para fazerem essas coisas, coisas que gems combatentes não podem fazer.

(Cornalina): Eu não quero uma pérola.

(Jade): Então talvez uma rubi. Elas são boas guarda-costas, e geralmente vêm em grupos, para que elas formem fusões facilmente. Não seria difícil você pegar uma rubi nos padrões que você precisa.

(Cornalina): Também não quero uma rubi.

(Jade): Então você quer o quê?

Cornalina não respondeu. Se afastou um pouco e, do nada, desferiu um golpe surpresa, que Jade bloqueou facilmente. Cornalina sabia que não atingiria a gem verde, já que ela era treinada para situações como aquela. Mesmo assim, Cornalina continuou desferindo golpes a torto e a direito, todos bloqueados por Jade. O ciclo estranho continuou até que elas estivessem tão perto uma da outra que Cornalina acabasse enroscando os braços ao redor da guarda-costas.

Os movimentos que se seguiram depois foram totalmente diferentes. Não era mais como se elas estivessem treinando movimentos de luta. Eram movimentos totalmente suaves, quase como uma dança. Cornalina havia dado todos aqueles golpes de luta porque sabia que, enquanto Jade estivesse prestando atenção no movimento agressivo de seus punhos, não se preocuparia com uma mão delicada se esgueirando por entre sua cintura. Apesar de não estarem mais “lutando”, Jade não se sentia confortável. Algo a dizia para não baixar a guarda ainda.

As duas continuaram naquela sincronia de movimentos, naquela dança sem música. O auge foi quando Cornalina, sem nenhum aviso, fechou os olhos e inclinou o corpo para trás. Ela teria tomado uma queda feia se Jade não a tivesse segurado.

Na verdade, era quase como se ela soubesse que Jade a seguraria.

Jade ainda se esforçava para manter sua expressão facial de indiferença, mas estava difícil fazer isso enquanto segurava Cornalina pela cintura e pela coxa. Era sua obrigação ética e profissional se mostrar impassível em qualquer situação. Guarda-costas não podiam criar qualquer vínculo com quaisquer protegidos, pois em caso de morte do guarda-costas, o protegido ficaria extremamente abalado.

Mas para Jade, isso era quase impossível. Cornalina era linda, de corpo, de rosto, de voz. Se ela quisesse seduzir um humano com sua aparência privilegiada, seria fácil demais. Mas não só isso, as duas também tinham história. Jade havia sido escorraçada num treinamento de guarda-costas por uma quartzo muito mais forte. Sim, ela estava exausta depois de enfrentar 25 oponentes, mas aquilo não era desculpa. Nenhuma gem de elite aceitaria uma guarda-costas que não passasse no exame.

Mas Cornalina aceitou.

Outra coisa: Cornalina sempre tratou Jade mais do que apenas como uma guarda-costas. Jade era também sua confidente, sua estrategista, seu braço direito... sua amiga. Era normal para um protegido querer criar vínculos com guarda-costas, mas o guarda-costas deveria estar ciente disso e não se deixar cair nesse truque.

Jade havia falhado nisso miseravelmente.

Cornalina então se colocou em pé de novo, dessa vez com um sorriso estranho, que causava uma sensação desconfortável em Jade.

Não era o sorriso que Cornalina usava quando estava feliz, ou o sorriso de quando ela havia gostado de algo que Jade fizera para ela.

Era um sorriso diferente.

Cornalina também estava com um olhar penetrante. As orbes douradas nos olhos dela hipnotizavam Jade, motivo pelo qual ela às vezes evitava contato visual. A hipnose foi tão forte que Jade nem percebeu que Cornalina estava se aproveitando daquele movimento de dança para empurrá-la para trás lentamente. Só percebeu quando suas costas encostaram numa grande parede de pedra lisa.

Jade se virou para olhar a parede, mas Cornalina a fez manter o contato visual. Retirando os braços da posição de dança, Cornalina começou a segurar Jade pelos pulsos, fazendo ela manter os braços abertos para cima. Jade tentou mover os braços, mas Cornalina estava segurando com bastante firmeza. As mãos enluvadas de Cornalina, apesar de delicadas, não deixavam de ser tão fortes quanto a de quaisquer outras gems. Lentamente, as mãos de ambas foram se juntando, com seus dedos se entrelaçando.

Jade não entendia o que estava acontecendo. Cornalina sorria de um jeito totalmente estranho, segurava suas mãos com uma firmeza que a impedia de se soltar, mas ao mesmo tempo com uma delicadeza e carinho singulares, além de a penetrar com aquele olhar dourado que ela tinha. Não bastando tudo isso, a temperatura ao redor de Jade havia mudado abruptamente. O frio da noite no deserto havia dado lugar a uma sensação de esquentamento, como se houvesse uma fonte termal logo abaixo dela.

Jade desviou o olhar para baixo, para olhar sua pedra. Ela estava brilhando, emitindo um brilho verde fraco. A pedra no umbigo de Cornalina também emitia um fraco brilho laranja, em piscadas que intercalavam com o balanço dos quadris da gem laranja.

*SMACK*

Aquele familiar som de estalo fez Jade arregalar os olhos, surpresa. Cerca de três segundos depois, a visão de Jade começou a ficar turva, por conta de suas pálpebras pesadas. Suas narinas começaram a ser invadidas por uma fragrância adocicada, e ao mesmo tempo quente. Os músculos de Jade começaram a relaxar, desistindo de oferecer resistência. Com a mente embotada por aquelas sensações, e com os olhos levemente fechados, Jade acabou deixando um suspiro escapar dos lábios trêmulos.

Uma leve risota sedutora escapou dos lábios de Cornalina, fazendo Jade sentir suas bochechas esquentarem bastante. O tom de verde que corou o rosto da guarda-costas combinava perfeitamente com a marquinha de batom que Cornalina estampou na testa dela. Cornalina aproximou os lábios da orelha de Jade, e começou a sussurrar.

(Cornalina): Já tem alguma pista de que gem eu quero?

Jade não conseguiu responder nada. Ofegava como se estivesse exausta, fazendo seu busto se mexer conforme o ritmo de sua respiração. Cornalina resolveu descansar o rosto no busto de Jade, com seus cabelos sedosos roçando no rosto da gem verde, inebriando ela com um aroma adocicado característico.

*CHUAC*

Outro beijo, dessa vez na pontinha do nariz. Cornalina novamente soltou sua risadinha sedutora ao ver outra marquinha de batom enfeitando o rosto de sua guarda-costas. As mãos das duas foram se soltando levemente. Jade sentiu as mãos meio dormentes, enquanto as de Cornalina se apoiavam nos seus ombros. Depois Jade começou a segurar nos quadris de Cornalina, também começou a sentir o balançar característico deles. Para lá e para cá, para a esquerda e para a direita... um ritmo gostoso e relaxante...

*CHUACH*

*SMACK*

*CHUAC*

Mais três estalinhos característicos. Cornalina fazia sua guarda-costas baixar a guarda, distraia-a com sussurros, risotas sedutoras, movimentos relaxantes, depois dava um bote, como uma cobra, mas ao invés de marcas de picadas, deixava manchinhas de batom. Dessa vez no cantinho da boca, na bochecha e no pescoço.

Suspiros e sons ofegantes. Era tudo o que saía da boca de Jade sempre que ela tentava pronunciar três letras. A verdade é que parte dela, uma grande parte por sinal, não queria falar nada, apenas desfrutar aquele momento. Jade sabia, bem no íntimo, que aquilo podia ser uma má ideia. Celestita e Esmeralda quase foram estilhaçadas por causa daquilo. Mas a essa altura do campeonato, Jade não ligava mais. Não se importava mais com Hessonita, com as Diamantes, com a causa de Homeworld (se é que algum dia tiveram uma causa), com nada. Apenas com suas companheiras da Divisão Sigma.

E com Cornalina. Ela, principalmente.

Cornalina parou por alguns momentos, soltando Jade. Pôs a mão na cintura e começou a falar, ainda com seu sorriso característico.

(Cornalina): Peça.

(Jade): O q-quê?

(Cornalina): Nossas duas pedras estão brilhando, e muito. Nós duas sabemos que é apenas questão de tempo. Mas eu quero ouvir você pedir. Você nunca foi boa em lidar com sentimentos como foi em lidar com inimigos que me ameaçaram.

(Jade): ...

(Cornalina): Não vamos sair daqui até que você crie coragem.

(Jade): ...

Cornalina simplesmente pôs as mãos na cintura e ficou esperando enquanto Jade a encarava, com o rosto corado, sem dizer uma palavra. Alguns segundos depois, Cornalina só sentiu um puxão abrupto, para em seguida perceber que ambas estavam com os lábios colados. Cornalina segurou com força os braços de Jade, como se tentasse se soltar, mas pouco a pouco ela foi se rendendo, à medida que parou de sentir o corpo.

Não sentia mais as pernas, as mãos, os braços... nada. Só uma sensação inebriante, deliciosa e relaxante.

Uma luz brilhante notou entre as paredes daquela ala do Jardim Beta. Quando acabou, só havia uma única gem, de quatro olhos, num arranjo similar ao de Rainbow Quartz. A gem tinha cabelo branco, pele verde escura com diversas manchas avermelhadas, vestia um top e maxissaias ambos da cor preta (https://images-wixmp-ed30a86b8c4ca887773594c2.wixmp.com/intermediary/f/4445717d-858f-4dd8-9661-f2c47cb9a059/daew6dh-b40cb4be-5f8a-4d46-aae4-a2d74015c120.png/v1/fill/w_790,h_1012,strp/bloodstone_by_analsaviorr_daew6dh-pre.png).

A nova gem começou a falar consigo mesma, num monólogo similar ao de Turmalina Paraíba.

— Quando eu disse para você pedir, eu esperava que você falasse.

— Ações falam mais alto que palavras. Você sabe que eu sempre pensei assim.

— Verdade.

— Você sabe que vamos ser estilhaçadas por isso, né?

— É claro que sei. Eu vou ser estilhaçada, você vai ser estilhaçada. A Celestita, a Esmeralda, a Jet, a Bixbita, a Larimar, a Ônix... todas nós vamos... mas hoje não.

— Você é louca.

— Sei disso, e você é a que segue a louca...

— Claro, eu tenho que te proteger.

— Não, quem tinha que fazer isso era a Jade, e eu não estou vendo a Jade por aqui... só uma gem linda e poderosa, com belas curvas e uma voz encantadora.

— *risos* cruzes, você continua extravagante como sempre.

— O que posso fazer? É o meu jeito.

— Não, este é o jeito da Cornalina, e eu não estou vendo a Cornalina por aqui... só uma gem linda, poderosa e blá-blá-blá.

— Verdade...

— Uma gem que por sinal nem eu nem você sabemos o nome...

— Tem razão.

A nova fusão gem pôs as mãos na cintura e deu uma volta ao redor de si, como uma verdadeira modelo.

— Essa nova fusão tem o jeito de uma Jaspe de Sangue... mas eu não acho esse nome muito bonito para ela. O que acha de... Bloodstone?

— Tem uma sonoridade bonita. É, Bloodstone.

Escondida num canto, espionando a fusão, estava Larimar. Ela havia sido atraída pelo brilho intenso que vira poucos segundos atrás. Ela reconheceu, mesmo na escuridão, as feições familiares de Jade e Cornalina estampadas na fusão, bem como conseguiu ver um leve reflexo das pedras de ambas, nas posições originais delas. Mas ao contrário de outras gems, a reação de Larimar não foi de desprezo ou repulsa.

No rosto da pequena gem azulada só havia admiração e fascínio.


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Notas finais do capítulo

Mais de 7500 palavras + 20 páginas no Word = um capítulo incrível. Aqui eu finalmente usei a abordagem que eu queria usar com o Sebek. Uma coisa que eu sempre notei na fanbase de Steven Universo é que todo mundo ama as gems: gostam das Crystal Gems, das gems de Homeworld, das Diamantes, das Descoloridas, até mesmo criam suas próprias "gemsonas". Porém, as gems são meio que as vilãs do desenho. Elas tentaram destruir a raça humana, tanto que num dos curtas de Steven Universo, a Pérola até começa a se desculpar desajeitadamente por tudo o que aconteceu (rendendo uma cena cômica da Garnet carregando ela para fora da tela), como se ela tivesse medo de alguns humanos alimentarem ressentimento disso.

Por que será, hein?

Eu escrevi Sebek partindo de dois conceitos: Em primeiro lugar, Sebek foi criado para ser um "bad ending" do Amennekht. Sebek é o Amennekht que, ao invés de ser resgatado por Rose, foi mantido prisioneiro num zoológico por mais de uma década. Sebek representa o que Amennekht poderia ter se tornado.

Em segundo lugar, Sebek foi inspirado em pessoas da vida real, principalmente em membros de militâncias sociais. Para Sebek, toda gem é igual, toda gem deve ser odiada, porque elas estão matando a humanidade, estão destruindo a Terra. Quer dizer, dane-se o fato de que Sebek espanca gems indefesas a troco de nada, dane-se as gems que são mantidas cativas em condições deploráveis, as que são executadas publicamente para agradar uma plateia sádica, tudo isso é por um "bem maior". Qualquer humano que lute pela liberdade de seu povo têm a obrigação moral de concordar com CADA ato de Sebek, SEM EXCEÇÕES!!! Do contrário, não é um humano de verdade, e sim um traidor. Um opressor. As más línguas até criaram um nome infame para isso: "Ódio do Bem".

Depois desse capítulo, declaro encerrado o hiato de "Além de Rainhas e Generais". O próximo capítulo que postarei dará continuidade à saga de Oliver e Lily para impedir que suas comunidades se encontrem e se destruam mutuamente. Espero que tenham gostado deste capítulo. Até a próxima vez.



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